domingo, 31 de março de 2013

OAB-CE: A NOSSA INSTITUIÇÃO OCTOGENÁRIA



Clodoaldo Pinto
Aos 07 de janeiro de 1933, designada pelo Instituto dos Advogados, reuniu-se a comissão provisória formada pelos advogados Clodoaldo Pinto, Edgar de Arruda e José Alberto Martins Rodrigues, com o fim de criar a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE).

Celebra, portanto, a nossa OAB os seus 80 anos de existência, permeados de glórias e conquistas mais caras, mantendo viva a memória de enfrentamentos e desafios de movimentos libertários. Aberta e atenta às inovadoras mudanças globais, moderniza-se, acompanhando as novas tecnologias, as transformações sociopolíticas do mundo. Desse modo, mantêm-se as tradições fincadas em raízes profundas, nos direitos individuais, dos quais é paladino o advogado.  

Há de se reconhecer o empenho de todos os servidores desta Seccional, indispensáveis no cumprimento de suas difíceis missões, mercê das transformações sociopolíticas. Nesse estado de coisas, atua com elevado senso de justiça, pautada na isenção, independência e consciência ética de seus membros.

A sua posição permanente é a da defesa da classe, dos direitos humanos, da justiça social e do estado democrático de direito. À advocacia, como profissão livre, é atribuída, estatutariamente, a natureza de serviço público, mas unicamente subordinada à lei, desvinculada de órgãos ou entes da pública administração, vista nas palavras de Rui Barbosa “como um instrumento espontâneo das grandes reivindicações do direito”.

O advogado é indispensável à administração da justiça e protegido contra qualquer violência no exercício de seu mister, como sinaliza o artigo 133 da Lei Maior. No entanto, a imunidade judiciária não é absoluta: as prerrogativas visam à garantia do princípio do contraditório e da ampla defesa, certamente, dentro dos limites da lei.    

Bom seria que as comemorações dos 80 anos da OAB-CE servissem de marco para redobrar o fortalecimento das prerrogativas do advogado. Quão importantes! Pois, corolárias da nobre função, conquanto seu múnus público seja, por vezes, interpretado como privilégios ou benesses.

Em um país a cada dia mais desigual, não é fácil lograr o reconhecimento espontâneo de prerrogativas. A categoria reúne cerca de 17.000 advogados. Naturalmente, a convergência de forças é vital à efetivação desse reconhecimento, colidente – em última análise – com os interesses do próprio cidadão. O conhecido lema da Universidade do Porto, Virtus Unita Fortius Agit, é aplicável por excelência ao caso. Aliás, é auspiciosa a notícia de que a nova diretoria do Conselho Federal criou a Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas.

Valdetário Monteiro
Octogenária, a instituição sobressai pelas inquestionáveis realizações consubstanciadas na gestão do Presidente Valdetário Monteiro,  que foi reconduzido, por mérito, para o triênio 2013/2015. E novos horizontes despontam: o projeto de unificação da OAB, CAACE e FESAC em futura sede, espaço onde todos os advogados terão condições para usufruir um melhor atendimento de seus serviços.

Além do mais, a respeitável octogenária, nesse novo triênio, estenderá a sua política de interiorização de ações, mediante investimentos estruturais, dotando as subseções de sede própria, salas de apoio ao advogado, na grande maioria das comarcas e promovendo a redução da anuidade.

Os homens passam; as instituições permanecem! É de suprema importância que a conjugação da vontade à ação continue a se manifestar, para reger a inerente dinâmica da OAB-CE.

Parabéns insigne octogenária!

Por Paulo Maria de Aragão 
Advogado e professor 
Membro do Conselho Estadual da OAB-Ce
Titular da Cadeira nº 37 da ACLJ 

quinta-feira, 28 de março de 2013

ARTIGO


LEI DOS DOMÉSTICOS – EVOLUÇÃO DA SOCIEDADE

Nos anos 90, morreu uma menina em Fortaleza, no apartamento de uma família onde ela prestava serviços domésticos, na condição de criadinha sertaneja. Constatou-se que o fato tinha contornos monstruosos, pois a jovem sofria maus-tratos e morrera por inanição, à míngua de alimentos, numa  versão real e macabra da Gata Borralheira.  

