quinta-feira, 31 de julho de 2014

ARTIGO (RMR)

SAUDADES DE RIO BRANCO
Rui Martinho Rodrigues*

Barão do Rio Branco
A diplomacia brasileira já foi respeitada. Herdou de Rio Branco o discernimento para vislumbrar os interesses nacionais, realismo político, noção de conveniência e oportunidade de exercer protagonismo e o respeito aos mais caros princípios da diplomacia, tais como não intervenção nos assuntos internos de países soberanos e escrupulosa observância das regras de neutralidade nos conflitos entre terceiros.

Política internacional é jogo pesado. Exige o reconhecimento do próprio peso relativo. Mussolini pegou na rodilha sem poder com o pote. Perdeu. Franco, mais sábio, permaneceu neutro e ganhou. China, Índia, Rússia, potências nucleares muito mais influentes, mostram-se mais moderadas do que o Brasil na questão de Gaza. Os países árabes não demonstram tanta sensibilidade quanto ao conflito citado. Egito, Síria, até o “partido de Deus” permanecem distantes do Hamas, grupo político havido como terrorista.

O Brasil foi o único país a retirar o embaixador de Israel. Perdeu status de neutro e de possível mediador. Sem força militar, sem influência, entramos no jogo sem ficha. Nem na América do Sul lideramos. Bolívia, Equador, Argentina e Uruguai são influenciados é pela Venezuela. Somos uma economia voltada para dentro. Pouco importamos ou exportamos. Temos menos de dois por cento do comércio mundial. Não podemos ameaçar com embargos. Israel mantém com o Brasil programas de cooperação tecnológica e industrial, como é o caso do projeto de um míssil. O Hamas nada tem a oferecer.

A tese da “desproporção” da força é falsa. Desproporcional é o uso continuado da força após cessada a agressão. Os disparos contra Israel não cessaram. Os bombardeios de Israel são antecedidos de avisos. O Hamas não aceita um cessar fogo, quer apenas uma pausa para ultimar novos ataques. Mostra indiferença com o sofrimento do próprio povo, que usa como escudo.

Buscamos mais protagonismo do que os árabes e todos os governos do mundo. Faltou realismo, pragmatismo e autocrítica.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10

ARTIGO (PMA)

AINDA PÃO E CIRCO
Paulo Maria de Aragão*

A prevaricação, a crueldade e a dissolução acabaram com as antigas glórias de Roma. Quando a imoralidade invade a classe governante, influencia as camadas inferiores da sociedade. A devassidão dos costumes redunda em devassidão dos princípios. Predominam os sentimentos baixos e esmagam a força moral do caráter.

Roma deve a sua decadência à corrupção e aos desmandos. Com efeito, a Senhora do Mundo sofreu a invasão de tribos selvagens saídas das florestas da Europa Central, ao tempo que ricos viviam imersos em deleites voluptuosos, os pobres arrastavam a existência na miséria e na mendicidade.

Os dias de grande espetáculo no Coliseu eram considerados dias festivos para toda a cidade. Homens, mulheres e crianças acudiam ao sangrento espetáculo. Viam-se magistrados e senadores, funcionários do Estado, nobres e plebeus. Gladiadores adiantavam-se à presença do
imperador e exclamavam: “Ave Caesar, morituri te salutant”. Davam as feras princípio à sua obra, que os gladiadores terminavam. O entretenimento durava até a noite, retirando-se o espectador ébrio de sangue.

No Brasil, guardados os exageros, por séculos há o predomínio da roubalheira, da corrupção, de políticos impudentes, de juízes vendilhões e de marginais que hoje se escondem por trás da falta de compromisso democrático. Raros homens íntegros se atrevem a participar dos negócios governamentais. As decisões são tomadas para atender promessas oficiosas de campanha. Não é de hoje a espúria distribuição de cargos para garantir alianças partidárias e apoio parlamentar.

