terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

RESENHA - Reunião Virtual da ACLJ (27.02.2023)

 REUNIÃO VIRTUAL DA ACLJ
   (27.02.2023)





PARTICIPANTES

Estiveram reunidos na conferência virtual desta segunda-feira, que teve duração de 30 minutos, dez acadêmicos.

Compareceram e trocaram ideias o Jornalista e Advogado Reginaldo Vasconcelos, o Marchand e Publicitário Sávio Queiroz Costa, o Professor, Médico e Latinista Pedro Bezerra de Araújo, o Especialista em Câmbio e Comércio Exterior Stenio Pimentel (Rio de Janeiro-RJ), o Agrônomo e Poeta Paulo Ximenes,  o Advogado Sionista Adriano Vasconcelos, o Jornalista Wilson Ibiapina (Brasília), o Magistrado Emérito, Professor e Advogado Aluísio Gurgel do Amaral Júnior, o Advogado, Professor, Apresentador de Rádio e TV, Compositor Musical,  Músico e Cantor César Barreto, todos Membros Titulares da ACLJ, e o Linguista e Escritor Dmitry Sidorenko, Membro Honorário Correspondente da ACLJ (São Pètersburgo, Rússia). Como convidadas especiais Svetlana e Anfisa Sidorenko, mulher e filha do Dmitry, e a infanta Ana Sofia Paiva, neta afetiva do acadêmico Reginaldo. 
  


TEMAS ABORDADOS

Na reunião virtual da ACLJ desta segunda-feira, após os assuntos vicinais relativos aos fatos recentes da vida de cada qual, sua experiência e o seu extrato filosófico, e dos temas carroçáveis das anedotas, entrou-se pela rodovia pavimentada pelas matérias acadêmicas, tratando-se dos preparativos para a Assembleia Geral Aniversária prevista para o dia 04 de maio vindouro, em que será lançado o livro de memórias do Dmitry Sidorenko, "De Khabarovsk a Fortaleza", e tomarão posse o jornalista João Bosco Serra e Gurgel e o médico e escritor José Maria Chaves, nas Cadeira nº  31 e nº 23, respectivamente.

DEDICATÓRIA

A reunião desta segunda-feira, dia 27 de fevereiro de 2023, por aclamação do grupo virtualmente reunido, foi dedicada ao Governador de São Paulo, o engenheiro carioca Tarcísio Gomes de Freitas, oficial da reserva do Exército, Ministro da Infraestrutura no Governo Bolsonaro, pela sua magnífica atuação emergencial durante os esforços de socorro às vítimas do grande temporal ocorrido no litoral norte do Estado, durante o carnaval deste ano.

Tarcísio transferiu  a sede do Governo para a cidade de São Sebastião  local do teatro de operações  e tomou enérgicas e profícuas providências, junto à Defesa Civil, ao Corpo de Bombeiro, à Marinha e ao Exército, na busca por sobreviventes, no resgate dos corpos das vítimas fatais entre os escombros e sob o solo dos deslizamentos, mas principalmente garantindo alojamento seguro e confortável aos desabrigados pelas chuvas torrenciais que fizeram derruir suas residências. Ao "Capita", as nossas homenagens.        


   

CRÔNICA - Laprovitera À Paris (TL)

 LAPROVITERA À PARIS
Totonho Laprovitera*

 

Três breves histórias em Paris.

 

A primeira.

 

No dia 11 de setembro de 2001, em Paris, eu estava expondo desenhos e pinturas na Embaixada do Brasil na França, quando uma brasileira que andava por lá, desesperada, chegou duma vez na galeria e deu a notícia do ataque terrorista às Torres Gêmeas, em Nova Iorque. Agoniada que só, anunciou até o início da Terceira Guerra Mundial! Vixe Maria, respeite o susto! E logo pensei: Ô, meu Deus, que saudade de casa...

 

No dia seguinte fui instruído pela Embaixada a evitar andar de ônibus, de metrô e ir a lugares onde houvesse concentração de pessoas. Contaram-me, ainda, que 24 horas após o atentado, a polícia parisiense havia desarmado cerca de 60 bombas pela cidade.

 

Cortei foi prego, não vou nem mentir...

 

A segunda.

 

Aconteceu em Paris. Após irmos à exposição “Hitchcock et l'art: coïncidences fatales”, eu e Elusa fomos convidados pelo Anuar Nahes, então conselheiro cultural da Embaixada do Brasil na França, para tomarmos um café no terraço do Centre Georges Pompidou.

 

Conversando acerca de cultura, costumes e comportamentos, Anuar me instruiu que quando nos oferecem um copo d’água, por exemplo, devemos dizer “eu quero” ao invés de “aceito”. No caso, quem aceita toma atitude de povo submisso, sem capacidade de escolha para decidir se quer ou não o que lhe apresentam.

 

Curioso, foi quando fui apresentado ao Anuar e falei que achava já lhe conhecer de algum lugar. Ele, educadamente, me contrapôs: “Já sei, você deve estar me confundindo com o garoto-propaganda da Bombril”.

 

A última notícia que tive do Anuar, é que ele era embaixador do Brasil no Iraque.

 

A terceira.

 

Noutro dia eu estava ouvindo “Café Soçaite”, de Miguel Gustavo, e reparei no final da canção Maria Bethânia dizer: “Como é que pode, Nina Chaves conta...”


 

Pra quem não sabe, possuidora de uma escrita refinada e respeitada, na década de 60, Nina Chaves trabalhou no jornal O Globo como editora de moda. De elevado prestígio e credibilidade ilibada, o que ela escrevia, fazia-se valer!

 

Em 2001, eu tive a oportunidade de conhecer Nina em Paris. Apresentado por Anuar, assuntamos muito sobre arte. Confesso que eu fiquei seduzido com a capacidade da jornalista de expor ideias tão ricas de simplicidade, o que até parece ser fácil, mas não é.

 

Querem saber duma coisa? Eu vou é botar de novo “Café Soçaite” pra tocar na radiola!


sábado, 25 de fevereiro de 2023

CRÔNICA - Uma Parada Na Rota do Meu Rumo

 Uma parada
na rota do meu rumo
JB Serra e Gurgel* 

 



Meu melhor momento no Rio de Janeiro foi quando trabalhei com Ibrahim Sued. Diziam isso e aquilo sobre ele, mas, para mim, ele foi um pai. Não tenho nada a reclamar. Sempre me tratou com dignidade e respeito. Exigia notas “off the records”, “em primeira mão”, “bomba-bomba”, com identificação de fonte. Chegava cedo ao escritório na Rua Siqueira Campos, 43, sala 836, onde me esperavam dois telefones, 2376850 e 236 5212, e um “sebo”. Tinha que falar com meio mundo em Brasília via telefonista, com muita demora. 

Todo mundo queria ser informante de Ibrahim. Isto me facilitou a missão. Assim, no Senado a fonte era o Senador Gilberto Marinho, Presidente. Na Câmara, o Deputado José Bonifácio, Presidente. No Supremo, o Ministro Luís Galotti, Presidente. Na Academia de Letras, Pedro Calmon, Presidente. Todos amigos dele. No Itmaraty, os embaixadores Maury Gurgel, Donatello Griecco, Italo Zappa, idem. 

Ainda na Academia Brasileira de Letras: Josué Montello, Gilberto Amado, Guimaraes Rosa, Peregrino Júnior, Ivan Lins, Cícero Dias, Di Cavalcanti, Isaac Karabtchevsy. A elite empresarial do Rio de Janeiro era fonte. 

Ministros de Estado e dos Tribunais Superiores; procuradores, juízes, senadores, deputados, do governo e da oposição – todos os seus assessores de imprensa queriam ser fontes. 

Oscar Ornstein era informante de personalidades, pois era o poderoso gerente do Hotel Copacabana Palace. 

Eu não procurava o high socitety, que ficava por conta de Fernando Carlos de Andrade, irmão de Evandro Carlos de Andrade, que foi editor de O globo e diretor da Rede Globo, também sócio de Ibraim em objetos de arte. Tiveram uma galeria em Ipanema. 

Pintores famosos lhe levavam quadros, para que ele desse nota na sua coluna. Muitas dessas pinturas ficaram comigo. Eles saíam do escritório, Ibrain dava a nota e me dava os quadros. Fui o amigo de um que nunca foi ao escritório, Orlando Teruz. Este me deu um miniquadro, que fui buscar no seu atelier. Foi muito útil, pois não tendo como dar sinal em dinheiro para compra de um apartamento em Niterói, dei o miniquadro. Teruz me repôs com um desenho. 

Ibrahim chegava ao escritório, lia os recortes do Lux Jornal, jogava os papéis lidos no chão. Lia livros jogando as páginas lidas no chão.  Não esquentava a cabeça com os xingamentos de Stanislaw Ponte Preta, a quem respondia com seu clássico bordão: “ladram os cães, e a caravana passa”. Ou: “cavalo não desce escada”. Depois pegava um livro de pensamentos, tirava um deles e punha na boca de alguém. Certo dia, o embaixador Gilberto Amado ligou para o escritório querendo falar com ele, muito aborrecido. Ibrahim colocara na sua boca um pensamento que não se coadunava com sua pessoa. Ligou várias vezes, Ibrahim não o atendeu. 

Ibrahim ficava feliz quando chegava ao escritório e pedia que eu pusesse o Presidente Costa e Silva na linha. Eu ligava para o Major Lair de Almeida, Ajudante de Ordens, e dizia que Ibrahim queria falar com o Presidente. Rapidamente o Major punha o Presidente na linha e eu falava: “Ibraim! O Presidente”. Ele ficava muito tempo ao telefone, comentando coisas do dia-a-dia da política. Nunca falou com o Presidente Médici. Nunca falou com o Presidente Geisel. 

Aos sábados, quando fechávamos a coluna de domingo e de segunda de O Globo, Ibrahim chegava depois das duas, sempre vermelhão do sol da piscina do Copacabana Palace. Contava suas vantagens e suas aventuras. Certa vez, pegou um taco de polo e tentou fazer uma jogada no escritório. Deu-se mal, pois a bola acertou um lustre e foi um susto. 

O melhor momento de Ibrahim não foi quando lançou o seu livro “000  Contra Moscou”, mas quando foi eleito paraninfo de uma das primeiras turmas de comunicação da Universidade de Brasília. Elio Gaspari foi com ele a Brasília e ajudou a escrever a saudação. 

Eu saía do escritório na semana às 16:30h, indo de ônibus para a TV Globo, na Gávea, a fim de falar com meio mundo, colhendo notícias para o seu programa, “Ibrahim Sued, o Repórter”. Foram muitas “bombas-bombas”. Guardo fotos do programa de despedida quando me apresentou ao distinto público... 

Ibrahim me indicou a Joaquim Xavier da Silveira para um emprego na Embratur, ao Governador Raimundo Padilha para um emprego na Flumitur, e ao  Paulo Cesar Ferreira para um “bico” com o Ministro Delfim Neto – que se transformou num emprego com Carlos Alberto de Andrade Pinto no Embratur/IBC. 

Certo dia me inscrevi para comprar um fusca na Caixa. Não sabia nem dirigir. Falei para ele que fora sorteado, mas não podia pegar o carro, pois não tinha a entrada. No outro dia ele chegou com um envelope com o valor da entrada e me disse: “Vá pegar seu carro”. Fui pegar o carro com um amigo que o levou para garagem em Niterói. 

Num determinado momento ouvimos, eu e o Fernando, que ele atendia muitos telefonemas do Dr. Roberto Marinho. Percebemos que o Dr. Roberto o aconselhava a manter o casamento com Dona Glorinha Sued, mãe de seus filhos, de quem fora padrinho do casamento. Vida que segue, Ibrahim foi em frente seu destino e o Dr. Roberto se separou da mulher, Dona Stela, e acabou se casando com Dona Lyli, que fora sua namorada na juventude e que fora casada com Horácio Carvalho, dono do Diário Carioca. 

Quando andava de taxi comigo, se era reconhecido, não gostava. Pagava suas contas no restaurante onde almoçávamos juntos. Não aceitava cortesia. 

No natal recebia muitos presentes, eu mesmo ganhava dele muitas cestas que levava para Niterói. 

Apoiou-me quando da minha ida para Brasília, indicado por Elio Gaspari e Evandro Carlos de Andrade, para assessorar o Nascimento Silva. O Nilo Dante indicou o Ricardo Boechat para me substituir. 

Quando Ibrahim ia à Brasília eu era seu motorista, do aeroporto para o hotel e do hotel para onde fosse. Continuei como informante da coluna, em admiração ao mestre, ao líder, ao colunista, a quem me acolheu com humanidade na parada do meu rumo.


 

Nota do Editor 

O jornalista cearense João Bosco Serra e Gurgel foi proposto à quadraginta numerati da ACLJ pelo confrade Fernando César Mesquita, tendo sido eleito e com posse prevista para o dia 04 de maio próximo, na Cadeira de nº 23. Nessa crônica de estreia ele fala de sua longa convivência jornalística com um dos primeiros e mais famosos cronistas sociais do Brasil, o carioca Ibrahim Sued (1924-1995).


 

ARTIGO - Novamente os Tributos (RMR)

 NOVAMENTE
OS TRIBUTOS
Rui Martinho Rodrigues* 

 

Reforma tributária entrou novamente em pauta. O problema dos tributos deu origem a expressão manicômio tributário. Contribuintes se queixam da complexidade e do custo causado pelo labirinto de regras. 

Economistas e empresários lamentam o desestímulo que o nó górdio tributário representa para investidores e administradores de empresas. Pessoa natural sofre com a carga tributária. Estados e municípios criticam a repartição das rendas entres os entes federativos. Capital e trabalho se sentem prejudicados. 

A formulação do sistema tributário é enganosamente simples. Bastaria cobrar menos de muitos arrecadando o suficiente; ponderar a capacidade contributiva; e simplificar o processo de arrecadação. Fácil como amarrar o guizo no pescoço do gato para a avisar os ratos da aproximação do felino. Mas contribuintes querem pagar menos. 

Entes federativos querem arrecadar mais e querem uma fatia maior da divisão do bolo. União, Estados e municípios estão sempre em dificuldade para fechar suas contas. Empresas de grande porte estão perigosamente endividadas. Uma enorme parcela de consumidores (famílias) não está podendo honrar seus compromissos. Até a situação dos grandes bancos estaria inspirando cuidados. 

O manicômio tributário precisa ser melhorado. Um dos desafios é compatibilizar o tamanho das despesas e investimentos públicos com o tamanho da arrecadação possível e conveniente. Depois viriam os difíceis acertos ligados a repartição da renda entre os entes federativos; a consideração dos impostos diretos e indiretos, a distribuição do ônus pelas diferentes atividades econômicas e tantas outras coisas.

As políticas sociais são recompensadas com votos, o que nos leva a adotar o modelo do Estado provedor da Europa Ocidental e setentrional, embora a nossa economia não tenha a produtividade observada nos países destas regiões e a nossa infraestrutura de transportes não seja tão favorável como nos paraísos citados. Copiamos o modelo sem pensar na reserva do possível. As economias onde Estado é o provedor estão emitindo sinais de desgaste, seja pela crise fiscal, seja pela incapacidade de competir com os asiáticos. 

A capacidade financeira do Estado brasileiro é menor do que a dos países europeus. A nossa capacidade de competir com os asiáticos também é menor. Milhões de pessoas estão sendo retiradas da miséria no oriente. Mas nós não queremos seguir o exemplo deles, que escolheram a geração de emprego como a melhor política social, ao invés do assistencialismo. Nem respeitamos a reserva do possível, que na prática é o equilíbrio fiscal. Optamos por gastar o que não temos e consumir sem investir na produção, na produtividade. 

Os asiáticos, ao retirar milhões da miséria, estão alargando a faixa da classe média, camada social odiada no Brasil dos “virtuosos”. Parece um enigma indecifrável que a tendência política que odeia a classe média, como a professora Marilena Chauí, tenha na referida classe o seu reduto eleitoral. Os bairros elegantes votam nos candidatos que odeiam os seus moradores. 

Não é fácil decifrar o que os portadores do ódio do bem consideram classe média. Não deve ser pela origem da renda (teoria de estratificação social inspirada em Karl H. Max, 1818 – 1883) pois sob tal critério só existem duas classes: uma tem a renda oriunda do capital; outra obtém seus ganhos pelo trabalho. Não haveria a classe média.

Caso a teoria de estratificação social adotada seja a quantidade de renda, venha do onde vir (posição no mercado), segundo Max Weber (Maximilian K. E. Weber, 1864 – 1920) classe média é quem ensina nas universidades onde a professora Chauí trabalha e vende seus livros, está nas empresas públicas, como a Caixa Econômica Federal; nas de economia mista, como o Banco do Brasil e a Petrobrás, ou em alguns setores da administração direta dos entes públicos, como a Receita Federal, a magistratura e o Ministério Público, que integram as correntes políticas que odeia a classe média. 