Indignado com essa ocorrência dantesca, um holandês que residia na cidade, trabalhando em uma ONG humanitária, fez publicar um artigo no jornal O Povo, atribuindo o crime ao hábito dos brasileiros de manterem escrevas até então, trabalhando em suas casas.

Ao ler a matéria reagi incontinenti com uma réplica no mesmo jornal, lamentando o fato horrendo que ocorrera tão perto de nós, como infelizmente acontece no mundo todo vez por outra, mas repudiando a atitude do estrangeiro que se imiscuía na intimidade do nosso povo, pior ainda, atribuindo escravismo aos brasileiros.

Até recentemente, trazer crianças do interior para cumprir tarefas domésticas na cidade era comum em todo o nordeste brasileiro. Diante da aridez da nossa hinterlândia e da pobreza reinante nos sertões, essas pessoas que vinham se incorporar a famílias urbanas eram de fato premiadas pela sorte.

Raramente os criados atingiam o status de filhos adotivos, e sim de afilhados, mas, via de regra, tinham alimentação farta, assistência médica e odontológica quando necessário, que as famílias não queriam alguém doente nas suas cozinhas, ou cuidando das crianças. E no turno da noite esses criados frequentavam os chamados “grupos escolares” que se espalhavam na cidade, de modo que, malgrado muito raramente chegassem ao ensino médio, eram alfabetizados.

Claro que aos olhos de hoje isso não parece o ideal, mas era o que se tinha de melhor naquele contexto sociológico. Minha avó, meus pais e meus tios criaram muitas meninas e meninos que participavam afetuosamente da vida da família, os mais antigos morrendo na velhice já convertidos à condição de parentes, acatadíssimos no afeto das novas gerações que ajudaram a criar e viram crescer.

Muitos saíram para casar com pessoas de seu nível social, não raro recebendo dos padrinhos casas no subúrbio para criar suas famílias. Alguns rapazes serviram ao Exército, obtiveram empregos formais, tornando-se profissionais muito conceituados. No Ceará raramente eram pretos, na sua maioria brancos, caboclos, mamelucos e cafuzos, mas a minha própria ama era uma jovem negra que estudou e que depois se tornou contabilista. 

Uma lei que garante aos empregados domésticos os mesmos direitos jurídicos dos demais trabalhadores acaba de ser aprovada no Congresso, o que é ótimo. Mas isso não significa que os antigos criados fossem escravos das famílias, porque na verdade eram vítimas de uma condição social madrasta, de modo que ser incorporados às famílias de classe média era então um golpe de sorte – desde que não tivessem o azar de cair em mãos criminosas, como aconteceu com a inditosa jovem assassinada.  

Aquele holandês, Franz Van Kranen, que hoje é músico e advogado, entendeu meu enfoque, tornou-se meu amigo e me recebeu em Amsterdã, anos depois.

Por Reginaldo Vasconcelos         

segunda-feira, 25 de março de 2013

INFORME


O Engenheiro Cássio Borges, ex-Diretor Regional do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, o DNOCS, membro honorário da ACLJ, está indignado com a repercussão negativa da invasão do órgão pela Polícia Federal, no último dia 20, que cumpria ordem judicial de busca e apreensão.

Em carta ao Presidente do Centro Industrial do Ceará – CIC, entidade que vai promover em agosto próximo um grande seminário em defesa das instituições regionais, Dr. Cássio presta esclarecimentos sobre aquela ação policial veiculada pela imprensa. Com o mesmo objetivo esclarecedor, reproduzimos abaixo trechos da missiva do confrade.

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Na última quarta feira, dia 20, a sociedade cearense e nordestina tomou conhecimento, através da imprensa escrita e televisada, da invasão teatral do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS, pela Polícia Federal.

