sexta-feira, 30 de março de 2012

NOTA ACADÊMICA - ACLP

Aconteceu nesta quinta-feira, dia 29 de março, no Palácio da Luz, a posse da nova Diretoria da Academia Cearense da Língua Portuguesa, eleita para o biênio 2012-2014.

A composição da nova Diretoria da Academia Cearense da Língua Portuguesa está assim constituída:

Presidente: Vicente Alencar;
1º Vice: Révia Herculano;
2º Vice: Regina Barros Leal;
1º Secretário: José Alves Fernandes;
2º Secretário: Myrson Melo Lima;
1º Tesoureiro: Giselda Medeiros;
2º Tesoureiro: Aíla Sampaio;
Diretor de Comunicação: Ítalo Gurgel.

O 1º Secretário da nova Diretoria da entidade congênere, o Prof. José Alves Fernandes, é também Titular Emérito da Cadeira de nº 39 da ACLJ, que tem como patrono o saudoso publicitário Tarcísio Tavares.

Informa Vicente Alencar

O RATTO E O QUEIJO DE CEM CONTOS Crônica


Tratam-se carinhosamente por Rattos: Ratto Pai, Ratta Mãe, Ratta Filha e Ratto Filho. Rattinho e Rattinha são diminutivos inevitáveis. É assim porque fazem ratices como, por exemplo, abrir parcialmente potes de requeijão sem retirar completamente o lacre, deixar farelos de pão na mesa, ou comer o último pedaço de pudim e guardar a forma vazia na geladeira como se ainda contivesse alguma coisa. Além de todos gostarem de queijos, claro. O “T” dobrado é para diferenciar dos roedores comuns.

Pois bem, naquele dia, Ratto Pai foi ao centro da cidade desbloquear o cartão magnético de sua conta bancária, que, de uma hora para outra, negava-se a realizar saques e depósitos. Restabelecidas a funções do cartão, fez uma retirada de cem reais para atestar que estava tudo certo. A operação foi realizada com sucesso! Na sequencia, aproveitou a viagem e passou num tradicional comércio especializado em queijos da terra, onde comprou uma peça de quilo e meio de coalho, pagando a despesa com a nota de cem, que pouco tempo passou no bolso de sua camisa.

Chegando em casa à noite, fez um balanço dos gastos do dia, dando por falta de certa quantia. Refez as contas, fez de novo. O saldo não fechava com o que deveria ser. Depois de muito pelejar com a calculadora, percebeu que lhe faltava o troco do queijo, algo em torno de setenta e cinco reais. Primeiro ficou chateado com o prejuízo, mas, depois, resolveu curtir a situação.

Assim, quando a Ratta Mãe chegou do trabalho, deparou-se com uma cena inusitada: o Ratto Pai estava sentado solenemente à cabeceira da mesa da sala de jantar, com uma garrafa da melhor cachaça posta à sua frente. Acompanhavam dois pequenos cálices de cristal, talheres finos, azeite de boa qualidade, prato de porcelana onde repousavam cubinhos de queijo e guardanapos de linho. Tudo isso sobre uma delicada toalha e com uma música suave ao fundo.

“Mas quediabeisso, Rattinho?”, quis saber a esposa, curiosa e já rindo da marmota. “Mulher, é precioso muita pompa e circunstância para degustar um queijo coalho de cem contos!”, respondeu ele, explicando em seguida, tim-tim por tim-tim, o que ocorrera naquele dia. Como havia um segundo lugar posto à mesa, ela resolveu lhe fazer companhia naquela ratice, e saborear, também, o tal “queijo de cem contos”. Dizem que estava uma delícia!




Por Altino Farias

quinta-feira, 29 de março de 2012

HOTEL SEIS ESTRELAS – Crônica

Viajar sempre fez a alegria dos meus dias. Em férias pelas ruas do Aracati, ou nos sítios de Tururu, minha infância foi um prazer só. Adolescente, contava os dias para a chegada  do carnaval em Salvador ou da partida do trem rumo à exposição do Crato.

As viagens, no entanto, mudam de significado com o avançar da idade. Quando adulto, o que antes era pura aventura, agora  significa aprendizado. O grande barato fica por conta do ineditismo do lugar visitado. Sua música, gastronomia, história e, enfim, a sua gente.
 
Mas, curioso mesmo é o viajar dos idosos. Com a experiência que acumularam na vida, juntam numa combinação sábia a aventura e o conhecimento a um novo fator agora marcante: a hospedagem. De detalhe do passado, o hotel passa a ser essencial nos planos de viagem da chamada terceira idade.