Revista Veja
O mais grave é serem os cargos preenchidos por qualquer apaniguado, seja ladino, seja  détraqué. Isso não importa, o importante é “quem indica” ou QI. Pobre democracia, transformada num verdadeiro balcão de negócios! Os escândalos institucionais, em sequência, são infindos e abafados. Há um flagrante mal-estar social com a maneira de se fazer política. 

Ora, há de falar-se em bons gestores quando a administração é dirigida por pessoas descomprometidas com a ética e a moral, requisitos indispensáveis aos anseios da sociedade? Uma questão de bom senso: poderá haver eficiência de setores orquestrados pela incompetência e desonestidade? É como confiar o galinheiro à raposa, isto é, aos sequazes do velho jargão: “Toma lá, dá cá”.

Diferentemente da antiga Roma, revela o óbvio ululante: numa distância de tempo inimaginável, impossível seria fazer um comparativo entre a queda daquele império e a nossa realidade, não obstante serem ambas laceradas pela corrupção. Aquele império viveu período áureo; o Brasil, nem no monárquico, nem no republicano, o conheceu.

Longe do vasto império romano, nem mesmo hoje, poder-se-ia comparar o Brasil com a atual república italiana. Esta ocupa o 24º lugar no ranking dos países mais desenvolvidos do mundo, com o índice de qualidade de vida entre os dez primeiros e a educação básica em altíssimo nível.

Aqui, carecemos de saúde, sistema educativo e segurança, mas não faltam bolsas de todo tipo, auxílios daqui, ajudas dacolá, que tanto incentivam a inércia dos compatriotas. Sem alarde, a violência se instalou entre nós: assaltos, arrastões, assassinatos, tráfico, tudo está banalizado. O governo, ao esbanjar milhões na construção de estádios para a Copa e preterir o setor de saúde, que está no fundo do poço, foi além dos limites. Contudo, a desfaçatez ocupará palanques eleitorais, e os demagogos irão dizer que a saúde está à beira da perfeição.

Segundo os passos da história, sábio é quem aprende com o erro dos outros, qualidade essencial para os governantes. Oxalá o Brasil não incorresse nas mesmas causas da crise que provocou a queda do império romano. Apesar de indesejáveis, há tempos, algumas delas são exercitadas, como o estratagema do “pão e circo”. Isso ocorre, sobremodo na época eleitoral, quando a população carente e desinformada aflui aos forrós regados a cerveja e acaba esquecendo os graves problemas sociais, reduzindo as chances de protesto.

(*) Paulo Maria de Aragão 
Advogado e professor 
Membro do Conselho Estadual da OAB-CE
Titular da Cadeira nº 37 da ACLJ

quarta-feira, 30 de julho de 2014

CRÔNCA (VM)

ENXUGA-GELO
Vianney Mesquita*

Três são as coisas que se me afiguram inúteis: a luz de uma vela ao Sol, a chuva caída no deserto e a verdade proposta ao ignorante. (Padre Juan Arolas. *Barcelona, 20.06.1805; +Valência, 25.11.1843).


Ao perfazer, celeremente, o caminho para o inexorável ocaso anímico (Palmácia-CE, 17.08.1946), após cerca de quarenta anos procedendo à tarefa prazerosa de remover de textos (postulantes a publicação) equívocos gramaticais, inconsistências estilísticas, impropriedades de teor histórico, geográfico, sociológico e coisas semelhantes, eis que um contratante poderoso, de cidade grande que não Fortaleza, por meio de prepostos – sub tegmini fagi vergiliano do poder  deixou de considerar boa parte das minhas intervenções. 

Assim procedeu, ab ruptu, em original de livro a que me submeteu por indicação de um colega professor, sem aduzir qualquer razão, tampouco pedir explicações sobre as marcações procedidas, lance em que, decerto, justificaria minhas decisões e o demoveria do intento, já então decidido, de eludir as ditas intervenções.

Do lado dele, este representa um comportamento, no mínimo, esquisito, eximindo-me de referir ao esgalho filosófico a Nicômaco, porquanto ocorreu ao reverso da normalidade, quando a parte julgou o juiz, pois a ele me submeti e não o contrário, consoante, aliás, foi verbalmente avençado.

Malgrado haver sido avaliado – pois, estranhamente, não logrei laborar feito avaliador – me acho desincumbido do trabalho acertado, desenvolvido com a necessária responsabilidade, cuidado estreme e zelo habitual, remunerado conforme se pactuou.

Impende externar, por imprescindível, o fato de não me sentir na obrigação de devolver o valor da retribuição, pois efetuei a atividade conforme o figurino, com todos os efes e erres, ao modo de proceder há dezenas de anos. Isto me rendeu renome e crédito no ecúmeno inteligente e culto, na Capital do Ceará e noutras metrópoles, como um dos revedores preferido das universidades e institutos de ensino superior e pesquisa.

Não deploro, impõe-se dizer, o crédito fora da “nominata” do citado livro, feito responsável pela revista do texto; lastimo, entretanto, depois de tanta estrada, é o fato de experimentar a sensação de haver, conforme evoca o religioso e poeta catalão Padre João Arolas, chovido no deserto, inflamado lamparina sob o sol e proposto verdade a ignorantes que, como sói acontecer, sempre a rebatem.
Apenas uma vez, porém (não faz mal, é o tempero), fui feito ensacador de ar, enchedor de pneu de trem e enxugador de gelo.

Cest la vie!
*Vianney Mesquita 
 Docente da UFC 
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa  
Acadêmico Emérito-titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo 
Escritor e Jornalista

CRÔNICA (RV)

 DÍSTICO APAIXONADO
Reginaldo Vasconcelos*


Deu na Time. O piloto de jato americano gravou suas últimas palavras na caixa preta do avião, quando o aparelho imbicava irremediavelmente para o solo: “Ma, I love you!”. 

Não sei que nome feminino está sintetizado nesse minúsculo nickname, tampouco saberia dizer por que razão o apaixonado militar não acionou a poltrona ejetora a catapulta-lo sobre a  morte. Também não dá para invocar o super-homem, que faça o mundo girar ao contrário para livrá-lo da tragédia. Só sei que foi assim, como diria o Suassuna.

O que importa aqui é o belo anúncio da paixão, o momento grave do manifesto, a melancolia inefável que transporta. O rapaz ia morrer e quis então registrar sua devoção à moça amada, grandiosa e definitivamente. Seu gesto corresponde a fazer soar uma declaração de amor por todas as planícies do universo, espalhar bandeiras com dísticos afetivos sobre os picos das montanhas, cobrir o mar com rosas púrpuras, com dedicatórias em bilhetes. Ele ia morrer e ele a amava. 

Um dia desses vi pela rua uma mulher que amei demais. Ela passava, eu passei, sequer me viu. Mas de dentro do carro tive ganas de ejetar-me dali e ir abraçá-la na calçada, e dizer-lhe o quanto a amei no passado, e apresenta-la à família como antigo bem-amado.

Diria às atuais donas de mim, senhoras da minha alma, que aquela criatura inexpressiva um dia representara na minha vida o sino e a ponte, o barco e o porto, a vela e a porta, a faca e o pomar. Fora eu um piloto que fosse morrer naquela época talvez tivesse lembrado de timbrar o meu amor a ela nos gravadores do avião, sem saber que, em não morrendo eu, que não morri, aquele sentimento morreria, para converter-se em apenas nostálgica lembrança. 

Penso que morreria de amor se fosse o caso. E por amor mataria, se necessário, porque sou mesmo dado a esses rasgos amorosos. E por amor trabalharia de pastor por sete anos, como teria feito o bíblico Jacob, o qual queria desposar Raquel, “serrana bela”.

E se não fosse necessário tanto, mas fosse possível conquistar a amada mulher pichando muros eu faria como o moço do subúrbio que escancarou na parede mais suja, com a sua pior caligrafia, com tinta barata, mas em letras garrafais: 
Dea. Te adoro, sua doida!
E assinou: Jean.



*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ   

ARTIGO (RMR)

A CONQUISTA DA HEGEMONIA II
Rui Martinho Rodrigues*


A hegemonia ideológica se relaciona com a tradição libertária: pensadores clássicos e a Igreja.