Eu e o Dr. Victor Frota, Presidente do Crea-Ce falamos ontem, pessoalmente, com o engenheiro Emerson Fernandes, atual Diretor Geral do DNOCS. Pelo que soubemos esta invasão à sede do DNOCS não tem nada a ver com a atual administração do órgão e, pelo que percebi, tampouco com a anterior.

O que "eles" estavam procurando era documentos referentes à verbas das chamadas “emendas parlamentares”, que são repassadas para as prefeituras, as quais têm sobre si a responsabilidade de fazer as devidas licitações.

Agora, se essas licitações são fraudulentas ou não, ao DNOCS não cabe nenhuma culpa, que na atualidade não tem pessoal nem para se manter em pé. Portanto, o DNOCS não tem nada a ver com aquele lamentável episódio da última quarta-feira.

O DNOCS é apenas uma "caixa de passagem" das referidas verbas dos parlamentares. Como vamos reparar perante a sociedade nordestina e brasileira mais esta imagem negativa do nosso Departamento? Culpa da Justiça, que mandou a Polícia Federal fazer aquela espetacular operação bélica em total desrespeito àquela instituição e aos seus servidores.

Esta é apenas uma satisfação que estou lhe dando em caráter pessoal e particular e, ao mesmo tempo, renovando o convite para que continuemos em frente na defesa do DNOCS. Porém, gostaria de lhe dizer que, na minha ótica, existem forças poderosas trabalhando diuturnamente nos bastidores visando a extinção dessa que é uma da mais antigas instituições federais de nosso País.

domingo, 24 de março de 2013

OFICINA DE REDAÇÃO


A ACLJ promoverá a 1ª Oficina Acadêmica de Redação, nos dias 04, 11, 18 e 25 de maio vindouro, no auditório da ACI, visando orientar estudantes de Fortaleza na prática da dissertação, da narração e da descrição, com vistas às provas do Enem e do exame vestibular. Nas manhãs daqueles quatro sábados do mês se transmitirão técnicas e se debaterão temas da matéria redacional.  

Neste mundo atual da comunicação eletrônica se tem estabelecido um contraponto curioso. Enquanto a oralidade dos aparelhos celulares e o jargão simplificado das mídias sociais da Internet têm facilitado a interação entre as pessoas, em contrapartida têm reduzido o estímulo à produção de texto escrito em bom vernáculo português.

A realidade virtuosa é que todos os concursos públicos, a começar pelo Enem e pelo exame vestibular, exigem dos candidatos redações escorreitas, cursivas, presenciais, para garantir aprovação. Isso leva as boas escolas a incluírem a matéria no seu currículo, e faz com que a juventude brasileira se esforce para aprender a escrever corretamente.

Mas a grande mídia nacional acaba de denunciar falhas gravíssimas na correção das redações do Enem, evidenciando que a grande quantidade de provas em cada concurso e o tempo exíguo para se definirem os resultados estão levando os corretores a simplificar o método de trabalho, deixando passar erros gritantes em provas bem avaliadas.

Esse vergonhoso fato certamente fará o Ministério da Educação recrudescer na correção dos futuros exames, provavelmente aumentando o número de profissionais encarregados, o que vai subir o nível de exigência intelectual dos candidatos doravante.

Diante desse quadro a ACLJ resolveu dar o seu contributo à juventude cearense, promovendo essa primeira oficina de redação que, em obtendo êxito, poderá se tornar uma atividade acadêmica regular. 

sábado, 23 de março de 2013

CRÔNICA


O QUARTO PODER

Nesta semana, o jornal matinal de uma emissora de TV mostrava, em rede nacional, imagens de uma ação policial que ocorrera em favela de alguma das grandes cidades brasileiras, onde ao ser abordado e reagir a tiros, havia sido morto um famigerado bandido que a polícia procurava.
  
As cenas mostravam claramente que, após o confronto com o criminoso, meia dúzia de policiais era atacada por turba numerosa, que investia contra os agentes públicos com violência, estilhaçando a pedradas os vidros das viaturas, indiferente mesmo aos tiros de advertência que um dos policiais disparava para o alto.

