sábado, 29 de setembro de 2018

NOTA JORNALÍSTICA - Sereia de Ouro 2018


SEREIA DE OURO
2018

O Sistema Verdes Mares de Comunicação, do Grupo Edson Queiroz, realizou na noite de ontem (28.09), no Teatro José de Alencar, a 48ª edição do Troféu Sereia de Ouro.


A comenda foi criada pelo Chanceler Edson Queiroz em 1971, e foi mantida de forma ininterrupta por Dona Yolanda, outorgada solenimente a cada ano a quatro personalidades cearenses que se tenham destacado em seus respectivos ramos de atividade.



Este ano foram agraciados o empresário Beto Studart, o artista plástico e sônico Descartes Gadelha, a ministra do TST Kátia Arruda e o médico Odorico de Moraes Filho.


A ACLJ cumprimenta especialmente os novos sereiados Beto Studart, Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), e Descartes Gadelha, um dos maiores artistas cearenses de todos os tempos, que são seus Membros Beneméritos.


A nossa instituição esteve representada na solenidade por seu Presidente Reginaldo Vasconcelos e  por seu Presidente Emérito Rui Martinho Rodrigues, a convite do Diretor Institucional do Grupo Edson Queiroz, Igor Queiroz Barroso, 12º Membro Benemérito da ACLJ – na imagem, com a sua Aline Felix Barroso. 




Estavam ainda presentes os Membros Beneméritos Lúcio Alcântara, Graça Dias Branco da Escóssia, Ubiratan Aguiar e  José Augusto Bezerra, e os Membros Titulares da ACLJ Sávio Queiroz, Totonho Laprovitera, Wilson Ibiapina e Paulo César Norões. 

    

POEMA - Porta do Sol (TL)


PORTA DO SOL
Totonho Laprovitera*



Esses olhos miúdos
mirando mil sonhos
são contas graúdas
fazendo de conta
que são decoradas
na ponta da língua,
que são desenhadas
na Porta do Sol

Luz flamejante,
vermelha e amarela,
da chama da Espanha
que a noite aquece
na Plaza Mayor,
trazendo o calor
pra quem não esquece
do fogo do amor

Quero teus beijos,
pintar teus desejos
com fome, com sede,
na coragem do medo
agora que eu chego
sem pressa aqui,
contigo eu sonho
cantando em Madri




RESENHA - Programa Da Hora (27.09.18)


PROGRAMA “DA HORA”
APRESENTADOR
ALFREDO MARQUES
TV UNIÃO
 27.09.18

O Programa Da Hora – que vai ao ar, ao vivo, de segunda a sexta-feira, às 12:30h, com reprise às 18:30h, pela TV União (Canal 17.1 na TV aberta e 521 na Multiplay) – na edição desta quinta-feira (27.09) teve a participação do seu apresentador titular Alfredo Marques, e dos também advogados Roberto Pires, Djalma Pinto e Reginaldo Vasconcelos, presidente da ACLJ, e do convidado especial o médico cardiologista Lineu Jucá. Na edição ao vivo, antecipado para as 12:00h, durante o período da propaganda eleitoral.

Alfredo Marques abriu o programa indignado com a notícia de que  moradores da cidade de Caucaia tiveram as fachadas das casas pichadas com mensagens em tom de ameaça. Segundo os moradores da região, o local é ameaçado pela violência entre grupos criminosos. 

Além das mensagens de intimidação, o portão de uma das casas foi alvejado por disparos de arma de fogo. Vários moradores da área estão abandonados as residências  – e essa é a finalidade dos bandidos, que se apropriam dos imóveis.

Reginaldo Vasconcelos e Djalma Pinto opinaram sobre o absurdo dessa realidade, que representa a absoluta falência da República Brasileira, notadamente o Governo do Estado, que não consegue mais promover o Estado Democrático de Direito.

Alfredo considerou que essa arrogância das facções criminosas no Ceará dá sinais de que estão em plena vigência os acordos celebrados entre o narcotráfico e os Estado, a que se referiu Ciro Ferreira Gomes.


Roberto Pires colocou então na mesa as pesquisas indicando que Jair Bolsonaro, líder nas intenções de votos no primeiro turno, no segundo turno perderia para qualquer um dos concorrente. 

