sábado, 31 de julho de 2021

CRÔNICA - Isentão (AG)

 ISENTÃO
Aluísio Gurgel do Amaral Júnior *
 

Na condição de administrador de processos políticos  afinal de contas tenho presidido eleições desde 1994  me impus a disciplina da neutralidade. Muita gente acha que é impossível a neutralidade política, mas asseguro que um bom treinamento interior torna-a alcançável.

Por que escrevo isto? Para afirmar que ao longo destes anos aprendi na prática o que os grandes teóricos da política preconizam: não há um lado que tem razão no jogo político; há consensos e dissensos; há maiorias e minorias; há acertos e interesses, ou o contrário. 

Mas não há quem possa dizer que a razão política (ou a verdade política) está deste ou daquele lado. É um jogo de pouquíssimo ou nenhum conteúdo ético, pelo menos os filósofos que se ocupam da política costumam reclamar disto. Basta ver que a política condenou Sócrates à morte. Deu-lhe a oportunidade de salvar-se abandonando a cidadania ateniense.

 

Mas ele, corajosamente, preferiu a morte e tomou por vontade própria o veneno da condenação. Pois quando morreu Alexandre, o Grande, a política ateniense submeteu seu braço direito, o filósofo Aristóteles, ao mesmíssimo processo que antes havia submetido Sócrates. 

E também condenou Aristóteles à morte. E deu-lhe a oportunidade de salvar-se, desde que abandonasse a cidadania ateniense. Foi então que Aristóteles proferiu a célebre frase: “Eu não vou permitir que Atenas cometa duas vezes o mesmo erro contra a Filosofia!” E abandonou a cidadania ateniense – que então era o bem mais caro a um cidadão. Morreu solitário em Cálcis, na Eubéia, em 333 a.C. 

A política é mesmo assim. Nem é ética, nem é justa, nem é boa… Mas é necessária. Sem ela, viveríamos sob o império da força bruta. E segundo Aristóteles, somos todos animais políticos! Zoom politikon.

quarta-feira, 28 de julho de 2021

ARTIGO - Quem Tem Medo de Virgínia Woolf (RMR)

 QUEM TEM MEDO DE 
VIRGÍNIA WOOLF
Rui Martinho Rodrigues*

 

 

Edward Albee (1928 – 2016) é lembrado, entre outras coisas, por ter contribuído para o que Riccotto Canudo (1877 – 1923) considerava a sétima arte, com “Quem tem medo de Virginia Woolf”. Os diálogos deste filme desnudam o lado humano deplorável, camuflado pelas aparências. Pode-se dizer o mesmo da política dos nossos dias. É a substituição da hipocrisia, tributo que o vício paga à virtude, pelo escárnio ou desprezo pela certidão, segundo palavras da ministra Carmen Lúcia, que hoje parecem esquecidas. 

O debate sobre a apuração de votos em eleições revela aspectos deploráveis. Primeiro por não explicitar que se trata de um procedimento administrativo. Político é o ato do eleitor, que manifesta sua vontade ao votar, merecendo a proteção do segredo. A apuração, como ato administrativo que é, deve seguir o princípio da publicidade dos atos de administração. 

Alega-se, como obstáculo, a despesa necessária para acoplar impressora na urna eletrônica, enquanto se institui um fundo eleitoral de quase seis bilhões de reais. Suspeita-se de um propósito golpista, recusando-se a adotar o procedimento que retiraria o pretexto dos golpistas. 

Invoca-se a inexistência de precedente de fraude, como se a impossibilidade de verificar tal ocorrência fosse prova de sua inexistência. Ocorrem, entre outras coisas, apagões durante a apuração, cujos efeitos sobre a totalização dos votos desperta suspeitas. Nenhum dos lados do debate notou: depois da adoção do voto eletrônico surgiram maiorias inusitadas. Prefeitos e governadores obtiveram até 80% dos votos válidos. 