Voltando ao estúdio, uma das apresentadoras do noticiário manifestou furiosa indignação contra a polícia, que, segundo ela, se mostrara despreparada para conter o tumulto, a seu juízo agindo de forma truculenta contra a população indefesa. A incongruência de seu texto era tamanha que até parecia que ela falava sobre outro vídeo, e não aquele que a reportagem acabara de exibir, em que a polícia era a vítima.

Ainda na mesma semana assistimos a outra matéria jornalística escandalosa, em que o jurista cearense Jorge Hélio, um dos representantes da advocacia no Conselho Nacional de Justiça, é apontado injustamente como exemplo dos conchavos entre advogados e juízes que pontualmente se verificam no Judiciário brasileiro, segundo acaba de afirmar o Ministro Joaquim Barbosa, Presidente do Supremo Tribunal Federal, e daquele CNJ.

Novamente, na mesma linha do denuncismo desvairado, a mídia nacional investe contra agentes públicos inocentes, acusando-os de improbidade invisível, distorcendo atos institucionais cuja legitimidade é demonstrada pelos fatos. Um colega no Conselho, o juiz Tourinho Neto, pediu a Jorge Hélio que imprimisse especial celeridade ao julgamento de um pleito administrativo de seu interesse familiar, que lhe cabia decidir, e atendendo a esse pedido o Conselheiro julgou rápido – somente isso, nada mais que isso.

O que ocorreu foi um pedido de celeridade no julgamento de um processo administrativo, feita entre colegas do CNJ, e não um conluio processual entre um juiz e um advogado, ao contrário do que a imprensa insinuou, pois ali ambos estão legalmente investidos na condição de pares de um conselho de justiça. Não são o advogado de uma causa judicial e o juiz que a preside, mancomunados pelo sucesso injusto de uma das partes, com mútuos fins pecuniários – e foi apenas a casos assim que Joaquim Barbosa referiu.   

Ora, pedido de pressa dos atos de ofício é comum que os interessados dirijam aos magistrados, formal ou informalmente, conduta perfeitamente idônea e legítima. É dever de todo juiz julgar com a máxima rapidez, imprimindo agilidade aos seus atos, na direção do que a Constituição Federal denomina “duração razoável do processo”, de modo que instá-lo para que cumpra esse múnus com exação não configura ilicitude. A interpretação arbitrária de que subjacente a esse pedido haja pressão por julgamento de mérito favorável é uma ilação sem fundamento, maliciosa e descabida.

A conclusão é de que até o jornalismo brasileiro, ao incorrer em parcialidade tosca e desumana, parece adoecer, juntamente com as instituições espúrias desse País que ele cobre a cada dia, em que o Parlamento aclama monstruosos “bezerros de ouro” para dirigir os destinos legislativos da Nação. Que Deus se apiede de nós!

Por Reginaldo Vasconcelos

quarta-feira, 20 de março de 2013

RESENHA - DIRETO DA REDAÇÃO


 

O Direto da Redação, programa que vai ao ar de segunda a sexta pela TV Cidade, às 8:15h da manhã, apresentado pelos jornalistas e analistas sociais Alfredo Marques e Freitas Júnior, membros da ACLJ, na edição desta quarta-feira, dia 20 de março, tratou dos temas mais atuais e momentosos.

Em entrevista com o Deputado Federal do PT Eudes Xavier, os apresentadores do programa trataram sobre os esforços da bancada nordestina pela revitalização do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca, o secular DNOCS, autarquia federal com sede em Fortaleza que vem sendo injustamente tratada como o patinho feio do serviço público brasileiro.

Segundo Eudes Xavier, o Ministério da Integração Nacional, a que o DNOCS está afeto, tende a esvaziar a instituição, para fortalecer a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, a CODEVASF, com sede no Distrito Federal, para a qual pretende transferir todas as verbas destinadas à transposição do Rio São Francisco.

O DNOCS vem sendo sucateado há alguns anos, desde o Governo Fernando Henrique Cardoso, período em que chegou a ser extinto, ato revertido por pressões da bancada do Nordeste no Parlamento da República. Os postos agrícolas e os perímetros irrigados, que já tiveram ótima produção de alimentos no passado, à jusante das grandes represas que o DNOCS construiu, encontram-se hoje abandonados, à míngua de recursos para a sua manutenção.

