A
MANADA
Humberto
Ellery*
Em maio do ano passado (2016), o Sr. José
Sérgio de Oliveira Machado celebrou uma delação premiada com o Sr. Procurador
Geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros.
Quando as delações vieram a público
verificou-se que Sérgio, munido de um
gravador, e usando de astúcia, induzira os senadores Romero Jucá, Renan
Calheiros e o ex-presidente José Sarney a fazerem declarações criticando
fortemente a Operação Lava-Jato.
Ficou famosa a fala do Jucá dizendo: “...é preciso estancar essa sangria”. Os
três personagens disseram coisas que demonstravam um certo temor de que a
operação os alcançasse mas, além disso, nada tão comprometedor.
Li com muita atenção toda a degravação da
denuncia, e, após muito analisar, cheguei à conclusão de que não havia nas
falas dos envolvidos nenhum crime tipificado que merecesse uma denuncia formal.
No dia seguinte encontrei alguns amigos e fiz
o seguinte comentário:
“Essa
delação prova três coisas apenas, e duas eu já sabia: que o Sérgio é desonesto
e inescrupuloso confesso; novidade pra mim só mesmo sua deslealdade, pois,
nas falas do Sarney, do Jucá e do Renan não vislumbrei crime algum”.
Foi o que bastou para eu ser xingado de “defensor
de bandidos”.
Em nada adiantou eu dizer que não defendia,
nem defendo, esses três. O que eu defendo, enfaticamente, é a Lei. Se queremos
depurar a atividade política, e retirar da vida pública os bandidos que a
infestam, temos que fazê-lo sob o império da Lei. Ou nós lutamos para viver sob
a força do Direito ou seremos subjugados pelo direito da Força.
Um ano depois a Polícia Federal concluiu que
não havia nenhum crime tipificado contra o Sarney, o Jucá e o Renan, conforme
eu dissera. Nenhum dos que me chamaram de “defensor de bandidos” veio a mim se
desculpar, nem eu quero isso.
Mas o arrogante Janot, antes de pedir o
arquivamento da denuncia, do alto de sua empáfia, afirmou: “Os crimes só não
foram cometidos porque eu denunciei antes”. Em sua cabeça perturbada ele criou
mais uma ferramenta de combate ao crime: a “Delação Preventiva”. Palmas, que
ele merece!
Antes de encerrar, um breve parêntese: Embora
eu aceite como válido o instituto da “Colaboração Premiada”, não consigo ter
simpatia pelos “dedos-duros”, mesmo porque são todos criminosos, por definição.
Agora alguns amigos queridos me avisam que vou
acabar “queimando o meu filme”, por defender o Presidente Temer. Vou repetir
mais uma vez: minha preocupação é com a Constituição, com o Direito, com a presunção
de inocência, até que se prove a culpa.
Nunca afirmei que o Temer é inocente, pois
estaria incorrendo no mesmo erro que combato, dos que o dizem culpado sem uma
investigação que conclua pela culpa (ou inocência).
O mais próximo disso a que cheguei foi dizer
que, por sua esplêndida condução na recuperação econômica do País, e sua
coragem em lutar por reformas tão indispensáveis quanto impopulares, ele tem
comigo um crédito de confiança. Um político desonesto não assumiria o
formidável desgaste decorrente de uma política austera, voltada para o bem das
gerações futuras.
Vou repetir de novo (vou acabar tendo que
desenhar): se amanhã o Ministério Público provar que o Temer é corrupto,
mudarei de opinião. Tranquilamente.
Mas enquanto existirem contra Temer apenas
delações e ilações, que não provam absolutamente nada, como admitiu seguidas
vezes o próprio Janot, prefiro acreditar num político que, até “dar um golpe” no
PT, jamais teve qualquer denúncia contra si.
Até lá, não darei crédito a bandidos
mentirosos como os brothers
Batistas (com Nota Oficial assumindo seu desapreço pela verdade), ou como esse
tal Lúcio Funaro, que, mesmo nunca tendo visto o Temer de perto, diz que “tem certeza quase absoluta de que ouviu
falarem que não sei quem me disse que, não sei onde, alguém contou que parece estar
cada vez mais convencido de que é verdade”. É a nova “delação terceirizada”
(royalties para o jornalista Carlos Andreazza).
A parte da imprensa que está engajada no “Projeto
Fora Temer”, utilizando a máquina petista de assassinar reputações, já
arranjou até uma profissão para o picareta do Funaro: “Operador Financeiro”.
Por último: Não vou seguir “cientistas
políticos”, “especialistas”, colunistas ou comentaristas, principalmente da
Globo News. Sigo a minha cabeça, a minha capacidade de discernimento e até a minha
intuição. Sou infenso a seguir manadas.
Como no Cântico Negro do José Régio: “Não
sei por onde vou / Não sei para onde vou
/ Sei que não vou por aí!
COMENTÁRIO:
O ínclito, lúcido, e – por que não dizer? – o sábio
confrade Humberto Ellery, meu estimado contraparente, é um aguerrido defensor
de suas ideias e de suas próprias conclusões, o que, por todos os títulos, é edificante
e admirável.
Todavia, a chamada “verdade real”, que é o grande objetivo
do persecutio criminis, tem os mesmos
atributos fugidios e miméticos do lagarto estelião: hora parece estar aqui, hora
parece estar acolá; hora parece ser assim, hora parece ser assado.
Então, a Polícia e o Ministério Público, que
mourejam no procedimento criminal que a mídia escrutina, vão apanhando tudo que
semelhe ser o réptil procurado. Na fase processual é que a verdadeira coloração
da sua pele é enfim identificada.
Sim. Os investigadores não têm que ser imparciais.
Eles apresentam no inquérito e na denúncia uma verdade horizontal, um quadro
fático em duas dimensões, sem o necessário contraditório, cabendo ao Judiciário
verticalizar, aprofundar, tridimensionalizar a verdade, para absolver ou condenar.
No caso, segundo Ellery, Michel Temer – tradicional aliado
petista, líder de um grupo político muito suspeito, compositor de um Ministério
com vários réus-presos, com o principal assessor pilhado em circunstância
indefensável – seria ele o que se poderia chamar de um “corrupto Denorex”: tem cara
da corrupto, tem cheiro de corrupto, vive cercado de corruptos, entretanto é honesto
como a mulher de César, porque, realmente, até aqui, não há contra ele uma só prova
cabal.
Eu sou advogado, com experiência no processo-crime e
longa militância no Tribunal do Júri, e sei que diante de uma acusação não há
neutralidade: ou a pessoa adota a tese incriminadora, ou assume os argumentos
da defesa. Ou acredita no advogado, ou aceita a verdade da promotoria.
Assim, enquanto o camaleão da verdade real ainda não
revelou exatamente onde está, nem a sua real pele mosqueada, o critério do
observador é aleatório ou afetivo.
Para mim, Temer está na posição bíblica do inditoso
Bom Ladrão. Embora ladrão e crucificado, suando e sangrando, está apoiando a
boa causa cristã e não merece descer ao inferno – até porque, se o fizer agora,
o Brasil vai afundar nas trevas. A política econômica está certa, estamos
superando a crise, as reformas estão em curso, devemos esperar as eleições.
Resultado da equação: A “manada”, ressentida e irrefletida,
brada “Fora Temer!”; eu o culpo, mas, racionalmente, digo “Fica Temer”; Ellery o prefere desculpar
e absolver.
Reginaldo
Vasconcelos