O pensamento libertário é sedutor. Promete emancipação. Declara a nossa racionalidade. Lisonjeia. Promete superar o freudiano mal-estar na civilização. Infelicidade é culpa dos limites opressivos. É o mundo em preto e branco. Tem mocinho e bandido, vítima e algoz, identidades bem definidas, certezas, verdadeira consciência e a promessa messiânica: emancipação. 

É bom ser mocinho, combater vilões, ser “esclarecido”. Quando oportuno, nega-se a existência da verdade (não a “verdadeira consciência”); e da identidade (não a de “esclarecido”). É a dialética, “senhora de costumes cognoscitivos fáceis”. Pulsão de vida e de morte, passionalidade e outras coisinhas são desconsideradas. Alega-se que “o homem é um animal político”. Não importa que a nossa sociabilidade seja forçada pela necessidade.

Pensadores clássicos muito citados, pouco lidos e menos compreendidos, ensejam pose de sábio. Basta aludir a um renomado autor, alguns chavões e se obtém aplausos. Não é Gramsci. Já havia sofistas entre os gregos, reduzindo tudo à retórica relativista. Os helenos sucumbiram aos romanos. Aqueles viviam de retórica, estes da solução de problemas. A conquista da hegemonia pelos libertários é a vitória da deusa Bem-aventurança (Preguiça, para os desafetos), que prometia colher sem plantar. É a derrota da deusa Virtude, que dizia: “Você só vai colher o que plantar”.

O Vaticano e o Clero influenciavam o Brasil. A maioria dos cardeais da cúria metropolitana era italiana e francesa. Nestes países o partido comunista crescia a cada eleição. A América Latina parecia a beira da revolução. A corrida espacial favorecia a URSS. O Vaticano II veio para aderir aos vencedores. O Clero, anticomunista, tinha tendência fascista, celebrara um acordo com Mussolini, apoiara a Ação Integralista Brasileira.

Comunofascistas acham que o homem não se pertence, formam partidos orgânicos, adotam o culto à personalidade dos líderes, são messiânicos, representam o bem contra o mal, são disciplinados, têm um inimigo a quem odiar, são irmandades, fazem pose de superioridade moral e intelectual, tratam o homem como animal de rebanho, dizem que os fins justificam os meios (abrindo a caixa de Pandora), negam a escolha livre e consciente. São iguais. A Igreja adota tudo isso. A conversão dos integralistas ao “esquerdismo” confirma a unidade comunofascista. O Vaticano II foi a passagem de uma coisa para o que parece ser outra.

O cristianismo é teocêntrico. O marxismo é antropocêntrico e cosmocêntrico. A dialética concilia. Confundiram fazer o bem com a luta por um mundo melhor (isso é outra reflexão).

Gramsci é obscuro. Burlava a censura dos carcereiros e do PCI. Pregava a “guerra de trincheira” (reformismo?), sem repudiar a revolução. Ambiguidade dos astrólogos é receita de sucesso. Todos podem se ver na obscuridade do texto. 

Gramsci e a hegemonia por ele pregada se beneficiaram disso.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor - Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
  

sexta-feira, 25 de julho de 2014

ARTIGO (VM)

Metodologia da Ciência
O PROCEDIMENTO DA INDUÇÃO
Vianney Mesquita*



                                            Só sei que nada sei. (Sócrates)

Dos métodos da razão ou discursivos inventariados pela Metodologia Científica e recorrentemente empregados no decurso de uma investigação, o expediente da INDUÇÃO exprime considerável quantitativo de fatos procedentes de um problema bem maior. Descansa este em se saber se é válido, sob o espectro da Teoria do Conhecimento, estabelecer verdades universais ou proposituras globais com arrimo num total variável de indicadores particulares ou de proposições menos gerais.

Ao passo que na DEDUÇÃO as premissas verídicas conduzem a ilações também verdadeiras, na INDUÇÃO as conclusões se expressam questionáveis no concernente a sua veridicidade.