O engenheiro Cássio Borges, membro desta ACLJ, é um dos grandes defensores do DNOCS, a que serviu por tanto anos, um verdadeiro Jorge da Capadócia lutando contra o dragão da insensibilidade política e administrativa dos últimos Governos Federais, que não levam em conta a belíssima história desse órgão que tantos serviços têm prestado e ainda pode prestar aos estados brasileiros insertos no polígono das secas, na área dos recursos hídricos, na grande açudagem, na irrigação, na implantação de projetos agronômicos avançados. 

Canais de irrigação abandonados no Perímetro Icó - Lima Campos

terça-feira, 19 de março de 2013

CRÔNICA


SECA: DRAMA SECULAR

Sem medir as palavras e sem qualquer cerimônia, um abastado fazendeiro da região central do estado, influente político, jactava-se de sua prosperidade: “A seca continua sendo o melhor negócio, pois ela sempre me rendeu mais do que a chuva”.
 
Do ponto de vista socioeconômico, vê-se o porquê da inexequibilidade da reforma agrária na região nordestina. As chuvas contrariam o subjugador que explora o incauto sertanejo sob a ótica política e financeira.

Abertura de frentes de serviços, distribuição de alimentos, construção de açudes e outros itens provenientes de recursos públicos são meros paliativos. Muitas vezes, servem mais às propriedades privadas do que às comunidades desassistidas.

Dúvida não há de que já se dispõe das mais sofisticadas tecnologias para pôr termo a esse drama secular. Será que o nordestino, figura nobre, forte e corajosa, nasceu sob a sina do infortúnio, discriminado, vivendo de olhos voltados para o céu a rogar por chuvas? 

Dezenove de março é o dia de São José, o padroeiro do Ceará, véspera do solstício, integrado à cultura popular como data da previsão: não chovendo, a seca é quase certa, e se inicia o quadro de horror: o solo fende-se, a tristeza se espalha, começa a retirada, homens, mulheres e crianças ganham as estradas do “progresso” em busca da sobrevivência.

Parece, no entanto, que o quadro apenas sensibiliza o brasileiro nos versos de tristeza e dor, como os descritos em “Asa Branca”, “Último Pau-de-Arara” e “A Triste Partida”, de Patativa do Assaré. 

As tomadas de tevê e as cenas cinematográficas retratam a desolação de terras queimadas, o pedido de água em volta dos carros-pipa. Os rebanhos morrem de fome. Os que sobrevivem mal movem suas carcaças. O agricultor depõe a enxada de braços e semblante escarnados. São símbolos da miséria e da seca nordestina que não podem ser vistos como coisa do destino.

É inaceitável o perpetuar desse drama, em que se testemunha a perda de plantações, de empregos, de vida; existências destroçadas alcançam o mais baixo grau da indigência humana – vergonha nacional, em virtude da ação criminosa de muitos.

O mais degradante é que tudo se desenvolve sob o pálio de uma constituição que considera primordiais a cidadania e a dignidade e, por ironia, ainda fala na erradicação da pobreza e da marginalidade. Inclusive, cuida de incentivos específicos ao desenvolvimento e à redução das desigualdades nas regiões sujeitas às secas periódicas.

Onde se acha, então, o estado de direito, que deve respeito ao cidadão, sobretudo a obediência aos direitos sociais e coletivos? Não há mais o que se estudar sobre a seca. Trata-se de um fenômeno da natureza, ao qual se deve adequar.

Ao ser humano só não é possível ressuscitar os mortos, transformar a água em vinho e manter a vida sem oxigênio. Há de se reprovar, ao longo do tempo, a incúria e as promessas mal-intencionadas que se fazem ante a boa-fé e a ignorância do povo.


No império Pedro II, e, na República, presidentes visitaram, em tempos de inclemência, o Ceará. 
Prometeram erradicar a tragédia secular mediante a transposição das águas do São Francisco e um programa educativo. Essa iniciativa foi retomada hoje, sem que se chegue a um consenso para sua efetivação.

