NUCIFERACULTURA
Neologia
Necessária
Vianney
Mesquita*
Pouca necessidade de pensar praticam aqueles
que nunca precisam de palavras novas.
Soneto Decassilábico Português
[Rima Encadeada]
BOM
NEOLOGISMO
(V.M.)
De
quando em vez um neo termo aflora,
Corrobora
o potente Dicionário.
Permissionário,
ao luso se incorpora
E
aprimora seu vocabulário.
Não
mercenário, de bom cepo explora,
Monitora
o asserto consectário;
Corolário
de origem, ele perora
Bem se
alcandora ao usual glossário.
Mais
que ordinário, eis por que se alça,
Os
cânones da língua vê e calça,
Sem
que, também, nossos linguistas poupe.
Mesmo
que enroupe a missão que encalça,
Adorna
o Português e o realça,
Ao ir,
fagueiro, enriquecer o VOLP.
Experimento o lance de proferir os comentários
deste artigo, com amparo na sentença epigrafada, de autoria de Arturo Graf,
literato teuto-greco-italiano, procedente de alemães, nascido em Atenas e com
registração de óbito em Turim (19.01.1848 – 31.05.1913).
As anotações dizem respeito a um pequeno busílis,
por mim topado, sempre que se me depara, a fim de revistar, algum escrito
acerca da produção, comercialização, cultivo e movimentação agrícola – e
econômica, principalmente – do coco-da-baía.
Também, vez por outra, sou conduzido a revisar
produções universitárias atinentes a outros componentes palmáceos alimentares,
amanhados como produtos para circulação no mercado, classificados num só gênero,
Coco - catolé, bocaiuva, macaúba,
coco-espinho etc. – com exceção do primeiro, em particular, para natural
sustento alimentar dos animais sem razão, pela ciência chamados de in anima
vili, em contraposição aos de cariz in anima nobili, os seres
racionais, que concertam a espécie humana.
Não custa fazer referência – porquanto é
ensejado – ao fato de que o babaçu, que no Nordeste do Brasil é tomado vulgarmente
como “coco-babaçu”, não é parte do gênero Coco,
mas pertence ao Orbygnia phalerata,
constitutivo de bem econômico de regular monta no âmbito do comércio de
produtos oriundos da atividade rural no País.
Mencionados experimentos acadêmicos, cujos teores
relatoriados são por mim transitados para revista, procedem de programas brasileiros
de pós-graduação em Agricultura, stricto
sensu (com exame extensivo aos outros setores da produção), por exemplo, da Universidade Federal
de Viçosa - MG, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ
(USP-Piracicaba-SP), Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA-Mossoró-RN)
e, nomeadamente, originários dos programas de Economia Rural, Mestrado e
Doutorado, da Universidade Federal do Ceará, Campus do Pici, aqui em Fortaleza, um
dos melhores programas de pós-láurea em curso no Brasil e, com irrestrita
certeza, em todo o Mundo.
O embaraço reside exatamente em determinar um
substantivo para bem retratar, nos relatos experimentais dos meus consulentes, a
atividade agrícola-econômica representada pelo Coco nucifera – Linn. 1757,
uma das dezenas de espécies, da família Arecaceae,
inserta no gênero único de taxinomia do coco, o coco-da-baía, principal
cultivar dessa classificação, estudado em nossas escolas sob o prisma
científico, na conjunção dos vários ramos do disciplinamento parcialmente ordenado
a envolverem seu exame.
Este impedimento não sucede, exempli gratia, com a cultura do café,
à qual, sem qualquer percalço de ordem gramatical, linguística e elocutória, se
concedeu o crédito de cafeicultura,
com o “i” do meio fazendo a ponte com os dois substantivos para
formar o asserto composto, com o escopo de não retratar ideação diferente (café-cultura, estabelecimento onde se toma café e se cultivam temas em
geral, café-livraria), bem assim – e, principalmente - com vistas a obedecer às regras de formação
vocabular da língua portuguesa, cujo trato, por não ser agora propício, não há
de vir à discussão, o que é passível de sobrevir noutra ocasião.
A igual acontece em citricultura, relativamente a cítricos (gênero Citrus, família das rutáceas), plantação, cultura e exploração
econômica, consoante ocorre com laranja e limão. E, assim, com sericicultura – criação do bicho-da-seda
(Bombryx mory), beneficiamento,
industrialização e comercialização da seda; olericultura
– cultivo e acrescentamentos econômicos de legumes; mangiferacultura – plantação, acompanhamento dos cultivares de
manga (Mangica indica); rizicultura ou orizicultura – cultura e economia do arroz (Oriza sativa); e tantas outras ações agroeconômicas de ofício dos
três setores produtivos – primário, secundário e terciário, isto é,
Agricultura, Indústria e Serviços.