É inescusável esquecer que Charles A. J. M. de Gaulle (1890 – 1970), no

auge da popularidade, como herói de guerra, obteve pouco mais de 60%; Juan D. Peron (1895 – 1974), voltando do exílio, desfrutando de popularidade inigualável, também teve pouco mais de 60%. Jânio da S. Quadros (1917 – 1992), o furacão eleitoral, não obteve nem 50% dos votos. Getúlio D. Vargas (1882 – 1954) e Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902 – 1976) tiveram pouco mais de 40%. Vitórias com mais de 70% dos votos são comuns sob ditaduras e agora na democracia à brasileira. 

Alguns magistrados dizem que o sistema eleitoral em vigor é invulnerável. Alvíssaras! Conseguimos um feito que o pentágono e a indústria bélica dos EUA não foram capazes de produzir. Mas há divergências. Ministros do STF interromperam constantemente a exposição de um perito que foi falar naquela corte sobre a insegurança da parte eletrônica do sistema eleitoral atual. Tanto empenho dos ministros em dificultar a exposição do perito sugere a pergunta: quem tem medo de Virginia Woolf ou do lobo mau? 

A apuração é feita por um pequeno número de pessoas no TSE. Não cabe invocar o argumento da confiança nos togados. Democracia é o regime da desconfiança. Por isso os poderes são limitados pela competência constitucionalmente definida; mandatos eletivos têm prazo de validade; poderes fiscalizam e limitam uns aos outros. Quem tem medo da publicidade dos atos administrativos? 

A confiança nos togados fica abalada quando ministros de tribunais superiores fazem campanha política. A decisão sobre sistemas eleitorais é decisão política, é competência política. O Ministro Luís Roberto Barroso disse que é preciso fazer alguma coisa para evitar que se repita no Brasil a vitória dos conservadores, como aconteceu na Polônia. Depois retratou-se. A retratação, todavia, não desmente o pensamento, mas apenas revela a inconveniência da sua revelação. A matéria poderá ser judicializada e o ministro militante poderá julgá-la.


ARTIGO - Pequenos Vícios - Jornal O Otimista (TL)


segunda-feira, 26 de julho de 2021

ARTIGO - A Era da Autoestima (RMR)

 A ERA DA AUTOESTIMA
Rui Martinho Rodrigues*

 

 

A periodização histórica expressa com ênfase a importância de alguns fatores. Eric J. E. Hobsbawm (1917 – 2012) assinalou certos aspectos históricos. Os títulos de seus livros, como “A Era do Capital” e “A Era das Revoluções”, sugerem a importância destes fatores. Momentos históricos têm muitos componentes. Examinar um deles não é apresentá-lo como o mais importante do conjunto. O mundo está conflagrado.

A guerra de todos contra todos, de Thomas Hobbes (1588 – 1679), parece real. É enorme a constelação de fatores (metodologia de Maximilian K. E. Weber, 1864 – 1920) envolvidos na exacerbação de ânimos. Examinemos a ênfase dada ao problema da autoestima. 

Tradições culturais, religiosas e filosóficas não estimulavam a autoestima. Alguns críticos consideram a tradição judaico-cristã repressiva. A autoestima seria prejudicada por ela. O homem é declarado mal em gênesis, 8;21, onde lemos que “...a imaginação do coração do homem é má desde a sua meninice...”. 

A carta de Paulo aos romanos, 3;23 diz: “Porque todos pecaram e destituídos estão da gloria de Deus”. Estas palavras não concorrem para inflar o ego, digo, a autoestima. Os críticos esquecem que todas as tradições milenares, das diversas confissões religiosas, têm um código moral incriminador de certas condutas. A falta destes códigos contribui para definir o trato com o sobrenatural como magia, distinguindo-o das religiões. 

A tradição judaico-cristã tem no seu código moral, um dos poucos pontos comuns com as demais tradições confessionais, embora seus aspectos singulares sejam pouco reconhecidos. René Girard (1923 – 2016), assinala a singularidade do cristianismo. A graça que conforta, sem a soberba da autoestima é singular. 