A seca é e será insolúvel com ações paliativas. O seu problema, como vem sendo tratado, manterá o estágio de pobreza extrema, morrendo pessoas de sede, inanição e epidemias, conquanto os que se dizem humanos se comprazam com a falta de água, benéfica à corrupção e moeda de barganha no processo eleitoral. Manietar os desavisados pelos cordéis da ignorância tem peso considerável e, muitas vezes, é decisivo na escolha da representação popular.

A miséria nordestina não pode ainda ser tratada como questão de caridade pública, pois, com ela, ocorre a perda da identidade, a reificação do homem, que se conforma com um auxílio, como o “bolsa-família”, para se perpetuar na pobreza e na ociosidade.

Desta sorte, ainda ecoa o baião “Vozes da Seca”, composto por Zé Dantas e Luiz Gonzaga, no início da década de 50. Essa obra desnuda a triste realidade dos nossos sertões: “Seu doutô os nordestino têm muita gratidão/ Pelo auxílio dos sulistas nessa seca do sertão./ Mas doutô uma esmola a um homem que é são/ Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”.

Por Paulo Maria de Aragão
Advogado e Professor
Cadeira nº 39 da ACLJ

Em 14.03.13

ARTIGO


segunda-feira, 18 de março de 2013

CRÔNICA



O PAPA DOS POBRES

Que o novo Papa Chico é virtuoso, a gente já percebeu bem claramente. O meu receio agora é de que ele revele um virtuosismo exacerbado. Ele já recusou sentar-se no trono, dispensou os papa-móveis, e anda preferindo a prata ao ouro nos adereços pontifícios.

Pessoalmente ele tem todo o direito de ser coerente com o seu voto de pobreza, mas as tradições vaticanas são multisseculares e são propriedade imaterial de toda a imensa cristandade, que quer pompa e circunstância. Aliás, ele já declarou sonhar com “uma igreja pobre, para os pobres”. Ora, por que não uma igreja rica para os pobres?

Um sacerdote tem função pastoral para com ricos e pobres, para com humildes e poderosos – assim como o médico, que não pode discriminar os pacientes, nem mesmo para distinguir polícia e bandido, ao aplicar a medicina. Quem quer resolver problema socioeconômico deve seguir outras carreiras, não a medicina, tampouco o sacerdócio.  

O fato de ser o Papa dos pobres, que de fato é virtuoso, degenerará totalmente caso ele pretenda investir contra os ricos, na contramão do eloquente ensinamento de Cristo, “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”.

A pobreza não é o mérito dos pobres, nem é necessariamente consequência da riqueza; só se pode reduzir a pobreza enriquecendo os pobres, e não empobrecendo os mais prósperos. Pensar o contrário é querer impor a pax romana, e o Papa tem que defender a paz cristã.

Idealmente, riqueza se produz, e se reproduz; não se transfere ou distribui a fina força. Tudo se resolve, quanticamente, pela mobilidade social, na via meritocrática, pela evolução cultural, pelo empreendedorismo, pelo trabalho. Não aritmeticamente, pelo garrote ideológico.  As teorias em contrário já se exauriram pela experiência.

Enfim, tomara que Francisco I seja mesmo voltado à pobreza – mas não no sentido de a querer reverenciar e manutenir. Tomara que ele seja atencioso com os pobres, mas na perspectiva de que saiam da pobreza. Pobreza é condição negativa eventual, a ser socorrida, a ser revertida, e não uma casta social a ser estimulada e cultuada.

Por Reginaldo Vasconcelos





sábado, 16 de março de 2013

CRÔNICA


UM AMANHÃ INCERTO


Vive-se em um estado de incertezas frente às ameaças de guerra nuclear, com consequências apocalípticas, somadas às agressões desenfreadas ao meio ambiente (queimadas, devastação, poluição, entre outras). O espaço verde é tomado pelo cinza. Contaminam-se os mares, os lagos e os rios.








