quarta-feira, 29 de julho de 2015

CRÔNICA - Lampião Era Gay? (WI)

LAMPIÃO ERA GAY?
Wilson Ibiapina*


Já chamaram o pernambucano Virgulino Ferreira de Lampião, Rei do Cangaço. Há quem acredite que ele não passou de um facínora, bandido, calhorda. Agora, estão dizendo que ele também era bicha. A polêmica está na rua. Duvidar de sua masculinidade é desmoralizar o maior herói popular do Nordeste. Seria verdade?

Capitão Virgulino foi morto pela polícia no sítio Passagem das Pedras, em Sergipe, a 40 quilômetros de Serra Talhada, onde nasceu. Na década de 30 ele foi chamado também de defensor dos pobres e oprimidos do sertão.

O que não se esperava é que agora, 77 anos depois de sua morte, surgisse em Sergipe o juiz aposentado Pedro de Morais para duvidar da masculinidade do perverso cangaceiro. Lenha na fogueira. No livro Lampião – O Mata Sete, cuja publicação e comercialização foram proibidas em caráter liminar, a pedido da família do biografado, o juiz revela que o machão Lampião era homossexual.

Em entrevista a Ana Cláudia Barros, no Site Terra Magazine, o juiz diz que “o livro não trata exatamente da homossexualidade de Lampião. Eu apenas mostro que ele era homossexual, mas não com força pejorativa. Eu não tenho absolutamente nada contra os homossexuais, nem a favor. Eu relato um fato histórico. Aliás, não sou o primeiro a escrever sobre isso, e nem o vigésimo”.

O Juiz revela que tem depoimentos de remanescentes, de parentes de Maria Bonita, de Lampião. Que ela era adúltera está em todos os livros. E acrescenta: “O que eu digo e mostro é que havia no cangaço um trio amoroso, envolvendo Lampião, Maria Bonita e Luiz Pedro, o amor dos dois".

Luiz Pedro era um cangaceiro, que seria namorado de Lampião, e eles teriam trocado juras de amor eterno. Certa vez, Luiz Pedro matou o irmão de Lampião, que era a coisa que Lampião mais queria bem, e, em troca, Lampião, que nunca foi de clemência, absolveu Luiz Pedro, exigindo dele juras de que jamais se separariam. Isso não me parece coisa de macho.



NOTA DO EDITOR:

Gays apreciam a tese de que grandes personalidades históricas eram gays. Reis, gênios das artes, heróis em geral – O  imperador Adriano, o pintor Da Vinci, o escritor Proust, o quilombola Zumbi – eram todos eles gays, segundo defendem ativistas do arco-íris, puxando brasas para as suas sardinhas delicadas.

Na mão contrária, inimigos do terceiro sexo contra-atacam, apontando o uranismo como causa da monstruosidade de celerados notórios, os quais, amorosamente incompreendidos e frustrados, se teriam tornado pervertidos sexuais e criminosos violentos – Nero, Jack (o estripador), Hitler... Agora, Lampião.

Notar que homossexualismo, no Brasil atual, não é crime; para a Igreja Católica de hoje, não é pecado; para a medicina moderna, não é doença; para as Forças Armadas, não é mais justa causa de expulsão. Portanto, apontar a homossexualidade de alguém não o deveria denegrir, nem enaltecer, pois grandes homens e rematados facínoras, indistintamente, foram gays no passado, como outros o são hoje.  

Tampouco é considerado opção ser ou não ser homossexual, ao contrário do que se dizia até recentemente, de modo que sê-lo não envolve culpa ou dolo. Ser gay seria então uma contingência, uma característica inata, que não influi nem contribui com o caráter e a índole da pessoa, assim como ser daltônico ou ser canhoto.

Também não faz sentido o termo “homofóbico”, porque “fobia” indica doença, e a aversão intelectual, ou a reprovação moral, ou a intolerância religiosa a alguma postura ou conduta alheia nada tem de patológico. É uma faculdade do indivíduo, no seu inalienável direito de opinião e de expressão – o que permite gostar ou não, apoiar ou não, conviver ou não – embora não autorize ninguém a agredir, maltratar, injuriar quem quer que seja.

Sendo assim, a eventual homossexualidade de Lampião é matéria de interesse histórico relativo – era ele canhoto? Seria ele daltônico? – características eventuais que não concorreriam para os seus crimes, nem elidiriam as suas culpas – e não têm importância maior para a história e para a ciência.

Maria Bonita foi adúltera, pois traiu o marido barbeiro ao entregar-se a Virgulino – isso é fato. Se ela deitava com algum outro cangaceiro do bando, e se Lampião consentia ou não, isso está adstrito à intimidade do grupo e à conveniência do casal.

Mas o cangaceiro Zé Pedro, cujas feições eram realmente mais aprimoradas que as dos demais cangaceiros, tinha a sua própria companheira no bando. Também é fato. Então, não haveria um triângulo, mas um quadrângulo sexual?


Esclarecimento

Virgulino Ferreira da Silva nasceu  em 7 de julho de 1897, no sítio Passagem das Folhas, no Município de Serra Talhada (PE).

Foi morto em 28 de julho de 1938 pela ¨volante¨ comandada pelo Tenente João Bezerra, no município Poço Redondo (SE), na Grota de Angicos, perto do Rio São Francisco.

É sabido que a biografia do Lampião tem muitas controvérsias quanto a datas, locais, lendas surgidas em torno do mito, mas esses dados que apontei são os mais aceitos.

José Humberto Ellery
Engenheiro Químico
Ex-Oficial da Marinha Brasileira
Membro Honorário da ACLJ

ARTIGO - Planejamento Sustentável (LRF)

FAVORABILIDADE DE TERRAS
PARA O PLANEJAMENTO SUSTENTÁVEL 
RURAL E URBANO
(Nova ferramenta para o correto uso do solo)

Luiz Rego Filho*

Muitas vezes os projetos em prol da organização e planejamento da produção agrícola são esquecidos, ou mesmo desconhecidos, dos tomadores de decisão – administradores públicos e grandes produtores rurais. O resultado da não aplicação dessa ferramenta produz, na maioria das vezes, problemas de ordem ambiental, com desdobramentos negativos nos aspectos econômicos e sociais.

Esses aspectos traduzem-se em enchentes, inundações, deslizamentos de terra, erosão precoce do solo rural e urbano, acarretando a perda de um dos maiores patrimônios de qualquer país: o solo. O passivo ambiental potencializa assim os passivos sociais e econômicos.

O conceito de sustentabilidade, da forma mais simples que o conhecemos, assentado no tripé ambiental, social e econômico, ou o “Triple Bottom Line”, compõe-se por sua vez em cada uma dessas pernas em fatores secundários e terciários, desdobrando-se em fatores, macrofatores e microfatores.

Desta forma, para que o uso da terra cumpra de forma sustentável seu propósito maior de gerar ganhos sociais, econômicos e ambientais, é necessário que os conhecimentos destes fatores sejam interpretados, utilizando-se vários critérios para fornecerem resultados básicos propulsores para planejamento e desenvolvimento de políticas públicas adequadas.

Estudos recentes, os quais resultaram em um protocolo testado, apresentam como solução proposta a produção de cartas básicas de planejamento relativas aos macrofatores ambiental, social e econômico, as quais, interpretadas em conjunto, regulam e ditam o melhor uso e ocupação das terras para planejamento rural e urbano.

A presente ferramenta foi desenvolvida pelo professor emérito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Doracy Pessoa Ramos, pelo geógrafo Fabrício Pimenta, do programa Rio Rural, vinculado à Secretaria de Estado de Agricultura e Pecuária, e por mim mesmo, como  pesquisador da Pesagro-Rio/CEPRUS (Centro Estadual de Pesquisa em Desenvolvimento Rural Sustentável).

Trata-se de uma inovação de processo, sendo que o aspecto inovador é o aproveitamento de informação e processo pré-existente, adaptado para produção de mapas básicos orientadores do planejamento rural e urbano. Induz aos tomadores de decisão nos âmbitos estaduais e municipais a desenvolver projetos que atendam ao conceito básico da sustentabilidade.

O conceito vem sendo trabalhado desde 2008 e sob o ponto de vista do planejamento rural tem como fim específico o de diagnosticar a situação do meio rural do Estado do Rio de Janeiro, suas potencialidades e seus obstáculos que impedem o desenvolvimento.  

Para o planejamento urbano, obtenção de cartas que indicam sítios propícios à urbanização numa escala de extremamente aptos a extremamente inaptos, justificando cada um por uma legenda simples de fácil interpretação.

Assim, objetiva-se alcançar o proposto pelo art. 182 da Constituição Federal de 1988, regulamentado pela lei Nº 10.257/2001, Estatuto da Cidade, o qual estabelece normas de ordem pública de interesse social em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental, além de uma série de outros dispositivos legais que regulam a questão.

TECLE PARA AMPLIAR
A presente inovação de processo abre perspectivas aos diferentes planos de governo e demais entidades governamentais ou não, reduzindo custos com relação às diferentes etapas e fases de Planos, Programas e Projetos.

Já se encontra configurado todo um banco de dados abrangendo todo o estado do Rio de Janeiro e recortes de municípios da Região Norte Fluminense, bem como recortes de microbacias do programa Rio Rural. Seria importante que outras edilidades do País se interessassem pelo tema, beneficiando-se desses estudos avançados. 



*Luiz de Morais Rego Filho
Agrônomo – Cientista – Especialista em solos
Doutor em Produção Vegetal pela Universidade Estadual Darcy Ribeiro - RJ
Pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro.
Membro Correspondente da ACLJ 

POEMA - Ver Cores - (CF)

VER CORES
Concita Farias*


A elevação do homem
Acontecerá
No dia em que obtiver
O poder
De ver cores,
Ao olhar um ancião.
Ver cores
Em lágrimas
Que falam de solidão.
Ver cores
Ao matar a fome, a sede
De um irmão.
Ver cores
No ato de se dar as mãos.
Entre cores, cores, cores...
Se dará a elevação!

(12/03/78)

*Concita Farias 
Pedagoga - Poetisa
Membro da ACLJ

terça-feira, 28 de julho de 2015

ARTIGO - Vergonhoso (CB)

VERGONHOSO
Cássio Borges*


Fiquei profundamente decepcionado quando soube que numa Audiência Pública no Senado Federal, realizada esta semana, na presença de eminentes personagens ligadas à questão dos recursos hídricos do Nordeste e de São Paulo (inclusive o atual Governador), o Diretor Geral do DNOCS, Walter Gomes de Souza, teve o desplante de dizer que ele tinha aprendido com os técnicos de São Paulo o termo "volume morto".

Ora, este termo existe no vocabulário do DNOCS desde o tempo que ele foi criado, em 1909. Está em todas as suas publicações, nos seus 105 ano de existência. É lamentável que  DNOCS seja tão mal representado tecnicamente em Fórum dessa natureza, pelo que se justifica a sua atual situação de desapreço e abandono na comunidade técnica nordestina e brasileira.

Em últimas palavras, fatos como este dão uma cabal demonstração de incapacidade técnica dos que atualmente estão conduzindo a questão dos recursos hídricos no Ceará (a sede do DNOCS é em Fortaleza) e no Nordeste.  Vejo isto com profunda decepção e tristeza.

Outras heresias  foram ditas naquela ocasião, como a velha história de mudar o nome do DNOCS de Departamento Nacional de Obras Contra as Secas para Departamento Nacional de Convivência com as  Secas. Coisa de quem não tem e nem sabe o que dizer.  Seria uma mudança estúpida e desnecessária, até porque isto não pode alterar em coisíssima alguma as ações daquele valorosa Altarquia, de inestimáveis serviços prestados à nossa Região. 

Acho que esta inusitada e inconsequente sugestão partiu, faz algum tempo, de algum paulista interessado em desmoralizar o Órgão, a partir do seu nome. Já escrevi um artigo sobre isto e citei o caso do “United States Bureau of Reclamation, entidade americana de supervisão de recursos hídricos, a mais respeitada em todo o mundo, cujo nome não tem nenhuma relação com o que ele realmente faz, mas nunca se cogitou em alterar. É com diz o Boris Casoy: "Isso é uma vergonha!".


P.S. - Na referida Audiência se discutia "A Crise de Água e Saneamento"



CRÔNICA - Auto Filho (VM)


PROF. DR. AUTO FILHO 
CONSULTOR NATA FINA
Vianney Mesquita*

Mais vale ler um homem do que dez livros. (Charles Augustin SAINT-BEUVEYBologne-sur-Mer, 23.12.1804; Paris, 13.10.1869).


Aprendi muito cedo a homenagear este brocardo saint-beuveano, quando  a ignorância, muito recorrentemente, me tortura, em particular pelo fato de aqueles a quem peço valimento serem também subscritores de livros, nas mais das vezes, até muitos, os quais costumo ler somente depois de haver descodificado convenientemente os primeiros.

Só assim, já vou com a certeza de não encontrar colagens em excesso, repetições, tautologias e, não raro, ideações alheias e sem referência, ao ponto de o leitor inábil e bobo intuí-las como da lavra do escrevinhador e, com muita frequência, ache de admirá-lo e dele sair a fazer apologias e jogar confetes, ao propagar ideias subtraídas de outra pessoa na qual o “autor” indevida e desonestamente se hospedou.

Mancheias de nomes sem livros e de valor inconteste saciam a história, exemplares dos quais pinço dois. O primeiro foi meu pai, Vicente Pinto de Mesquita, excepcional autodidata, cujas lições de vida constituíram verdadeiro manual, aide mémoire do conhecimento e da cultura, da lógica e do acerto, da retidão e da verdade  tudo isto haurido de leituras seletas amanhadas no trato do cotidiano e contato com a literatura de teor clássico, brasileira quanto internacional, malgrado jamais haja feito piso de uma escola formal.  Ainda menino, na Palmácea (1) do final dos ‘50, enquanto me deleitava com a Coleção Terramarear (de que constavam volumes sobre Tarzan, de Edgard Rice Burroughs), lembro-me de tê-lo visto lendo A Cidadela, de A. J. Cronin, com dois na reserva – O Castelo do Homem sem Alma (1931) e Os Verdes Anos (1944), do mesmo Archibald Joseph Cronin (YCardross, Dumbartonshire-UK, 19.07.1896;  Montreux – Suiça, 06.01.1981).


Wagner Turbay Barreira é o outro titã do saber  evidentemente em dimensão diversa de seu Mesquita – do qual não guardo notícia de haver deixado trabalho editorado, e de quem fui aluno em duas escolas da Universidade Federal do Ceará, em disciplinas de perfis diametralmente opostos, sendo ele perito em ambas, o bastante para argumento do seu preparo e manifestação da diligência professoral que conduzia, derradeiro reduto de extinção da dúvida. Espelho de mestre. Cristal se ser humano. “Um homem” – conforme disse, certa vez, João Pandiá Calógeras a respeito de Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto, ao narrar temas da Proclamação da República do Brasil.

Noutro texto, inserto no trabalho Nuntia MorataEnsaios e Recensões (Fortaleza: Expressão Gráfica, 2014, 368 p.), exprimia a noção de que, desde iniciado nos misteres da escrita, quando adentrei estudos do antigo curso primário, cuidei de afiançar a veracidade dos conceitos a manifestar, por intermédio, em especial, de obras de referência e de outras produções obsequiosas à consulta.

Apenas depois de convalidadas, as ideias prosperavam no texto, a fim de não conduzir os, então, frugais leitores ao logro, os quais poderiam multiplicar a falácia e perpetuar a inverdade. À medida, pois, que progredia a recepção dos curricula, no contato mais reiterado com excelentes professores – tive-os em profusão – usei de a eles apelar, não somente para obtenção de seus juízos atinentes aos assuntos por mim cuidados, bem assim para que me indicassem fontes onde me pudesse satisfazer da curiosice e amatar o apetite de conhecer, em ultrapasse à mera opinião comum.

A esses referenciais de pessoas cultas, que me não deixam na mão da dúvida e do não saber, costumo chamar “consultores padrão-ouro”, homens e mulheres postados na dimensão intelectual do Prof. Dr. Francisco Auto Filho, sobre quem muito me enleva proceder ao corrente comentário especial, para lhe dirigir, publicamente, um sentido agradecimento depois de salvar um artigo meu para um periódico científico, ao divisar impropriedades que, decerto, reduziriam em muito os proveitos já escassos daquele escrito. Isto ele o fez com a máxima presteza e o maior desvelo e, mui especialmente, sem panos mornos  ao amostrar a nueza real  nem parcimônia, e, inda mais, com incrível acuidade de um pensador de precioso alcance intelectivo.

Quando, em 2004, com a coautoria do Prof. Dr. Anchieta Barreto, demos a público A Escrita Acadêmica – Acertos e Desacertos, servimo-nos – e eu, em particular  de sua habílima consultoria em assuntos filosóficos, de sorte que, de lá até aqui, sempre que se me aza o ensejo, a ele me dirijo a fim de pedir amparo, na minha condição de semicego do saber, pois já chamava à atenção Karl Raimund Popper, em As Origens do Conhecimento e da Ignorância, para o fato de que [...] “somos todos iguais no infinito da nossa incompetência”, ao validar a confissão de Sócrates, quando disse, em síntese mais do que comprimida, só saber que nada sabe, o que muitos doutores e “ph-deuses” não têm a compostura de confessar.

Estudioso por compulsão, esse conhecido e celebrado jornalista investigativo e filósofo cearense, pelos seus escritos mui apreciados, magnas aulas e palestras subministradas aqui e alhures, dentre outras qualidades que lhe ataviam o caráter como prócer da Filosofia e da Ciência, ressalta a particularidade, pouco comum – seja isto expresso – de não rezar, sem que a convicção lhe permita, pelo catecismo de qualquer filósofo ou pensador de nenhum ramo ordenado do conhecimento, pois seu preparo adrede, cuidadoso e atilado lhe concede a circunstância do lume próprio, sem necessidade de uma lucerna emprestada que indiretamente o ilustre.

O Professor Auto Filho sempre me convence nas minhas constantíssimas incertezas, nas repetidas hesitações quando vou manifestar conceitos, razão por que, para gáudio meu, ele é outro dos meus consultores padrão-ouro, que me não permitem em meus escritos vazar a informação falseada.
Sinto-me bem quando posso me expressar assim...  


(1) Palmácea é o nome correto da minha cidade de nascimento, o qual, por corruptela, virou Palmácia. A Arcádia Nova Palmaceana, por meio do Árcade Antônio Carlos Sampaio de Oliveira, vai instar, junto à Câmara Municipal, para que a denominação seja corrigida.


segunda-feira, 27 de julho de 2015

ARTIGO - 50 Anos de Colunismo Político Diário


50 ANOS DE COLUNISMO 
POLÍTICO DIÁRIO
Por Jota Alcides*, em 26/07/2015, 

Enviado por 
Wilson Ibiapina**

Certa vez, num evento social em Brasília, tive a chance de perguntar ao jornalista e acadêmico Carlos Castelo Branco, o famoso Castelinho do Jornal do Brasil, o que era essencial para ser um bom cronista político.

Era tão grande a importância dele que diziam na época: “O Congresso trabalha muito mais na coluna do Castelo do que no próprio Congresso”. Respondeu-me, aristotelicamente, curto e pleno: “Ser um animal político”. Enquanto animal, uma raposa felpuda, cheia de sagacidade e sabedoria.

Foi assim que Carlos Castelo Branco tornou-se o patrono dos colunistas políticos brasileiros, o maior de todos nos últimos 50 anos. Ao lado dele, outros mestres: Carlos Chagas, Vilas-Bôas Corrêa e Jânio de Freitas. Há ainda os notáveis da atualidade: Clovis Rossi, Josias de Souza, Ilmar Franco, Merval Pereira, Ricardo Noblat, Eliane Cantanhêde, Dora Kramer. São nomes de prestígio nacional.

Eles têm em comum a filosofia jornalística do saudoso Luiz Beltrão, o primeiro doutor em comunicação no Brasil, ex-professor da Universidade Católica de Pernambuco e do Centro Universitário de Brasília-Uniceub, maior universidade privada do Centro-Oeste brasileiro.

Beltrão centra sua proposta de fundamento ético na prática noticiosa orientada à valorização humana na sociedade. Segundo ele, quase como numa balança, o jornalismo precisa se equilibrar em dois valores ligados intrinsecamente, assim como o direito e o dever: a liberdade e a responsabilidade, valores inseparáveis.

Mas, há também colunistas políticos regionais que adotam Beltrão e que seriam igualmente consagrados nacionalmente se escrevessem em jornais de referência nacional. É o caso de Edilmar Norões, radialista, jornalista, advogado e acadêmico, que está completando neste julho de 2015 exatos 50 anos de colunismo político diário no Nordeste brasileiro. Já tem mais de 18 mil colunas diárias publicadas, um acervo respeitável. É um animal político, diria Castelinho. “O que dá ao homem um mínimo de unidade interior é a soma de suas obsessões”, dizia o cronista e dramaturgo Nelson Rodrigues. Edilmar Norões é a soma de suas três grandes obsessões: radio, jornal e televisão.


Devotado ao jornalismo desde a mocidade, Edilmar compreendeu cedo, como Bismarck, que a política não é uma ciência exata, exigindo flexibilidade e maleabilidade, e que os políticos não amam nem odeiam. Muito pelo contrário.

Diretor, há muitos anos, da TV Verdes Mares e da Rádio Verdes Mares de Fortaleza, além de atuação no jornalismo impresso diário, Edilmar Norões tem sua trajetória quase toda ligada ao Sistema Verdes Mares, maior grupo de comunicação do Ceará. Conheço-o desde 1967, dos bons tempos do Rádio-Notícias Verdes Mares com ele, Mardônio Sampaio, Cirênio Cordeiro e Paulino Rocha. Sua conduta de profissional e de cidadão é irrepreensível. É o maior ícone do jornalismo político do Ceará.


Começou sua coluna política em 1965 no jornal Tribuna do Ceará, mantida desde 1981 no Diário do Nordeste, principal jornal do Estado, sendo leitura obrigatória de autoridades e personalidades do mundo político e empresarial do Ceará. 

Caririense de origem, Edilmar Norões projetou-se como multimídia no Ceará e se tornou tão influente que está para o jornalismo cearense como estão Parsifal Barroso, Virgilio Távora, Paulo Sarasate, Lúcio Alcântara e Tasso Jereissati para a história política da Terra da Luz, no último meio século. Todos esses grandes líderes passaram ou estão passando, mas Edilmar permanece iluminando o cenário político cearense com sua ética e seu profissionalismo: É um jornalista com atitude de servidor público, que deveria ser, mas não é, a atitude de muitos políticos.

“Cada um de nós, sejamos jornalistas, médicos, engenheiros ou de qualquer outra profissão, deve exercer sua atividade com responsabilidade e com ética, e procurar nunca se desviar, pois esses desvios é que, na certa, atrapalham e jamais permitirão que o profissional seja reconhecido pelo seu trabalho.


“Com responsabilidade, ética e profissionalismo a gente chega lá”, sintetiza o cronista político do Diário do Nordeste, aos 78 anos de idade, decano da crônica política no Ceará. De espírito dialogal e conciliador, sua norma de vida profissional é inspirada em máxima do romancista Gabriel Garcia Márquez: “A ética deve acompanhar sempre o jornalismo, como o zumbido acompanha o besouro”. Seu legado é o do jornalismo que extrapola o dever de informar por informar para o dever de informar para formar, buscando estimular as forças criativas da cidadania nas conquistas do bem comum e no fortalecimento da construção democrática.



Sempre admirado por sua sobriedade, sua seriedade, sua serenidade, sua cordialidade e sua afabilidade, Edilmar é adepto do credo do jornalista norte-americano Walter Williams: “Ninguém deve escrever como jornalista o que não possa dizer como cavalheiro”. 

Mas, pode um comentarista político escrever durante 50 anos, diariamente, sem ferir alguém? Pode. Prova-o Edilmar Norões. Até a mais dura verdade, nua e crua, ele consegue suavizar, se necessário, com tratamento equilibrado, civilizado e adequado, mas sem mascará-la. Parece ter sido formado em jornalismo pelo Instituto Rio Branco. É um diplomata da notícia.



*Jota Alcides é jornalista, escritor e conferencista cearense, radicado em Brasília. Natural de Caririaçú. É membro da Associação Brasileira de Imprensa e da União Brasileira de Escritores.

**Wilson Ibiapina
Jornalista
Diretor da Sucursal do Sistema Verdes Mares de Comunicação em Brasília - DF
Titular da Cadeira de nº 39 da ACLJ

domingo, 26 de julho de 2015

ARTIGO - As Dimensões da Crise (RMR)

AS DIMENSÕES DA CRISE
Rui Martinho Rodrigues*



Avaliar as dimensões da crise exige uma reflexão sobre o que seja e não seja tal coisa e onde ela se instala. O dicionário do Houaiss refere-se a crise como "um momento de agravamento de enfermidades, de definição de sua marcha evolutiva para cura ou para a morte; manifestação aguda ou agravamento de um mal; súbito desequilíbrio; grave desequilíbrio entre produção e consumo, com impacto sobre emprego, moeda e outros fatores; transição de um período de prosperidade para outro de depressão; momento histórico de indefinição, com riscos graves e iminentes". Os lugares em que a crise se instala, tratando-se de Brasil, são as finanças, a economia real e as instituições. Examinemos cada um destes canteiros onde as crises são semeadas e os frutos colhidos.

As finanças apresentam um quadro peculiar, em nosso País. As despesas públicas cresceram mais do que o PIB, ano após ano, por um quarto de século, desde 1991. A arrecadação tributária também cresceu mais do que a economia por um período quase tão dilatado de tempo. Isso não assustou senão aqueles analistas que clamaram no deserto. O crescimento da carga tributária, excedendo a variação positiva do PIB, não poderia durar para sempre. Acabou. As despesas, porém, continuam crescendo. Elas são rígidas. Estão amarradas em leis. Estão indexadas. Instalou-se um desequilíbrio. Mas não foi de súbito, como seria típico das crises. A crônica desta morte anunciada há muito estava prevista.

Temos, sim, uma crise financeira.

O ajuste do desequilíbrio fiscal precisaria de reformas, mas não temos condições políticas para tanto, aspecto que já passa para outro nicho: o da política. Outro traço das crises parece ausente: o momento de definição da marcha evolutiva para cura ou para a morte. O nosso caso, análogo ao da Argentina, parece inclinar-se mais pelas formas crônicas, não para a cura ou para a morte. Faltam partidos, líderes, programas e representação em geral.

Temos, sim, crise política.

A economia real se recente. Falta investimento produtivo. Declina a produtividade. Temos escassez de recursos humanos qualificados. A infraestrutura de transporte é péssima. Nada disso foi veio de súbito. Mas a transição das vantagens obtidas com o aumento das exportações de grãos e minérios; e com a estabilidade monetária do Plano Real passaram. A capacidade de suportar o aumento da arrecadação tributária maior do que o crescimento do PIB chegou ao fim. É a transição de um período de bonança para o de vacas magras. A massa de salários também cresceu mais do que a economia. A expansão do crédito ao consumidor, milagre do consumo sem renda, se desfez.