Algumas correntes filosóficas não inflavam a autoestima. Hobbes via no homem o lobo do homem e propunha o Leviatã, domador forte, para conter sua ferocidade. Não temia melindrar a autoestima. A vitimização do transgressor encontra arrimo na autoestima. Há fatores que realmente vitimizam pessoas. 

A superação das desvantagens, porém, exige a percepção lúcida da realidade, resiliência e perseverança. Reconhecer condições desfavoráveis e injustas não se confunde com a estimulação da autoestima. Bastam as garantias democráticas. O homem é guiado por pulsões inconscientes, influenciado pela recompensa, preocupado com a sobrevivência individual e da espécie, ameaçado pelo desamparo. Esta é a visão da Psicanálise, que não descreve uma natureza humana bela. 

A tendência para estimular a autoestima é contemporânea da fragilização do associativismo. Parentesco, grupos de vizinhança e grupos confessionais tornaram-se descartáveis. A secularização e o desencantamento do mundo, ou “desmagificação”, ao desmistificar o sagrado ensejou a banalização de tudo, confirmando as preocupações weberianas. O ego inflado pela autoestima trouxe a intolerância, a hipersensibilidade agressiva e o desprezo pela normatividade social seja ela costumeira ou legal. Aplauso, aprovação e até patrocínio ganharam status de direito exigível contra terceiros. 

A crítica do outro, a liberdade de consciência e de expressão tornaram-se subordinadas a autoestima de alguns, que são “mais iguais”, que podem submeter a autoestima do outro, havido como preconceituoso ou até como fascista. É a fórmula da guerra de todos contra todos. Falta a compreensão humilde das próprias imperfeições. O culto ao próprio ego é um fator antissocial que só convém aos pescadores de águas turvas.

sexta-feira, 23 de julho de 2021

RESENHA - Reunião Virtual da ACLJ (22.07.2021)

 REUNIÃO VIRTUAL DA ACLJ
   (22.07.2021)




PARTICIPANTES

Estiveram reunidos na conferência virtual desta quinta-feira, que teve duração de uma hora e meia, nove acadêmicos. Compareceram ao grupo o Jornalista e Advogado Reginaldo Vasconcelos, o Bacharel em Direito e  Especialista em Comércio Exterior Stênio Pimentel, o Procurador Federal Edmar Ribeiro.

Estiveram presentes também  o Advogado e Sionista Adriano Vasconcelos, o Médico, Professor, Filósofo, Teólogo e Latinista Pedro Araújo, o Poeta Paulo Ximenes, o Físico e Professor Wagner Coelho, o Agrônomo e Pesquisador Luiz Rego, e o Jornalista Wilson Ibiapina.



 TEMA DE ABERTURA

O Presidente Reginaldo Vasconcelos abriu a reunião discorrendo sobre os temas discutidos na primeira reunião presencial de Diretoria da ACLJ do "novo normal", ainda seguindo todos os protocolos sanitários recomendados em razão da pandemia, encontro do qual os acadêmicos residentes fora do Estado se ressentem de não terem podido participar.

Desenvolvendo o mesmo tema, tratou-se sobre a instituição da "Medalha Augusto Borges", a ser outorgada na Assembleia Geral Ordinária da ACLJ de dezembro, destinada aos jornalistas locais que se tenham mantido em profícua atividade  durante estes primeiros anos de pandemia, prestando serviço cultural e social, seja profissional ou amador, em qualquer veículo de imprensa ou mídia eletrônica da Internet.

Dentre os nomes propostos para receber essa comenda, indicado por Luiz Rego, o influenciador digital João Flávio Nogueira, um médico otorrino que comanda uma magnífica página no Facebook denominada "História e Estórias de Fortaleza", na qual ele ilustra comentários sobre o passado da Cidade com fotografias e vídeos antigos, colorizados por computador, visita pessoalmente locais históricos e faz vídeos aéreos da área urbana usando drone.