O problema não subsistiria, se a unidade
ideativa coco não sugerisse, colada à
sequente, a formação de nomes cacofônicos, ille est, a eventualidade de
cacófato – indicativo de som feio, desagradável, discorde ou com sentido
errado, advindo da articulação de dois termos juntos; e de unidade lexical
obscena, grotesca ou descontextualizada, proveniente da sílaba final de uma dição
à inicial de outra. Isto se dá em decurso de um seu homógrafo imperfeito,
parônimo – cocô (de origem
controversa) – representativo de excremento e, por extensão, algo de má
qualidade.
Desta sorte, convenhamos, são defesas, por
absolutamente descabidas, as referências a cococultura (aqui como a
sugestionar um exame parasitológico de material excrementício) e a cocoicultura,
cujo “i” certa pessoa já sugeriu como ligação, propondo-se a reduzir o efeito da
cacofonia, no entanto (a mim me parece), ideia desprovida de sucesso. No
tentame de aportar a uma solução, outras insinuações vocabulares afloraram,
entretanto, deseixadas de ideação lógica e revéis às normas de formação
glossológica em português, conforme sucede em coquicultura e cocucultura
– esta que me ressoa ainda mais desarrazoada.
Louvado, com efeito, na configuração latina da
denominação taxinômica efetivada pelo célebre e operoso naturalista sueco
Carlos de Lineu (Carl Nilsson Linaeus), em 1757 – Coco nucifera – penso haver encontrado uma proposição verosímil
(também verossível e verissímel), consistente em ajuntar, como primeiro
elemento do hibridismo ora sugerido, o conjunto vocabular nucifera (+ cultura), com esteio
nas razões aduzidas à continuidade.
Impende-me, então, elucidar, considerando, inauguralmente,
o fato de que alguém aventou – e os lexicógrafos, inadvertidamente, aceitaram,
introduzindo o verbete nas obras de referência – a expressão nucicultura, como representativa da
intenção de “cultura de nozes”, todavia procedente apenas das diversas
ocorrências de nogueira, como nos casos de nogueira-americana ou nogueira-pecã
(Carya illynoensis), nogueira-brasileira
ou nogueira-de-iguape (Aleurites
mollucana), nogueira comum (Juglans
regia), nogueira-da-austrália ou
macadâmia (Macadamia ternifolia) et reliqua.
Conquanto, sob o prisma da evolução histórica,
nuci se reporte a nogueira, a inserção definitiva e oficial da terminologia
nucicultura, especificamente para nogueira, nos dicionários, resulta, no mínimo,
apressada, porquanto nuci,
feita um antepositivo, do latim, alcança todo fruto com amêndoa, castanha, noz
e outros, como o são a
castanha-de-caju, fruto do cajueiro (Anacardium
occidentale) – pegada ao pedicelo comestível (caju, que não é fruto), bem
como todas as espécies do gênero Coco (único).
De tal maneira, pelo fato de estar
permanentemente sob registo lexicográfico, é interdito se empregar nucicultura, a não ser para o bem
originário das diversas espécies dessas árvores produtoras de nozes – ficando
de fora coco-da-baía, coco catolé (ou babão, quando não seco), macaúba, macaíba
e quaisquer outras palmáceas.
A sugestão, por conseguinte, é a de se cunhar o
neologismo NUCIFERACULTURA, objetivando
descrever, para emprego nos escritos de matéria investigativa, a plantação, o
cultivo e seus desdobres econômicos – evidentemente com os inerentes nexos
sociais – uma vez que a neologia (por enquanto!) é bem constituída, de nuci – envolvendo todo fruto com
noz – somada a fera, também
latim, elemento pospositivo, representativo de “que traz”, “conduz” – isto é,
feito de nozes.
Malgrado em detrimento das demais espécies do
gênero Coco, as quais praticamente
não possuem representatividade econômica, sendo parcas, por tal pretexto,
referências mais alentadas na literatura da Economia Agrícola, remansa, pois,
como alvitre a conformação neológica NUCIFERACULTURA,
para aplicação, nas Universidades e instituições de demanda científica, em
textos de manifestação do saber parcialmente ordenado relativo a coco-da-baía (Coco nucifera).
Minha expectativa é de que, dentro em poucos
anos, os glossários das ciências ditas aziendais,
ligadas ao ecúmeno rural, incorporem a sugestão, restando, também, a
probabilidade de, em poucos decênios, ou mesmo antes, os dicionários oficiais do
VOLP, circulantes nos nove países lusofônicos**, apropriarem a elocução, ao
jeito como procederam com relação à unidade de ideia nucicultura, devidamente em si consignada em tempo
relativamente curto.
*João
Vianney Campos de Mesquita é Prof. Adjunto IV da Universidade Federal do Ceará.
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa, Academia Brasileira
de Literatura e Jornalismo e Arcádia Nova Palmaciana (fundador). Da Associação
Brasileira de Imprensa e Associação Internacional de Jornalistas (Bruxelas-EU).
Escritor e jornalista.
**
Portugal, Guiné-Bissau, Angola, Cabo Verde, Brasil, Moçambique, Timor Leste,
São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial.