ERGASIOFOBIA
Vianney Mesquita*
Preguiça e ignorância se revoltam sempre contra aplicação e talento. [GASPAR MELCHOR DE JOVELLANOS – ou Baltasar Melchor Gaspar Maria de Jove Llanos y Ramirez. * Gijón, 05.01.1744; + Veiga, 27.11.1811. Poeta, advogado, diplomata e político).
Apavorante à primeira vista é a abertura deste
escrito, decorrente do inusitado da palavra que o nomeia, em evocação do meu estimado
amigo, Prof. José Cals Gaspar Junior, da Universidade Federal do Ceará, do qual
pela primeira vez e há muitos anos ouvi esta dicção e a quem homenageio,
também, no ensejo da elaboração das correntes notas.
PREGUIÇA
Este cultismo, em vigor dos Novecentos até hoje,
significa a repulsão doentia ao trabalho, aquele medo, sem razão plausível, de
qualquer atividade laborante. De exata etimologia helena - ergasia + phóbos – o pavor ao trabalho, distante de constituir mera
preguiça - pois estado de prostração
de teor orgânico ou psíquico - solicita atenção médico-psicológica à pessoa que
o conduz, decerto com acompanhamento psicoterápico, senão para curar, pelo
menos a fim de suavizar sintomas tão maléficos, com desdobramentos
psicopatológicos de grande monta, uma vez que induz, também, prejuízos, tanto
sob o prisma da convivência social quanto do ponto de vista econômico.
ÓCIO – OUTRAS LEITURAS
Assim entendida, ergasiofobia é sinônimo não
perfeito de vadiagem, falta de capricho, negligência, ausência de esmero
no que a pessoa executa, bem como de ócio,
dentre tantas outras acepções. A ideia de ócio, atual e revisionada desde a
segunda metade dos Mil e novecentos, no entanto, é objeto de estudos
científicos em profundidade como experiência pessoal e subjetiva, sob as luzes
da Psicologia do Lazer e da Teoria do Ócio, praticadas em várias instituições
universitárias do Mundo, a começar pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR. Menciono-a
desde logo, por ordem de proximidade e, em especial, pelo fato de concertar
altos estudos desse gênero em peças de mestrado e doutorado, sob a notável
orientação de cientistas de renomeada internacional, partícipes do Otium (mencionado logo à frente),
conforme ocorrem ser, por exemplo e em meio a muitos outros, o Professor Doutor
José Clerton de Oliveira Martins, bem como o Professor Doutor Padre Francisco
Antônio Francileudo, hoje no pántheion
da história da pesquisa brasileira, na qualidade de defensor da primeira tese
de doutoramento em Psicologia no Ceará.
Acresce fazer referência à aleia feminina,
configurada, na relação de outras estudiosas de poderio no Brasil, nas pessoas
da professora Grace Troccoli Vitorino e doutora Fabiana Neiva Veloso
Brasileiro, a primeira com título de doutor pela Universidade Federal do Ceará
– Faculdade de Educação, e a doutora Brasileiro laureada pela própria
Universidade de Fortaleza, sob a orientação do Prof. Dr. Clerton Martins,
havendo trabalhado na tese Da paideia à
Escola Contemporânea e de cuja Banca também participou a Prof.a Dr.a
Troccoli, em defesa sustentada, suma cum
laude, no dia 21 de janeiro do ano fluente.
Há bem pouco tempo, experimentei a satisfação,
também, de revistar o texto para qualificação de tese da doutora Adriana de
Alencar Gomes Pinheiro – também comparte do Otium
- de Juazeiro do Norte-CE, a qual trabalha na linha teórico-prática do
ócio, sob a direção didático-científica do Prof. Dr. Clerton Martins, com
artesãos em palha de milho de seu Município – pesquisa em andamento. OTIUM - LABORATÓRIO.
Tem ressalto nos experimentos acerca de ócio na UNIFOR o funcionamento, a pleno
emprego, do OTIUM – Laboratório de Estudos sobre Ócio, Trabalho e Tempo Livre,
criado em 2005, acessório imprescindível do Programa de Pós-Graduação (Mestrado
e Doutorado) de Psicologia, dessa prestigiosa instituição acadêmica local.
Naquele ano,
ex-positis, já se comprovara em movimento a significativa quantidade de
ensaios profundos acerca da necessidade de vincular os assuntos de fulcro de
que hoje se ocupa o Otium – tempos de
trabalho e fora dele – privilegiando seus reflexos na vivência das pessoas,
trabalhadores, sua família e a sociedade como um todo. Este foi, por
conseguinte, o leitmotiv mediante o
qual um pugilo de pesquisadores da melhor crase na grande área da Psicologia
decidiu instituir essa oficina científica, hoje inseparável da esteira temática
da pós-graduação sob comentário nessa gigante Universidade particular na
contextura brasileira.
Por conseguinte, tendo por pretexto o exame encalçado
pela Pós-Graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza, configurado nos pathé psíquicos na pessoa em sociedade e
sob cultura - a ideia, expressa nitidamente nos objetivos do Laboratório, é
alimentar o discurso dialogal pluridisciplinar, considerando o fato de a
ciência não interpor lindes de começo e fim, com vistas a iluminar o fenômeno
da subjetividade relativamente à elaboração dos tempos livre e ocupado. Assim,
a intenção, até agora exitosa, é aportar à compreensão nítida e aplicável do
que circunda essas dimensões, fato que se exprime absolutamente possível, hajam
vistas os resultados indicados pelas buscas procedidas, no exercício dialógico
com autores nacionais, estadunidenses e europeus, nomeadamente com investigadores
da Universidade de Deusto, localizada em Bilbao, capital da Biscaia, Comunidade
Autônoma do País Basco.
JOHN
NEULINGER (Dresden, 26.04.1924; +Dolgeville – NY – 20.06.1991).
Com efeito, o modus
operandi do Laboratório de Estudos sobre Ócio, Trabalho e Tempo Livre
assenta em fazer exatamente essa relação com uma significativa listagem de pesquisadores
daqui e do Estrangeiro, em demanda de assuntos que cuidam de escopos afins ao
ócio, transpondo a simples ideação de preguiça, patológica ou viciosa, mas
aportando, por exemplo, às noções industriosas expressas pelo psicólogo e
professor emérito de Psicologia de City College de Nova York, o
teuto-estadunidense John Neulinger (1924-1991), em seus estudos a respeito de
padrão e ausência de lazer, realizados no âmbito da Psicologia dos Estados
Unidos.
Um dos cientistas a inaugurar o exame do ócio com
estribo da Ciência Psicológica - como noticia a Professora Doutora Ieda Maria
Rhoden, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo- RS, doutora
em Ócio e Potencial Humano pela
mencionada Academia basca – o Psicólogo de Dresden e Nova York sugere um padrão
para taxionomia do ócio, consoante as condições que entende cruciais para a
experiência com tal circunstância – a motivação e o entendimento de liberdade –
molde sistemático, consoante Rhoden, que exerceu enorme influxo no estudos das
ideias ora tratadas nos derradeiros 30 anos, como, por exemplo, as noções de ócio puro e ócio-ocupação.[RHODEN, I. O ócio como experiência subjetiva:
contribuições da Psicologia do ócio. Rev.
Mal-Estar Subj. 9 (4) dez. 2009].
HOMENAGEM AO OTIUM
Uma das muitas satisfações que experimento é a de
haver acompanhado a invejável evolução do Programa de Pós-Graduação em
Psicologia da UNIFOR, desde seus albores, havendo procedido à revisão de teses
e dissertações, por indicação, de início, dos Professores Doutores Henrique
Figueiredo Carneiro, Isolda Castello Branco Bezerra de Meneses, Sylvia
Cavalcante, Leônia Cavalcante Teixeira e Clara Virgínia de Queiroz Pinheiro, e,
depois, de vários teóricos de uma das especialidades mais preeminentes da
Ciência, conformada pela Psicologia.
Estou ciente de que a totalidade desses
docentes-investigadores tem assento em qualquer cátedra universitária e
desfruta de entrada franca em todo campo de prova do Brasil e do Exterior,
muitos dos quais usuários e consultores dos nada menos de seis laboratórios
mantidos pelo referido Programa da UNIFOR. Seu trabalho seriíssimo, executado
no âmbito exigente das morais condições e intelectuais circunstâncias sob as
quais opera a demanda do feito científico, somente granjeia honra para nosso
Estado e divisas para o País.
Essas ligeiras notações, que muito me aprouveram
proceder, tiveram, especialmente, o desígnio de creditar homenagem aos
docentes-cientistas da UNIFOR, na seara riquíssima da Psicologia. A eles, pois,
dirijo emboras, como também aos seus orientandos, pela copiosa, renovada e
constante produção científica da mais suspendida essência,
em dissertações de mestrado e teses de doutor, além de artigos em periódicos
insertos no sistema Qualis e outros editados em revistas importantes e acreditadas
em várias partes do Mundo, cujas leituras embasam ensaios e mais ensaios à
procura do saber novo, dessedentando, nem que seja por pouco tempo, a
insaciável garganta da ciência, sempre necessitada de se abeberar de algo ainda
não sorvido pelo ânimo voraz do investigador de ofício.
Como termo destas notas, ofereço ao Otium um soneto por mim composto nos
idos de 1976 (há 39 anos), quando não ocorreu uma das aulas da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Ceará, ficando todos OCIOSOS, preguiçosos,
sem fazer nada, na inação, moleza e mandriice, decerto ao modo do ócio-puro, divisado pelo sobredito
pesquisador tedesco-ianque John Neulinger, bem ao gosto da ideia de
ergasiofobia, no começo conceituada.
ÓCIO
(OU ERGASIOFOBIA)
Fazer nada é forjar em forno frio,/É fazer fé na
fronte dos malucos; É atiçar lamparina sem pavio / E duvidar da liquidez dos
sucos.
Fazer nada requer regar o rio, /Remar a ré no
rastro dos caducos./ É, cegamente, acreditar num fio / De masculinidade nos
eunucos.
Fazer nada é, por final, amigo,/ O cogitar em
certas ilações:/ Na certeza iminente de perigo
Que a lazeirenta fome dos leões / Costuma produzir
nos corações/ Que os cardiopatas conduzem consigo.
Artigo-Homenagem ao Laboratório Otium
Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade de Fortaleza - UNIFOR
*Vianney Mesquita
Escritor e Jornalista
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