O único responsável, o homem, polui, desfloresta e desertifica para, em seguida, ter de se curvar ante a resposta da natureza, como vista nos terremotos da costa da Sumatra e no Japão.   

Anteveem-se desastres ecológicos, em face da incessante ação predadora humana. Entrementes, a natureza agredida reage, dando eficácia ao postulado newtoniano da ação e reação.

Apesar de sua pequenez diante da Sabedoria, o homem, dito racional, supõe-se um deus, uma ilha e despreza o viver efetivo e afetivo, em comunhão societária na polis e pela polis, imaginada no pensamento aristotélico. 

A velha ficção científica tornou-se realidade ao prenunciar os atuais riscos da humanidade, com a desintegração do átomo. E Einstein, mais tarde, confirmaria: "A desintegração do átomo transformou tudo, exceto nossa forma de pensar; por isso, caminhamos para uma catástrofe sem paralelo." 


Assim, o inadequado armazenamento dessa forma de energia e os dramas causados pelo seu mau emprego foram subestimados. Nessa toada optou-se – quase que exclusivamente – pela energia nuclear, que apesar dos cuidados na sua manipulação já protagonizou desastres ambientais. Paralelamente, postergaram-se fontes energéticas alternativas oferecidas pela natureza: a solar, eólica, das marés, das quedas d’água. 




As florestas estão sendo dizimadas. A poluição da atmosfera, das águas e a radioatividade são Sinais inexoráveis da ruína: os derradeiros estertores de um mundo corroído, de uma civilização a um só tempo avançada e decadente.

A tecnologia supera os limites da imaginação. Fabrica armas letais para destruir o mundo em minutos. Aviões não tripulados, os drones, matam a milhares de quilômetros de distância tendo por alvo, no momento, os suspeitos de terrorismo. Uma espécie de jogo de videogame que não estressa o matador.

A insensatez predomina, daí a destruição, a violência global. Nesse contexto que parece irreversível, conforta abrir a janela da contemplação do que ainda resta na natureza, apreciando-a como nascente de felicidade: o por do sol na linha do mar; o ouvir e sentir o marulho, enquanto o espumar das ondas esvanece no alvor das areias da praia.

Também enleva e conforta o recôndito da alma, arco Iris, a sinfonia dos pardais, o canto dos sanhaçus, dos bem-te-vis e de pássaros, em extinção, que alegram o alvorecer da metrópole. Entre a massa de concreto e o asfalto, ainda viça o verde, os beija-flores, onde livres gorjeiam e adornam as árvores e os jardins, conformando-se na “selva de pedras” como se vivessem em seus habitats.

Mesmo sem a utilização de armas nucleares, mas devido às agressões múltiplas perpetradas contra a natureza, explorada irracionalmente em seus recursos, a terra nossa corre o perigo de extinção. 

Apesar dos pesares, nesse cenário, os presságios são enfrentados pelos defensores da ecologia, idealistas que lutam por um desenvolvimento sustentável. Louvável trabalho voltado para um mundo melhor, somente atingível com a paz - o céu então ficará mais azul e o planeta terra mais enverdecido pela clorofila.

Por Paulo Maria de Aragão 
Titular da Cadeira de nº 37 da ACLJ



sexta-feira, 15 de março de 2013

RESENHA - DIRETO DA REDAÇÃO




O Direto da Redação, programa que vai ao ar de segunda a sexta pela TV Cidade, às 8:15 da manhã, apresentado pelos jornalistas e analistas sociais Alfredo Marques e Freitas Júnior, membros da ACLJ, na edição desta sexta-feira, dia 15 de março, tratou dos temas mais atuais e momentosos.

João Soares Neto, à esquerda de José Augusto Bezerra,
atual Presidente da ACL
A dupla entrevistou nesta edição o empresário e escritor João Soares Neto, dono do Shopping Benfica, que acaba de ser eleito para a Cadeira de nº 35 da Academia Cearense de Letras, cujo patrono é o inolvidável Thomaz Pompeu de Sousa Brasil Filho, o fundador da entidade.