No âmbito do labor investigativo da Ciência, constantemente se registam** problemas, nomeadamente no tangente à escolha e adequação do método, o que é permanente e vigorosamente debatido pelos pensadores desta seara, desde a madrugada do saber sistematizado.

No que respeita à INDUÇÃO, algumas soluções restaram propostas por filósofos de notoriedade, é claro, no entanto, sem unanimidade de entendimentos. Assim ocorreu com Francis Bacon, verbi gratia, acolitado por uma classificada aleia de bons pensadores, que aportou à indução amplificante, também denominada científica e baconiana, afirmação com estribo na descoberta de relações permanentes entre dois ou mais fenômenos, de um vínculo necessário e universal entre eles.

Temas de tal natureza, de indescartável importância para a descoberta da verdade fenomênica pelo mais curto e rápido caminho, são analisados pelos professores doutores Rui Verlaine Oliveira Moreira e José Anchieta Esmeraldo Barreto, no livro O Problema da Indução – O Cisne Negro Existe, editado pela Imprensa Universitária da U.F.C.

Reporto-me a um compêndio de insuperável rigor metodológico e professoral estruturação didática, qualidades representativas da estatura intelectual e da prontidão acadêmica de ambos, diuturnamente reciclados ao curso de muito tempo.

A discussão é aberta e simples, assentada no que há de superior em fontes bibliográficas. A linguagem é direta e concisa, dando azo a leituras correntes. É fácil e digna, também, do ponto de vista da Língua Portuguesa, sem quaisquer neologismos nem vícios, hoje muito comuns – e isto é reprovável – no repertório acadêmico, consoante sempre evoco nas páginas desta Folha informática.

Além do debate a respeito de entraves e soluções múltiplos da INDUÇÃO, os autores incluem uma seção suficientemente elucidativa acerca dos binômios particular-universal, sujeito-objeto e o problema da indução, exatamente com vistas a prontificar o leitor a descodificar a contento o texto principal relativo ao método indutivo.

Oferecem, alfim, os necessários elementos de probabilidade, objetivando, também, subsidiar o consulente no entendimento dos problemas e soluções indigitadas para maior eficiência e mais eficácia, quando do emprego dessa relevante metodologia racional.

O Problema da Indução - o Cisne Negro Existe é labor de inusitada aplicação intelectiva e, pelos elementos que reúne e explica, ensejará ao investigador, ao docente e estudante de pós-graduação – e até mesmo da graduação – das diversas áreas envolvidas com Metodologia, Filosofia das Ciências e matérias afins, o lance de compreenderem os óbices até hoje expressos pela INDUÇÃO, já que as soluções estão no livro diafanamente expostas.

Constitui o trabalho sob comento material indispensável a qualquer programa de pós-graduação que cuida do estudo da Ciência, bem assim ao investigador tendente a se utilizar deste método racional de descoberta do conhecimento.


** Utilizei o verbo assim mesmo – registar – igual a registrar, pois estão dicionarizadas ambas as formas.

*Vianney Mesquita 
 Docente da UFC 
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa  
Acadêmico Emérito-titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo 
Escritor e Jornalista

quinta-feira, 24 de julho de 2014

ARTIGO (CB)

ANASTÁCIO MAIA 
E O AÇUDE ORÓS
Cássio Borges*

Faleceu, no último sábado, em Fortaleza, um dos engenheiros mais representativos da vitoriosa história do Departamento Nacional de Obras contra as Secas – DNOCS. Trata-se de Anastácio Honório Maia, o construtor do Açude Orós no início da década de 60.

Esta imensa barragem é, sem dúvida, uma das obras da maior importância estratégica e econômica realizada pelo DNOCS nos seus 105 anos de existência. Na época, quando inicialmente foi projetada, era considerada como sendo uma das maiores barragens do mundo com quatro bilhões de metros cúbicos de água.

Quem conhece o real drama das secas no Nordeste e no Ceará, em particular, compreende de imediato a importância estratégica desta  represa, encravada em pleno coração da região mais seca do Estado do Ceará. Os primeiros estudos para construção do Açude Orós data de 1912 e, em 10 de outubro daquele ano, um grande incêndio nos escritórios do DNOCS, em Fortaleza, destruiu seu primeiro projeto e respectivos estudos.