Reginaldo objetou que essas consultas populares sobre intenção de votos no segundo turno, embora possam fazer um retrato do momento atual, não representam a realidade, pois o segundo turno é uma nova eleição, em que tudo zera e os dois candidatos terão o mesmo tempo de propaganda para "vender o seu peixe" aos que votaram nos  derrotados no primeiro turno.

Foi então trazida à discussão a notícia de que o vereador Carlos Bolsonaro, do Rio de Janeiro, filho do candidato a Presidente, teria compartilhado uma publicação grotesca da Internet que ataca a candidatura de seu pai, postagem em que se exibe um homem submetido à tortura por sufocamento, com um saco plástico sobre a cabeça, e tinta vermelha simulando sangue, legendada pela hashtag  Ele Não.  

Djalma, Reginaldo e Roberto Pires entenderam que Carlos Bolsonaro quis apenas manifestar a sua indignação com essa postagem, talvez com um comentário de protesto, enquanto Alfredo Marques entendeu que quem compartilha publicação no Facebook se torna responsável pelo seu conteúdo. 

A discussão derivou para  uma outra informação sobre eleitores do Bolsonaro que se manifestaram em passeata a favor da intervenção militar e de outras medidas antidemocráticas, defendendo Alfredo Marques que o candidato deveria ser responsabilizado pelo que fazem seus simpatizantes.

Roberto Pires se opôs a esse entendimento, argumentando que, em sendo assim, Haddad deveria responder pelo crime de Adélio Bispo, pessoa de esquerda que tentou contra a vida do opositor, líder nas pesquisas de intenções de votos. A discussão foi acalorada, sob a mediação do ponderado Djalma Pinto, até que uma falha elétrica provocou um blecaute nos estúdios da TV União, que saiu do ar por alguns instantes. 


O médico Lineu Jucá compareceu para comentar a boa qualidade do hospital público de Juiz de Fora, em Minas Gerais, em que Bolsonaro  foi atendido após o atentado sofrido. 

Ele frisou que os hospitais especializados em urgências médicas, como, por exemplo, o IJF, ditos de porta aberta, estão sempre prontos a atender vítimas de trauma, enquanto os chamados hospitais de porta fechada, se dedicam mais a tratamentos eletivos.

Lembrou que se o candidato tivesse sido atacado defronte a um destes hospitais de porta fechada” talvez não tivesse sobrevivido, porque não haveria um centro cirúrgico preparado para atender àquela emergência, nem cirurgiões de plantão para entrar em ação imediatamente.

Comentou ainda a excelência do nosso Frotão, tanto em referência a seus equipamentos quanto a seu corpo médico, mas lamentou que ele funciona sempre no limite de sua capacidade, por prestar atendimento a emergências médicas da Capital e do Estado como um todo.  Falou também do mau estado de conservação dos  Frotinhas, cujos prédios, que são antigos, estão muito degradados.

Indagado por Alfredo Marques, ele pontuou que o tráfico de drogas é a causa da grande quantidade de ferimentos a bala no Estado. Consultado por Reginaldo Vasconcelos, ele informou que os efeitos de um tiro de arma de fogo tem morbidade muito superior a uma facada, de modo que se Bolsonaro houvesse sido alvejado por uma bala teria tido menos chance de escapar da morte e de recuperar a saúde.

Ao encerrar o programa, Alfredo Marques atribuiu jocosamente o apagão que ocorreu durante o Programa à alta voltagem dos debates, que teria esquentado a fiação da emissora.

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

ARTIGO - Entre o Espeto e a Brasa (HE)


ENTRE O ESPETO E A BRASA 
Humberto Ellery*


O ano de 2016 poderia ter significado o fim do PT, pelo menos como um grande partido. Nas eleições para prefeito daquele ano a sigla sofreu a pior derrota entre todas as legendas, sob qualquer aspecto.

Em resumo: de cerca de 700 prefeituras conquistadas em 2012, com 17,2 milhões de votos, conseguiu em 2016 apenas 254, com inexpressivos 6,8 milhões de votos.