O ódio a classe média, leitora dos livros da professora Chauí e que vota em seus candidatos, tem uma explicação: não depende das bolsas e – no caso extremo – do cartão de racionamento. Não basta apoiar os herdeiros dos reis filósofos, é preciso depender deles. Isso explicaria a destruição planejada das economias da Venezuela, da Argentina e da Nicarágua. 

Destruir o agronegócio, no Brasil, não é um erro nem tem o objetivo de promover a justiça social. É um objetivo estratégico. Os problemas da Venezuela não são decorrentes da variação dos preços do petróleo. Arábia Saudita e Irã dependem do mesmo produto, arcam com pesadas despesas militares e não sofreram tanto quanto a Venezuela. Não devemos deixar que o ódio a classe média conduza a reforma tributária de modo a destruir este segmentos social com impostos diretos.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

CRÔNICA - Ritinha e Ricardinho (TL)

 RITINHA E RICARDINHO
Totonho Laprovitera*

 


Em sua deserta vida, nutria o sonho de namorar pra valer, na paixão de se entregar de corpo e alma. Em uma tarde de mormaço, Ritinha avistou Ricardinho, jogador de futebol. De compleição física seca, suas cambotas cambitas indicavam a sua vocação para a prática do esporte bretão.

Quando espiou Ricardinho caxingando, com um par de botinas debaixo do braço e um boné, com a aba virada pra trás, a candidata a maria-chuteira gamou na hora! 

Desde então, Ritinha se agarrou à fantasia de ser a esposa do príncipe dos gramados. Já se via morando no Estrangeiro, com os cabelos estirados, tingidos de loiro, e uma reca de filhos falando em inglês. E quando chegassem de férias, em Mucunã, certamente desfilariam na caçamba de uma cabine-dupla pelo distrito, sob os gritos de “urrus” e palmas e assobios do povo. 

Nas entrevistas Ricardinho fazia tipo, puxando um forte sotaque carioca e o dedo indicador zanzando pela orelha de abano. Diziam que ele era um ala esforçado, no esquema tático do “professor”. Vivia contando sobre grandes propostas recebidas, mas que não podia revelar, dada a cláusula de sigilo posta em pré-contrato. 

Arreada por Ricardinho, Ritinha decidiu abordá-lo no bar do “seu” Doca. Toda nos trinques, vestiu-se de Marisa, perfumou-se de Avon e carregou no encarnado do batom. Chegou de moto-táxi, sentou-se à mesa, pediu uma dose de Campari e uma porção de torresmo para tira-gosto. 

Ricardinho já havia entornado sete geladas e umas cinco canas, mordendo um único e enfarofado espetinho de carne de gato. Aí, avistou Ritinha, grelou os olhos na reluzente e recheada carteira de cédulas dela e, em ato de puro interesse, dirigiu-se à beldade: 

– Boa noite, broto! Estou vendo que está desacompanhada. Aguarda alguém? 

– Boa noite, moço. Não, não aguardo. Estou de passagem, pra me distrair um pouco... sei lá. 

– É como digo no Rio de Janeiro, broto: nada como refrescar a mente, num dia de bobeira. 

– Pelo sotaque, já vi que você não é daqui. Acertei? 

– Na mosca! Nasci em Flores, Russas, mas fui criado em Ramos, Rio de Janeiro. 

– E o que você faz da vida? 

– Bem, eu bato na redonda pra descolar um troco. Sou atleta profissional de futebol. Ah, eu me chamo Ricardo Augusto, mas atendo por Ricardinho. 

– Rita de Cássia, mas pode me chamar de Ritinha... 

E assim foi o primeiro capítulo da novela Ritinha e Ricardinho. 

Daí por diante, o falatório foi geral em torno do grude do casal. Avexada, Ritinha se entregou à Ricardinho e por um triz não embuchou. 

Quanto ao romance, ele durou o suficiente para o onzenário Ricardo Augusto descobrir a situação financeira de Ritinha. Na realidade, o “dinheirão” que ela fingia possuir era fruto de um seguro desemprego, somado à merreca de uma indenização trabalhista. 

Quer dizer, de fato, Rita de Cássia era lisa e desempregada. Por sua vez, Ritinha descobriu que Ricardinho era jogador sem-futuro e figurinha carimbada no ofício de ludibriar pequenos e bem intencionados clubes de futebol. Aí ela pegou abuso dele, que além de viver bichado, não tinha habilidade para dar três míseros pezinhos. 

Restou ao casal, o que sempre articula o professor Carlinhos Analfabético: “Don’t cry because it’s over, smile because it happened”, ou seja, “Não chore porque acabou, sorria porque aconteceu”.


CRÔNICA - Retiro Filosófico (RV)

RETIRO FILOSÓFICO
Reginaldo Vasconcelos*

 

Estamos na fazenda, após dois anos de recolhimento sanitário, em face da pandemia de Covid. 

Vimos para passar o carnaval, resgatando uma longa tradição familiar de fugir da folia momina na cidade, rumo ao campo. 

Ao adentrarmos a casa sede da fazenda uma gata muito meiga, que apareceu no nosso período de ausência entre os pets residentes, nos recebeu “com confetes dourados” – como se dizia antigamente. 

Ela roçava o corpo em nossas pernas ronronando, e deitava manhosa para receber nossos afagos. 

Todos nós ficamos encantados com um animalzinho tão afável com estranhos, e aparentemente inofensivo, que conquistou a todos nós. 

No dia seguinte, quando tomávamos o café da manhã na edícula da fazenda, desfrutando o ambiente bucólico, aquele meigo felino capturou, matou e em seguida devorou, diante dos nossos olhos, um mavioso passarinho canoro que nos brindara com o seu canto, e em seguida pousara descuidoso no gramado. 

Então me lembrei de uma crônica na qual Rubem Braga conta que ao chegar numa praia virgem do litoral catarinense em veraneio ficou maravilhado com a simplicidade, a pureza, a doçura dos pescadores locais, tão lhanos e prestimosos, exibindo o que deve ser a alma humana original, ainda isenta dos sentimentos sórdidos que medram na sociedade evoluída, e das maldades que a civilização implanta nela. 

No dia seguinte – o cronista revela estupefato – deu na praia um pequeno pinguim que se desorientara da sua rota migratória, e foi imediatamente trucidado a cacete por aqueles mesmos pescadores cordiais que lhe haviam parecido o suprassumo da pureza e a quintessência da bondade. 

Isso faz perceber que a vida é essencialmente cruel, e que é a inteligência e o discernimento das coisas que faz o ser vivo sair do primitivo rés do chão para contemplar as realidades superiores, e se conduzir sensatamente. 

Os nossos bichos de estimação, por exemplo, trazidos conosco, habituados com rações industriais, nem contemplam a hipótese de se alimentarem atacando outros viventes. 

Na fazenda, a pouco mais de cem quilômetros da Capital, soubemos que estamos entre duas facções criminosas que, ironicamente, nos garantem segurança, porque, conquanto compitam pelo comércio de drogas e de vez em quando se matem entre si, seus membros preservam o público local, coibindo o crime comum e o varejo delitivo, que podem atrair a polícia e atrapalhar o seu negócio. 

Ao cabo desse retiro espiritual e filosófico da família resta uma reflexão profunda sobre onde situar a virtude, nessa quadra da vida nacional tão conturbada, em que tem valido atacar passarinhos Mário-quintanianos,** e espancar pinguins graciosos, inocentes e indefesos, na encarniçada luta pelo poder absoluto e pela desvirtuação da sociedade.

**Poeminho do Contra
 
Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

Mário Quintana


NOTA LITERÁRIA - Longarinas Tríade de Leituras

 Longarinas
Tríade de Leituras




Iniciativa importante para o desenvolvimento intelectual das crianças está sendo lançada pelo Longarinas Tríade de Leituras, com a colaboração da nossa confreira Manoela Queiroz Bacelar. 

Longarinas é um grupo de leituras coordenado pela escritora Socorro Acioli, que funcionará em ciclos trimestrais. 

O primeiro ciclo chama-se “Quando as crianças narram”, e nele vamos ler três livros: 

1. Festa no Covil, de Juan Pablo Villalobos; 

2. Esperando Bojangles, de Olivier Bordeaut; 

3. O apanhador no campo de centeio, de J.D. Salinger.


Módulo 01 – Festa no Covil

05 de março

12 de março

19 de março

26 de março – Live com Socorro Acioli


Módulo 02 – O Apanhador no Campo de Centeio

02 de abril

09 de abril

16 de abril

23 de abril - Live com Socorro Acioli


Módulo 03 – Esperando Bojangles

30 de abril

07 de maio

14 de maio

21 de maio - Live com Socorro Acioli. Fechamento da tríade.

longarinasleituras@gmail.com


Inscrições e informações pelo link:

https://sun.eduzz.com/1763697

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

CRÔNICA - Um Pré-Carnaval Encabulado (RV)

UM

PRÉ-CARNAVAL

ENCABULADO
Reginaldo Vasconcelos* 

 

E

m nome da vertente jornalística da ACLJ saimos por aí colhendo os cacos de alegria no primeiro pré-carnaval pós-pandemia, e o encontramos ainda tímido, mal redimido, encabulado. 