A posse do novo imortal na ACL foi no último dia 21 de fevereiro, com toda a pompa e circunstância. Na entrevista ao Programa, João Soares falou sobre sua vocação literária e sobre os seus livros mais recentes, demonstrando méritos sobejos para integrar o silogeu secular – o que nem sempre se observa, quando as entidades congêneres se deixam encandear pelo prestígio político de candidatos e não prestigiam a verdadeira verve literária de outros concorrentes.  

quinta-feira, 14 de março de 2013

HABEMUS PAPAM


Deu-se ontem um importante fato histórico, a eleição de um novo Papa, que se seguiu a um acontecimento insólito – a exoneração voluntária do Papa anterior.

Há alguns dias o jornalista Arnaldo Santos reuniu mais três confrades da ACLJ no seu programa Visão Política, na FGF TV, para discutir as causas da renúncia de Bento XVI – o agora Bispo Emérito de Roma, Joseph Ratzinger – e naturalmente especular também sobre a eleição do seu futuro sucessor.


Na oportunidade, os Professores Roberto Martins Rodrigues e Rui Martinho Rodrigues, e este jornalista Reginaldo Vasconcelos, sob a mediação de Arnaldo Santos, tentamos analisar as três grandes teses sobre os motivos da renúncia.


Essas teses são a aposentatória, como verdade pública; a conspiratória, como verdade secreta, em que se liga a morte de João Paulo I ao atentado contra João Paulo II; e, enfim, a verdade prática, que seria a possibilidade de assistir à eleição do sucessor, e nela exercer alguma influência política.

O que se apura de tudo é que essas teses são complementares. De fato o Bispo Ratzinger estava cansado e doente, de fato sofria pressões insuportáveis das muitas facções que há na Cúria, e de fato quis acompanhar em vida os novos destinos da igreja.       

A igreja, na Idade Moderna, tem enfrentado três desafios seculares: no Século XIX, o liberalismo; no Século XX, o comunismo; e, neste século XXI, o relativismo da moral. 

Para os defensores desta última vertente, a chamada “cultura líquida”, a Igreja tem perdido adeptos porque não tem acompanhado a tendência evolutiva mundial, na qual a família se torna fluídica e amorfa, podendo ser mosaica, monoparental e homossexual.

Contudo, Rui Martinho demonstrou que, pelo contrário, a Igreja se tem enfraquecido exatamente por vir abandonando os seus preceitos tradicionais, degradando os seus rituais, desde a abolição do uso do latim até a dispensa da batina, com sacerdotes cada vez mais envolvidos em militância política, em negócios espúrios e em escândalos eróticos.

O Professor Rui fez ver que os fieis católicos têm migrado para profissões de fé muito mais rígidas, como as denominações evangélicas, o ascetismo budista e mesmo a rigorosa religião maometana. Ele nota que as pessoas que têm sede de espiritualidade não se conformam com hipocrisia moral e com regras frouxas.

O Papa eleito, o argentino Jorge Mario Bergoglio, agora Francisco I, se conflitou com o Governo de seu país exatamente porque defendeu posições conservadoras. 

Tudo indica que ele vai recrudescer na direção de uma Igreja mais intransigente com preceitos da moral, visando depurar as instituição dos espíritos mais modernosos, mas atraindo os que procuram pulso forte. 

Entendo que entre todos os sacerdotes católicos, em todos os graus de sua hierarquia, não há nenhum de mediana idoneidade. Para mim, eles todos se dividem em santos e cretinos, em Andrés Camurças e Fernandos Lugos, entre Helderes Câmaras e Severinos Cheregatos, sem nenhum tipo intermediário. 

Pessoas comuns não permanecem retas e castas como exige o sacerdócio, seguindo ritos medievais e professando um credo antigo, a menos que sejam dotadas de altíssima virtude. Por outro lado, pessoas de bem não conseguem permanecer fingindo, cumprindo uma pantomima eclesiástica, pelos confortos e vantagens que a batina proporciona. Esperemos que o Papa Francisco esteja entre os virtuosos.

Por Reginaldo Vasconcelos