As instituições, porém, resistem bravamente. O Congresso, o Ministério Público e o Judiciário estão funcionando, embora não sejam perfeitos. Aplicar a lei, seguindo os trâmites do devido processo legal, não é crise. Tratar os poderosos como manda a lei não é crise. Não temos crise institucional. Impeachment não é crise nem é golpe, nas condições aludidas. Antes pelo contrário: pode ser a solução. É preciso superar a crise política para que se possa implementar as soluções para a crise da economia e das finanças.


CRÔNICA - Um Quase Afogamento (AM)

UM QUASE AFOGAMENTO
Assis Martins*
(Ilustração de Audifax Rios)


Personagens principais deste relato: Luquinha, cabra disposto recém-chegado à capital para tentar a sorte; Dr. Miguel, lagosteiro, político influente e sua filha Ana, linda mocinha no viço e beleza dos quinze anos.

Quando Luquinha chegou a Fortaleza ficou abismado com o movimento dos carros e das pessoas. Viera esperançoso de arrumar uma ocupação decente, qualquer que fosse, contanto que desse para o sustento, e quem sabe, mandar algum para a família.

A casa de um conterrâneo onde se arranchou provisoriamente ficava perto da praia, mas a imensidão do mar não o impressionou, posto que nascera e se criara numa vilazinha praiana lá pras banda de Camocim, no litoral oeste do Ceará. Era o tipo padrão do praiano, criado com pirão de cangulo, curtido pelo sal e pelo sol, disposto para qualquer empreitada, tirante as que fossem para prejudicar alguém.

Naquela manhã estava alegre com a promessa de um emprego. Não sabia ao certo do que se tratava, apenas sabia que era no comércio de um parente do dono da casa onde estava.

Era um domingão daqueles, com uma fartura de sol e muita gente animada. Convite excelente para amenizar a saudade com uns mergulhos no mar, que para ele não tinha mistérios. Conhecia desde menino todas as manhas das ondas traiçoeiras e os atalhos sutis do vento nordestino.

Foi só chegar e, rapidamente, acomodar os pertences na areia. Daí a pouco estava no seu elemento, braçadas fortes, longos mergulhos. Estava relaxado de verdade, um ponto pequenino de felicidade naquele marzão verde "de tantas esperanças afogadas".

Com os negócios e a política correndo de maneira favorável, bem à vontade numa barraca de praia, cercado de bajuladores e de garrafas de cerveja, Dr. Miguel usufruía das benesses que o dinheiro proporciona. Embevecido com o movimento das beldades ao redor, mal reparava na filha que, aos poucos, se afastava com umas amigas.

Em dia de preamar as ondas vão ficando cada vez mais violentas, e Ana, com a imprudência própria da idade ia se afoitando; no momento seguinte já estava sendo arrastada para o mar aberto, sufocando com a água salgada. O pior é que os circunstantes não percebiam o que estava acontecendo.

O salvamento da garota foi emocionante, com sucessivos lances de arrojo e coragem de Luquinha. A sua decisão, a rapidez com que se atirou nas ondas, o nado forte e decidido e a forma como a retirou da água deixaram as pessoas impressionadas. No mais, seguiram-se as atitudes de sempre nessas ocasiões. A recuperação da jovem, as muitas lágrimas de alegria do pai e as palmadas amistosas nas costas curtidas do herói.

Porém, uma ideia ruim foi tomando conta da mente ingênua do rapaz, só porque um amigo fez um comentário irônico: "Ô bicho sabido, ficou um tempão agarrado com a menina quase nua pra ver se ela respirava..."

Foi o bastante para ele ficar imaginando que o pai dela talvez achasse que se aproveitou da ocasião. E os pensamentos ruins, teimosos foram crescendo, pois os bons passam rápido sem deixar rastro.

E lá estava Luquinha impressionado, sem dormir direito, o que contribuiu para o desfecho. Alguns dias depois, um carro enorme para na frente da casa, e dele desce a figura imponente do Dr. Miguel, conseguira o endereço e vinha agradecer ao salvador da filha, dando-lhe um emprego numa de suas indústrias. Não chegou a dizer a que veio, pois Luquinha, rápido, saiu pelos fundos com seus parcos pertences e hoje, já velho, na sua vila praiana, conta para os mais jovens histórias fantásticas, cheias de maresia e de mistérios.

*Assis Martins
Funcionário da U.F.C.
Cronista e Ilustrador.
Bacharel em Geografia e Tecnologia e Gestão do Ensino Superior  pela Universidade Federal do Ceará

CRÔNICA - Dedilson (RV)

DEDILSON
Reginaldo Vasconcelos*


Acaba de falecer no Hospital de Messejana o promotor artístico Dedilson Martins”. Este anúncio necrológico, nos caracteres da TV, em pleno horário nobre, fez-me refletir sobre a força de vontade, esse instrumento que move montanhas.

