O IMPÉRIO
CHINÊS RENASCE
Luciara de Aragão*
Desde 2008, em torno dos jogos olímpicos e por
quase uma década, a metrópole de Pequim pareceu erguer, em torno dela, uma nova
ordem mundial. A China começava uma fase de lua de mel com os outros países e ainda
que tivesse reprimido um recente levante no Tibete, o país angariou simpatias internacionais
após um devastador terremoto.
Muitos foram a
Pequim para a “festa de debut” da China. Líderes estrangeiros encantaram-se com
a arquitetura, os fogos reluzentes e as cerimônias de abertura ostentando as
ambições de poder do país.
Em seguida, o mundo
chegou a “outro ponto de inflexão: a implosão do sistema financeiro americano e
a crise econômica global. O crescimento da China escorou ao mesmo tempo a
economia mundial e a crença entre as autoridades do país de que seus sistemas
econômico e político poderiam ser rivais de seus correspondentes americanos” (jornalista
Edward Wong. Papers 2008 Universidade de Harvard).
Ser abertamente autoritário, não impediu o
país de funcionar como um ímã. Muitos pensaram que a China iria forjar uma nova
identidade, mais aberta e vibrante, iniciando uma era de novas ideias, valores
e uma inovação cultural, digna do desejado status de superpotência.
Essas expectativas
esperançosas não se cumpriram. Dentro de um espectro amplo, do comércio à
internet, do ensino superior ao cinema, fica explicito um modelo chinês autoritário
para o mundo. O império que renasce é o resultado do exercício de poder esmagador
do Partido Comunista, incluindo a coerção econômica e religiosa, o que anula o
poder de atração da sua cultura e saber.
Embora, das grandes potências
dominantes no Século XIX, só a China surja como um império rejuvenescido, o faz
sob o todo poderoso Partido Comunista dominando um vasto território reunido pelos
governantes manchu da dinastia Qing, obtidos pela rota da guerra e da
diplomacia.
Favorecida pela
Geografia, seu domínio avança com o uso de suas forças armadas para testar o
seu potencial de controle, seja nas fronteiras disputadas, do Mar do Sul da
China até o Himalaia, ou nas campanhas internas que estimulam o nacionalismo. A
dinâmica externa da China, engendra ambições externas.
Na história recente,
os Estados Unidos foram uma luz global para todos aqueles que defendiam valores
como o estado de direito, a liberdade de expressão, a transparência do governo,
o respeito aos direitos civis e os direitos humanos.
Mesmo que as
políticas do governo frequentemente não igualassem esses ideais, o “poder
brando” americano soube ser tão poderoso quanto suas forças armadas. A ascensão
e a forma de atuar da China oferece sombrio contraponto.
Logo, a partir de
2009, o poderio duro do Partido Comunista Chinês, nos âmbitos externo e interno,
atuou com força bruta, suborno e intimidação, de modo cada vez mais forte,
dentro da consolidação do pensamento de Xi Jinping na formação do Partido,
colocando-o ao nível de Mao Tse-tung.
No exterior, a China
estabelece uma política agressiva com a construção de instalações militares em
recifes disputados no Pacífico e invasão de redes cibernéticas. A China
pressiona por uma infraestrutura em forma de cinturão, atravessando a Eurásia.
Mesmo trazendo benefícios aos países envolvidos, ela exerce sua influência
territorial pelo comercio e pela coação.
Nenhum país conhece
melhor a aspereza chinesa do que a Noruega. O país foi retaliado com o
rompimento das relações diplomáticas e comerciais durante os seis anos que se
seguiram a concessão do Nobel da Paz (2010) a Liu Xiaobo defensor da democracia
e preso na China onde morreu.
Ao consolidar suas
fronteiras terrestres, a China começa a voltar-se para o exterior e ao
contrário dos Estados Unidos não vem munida de um ideal missionário voltado às
questões mundiais.
Não é ponto pacífico
que não pretenda difundir sua ideologia e seu sistema de governo”. O que a
impele para o exterior é a necessidade de assegurar energia, metais e minerais
estratégicos a fim de sustentar o padrão de vida em ascensão” (Kaplan, Robert.
2003 p.202).
Para este fim, a
China vem estabelecendo “relações vantajosas de poder tanto em territórios contíguos
quanto em lugares remotos que oferecem uma abundancia desses mesmos recursos de que o país necessita para alimentar o seu crescimento” (Kaplan.
Idem. Ibidem).
Pode-se concluir que
sair de suas fronteiras oficiais está ligado a um interesse nacional vital:
sobrevivência e a expansão econômica o que define o país como hiper-realista. A
busca chinesa põe-se em rota de colisão com países e governos de conotação
direitistas como os Estados Unidos, colidindo também com Índia e Rússia por
suas próprias esferas de influência.
Internamente, o Partido
Comunista detém advogados atuantes dos direitos civis, sufoca a internet,
obriga empresas e universidades a instalarem células do partido, proíbe bíblias
e o exercício da liberdade religiosa, planeja um sistema de Crédito Humano, um inferno
orwelliano, por ser parecido com um
livro de George Orwell, quando as notas dos seus cidadãos se ligarão à obtenção
dos seus empregos, hipotecas e as vagas das escolas de seus filhos. (Tashi
Wangchuk, Times 2015).
Tashi é o tipo de
cidadão que a China desvaloriza mesmo quando trabalha dentro da lei e recomenda
políticas em beneficio das pessoas comuns. Seus projetos de ensino do idioma
tibetano o condenaram. Mesmo, passados dois anos, ele continua detido em Yushu,
sua cidade natal.
A ideia de um
sistema orwelliano aparece pela primeira vez em documento de 2014, invocando
que isto vai melhorar os serviços do Estado, facilitando o aceso aos
financiamentos. O uso está planejado para 2020. A nota do cidadão será a base
de confiabilidade de uma pessoa e a classificação será pública.
A privacidade inexistirá
na China, que se revela como um estado policialesco completo. Nesta segunda década
do Século XXI, a China segue impiedosa nas suas ideias como no tempo de Mao. Ressaltemos
aqui que o progresso moral em política internacional é um projeto norte-americano,
não chinês.