Perdeu principalmente a joia da coroa, a prefeitura de São Paulo, ainda no 1º turno. Perdeu também a metade dos seus vereadores, um encolhimento geral de cerca de 60%.

Em maio já perdera a Presidência da República, com o afastamento de Dilma, cujo Impeachment se confirmou no final de agosto.

Todas essas derrotas políticas e eleitorais, somadas ao desnudamento de seus crimes, faziam prever um fim melancólico para o partido, que estava havia treze anos no poder, com muito dinheiro em caixa (surrupiados dos cofres públicos), e um projeto de perpetuação no poder, que felizmente não se concretizou.

Foi então que uma série de coincidências favoráveis aos petistas, somadas a uma resiliência política impressionante, iniciaram um processo de ressuscitação do partido. Esse processo nos trouxe a uma eleição presidencial que, para nós liberais, conservadores e não-petistas, é uma verdadeira “sinuca de bico”. Estamos entre o espeto e a brasa.

É claro que todos os fatores que foram se conectando, de modo favorável ao ressurgimento do PT no cenário eleitoral como um ator competitivo, capaz de mais uma vez abiscoitar a Presidência da República, não fizeram parte de um projeto planejado e executado com maestria por seus próceres.


Seria necessária uma mente malignamente petista, formada por cérebros privilegiados, uma soma de Maquiavel, Gramsci e Golbery (para adicionar um toque brasileiro) para alcançar tal intento. Mas o fato é que o quadro que se desenhou ficou “como o Diabo gosta”; para o PT foi melhor que a encomenda.

Dentre os diversos movimentos do período, a persecução aos políticos corruptos, altamente louvável, transmudou-se, por conta de uma vaidade sem limites de alguns membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, numa verdadeira razia contra a classe política, como se todos fossem “farinha do mesmo saco”, o que, absolutamente, não é verdadeiro.

O maior símbolo do que eu chamo de “Projeto de Extinção da Classe Política” é a famosa “Lista da Odebrecht”, em que são detratados políticos do maior respeito, como Aldo Rebelo, Jarbas Vasconcelos, Osmar Terra, Ana Amélia, Raul Jungmann, Roberto Freire, Arthur Virgílio, e muitos outros mais da mesma estirpe.

Eles foram lançados pelo Sr. Rodrigo Janot e o Ministro Edson Fachin na mesma lama em que chafurdam Eduardo Cunha, Jader Barbalho, Renan Calheiros, Sérgio Cabral, Anthony Garotinho, Agnelo Queiroz, Gleisi Hoffmann e muitos outros. A tal lista traz no total os nomes de quatrocentos e quinze políticos, de vinte e seis partidos.

Nem o Lula chegou a tanto, pois dizia que havia apenas trezentos picaretas no Congresso Nacional (e ninguém entende mais de picaretagens do que ele). Acontece que quando todos os concorrentes são atirados na lama, vence a corrida quem já está habituado a chapinhar no chiqueiro. Adivinhou quem pensou no Lula.

A rapidez com que o Juiz Sérgio Moro, certamente com a melhor das intenções, levou adiante o processo contra “a Jararaca de Garanhuns”, e o TRF-4 bateu todos os recordes na sua tramitação em segunda instância, negando a famosa leniência de nossa Justiça, deu ao ex-presidente uma imagem de vítima, uma bandeira de mártir, de perseguido injustamente, enfim, de “preso político”, o que nada mais é do que falácia. Mas o PT não precisa de verdades para lutar contra seus adversários.

Outro fator favorável derivou das pesquisas eleitorais, que estão sendo marteladas pela mídia há mais de um ano, sempre mostrando o Lula na frente, com cerca de 30% das preferências do eleitor.

Não vou fazer afirmações irresponsáveis acerca dos Institutos de Pesquisas, de sua honestidade, competência e até de um eventual petismo. Não afirmo o que não posso provar. Mas ninguém pode negar o forte efeito indutor de tais pesquisas, que têm um histórico de erros e imprecisões enormes, quase sempre a favor do PT.

Para completar o quadro favorável ao PT surgiu na Câmara dos Deputados, lá nos corredores esquecidos do “baixo clero”, um deputado constrangedoramente despreparado que encarnou, à perfeição, o seu adversário favorito.