Por seu turno, Wilson Ibiapina sugeriu para a outorga da Medalha Augusto Borges o nome do agitador cultural Guto Benevides, que se mantém ativo no Facebook e que acaba de lançar um livro sobre os oitos anos em que esteve à frente da nova TV Ceará.  

Também foi abordada a outorga do título de Destaque Cearense, que na mesma oportunidade distinguirá médicos e pesquisadores em medicina cearenses no combate à Covid-19 — além do título Homem do Ano em 2021, que condecorará o cearense que mais brilhou no cenário estadual, nacional ou internacional.
    

OUTROS ASSUNTOS ABORDADOS 

Saindo da rodovia temática em que se palmilham os assuntos administrativos e as pautas sociais da ACLJ, o grupo entrou pela via vicinal dos temas leves, pela informalidade das reminiscências de cada um sobre o rádio e a televisão cearenses, Paulo Ximenes lembrando ter sido o primeiro menino a se apresentar dançando rock and roll em programa infantil do Augusto Borges, na velha TV Ceará. 

Ibiapina lembrou do programa hebdomadário "Sete Dias em Destaque", na mesma TV Ceará, em que João Ramos entregava pequenos troféus em forma de jangada às pessoas que se tivessem notabilizado na sociedade cearense, a cada semana. 

Relembram-se também radialistas mais antigos, como José Limaverde, depois seus filhos Paulo e Narcélio, este último ainda em atividade na Rádio Assembleia. Lembrou-se também do Américo Picanço, que atuou na TV Ceará com Renato Aragão, e do Nazareno Albuquerque, que brilhou na área da comunicação cearense — rádio, televisão, publicidade.

PERFORMANCES LITERÁRIAS

Edmar Ribeiro brindou o grupo com a leitura do poema "Evocação Mariana", de Carlos Drummond de Andrade, enquanto Pedro Araújo leu uma bem-humorada trova que escreveu sobre o flagrante fotográfico em que ele foi registrado na reunião presencial da ACLJ, na noite de terça-feira, abaixo reproduzida:




Reginaldo leu fragmento de crônica sua intitulada "Lixo Santo", do seu livro "O Passado Não Passa" — e exibiu a capa de seu exemplar da mais recente obra de Wilson Ibiapina  — "Histórias de Gente da Gente". Pedro, por sua vez, mostrou o livro de poemas "Doce Mar Selvagem", do Paulo Ximenes, de quem ganhou um exemplar e sobre o qual teceu louvores.  



    DEDICATÓRIA 

A sessão virtual da ACLJ realizada nesta quinta-feira, dia 22 de julho, foi dedicada ao colunista cearense em atividade há quase 70 anos, um recorde mundial, que não constará no Guinness Book porque ele não guardou os comprovantes de sua participação na imprensa nas primeiras décadas da carreira. 

Lúcio Brasileiro, nascido Francisco Newton Quezado Cavalcante, natural da Cidade de Aurora, radicou-se na Capital desde cedo e foi um ícone do colunismo social em Fortaleza, desde a sua juventude, militando em diversos órgãos da imprensa cearense.
 

A primeira homenagem que Lúcio Brasileiro recebeu em comemoração às suas bodas de diamante no jornalismo, ao completar 60 anos ininterruptos de imprensa, lhe foi prestada 
em 2014 pela ACLJ, que lhe outorgou a Comenda Governador Parsifal Barroso, em solenidade realizada no auditório da Fiec.  

Lúcio foi também objeto da primeira entrevista do programa "Um Livro Aberto", produzido pela ACLJ, gravado em fevereiro de 2020 no auditório da Palácio da Luz, dias antes de ser declarado pandemia o surto da Covid-19, que então já grassava em outras latitudes do Planeta.

Embaixo, a vinheta do programa Um Livro Aberto, e mais abaixo o link que dá acesso à integra do programa — que também marca a última participação do acadêmico Augusto Borges em evento da ACLJ, colega e velho amigo do entrevistado,  participando da mesa de entrevistadores. 
  