Em 1958, um ano das mais aterradoras secas na região nordestina, aproveitando a mão de obra dos flagelados, iniciou-se o preparo das fundações para a construção da grande obra, de sorte que as chuvas já as encontrassem prontas no início de 1959. À frente da equipe estava o Eng.º Anastácio Maia. Nascia, assim, mais uma comunidade no Estado do Ceará: o município de Orós.

Após o inverno de 1959, que foi regular no vale do Rio Jaguaribe, o rio foi finalmente fechado. Chegou 1960 e, como sempre, a situação era de expectativa. Será seca? Desde 1950 o Nordeste atravessava um dos períodos mais secos de sua história. As águas do inverno de 1960 começaram a impor receios ainda nos primeiros dias de janeiro, face o imprevisível. Chuvas em todo o interior do Estado. 

Verdadeira massa humana a revezar-se com as máquinas, objetivando elevar mais alguns centímetros a barragem, a fim de aumentar sua capacidade e represar milhões de metros cúbicos de água ameaçadora que chegava. Homens, meninos de todas as idades entre a passagem de duas máquinas, de pá, picareta, enxada ou mesmo com as mãos trabalhavam incessantemente. No Posto Fluviométrico do DNOCS (instalado em 1911, provavelmente o primeiro da América do Sul), localizado em Iguatu, dizia da elevação sempre crescente do nível do rio.

Exatamente aos 17 minutos do dia 26 de janeiro começou a ocorrer o transbordamento. O reservatório continuava enchendo e, cerca de 30 minutos após, ouviu-se um estrondo tal qual gigantesca cachoeira. A água transbordava pelo meio da barragem e, logo em seguida, em toda a extensão dos seus 600 metros.

Não houve o terrível rompimento da barragem. A erosão processou-se relativamente lenta no meio da barragem de terra. Estava praticamente definida a situação. Restavam 2/3 do maciço. Viu-se, então, a solidez da obra. O Orós comportou-se de maneira inédita. Uma vitória da engenharia do DNOCS.



Os Técnicos daquele Departamento tendo à frente o Engº Anastácio Maia e outros do mesmo gabarito técnico/profissional, já estavam com planos de construir, de imediato, os açudes Banabuiú, Castanheiro, no Rio Salgado, em Lavras da Mangabeira, e de Boa Esperança no Estado do Piauí, as maiores obras programadas após a conclusão do Orós.

* Cássio Borges
Ex-Diretor do DNOCS
Engenheiro civil formado pela Escola Politécnica de Pernambuco, com cursos de especialização em Hidrologia e recursos hídricos, pela Escola Nacional de Engenharia e Pontifícia Universidade Católica-PUC, ambas do Rio de Janeiro. É Membro Honorário da ACLJ.
   

ARTIGO (RV)

A MORTE DE IMORTAIS.
O FATO JORNALÍSTICO 
E O MARCO HISTÓRICO
Reginaldo Vasconcelos*


A Academia Brasileira de Letras acaba de perder três de seus quarenta titulares, no espaço de apenas 20 dias, o que é um fato insólito. O primeiro foi o carioca Ivan Junqueira, que morreu neste recente 03 de julho.  

Mas os dois últimos a falecer eram da ala dos acadêmicos nordestinos – outra coincidência histórica. Ambos grandes estrelas de popularidade nacional, gente cujas letras decolaram para o teatro, o cinema, a televisão.

João Ubaldo Ribeiro, que deixou a vida terrena no último dia 18, era baiano; Ariano Suassuna, paraibano, fez a passagem na tarde de ontem, quando a ABL ainda celebrava as exéquias rituais a João Ubaldo.

Então se repete na mídia o cacoete de se abordar parentes e amigos de cada um dos defuntos para lhes ouvir opiniões, deflagrando uma cascata de lugares comuns e obviedades – pessoa inesquecível, perda irreparável, tristeza profunda.