Trata-se de um Mito, no estrito sentido da palavra, algo legendário que não tem existência real, e com uma imagem virtual muito maior que ele próprio, que me parece honesto e bem intencionado, que defende princípios cristãos, é contra o aborto, a política de cotas, o kit gay, é a favor de armar a população para combater a criminalidade, diz que “bandido bom é bandido morto”, e conseguiu arrastar atrás de si enorme parcela da população, que compartilha com ele a indignação com o atual quadro político, com o antipetismo que ele demonstra, e que também “é contra tudo isso que está aí”.

Afirma também que  não vai “lotear o ministério em troca de apoio”, nem vai “negociar” a aprovação de projetos com o Congresso Nacional, que considera totalmente corrupto! Vai reeditar a “Política dos Governadores”, que fez sucesso na “República Velha” (1889/1930).

Caso o Haddad vença a eleição, o que é muito provável, no dia seguinte o Brasil vira uma espécie de PCC, ou Comando Vermelho, pois vai ser comandado de dentro de um presídio. Teremos um novo poste, tão ou mais pernicioso que a Dilma, com a (des)vantagem deste ser realmente Doutor, ao contrário daquela, que alegou uma formatura improvável.

O Haddad é bacharel em Direito, Mestre em Economia e Doutor em Filosofia. É aquilo que o matemático e ensaísta libanês Nassim Taleb chama de I Y I (pronuncia-se em inglês ai-uai-ai – Intellectual Yet Idiot – que significa “intelectual ainda idiotizado), como costumam ser os intelectuais marxistas. O candidato do PT, se eleitor, vai repetir o descalabro Dilma – porque não foi a burrice que fez naufragar governo dela, mas a ideologia, a mesma que professa o poste Haddad. 

Por outro lado, caso o Bolsonaro vença a eleição, o PT vai assumir a oposição, vai fazer o que sabe fazer melhor: atrapalhar, impedir o governo de realizar qualquer coisa, que mesmo sendo de interesse do País, não corresponda às suas idiossincrasias ideológicas. De dentro do presídio virão ordens para queimar ônibus, interditar cruzamentos rodoviários com pneus em chamas, greves em profusão, invasões de autarquias, fazendas, prédios públicos, e toda sorte de manifestações que fazem a alegria das hostes mortadelas.

Não consigo perceber no Mito a mínima competência para afrontar o PT e sua “Máquina de Assassinar Reputações”, principalmente porque ele nunca demonstrou um mínimo de liderança (em sete mandatos participou de nove partidos, quase todos nanicos, e nunca foi líder de nenhum deles), não tem um partido forte atrás de si, e não pretende “negociar” apoios no Parlamento.



Ficamos assim: Bolsonaro X Haddad  . “Se correr o bicho pega; se ficar o bicho come”.



COMENTÁRIO

Magnífica reflexão de Humberto Ellery, competente e apaixonado ensaísta político. Porém, a meu juízo, cumpre escoimar alguns exageros cometidos ao longo de seu exercício de retórica, sem embargo de que, ao fim e ao cabo, o raciocínio que desenvolve leva à percuciente conclusão já indicada desde o título – o agudo dilema destas eleições. 

Primeiro, não me consta que a mentira e a improbidade sejam inerentes à ideologia socialista, com os seus nobres contornos teóricos originais, sociais e humanitários, que, como infelizmente não funcionam na prática, passam a justificar todos os meios para a sua consecução. 

Socialistas mentirosos e ladrões, são, portanto, excrecências  distorções ideológicas. Desta sorte, foi a prática canhestra de uma pseudo ideologia socialista, além de pura estupidez e arrogância, que levaram o Governo de Dilma Rousseff ao fracasso.  Enfim, penso que as práticas político-administrativas viciosas defluem da ganância econômica e da sede de poder dos indivíduos, indiferentemente à sua bandeira ideológica.

No caso dos governos de direita, locupletam-se por via da livre obtenção e concentração de capital espúrio, através da manipulação desonesta dos “tecidos moles” do sistema democrático; em se tratando da esquerda, pela aplicação das rígidas estruturas ósseas do regime marxista e da afiada queratina autoritária que caracteriza as ditaduras.