Ecoaram pelo meu ser as palavras de Santo Agostinho: “Muito cuidado com o que você realmente quer, pois é exatamente o que você terá”. Em seguida, chamei ao telefone alguns que haviam conhecido o Dedilson menino, para dividir com eles a perplexidade que sentia.

O povo iletrado do sertão inventa nomes, combinando sílabas que forneçam um som pomposo, quando decidem variar dos tantos Franciscos, Antônios, Joãos, Josés, Raimundos e Pedros. Os pais batizaram Dedilson com esse nome meio estranho, nem Dilson nem Deusdedith, palavra sem história e sem origem etimológica.

Sobre esse nome brotou um rapaz franzino, que dissentia dos demais da prole, rudos lavradores. Moravam em nossas terras, nas fraldas da represa Lima Campos, imensa família em diminuta choupana de dois vãos, água no pode e pertences em sacos, que a mobília era mínima. Uma velha mesa e alguns tamboretes, o fogão a lenha, uma cama de varas, as redes penduradas nas forquilhas, armadas à noite, uma sobre as outras.

Ele era neto da parteira Deolinda, que aparava todos os filhos da pobreza, mas que, dele mesmo não veria algum bisneto, pois não sendo mulher, Dedilson era fêmeo. Ali e então, isto era grave, não só pelos preconceitos do povinho, desinformado sobre os milênios de uranismo que tem registrado a humanidade, mas principalmente porque aquela flor imperfeita seria sempre uma boca a mais e um braço a menos para as lides do roçado. Sua mãe, como é de regra, protegia-o, enquanto os demais se envergonhavam.

Ao ler aquele obituário na tela da Globo chamei logo Dulce Vasconcelos, que na juventude tanto se divertia com os modos do Dedilson. Em férias conosco na fazenda, folgava em conversar com o rapazola nos alpendres, como fossem duas moças. Parece que o vejo magrinho, de camisa “volta ao mundo”, indagando minha jovem tia sobre matérias de revista, sobre moda, sobre artistas.

Nesse tempo, início dos 60, a televisão em preto e branco mal servia à Capital. Naqueles ermos, onde sequer chegava asfalto, não havia luz elétrica e toda a informação vinha pelo rádio, sempre à pilha, raramente portátil. Dedilson queria saber sobre Aila Maria, com quem tia Dulce acusava parentesco, para alimentar o seu encantamento. Ele perguntou-lhe certa vez se a cantora usava “película”, confundido o termo “peruca”, de uso recente, com a palavra tradicional para as fitas de cinema.

Enfim, enquanto os irmãos lutavam contra as secas, Dedilson sonhava com a mídia: os salões da sociedade, os palcos artísticos, as passarelas coloridas. Veio, viu e venceu, dedicando sua vida ao sonho de menino.

Promoveu shows em Fortaleza, organizou desfiles, realizou concursos de beleza, contratando algumas vezes artistas de renome vindos do Sul-Maravilha. Não juntou dinheiro, e muitas vezes, perfeccionista e visionário, tão pouco lhe rendiam as promoções, que afinal não podia cumprir os compromissos.

Certa vez, depois de uma festa que pouco rendera, quase foi espancado pelos músicos. De outra feita, o cantor Aguinaldo Timóteo, contratado por ele, fracassado o show, levou-o às barras da Justiça. Mas Dedilson, vocação imperiosa, pobreza franciscana, não desistia. Até que a doença o prostrou.

Mal curado de tantas mazelas juvenis, inclusive uma tuberculose violenta, os pulmões não mais arejavam suficientemente o corpo raquítico. Silvana Portugal, linda e nobre mulher cuja beleza adolescente ele revelara em seus concursos, solitária e solidariamente prestou-lhe assistência. Sem ter nada de seu, além de um radinho de pilhas sempre à cabeceira, ele fez à amiga um último pedido: não o deixasse “descer à pedra”, a lousa anônima em que se retalham os indigentes nas faculdades de medicina.

A 19 de março de 1985, um dia de São José muito chuvoso, a pobre flor sertaneja, que já murchara, desprendeu-se da haste. Silvana procurou Luciano Monteiro, empresário magnânimo, patrocinador tradicional das festas do Dedilson, que custeou os seus funerais.

No dia seguinte, Ezaclir Aragão, renomado jornalista, que como muitos da imprensa e dos meios publicitários fora amigos do morto, publicou uma crônica comovida e gentil sobre o seu único legado: aquele radinho de pilhas, que no dia de sua morte desaparecera do hospital.


*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