Encabulado é a palavra exata para caracterizar acanhamento, constrangimento, desencanto – e não “envergonhado”, como preferem os sudestinos, porque “vergonha”, contrario sensu, significa dignidade, brio, honra. 

Era de se esperar que, em virtude da demanda reprimida de folia momesca por dois anos, a animação fosse gigante, a maior dos últimos tempos, décadas, séculos – tambores mais fortes, clarins mais sonantes, sorrisos mais largos, mais bêbados do que normalmente se encontram no período.

Não. O que vimos foi um pré-carnaval meio contido, meio desacorçoado, muito ajuizado, mais sueco que baiano, muito mais para pierrôs chorosos do que para a alegria exagerada do Zé Keti, com os seus “mais de mil palhaços no salão”. 

O carnaval deste ano encontra um País entristecido e sobressaltado por uma campanha política sórdida, uma administração pública confusa e raivosa, e uma imprensa pautada pelo jornalismo mais tacanho, politizado, com muito pouca ênfase à maior festa popular da humanidade. 

Nenhum concurso de marchinhas ou de fantasias, nenhum batalha de confete e serpentina, nenhuma bela canção sob o tema romântico das paixões de carnaval, nenhuma composição irreverente fazendo blague com figuras públicas da vida nacional, como se via no passado. 

Além disso, mundo a fora, uma guerra sangrenta e fraticida na Ucrânia, um terremoto tenebroso na Turquia, com milhares de mortos e feridos sob escombros, e uma nova Guerra Fria surgindo entre estadunidenses e chineses.  

Então convoquei o promoter Alexandre Maia, radialista, ex-presidente da Federação Cearense das Agremiações Carnavalescas, o idealizador do Fortal, um dos maiores especialistas no assunto, Comendatário da ACLJ, e fomos visitar as mais tradicionais manifestações do pré-carnaval de Fortaleza.

 

Começamos pela Embaixada da Cachaça, no bairro Joaquim Távora, que, sob a autoridade dos embaixadores Gorete e Altino Farias, elegeu o seu próprio Rei Momo. Recebeu o título das mãos do monarca oficial da Cidade, Sua Majestade Gil Baratha, o ilustre Buiuzinho – Primeiro e Único, o mascote daquela casa etílico-diplomática. 


Depois seguimos o cordão “Aí Dentro, Vossa Excelência”, de título muito irreverente e pertinente no momento, por ruas do miolo da Aldeota até o Náutico, e acompanhamos o Bloco da Cachorra Magra e da Baqueta, pelo circuito litorâneo Praia do Ideal e de Iracema.

 

Fomos também ao “Não Ispaia Sinão Ienche” (que sempre “ienche”), o popular carnaval promovido todo ano pelo folclorista e carnavalesco Dilson Pinheiro (Membro da ACLJ), que ingressou no meio artístico pelas mãos de Alexandre Maia, e de lá fomos ao “Carnaval da Saudade” do Náutico Atlético Cearense.


Na sua sede suntuosa, tombada pelo Patrimônio Histórico da Cidade, o Náutico, sob a presidência do advogado Jardson Cruz, como sempre reuniu um grande concurso de público no seu baile mais tradicional – o “Carnaval da Saudade”, animado pela fabulosa “Orquestra Brasa Seis".

Neste ano organizado pelo promotor de eventos Elenilton Jorge, tendo o eficiente serviço de bar e restaurante a cargo da família Martins Vasconcelos (Ediane, Attila e Attílio), e sob as bênçãos do Rei Momo Rui Baratha (determinado a desbaratar o baixo astral),  essa festa do Náutico representa, há muitos anos, o “primeiro grito de carnaval” oficial de Fortaleza. 




O tríduo momino se enfraquece ainda mais na Capital, com os mais animados demandando ao mela-mela das cidades praianas cearenses, ou a Olinda, ou à Bahia, e os menos foliões se recolhendo à serenidade dos sítios, às fazendas bucólicas, aos redutos paradisíacos da montanha.