PROGRAMA UM LIVRO ABERTO



Coincidentemente, na data de hoje, dia seguinte à reunião virtual objeto desta resenha, que foi a ele dedicada, Lúcio Brasileiro, em sua prestigiosa coluna no Jornal O Povo, em seu marcante estilo, fez carinhosa referência à primeira reunião presencial da ACLJ no "novo normal", ocorrida na última terça-feira, dia 20 — nota que abaixo transcrevemos.

Aconteceu, e decididamente aconteceu. Estou me referindo, no caso, ao reencontro, naturalmente presencial, da Academia de Literatura e Jornalismo. 

Aliás, Reginaldo Vasconcelos, conduzindo, ao lado do Presidente Emérito Rui Martinho Rodrigues, reabriu brilhantemente. 

Com justo reconhecimento, ao criar medalha indiscutível, batizada por uma das três legendas radiofônicas, Augusto Borges, partinte recente. 

Todavia, não apenas, pois, com seus companheiros, também estabeleceu, para novembro, apontamento do “Destaque Cearense”. 

E teve mais. Por conta do poeta Paulo Ximenes, mimando os presentes com o seu último “Doce Mar Selvagem”, Alana Alencar, neta de Raimundo Girão, no prefácio.

Valendo-se da oportuna ocasião, anfitriolo Altino Farias proclamava o lançamento do Cardápio Cultural, a partir de agosto, de sua Embaixada da Cachaça, reduto onde noitada transcorreu sobre carreteis. 

Lúcio Brasileiro - Jornal O Povo - Edição de 23.07.2021





   

CARTA AO SENADO - Faça-se a Água - Risco de Tragédia no Jaguaribe (CB)

 Faça-se a Água


Risco de Tragédia
no Jaguaribe





Exmos. Senhores Senadores  

Confesso, enquanto especialista na área de recursos hídricos, tendo editado cinco livros sobre este tema em nossa região e publicado cerca de 300 artigos nesta especialidade, em jornais, revistas técnicas, tendo frequentado três das maiores faculdades de engenharia do nosso país, a Escola Politécnica da Universidade Católica de Pernambuco, a Escola Nacional de Engenharia e a Pontifícia Universidade Católica (Puc), estas duas últimas, do Rio de Janeiro, que estou profundamente decepcionado com os rumos que estão dando a este assunto em nossa região.

Inicialmente, era somente o estado do Ceará, através do seu Secretário de Recursos Hídricos, que pretendia se apossar dos 66 açudes federais construídos pelo Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas) localizados nesta unidade da federação, tendo como objetivo vender a água neles acumuladas através da Cogerh (Companhia de Gestão de Recurso Hídricos do Estado do Ceará) que, segundo constava estava apurando (?) a fabulosa quantia de R$ 480 milhões para cobrir, anualmente, os deficitários cofres estaduais. O próprio Diretor-Geral do Dnocs confirmava esta informação.  

No ano de 2009, que não foi um ano excepcional de chuvas, a exemplo dos anos de 1924, 1974 e 1985, o Açude Castanhão tomou extraordinário volume d’água e quando o nível desta atingiu a cota de alerta, a cota 106 m, todas as 12 comportas já deveriam estar abertas, mas, imprevidente e infelizmente, não estavam. Toda a população do Baixo Jaguaribe (cerca de 300.000 pessoas) ficou ameaçada de uma tragédia.

Os gestores desta obra, na mente de poderem dispor de mais água, deixaram o nível desta atingir a cota máxima, isto é, a cota 106 m, na qual o açude acumulava, naquela situação, 6,7 bilhões de m³, incluindo incorreta e indevidamente neste volume, o que seria disponível (portanto, tecnicamente não utilizável) para o controle de enchentes, ou sejam, 2,3 bilhões de m³. Graças a esta incorreta e inconsequente decisão, correu-se o risco de o nível das águas superarem o cume dos diques (de terra) e, por muito pouco romperem causando uma tragédia no Baixo Jaguaribe, como acima foi dito.

Senhores Senadores, desculpem-me, mas estou cumprindo um dever de cidadania ao lembrar-lhes a possibilidade de repetição daquele perigoso episódio de 2009, com o qual inicio a redação do livro que escrevi, de 362 páginas, intitulado: “A FACE OCULTA DA BARRAGEM DO CASTANHÃO – Em Defesa da Engenharia Nacional”. Tenho acompanhado algumas incursões de Vossas Excelências no campo da Ciência Hidrológica com os quais estou em absoluto desacordo. A grande maioria dos Senhores, por exemplo, certamente nunca viu a capa de um livro de Hidrologia. Não é verdade? Estão mal assessorados. 

Já bastam os cerca de dez ou doze erros grosseiros (e bota “grosseiros” nisto!) que foram cometidos no projeto do Açude Castanhão, objeto do livro, acima referido que escrevi. Para mim, já basta de tanta INCOMPETÊNCIA (com letras maiúsculas) dos responsáveis por esta questão dos recursos hídricos no estado do Ceará. 

Para a absurda decisão de transferir as ações técnicas e científicas na área de recursos hídricos do Dnocs para a Codevasf, eu diria que aquele Departamento Federal atua na região semiárida do Nordeste brasileiro em rios temporários, isto é, em rios intermitentes, enquanto a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) atua em rios perenes, no caso os rios São Francisco e Parnaíba. Portanto, o Dnocs tem expertise de 112 anos numa região problemática do nosso país, densamente povoada, que requer água acumulada em açudes em rios intermitentes e gerenciamento eficaz dos seus recursos hídricos. 

A Codevasf não precisa “fazer água” porque onde ela atua já tem água em abundância. Os rios são perenes. O Dnocs, ao contrário, tem que “fabricar água” e, como disse, em homenagem que recebi na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em comemoração dos 110 anos do Dnocs, que ele é de fato, “o maior fabricante de água em regiões semiáridas do mundo”.  

Infelizmente, no nosso país, os interesses políticos se apresentam mais importantes dos que os técnicos como fatores decisórios de um empreendimento, quando estes deveriam ser amparados cientificamente pelas normas técnicas, legais e jurídicas. De onde se conclui que na atual conjuntura nos meios nordestinos, o Poder Político está acima da Técnica e da Justiça, para a minha tristeza e para a decepção de toda a comunidade técnica/científica de nossa região.   

Atenciosamente,                                                

Engº Cássio Borges 


quarta-feira, 21 de julho de 2021

NOTA ACADÊMICA - Primeira Reunião no "Novo Normal"

 PRIMEIRA REUNIÃO
NO
“NOVO NORMAL”


Na noite desta terça-feira, dia 20, a Diretoria da ACLJ teve a sua primeira reunião presencial desde o início da pandemia da Covid, no chamado “Largo da Poesia”, jardim da Tenda Árabe.

Compareceram o Presidente Reginaldo Vasconcelos, o Presidente Emérito Rui Martinho Rodrigues, o Secretário-Geral Vicente Alencar, o Primeiro-Secretário Altino Farias, o Segundo-Secretário Adriano Jorge, e o Diretor-Tesoureiro Paulo Ximenes.

Também disseram presente o Cônsul Luciano Maia, o Marchand Sávio Queiroz Costa e o Médico Pedro Bezerra de Araújo. 

Na reunião, Luciano Maia exibiu a sua mais recente obra poética de sonetos – “Dunas” – a ser lançada em outubro próximo, da qual levou um exemplar ao Reginaldo, que fará a apresentação do livro no seu lançamento.

Pedro e Altino fizeram performances literárias, com leitura de textos autorais. Paulo Ximenes distribuiu exemplares de seu livro de poemas Doce Mar Selvagem”. 

O embaixador do destilado nacional em Fortaleza, Altino Farias, agraciou Reginaldo com uma garrafa da cachaça “1000 Montes”.

Trata-se de produto mineiro de categoria premium, envelhecido em barris de carvalho americano, padrão exportação – e Altino abriu outra botelha do mesmo rótulo para degustação dos circunstantes. 

O Embaixador Altino também presenteou o Presidente com uma taça de cristal, que foi desenvolvida para o trago elegante da bebida, desenhada para preservar o seu buquê até o nariz e o seu sabor até a boca. 

No concílio inaugural da nova fase foi rememorado o passado e discutido o futuro da ACLJ, e escrutinados os nomes do “Homem do Ano”, dos três “Destaques Cearenses”, e dos quatro recipiendários da “Medalha Augusto Borges” – títulos a serem outorgados em dezembro.

 

No jantar foram servidos aos convivas risotos de camarão e de lagosta.

  

COMENTÁRIO

Como minha primeira reunião na ACLJ, mesmo sem ainda ter tomado posse, fui tomado de muita honra pelos colegas presentes, verdadeiros ícones de nossa Terra da Luz. 

A ambiência estava carregada de vibrações positivas. Podia-se sentir e ver no desenrolar da reunião. O Presidente conduziu bem e todos tiveram espaço dinâmico. 

O anfitrião, confrade Altino, acolheu-nos com muita fidalguia e proporcionou-nos ainda degustação da saborosa 1000 Montes. Deu até pra pensar que “se Jesus tivesse nascido no Ceará, teria usado desta cachaça, ao invés do vinho”. 

Quanto às láureas, ficou claro a acepção de qualquer ideologia e partidarismo político na escolha dos nomes. 

Pedro Araújo

 

 

ARTIGO - O Reino de Cronos (RMR)

 O REINO DE CRONOS
Rui Martinho Rodrigues*

 

Disciplinas humanísticas têm por objeto o significado de atos e fatos (Sociologia compreensiva). Um ciclista atropela um pedestre e o ocorrido foi involuntário para ambos. Temos um fato jurídico (não advindo da vontade), não um ato jurídico (volitivo). Maximilian K. E. Weber (1864 – 1920) diz que o acontecido não tem natureza sociológica. Fato, para Nicolau Maquiavel (1469 – 1527), guarda relação com a fortuna, acaso ou com os fados. 

O Direito trata de condutas. Caso fortuito e força maior, no art. 393 do C. C, isenta de responsabilidade quem não o provocou, diversamente dos atos. O Direito penal só criminaliza condutas. Não tipifica sentimentos, conceitos ou preconceitos. Não trata da pessoa do agente ao tipificar condutas. Hoje falam em “crime de ódio” e “preconceitos”, respectivamente sentimento e forma de cognição prévia ao exame do objeto. A abrangência do Direito penal, que deveria ser a ultima ratio, está sendo perigosamente alargada. Definir sentimentos e extinguir a diferença entre preconceitos e valores agride a liberdade de consciência. Lesiona todas as liberdades. 

A pós-modernidade fortaleceu o relativismo que Karl R. Popper (1902 – 1994), sem aludir aos traços da pós-modernidade, desqualificou como laxista. O perspectivismo também foi revigorado. Os sofistas estão de volta? Alan Sokal (1955 – vivo) e Jean Bricmont (1952 – vivo), na obra “Imposturas intelectuais” certamente não pretendiam dizer isso, mas apresentaram fatos sugestivos desta compreensão. 

Dizer que sempre “temos um lado” tornou-se um mantra repetido sem o cuidado de limitar o seu alcance ao juízo de valor. É desonesto apresentar juízo de realidade conforme o “lado do declarante”. O Absoluto, “do latim, destacado de, desligado de, isto é, livre de toda relação, independente” (Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano), existe sim. Dizer que “se A é maior do que B; e B é maior do que C, então A é maior do que C” é uma proposição incondicionada. A negação generalizada do absoluto é uma contradição nos termos, pois tal declaração seria absoluta. O relativismo cognitivo subjaz ao relativismo ético. 