Segundo, o apodo de “mito”, que do grego indica “fábula”, foi conferido ao Bolsonaro pelo seu próprio eleitorado, de modo que a palavra, neste caso, não transporta o sentido  de “fabular”, de algo que não exista no real, mas tem a semântica de “fabuloso”, aquilo que, de tão excepcional e surpreendente, conquista o aplauso popular.

Terceiro, não vigora o argumento de que Bolsonaro não governará bem em sendo eleito porque em tantos anos de mandato nunca liderou ninguém, nem demonstrou habilidade para negociar com o Parlamento, pois durante o tempo todo ele foi crítico do establishment, e combateu severamente a estrutura corrupta e autoprotetora que ele se propõe a detonar, de modo que, pelo menos, a sua coerência política se preserva.

Reginaldo Vasconcelos
   

ARTIGO - Aspirações e Direitos (RMR)


ASPIRAÇÕES E DIREITOS
Rui Martinho Rodrigues*


Desviamos a nossa atenção da produtividade. Trocamos a propensão de poupar, pela de consumir e pelo uso do crédito para desfrute. Consumo sem renda, produção sem investimento e com baixa produtividade são falsos milagres. A complexidade do mundo contemporâneo exige regulamentações e obrigações de fazer por parte do Estado. 

É preciso, porém, parcimônia na dosimetria das benesses e tutelas delas decorrentes. A degradação da democracia em demagogia (Aristóteles, (384 a. C. – 322 a. C.) se ligado, hoje, principalmente ao excesso de demandas (Norberto Bobbio, 1909 – 2004). Eleições tornaram-se concursos de promessas irrealizáveis. Não aprendemos com os fatos. Déficit público, juros altos, recessão e desemprego passam em branco pelas nossas consciências, como os acidentes de trabalho e de trânsito, sem que tomemos as devidas precauções.

Aspirações conduzem a diferentes motivações e iniciativas. Esforço e empreendedorismo podem nascer de legítimas demandas. São caminhos de quem persegue os próprios objetivos pela superação de obstáculos, por serem direitos potestativos, aos quais não cabe contestação, mas que não impõem deveres a terceiros. Outro é o roteiro de quem atribui ao direito potestativo as suas realizações, a falsa prerrogativa de exigibilidade contra terceiros.

Os códigos de Manu (situado entre o ano 1000 e 1500 a. C.) e de Hamurabi (séc. XVIII a.C.), entre outros, expressavam comandos do rei, dirigidos aos súditos, prescrevendo obrigações de não fazer. Protegiam o mais fraco. Diziam: não mate, não tome a mulher do outro, não roube, que são práticas do mais forte. 

Depois tivemos comandos dos cidadãos endereçadas ao rei, também expressando obrigações de não fazer, limitando o poder do Estado e dos seus detentores, como a Carta do Rei João sem Terra, em 1215, dizendo coisas como não cobre impostos sem ser autorizado por lei, nem condene sem o devido processo legal, protegendo o cidadão, a parte mais fraca, do Estado, a parte mais forte. Obrigação negativa não gera ônus material. Não enseja à parte obrigada a oportunidade de reivindicar poder para adimplir a obrigação.

Modernamente os cidadãos atribuíram ao Estado obrigações de fazer. Serviços de saúde e educação se somaram ao milenar dever de prover segurança e dirimir conflitos, até então únicas obrigações de fazer. Seguiram-se as obrigações positivas para com habitação, transporte, lazer. A lista é sempre crescente. O processo histórico criou necessidades incontornáveis que estão na origem de tais obrigações. Aprendemos a gostar de tais direitos e chegamos ao Estado provedor. O desfrute do próprio esforço, direito potestativo, está sendo substituído pelo direito de exigir de terreiros, no caso, do Estado, o gozo do que não foi conquistado. A ideia de superação das dificuldades cedeu lugar a revolta em face dos obstáculos próprios da vida fora do paraíso.