Autoridades, por seu turno, divulgam notas de pesar compostas a partir de um manual de meia dúzia de frases que os assessores embaralham e recombinam, sem poderem disfarçar a banalidade dos termos surrados. Para traduzir a perda de entes queridos ou célebres só o abraço e o silêncio, no máximo toques de sinos. Todas as palavras são supérfluas.

A morte natural na maturidade é tão previsível e inevitável quanto os consequentes necrológios e epitáfios tautológicos. Tragédias para as famílias enlutadas, apenas marcos históricos para a sociedade, em se tratando de homens públicos que falecem.

Avoco-me, toda sorte, a obrigação de dizer algo, em nome da ACLJ, sobre os fatos jornalísticos da sequência de eventos funestos no âmbito da nossa congênere nacional, dois deles envolvendo intelectuais nordestinos, e sobre o marco entrevisto no fim de ciclos literários intensamente produtivos.

João Ubaldo Ribeiro era um jornalista poliglota, bacharel em Direito e professor, cronista e romancista refinado, que morou em três países estrangeiros, casou três vezes, e vivia no Rio. Era cadeira cativa nos botequins da boemia carioca, e tinha o seu norte onírico na Ilha baiana de Itaparica.

Era um dos ícones da ilustre baianidade contemporânea, da qual fizeram ou fazem parte Carybé e Jorge Amado, Glauber Rocha e Raul Seixas, Gilberto Gil e Caetano Veloso. João Ubaldo viveu com prazer e morreu com honra.

Ariano Suassuna, também formado em Direito, era mais solar e menos marinho que o seu comoriente baiano. Casou uma só vez e com a sua musa eterna, Zélia – a “mulher vestida de sol”.

Criou e presidiu o “Movimento Armorial”, que pretendia armar uma cruzada pela cultura sertaneja, contra influências estranhas, dotando de nobreza heráldica própria todas as manifestações artísticas do semiárido brasileiro.

O repente, a viola, a cantoria, a sanfona, o cordel, a xilografia, o mamulengo, a cerâmica rústica, a vaqueirice, o cangaço, o xote, o xaxado, a caatinga, o couro cru, a culinária cabocla, a província, a paróquia, tudo isso compunha o universo telúrico de Ariano Suassuna, e tudo isso perpassa a sua vasta produção literária, tão bela quanto original, cuja obra-prima é o conto burlesco “Auto da Compadecida”, que do teatro virou cinema e conquistou o país inteiro. Suassuna viveu com honra e morreu feliz.

*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ

terça-feira, 22 de julho de 2014

NOTA ACADÊMICA

BETO STUDART NA ACLJ


Aceitou a outorga do título de Membro Benemérito da ACLJ o empresário Beto Studart, homenagem para a qual foi proposto pelo acadêmico Dorian Sampaio Filho e posteriormente eleito pela Decúria Diretiva da entidade.

Jorge Alberto Vieira Studart Gomes fundou o preside a Fundação Beto Studart de Incentivo ao Talento, condição que o credencia ao referido laurel acadêmico, reservado aos cearenses que afetaram capital próprio em prol da cultura ou da imprensa no Estado, bem como a artistas que hajam projetado o nome do Ceará além-fronteiras.

A honraria acadêmica dirigida ao Beto Studart lhe foi revelada pelos confrades Arnaldo Santos e Reginaldo Vasconcelos, os quais ele recebeu em seu 
escritório na tarde de ontem, 21 de julho, oportunidade em que lhe foi entregue em mãos a comunicação oficial da Diretoria da ACLJ, assinada pelo Presidente Rui Martinho Rodrigues, sobre a propositura de seu nome, a sua eleição, a sua diplomação e a sua posse.

Na oportunidade, o novo acadêmico manifestou a sua satisfação pessoal em receber o título, e confirmou presença na Assembleia Geral Ordinária do dia 04 de dezembro próximo, na sede da ACI, em que será diplomado e empossado na dignidade de Membro Benemérito. 

Sua candidatura recebeu o apoio imediato do acadêmico Arnaldo Santos, que já o conhecia mais de perto, e do nosso Membro Honorário Dmitry Sidorenko, que o acompanhou em recente visita à São Petersburgo, na Rússia, onde este mora e trabalha atendendo aos brasileiros como guia e interprete.

O empresário Beto Studart passa a integrar a mais distinta categoria acadêmica da ACLJ, ao se tornar o décimo Membro Benemérito, casta a que já pertencem os outros grandes nomes da cearensidade, conforme relacionados:

Dona Yolanda Queiroz e a Dra. Wanda Palhano; o industrial Airton Queiroz, Chanceler da Unifor, e o artista plástico Descartes Gadelha; os empresários Deusmar Queirós e Ives Dias Branco e o médico e político Lúcio Alcântara; Miguel Dias de Souza e o compositor e cantor Raimundo Fagner. A galeria iconográfica abaixo está acrescida do eleito Beto Studart.  
  

ARTIGO (RMR)

HOLOCAUSTO E OMISSÃO
Rui Martinho Rodrigues*


Nazistas construíram abrigos para proteger o seu povo e avisavam quando da chegada dos bombardeiros aliados. Destruídas 80% das zonas urbanas da Alemanha, as perdas civis não foram na mesma proporção.

Os aliados não avisavam antes de atacar a Alemanha. O governo militarista do Japão permitia, quando os americanos avisavam que bombardeariam uma cidade, a retirada dos civis, embora isso prejudicasse a produção industrial e o esforço de guerra.

Israel bombardeia alvos “civis”, como casas e escolas palestinas, porque o Hamas deposita nelas foguetes que serão lançados contra os hebreus. Antes do bombardeio os judeus comunicam pelo rádio e telefonam para a residência a ser bombardeada, dando cinco minutos para que as famílias saiam.

Nunca antes na história deste planeta se viu tanta moderação. Surpreendente é que o Hamas proíba a população civil de fugir dos locais que serão bombardeados. Nazistas alemães e militaristas japoneses nunca foram tão longe contra o seu próprio povo. É o holocausto de civis e de crianças do seu próprio povo no altar da propaganda destinada a difamar Israel.

O pior é que a tática inescrupulosa tem funcionado. O sucesso da tática de apresentar o outro como cruel, enquanto se faz crueldade, funciona graças a cumplicidade dos “especialistas” e “entendidos” que pontificam sobre a guerra nos meios de comunicação. Só se ouve falar no número de mortos destacando civis e crianças vitimadas.

Nenhuma palavra sobre a prática cruel de proibir a fuga das famílias. Nada se comenta sobre o armazenamento de foguetes nas residências civis ou nas suas vizinhanças. O governo ou poder de fato que sacrifica as crianças do seu povo não recebe nenhuma condenação moral. Pelo contrário: é louvado e apresentado como vítima.

O grande argumento dos que se acumpliciam ao sacrifício das crianças obrigadas a esperar a morte, para ocultar a hediondez de tal política, é desviar a atenção para o uso da força por Israel. Fala-se em “excesso” ou “desproporção” da força empregada. Ignorância de uns, má-fé de outros.

Excesso culposo por parte de quem sofre um ataque é claramente definido na lei e na doutrina penal. O excesso se caracteriza quando, tendo feito cessar o ataque, o uso da força continua, perdendo legitimidade, porque a agressão a ser repelida deve ser atual. Caso o ataque tenha cessado a ação passa a ser dirigida a um tempo pretérito, deixando de ser defesa para ser vingança.

No conflito entre Israel e Hamas, o ataque – sem aviso – continua, procedente de Gaza, contra alvos civis em Israel. A atualidade do ataque tipifica a situação de inexigibilidade da conduta diversa da força. Uma democracia não poderia permanecer inerte enquanto o seu povo é atacado, tendo o governo meios de defesa.

A ignorância é desculpável. Não a má-fé, a parcialidade decorrente de motivos não declarados. As preocupações “humanitárias” desaparecem se a matança é na Síria, Iraque, Sudão. “Há qualquer coisa podre no reino da Dinamarca”, como dizia Shakespeare.

*Rui Martinho Rodrigues
Professor - Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10