A modernidade, na interpretação de Weber, tem no “desencantamento” do mundo, que Antônio Flávio Pierucci (1945 – 2012) entende como “desmagificação”, um dos seus aspectos centrais. O dito desencantamento ou naturalização levou a banalização e ao relativismo com ajuda da epistemologia laxista criticado por Popper, rompendo com a modernidade ao modo pós-moderno. A promessa de emancipação tornou sedutor o relativismo por flexibilizar limites éticos. Fortalece o hedonismo e “legitima” o niilismo. A política “desencantada” aderiu com sofreguidão a ideia maquiavélica de que basta aparentar virtude. 

A diacronia (dia = através de + Cronos = personificação do tempo) da política se inspira nos estudos de linguística de Ferdinand de Saussure (1857 – 1913), que tem como objeto a transformação das línguas ao longo do tempo. O filho de Urano e de Gaia é voraz. É preciso conter seu apetite pantagruélico. Por isso, ao lado da linguística, existe a gramática normativa. 

A convivência civilizada precisa de um mínimo de estabilidade. Referências tornadas inteligíveis pela diacronia acelerada geram anomia. Não existindo verdade, nem valores que mereçam acatamento, resta é a força. Oliver Nay (1968 – viva), na obra “História das ideias políticas”, ressalta que a semente da democracia foi plantada quando os gregos decidiram substituir a força pelo diálogo como fundamento de validade na razão. Reconheçamos razão, verdade, valores.

quarta-feira, 14 de julho de 2021

CRÔNICA - O Amor (PN)

 O amor
Pierre Nadie*

 

O sonho não acabou.

Não há lugar para utopias distópicas. 

A fragrância, a doçura, o valor do amor castigam com atroz fúria a promíscua, a ambígua significação, vazia da sua conotação não só principal, todavia, basilar. 

Amor sinonimia doação, dádiva total. Luta no afã da ansiada ajuda, do solidário apoio ao irmão. 

No mundo atual, consumimos paixão, arraigada no íntimo da nossa população individualizada, ludibriada por motivos sofismáticos, à luz dos malsãos princípios  da insana cultura. Amor cultua a vida, açambarca-a qual raiz a vitalizar o coração. 

O amor diviniza a vida. Consolida a paz. Traz harmonia ao coração angustiado. Tranquiliza a alma sofrida.

 

O amor dá ânimo novo, invadindo nosso corpo, conquistando a tão cobiçada coalisão humana, nos atos volitivos, a marcar o bom uso do arbítrio, ao compasso rítmico do diapasão, na marcha rumo ao raiar da manhã jucunda do novo mundo, ambicionado por todos, colimado por almas corajosas, ânimos impávidos. 

A vil trituração do amor, incrustada nos stands publicitários, causa distúrbios na moral, como na conduta da moçada ainda glabra do nosso Brasil. Sinistra ridicularização do mais santo, do mais sagrado, do mais humano grito da vida! 

O amor acalanta júbilo. Dádiva não há maior, quanto participar da glória dos humanos cônscios da sua aspiração comum: paz, justiça, harmonia, amor. 

A raça humana olvida a magnífica missão votada ao apoio ao irmão, instaura a instabilização social, prostituindo inspiração anímica do amor, com aplausos ao aborto incondicional, nas suas várias formas, subjugando-o aos instintos animais, aprisionando-o nas frias, quiçá malditas alcovas. 

Contudo, o amor não mirra, vai brotar. Não gora, vai ficar maduro. Jamais fica sáfaro, vai parir mais amor. 

Unidos, portanto, na conjuntura amical, forjada no cadinho do amor, vamos caminhando para atingir os páramos da comunhão final. Amor para com a família. Para com amigos. Para com amigas. Para com ricos. Para com não ricos. Para com a Nação. Amor para com o Dominador, Criador do mundo todo. 

Assim, pois, só o amor constrói. Nada mais. 

(ex livro traços flutuantes: crônicas médicas, antropossociológicas e literárias. 1986).