É cômodo defender direitos exigíveis; atribuir dificuldades e frustrações a terceiros; responsabilizar a realidade circundante pelos nossos erros; dizer que todos somos inocentes e as nossas aspirações são exigíveis contra outrem. O Estado passou a ter as mais amplas obrigações de fazer. Adquiriu, ipso facto, poderes sobre uma gama cada vez maior de poder sobre meios, situações e pessoas. Regulamentações, tributos e um dilúvio de problemas seguem a era dos direitos (Bobbio, 2004). O fim do voto censitário tornou preponderante a representação dos que reivindicam direitos, transferindo para terceiros o ônus das conquistas. Os custos, todavia, sempre chegam aos beneficiários e são mais caros do que se fossem pagos pelo próprio cidadão.


CRÔNICA – Um Galão Diferente (V.M.)


UM GALÃO DIFERENTE
Vianney Mesquita*


É próprio das grandes almas desprezar grandezas e almejar mais o médio do que o muito. (FRANCISCO Gómez de QUEVEDO y Saltibañez Villegas. Escritor áureo espanhol. Madrid, 14.9.1580 – Villanueva de los Infantes, 8.9.1645).


É deplorável ser comum no Brasil, em todos os seus rincões e em razão de haver uma cultura arraigada desde os primeiros instantes da Colonização Portuguesa – decênios iniciais do Seiscentos – o fato de pretender o cidadão representar, sob todos os aspectos, algo mais do que seu perfil regular permite, ideia configuradora, com variância de graus, da denominada soberba patrimonialista.

Esta circunstância é examinada, a miúdo, por diversos especialistas da história  patrial no decurso de sua fase de implantação, porém com rebatimentos constantes e modificados, como Octávio Ianni, Caio Prado Junior, Rui Martinho Rodrigues, Sérgio Buarque de Holanda e Florestan Fernandes, bem assim de outros autores que examinam o fenômeno, incluindo tempos recentes e a quadra fluente, em investigações stricto sensu na contextura das academias e institutos de pesquisa.


O fecho desta croniqueta, porém, fruto do excepcional engenho inventivo brasileiro, mormente de cariz nordestino, traz um raro exemplo de manifestação contrária à empáfia das pessoas, parece que, de caso pensado, ideado por um sertanejo cujo nome desconheço, no entanto tudo faz indicar ser ele um experto do canto de desafio, moto principal das cantorias próprias desta região do País e, nas mais das vezes, de tão agradável teor.

Está bem surtido o acervo de piadas com militares, especificamente com praças, do soldado sem fita ao cabo (ambos praças prontos), do anspeçada (antigo praça pronto) ao segundo tenente, todas de invenção desconhecida e da qual (para mim um fenômeno) não se reclama autoria em quaisquer condições.

Conta-se que, ao se apresentar à caserna na idade propícia a “servir à Pátria”, um postulante a recruta, após satisfazer a várias indagações de um sargento que cuidava do assunto, teve a si dirigidas esta perquisição e as subsequentes.

Quantos irmãos você tem?

Doze.

Tudo vivo?

Não. Vivo só eu. O resto tudo é otário!

Narra-se, também, de um recruta que tencionava passar a pronto, o qual se esmerava em decorar as continências de todas as graduações dos diversos estratos oficiais armados brasileiros – Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar, Bombeiro Militar etc., a fim de se dar bem quando da avaliação final para chegar a soldado pronto. Então, já sabia, DECORADO E DE SALTO*, as fitas, galões, estrelas, estrelas sobre fundo circulado e outros indicativos de todas as instituições armadas nacionais.

Eis que, numa manobra castrense pelas ruas da localidade onde servia (cidade grande!), apareceu ao longe, para cruzar com o contingente de seu quartel, um grupo grande de escoteiros com toda a hierarquia do grupamento – lobos, rambos, seniors e pioneiros – com o multicolorido fardamento e indicativos jerárquicos.

À medida que o conjunto se aproximava da sua bateria, tendo ao lado seu oficial comandante, ele se apavorava, pois jamais havia visto essa espécie de arma brasileira, tampouco aprendido a vênia que deveria fazer ao “oficial” que vinha à frente.

Ao chegar junto do pioneiro escotista comandante, ajoelhou-se, com as mãos postas e disse solenemente:

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

Para findar estas notas, diversamente do que se diz – “o general gostaria de ser a metade do que o cabo pensa que é” – vem a contraposição à ideia de empáfia, expressa numa cantoria.

Numa vila interiorana do Ceará, o cantador iniciava a peleja junto a outro violeiro, com seus instrumentos afinadíssimos. Antes da introdução, da querela versificada propriamente dita, passou na frente dos disputantes o Segundo Sargento, então delegado do lugar (anos 1950), quando o poeta cantou:

Vou botar mais um galão no ombro desse tenente!

Fingindo-se aborrecido, o Sargento expressou:

Não gosto de chaleiragem! Não sou tenente. Sou é sargento! Detesto puxa-saco!

Imediatamente, o cantador obtemperou:

– [...], mas o galão que eu digo é um galão diferente/É um pau com duas latas/Uma atrás e outra na frente!



terça-feira, 25 de setembro de 2018

CRÔNICA - Réquiem Urbanístico (RV)


RÉQUIEM URBANÍSTICO
Reginaldo Vasconcelos*


Corriam os anos setenta em seus albores. Mil novecentos e setenta e um, precisamente.

Todos eram vivos e jovens. Menos o Bebeto, o tio mais novo, que por volta dos trinta iria morrer de repente no réveillon daquele ano. Com ele eu encetara o projeto de instalar entre os muros daquele terreno na Av. Rui Barbosa, sob seus cajueiros e mangueiras, uma escola de adestramento de cães, atividade que eu e ele dominávamos, e que seria pioneira no Estado.

Na principal música de carnaval que embalava o período Sérgio Sampaio falava de um melancólico pierrô desapaixonado, perseguido pelas patrulhas ideológicas culturais, por não se ter engajado na luta da esquerda contra o regime militar. “Há quem diga que eu não sei de nada / que eu não sou de nada / que eu fugi da briga / que morri de medo quando o pau quebrou...”. A vida pela frente, eu já sabia, seria uma corrida de obstáculos, que não me intimidava. “Eu quero é botar / Meu bloco na rua / Brincar / Botar pra gemer. 

Mas dos rádios e fonolas mais comportados se ouvia o disco anual de um catolicíssimo Roberto, que chamava para si a atenção de Jesus Cristo, insistindo no refrão “eu estou aqui!”. O tio que ia morrer comprara o LP naquele natal para presentear alguém na família, e logo em seguida foi chamado para o Éden.

Eu estava aí meio menino nesta calçada, esperando um ônibus e projetando a ideia de adestrar cães, que não se concretizou porque o velho ranzinza dono do espaço resistia em cedê-lo para a exótica atividade, respondendo aos meus apelos que “de cachorrada andava cheio”. E as gestões não insistiram mais, e o plano não prosperou, porque o sócio no negócio desertou para o infinito.

Corte no tempo, sete anos depois, o empresário Bosco Coelho de repente transforma esse bosque urbano de meio quarteirão na mais agradável casa de pasto da cidade, a churrascaria Parque Recreio, com o seu pequeno zoológico, um formigueiro de garçons, e a melhor carne zebu do universo, assada ao sal grosso, no espeto, sobre a brasa.



Anos à frente eu a prestigiaria com frequência – com os amigos, com as namoradas, com a família, com o grupo de moças que eu fotografara para a minha página no jornal, marcando com um diagrama de lembranças específicas cada praça a céu aberto, cada palhoça, cada mesa do gigante restaurante.








Muitos mais anos à frente, já sem os bichos, que o Ibama confiscou – mas ainda com muito glamour, já sob a administração do ex-garçom que o arrendou e enriqueceu, fizemos ali as primeiras reuniões para a fundação da ACLJ, preparatórias para a instalação da confraria. E mesmo depois, era ali o nosso laboratório de intenções.







Agora a churrascaria fechou, e o terreno voltou ao seu estado original. Suas árvores estão novamente ameaçadas de extermínio, e tombarão juntamente com tantas memórias vivas que construímos embaixo delas. 



E a lua verá desconfiada / A Loura do Sol com mais um supermercado” – parafraseando o compositor Ednardo, na canção em que ele chora as inexoráveis metamorfoses urbanas, que trucidam o passado da cidade e soterram as melhores lembranças de seu povo.