Talvez por não ter atingido a idade do saber dos idosos, ou, quem sabe, por ainda considerar que o hotel se faz necessário apenas para guardar os pertences, não trago na lembrança os lugares em que me hospedei. Mas como a exceção é que faz a regra, lembro de  um hotel sim-senhor!

Certa vez, chegamos boquinha da noite – eu e amigos de imprensa – no longínquo “reino” do Dr. Eunício Oliveira, Lavras da Mangabeira, para observarmos uma reunião política.

Não tínhamos onde ficar. Procuramos abrigo de porta em porta, como se fossemos reis magos, sem estrela guia, perdidos nos sertões do Cariri. Lá pras tantas, uma santa alma nos acolheu. Fomos alojados nos fundos de seu estabelecimento, sob uma latada de maracujá e na vizinhança de um galo despertador e de suas companheiras.

Redes armadas e atadas a um mourão central do caramanchão, que permitia que a mexida de um se propagasse para os outros, nos deitamos para jogar conversa fora até sermos vencidos pela embriaguez do sono.

Fazia uma noite belíssima naquele verão sertanejo. A luz da lua passava por entre as ramagens do maracujazeiro; o céu era um salpicado de estrelas... Acordamos madrugadinha com o insistente bom dia do senhor galo.

De volta pra casa, o interrogatório de praxe:
- A viagem foi boa?
- Surpreendentemente ótima. Amor, você sabia que em Lavras da Mangabeira tem um hotel de pra mais de cinco estrelas? 

Por Dorian Sampaio Filho  

segunda-feira, 26 de março de 2012

NOTAS ACADÊMICAS

Vicente Alencar
O jornalista Ítalo Gurgel, presidente da Academia Cearense da Língua Portuguesa, dará posse à nova Diretoria eleita, na quinta-feira, dia 29 de março, a partir das 19:30h, no Palácio da Luz, Rua do Rosário, 01, sede da Academia Cearense de Letras. O novo presidente será o jornalista Vicente Alencar.


O jornalista Ossian Lima, que integra a crônica política do Estado do Ceará, editou em Curitiba, no ano passado, através da Estúdio Protexto, uma obra de fôlego, que tem recebido os elogios de todos aqueles que tiveram oportunidade de conhecê-la. Trata-se do LIVRO MUNDIAL DOS PROVÉRBIOS POPULARES, em que, numa exaustiva pesquisa, mostra o cotidiano verbal através do mundo.

O presidente da Academia Cearense de Letras, Pedro Henrique Saraiva Leão, médico e poeta, depois de muito tentar, conseguiu a verba necessária à restauração do quadro de Raimundo Cela, que se encontra no auditório do Palácio da Luz. A tela mostra a emoção causada pela redenção dos escravos, no Ceará, em 1884, quatro anos antes da assinatura da Lei Áurea. É a principal obra do acervo da ACL.



sábado, 24 de março de 2012

CHICO ANYSIO DESCANSOU


Informaram que morreu o Chico Anysio. Ecoou entre a Serra Gaucha e a Ibiapaba, a Serra do Mar e as Alterosas, a Chapada do Araripe e o Pico da Neblina, entre a Mantiqueira e a Serra dos Órgãos, principalmente entre a Serra da Aratanha e a de Maranguape, pelo Maciço de Baturité, um lamento lacrimoso. Chico Anysio morreu!

Ao contrário, penso que Chico Anysio descansou. Ele realizou os doze trabalhos de Hércules ao longo da vida e da carreira, desde a meninice até os 80 anos de idade. Criou e incorporou mais de 200 personagens, completos e distintos, produziu mais uns tantos filhos nos seis casamentos, publicou muitos livros, brilhou no teatro, no rádio, na televisão e no cinema. Estava idoso, doente, encontrara na sua Malga a mulher definitiva. Chico Anysio descansou.

É certo que ele não queria parar, que a família o queria ainda muito, que a Nação queria mais. Mas ele cansara, sofria, estava em paz com a consciência. Chico era uma pessoa comum: mau gestor de finanças, ex-marido caloroso, afetuoso pai, amigo prestimoso. Dava asas à Rede Globo em altos níveis de audiência, a Globo lhe cortava as asas para que não subisse mais que ela. Ele batia na empresa, fazia desabafos. Ela perdoava e abafava.

Mas, como profissional, Chico Anísio era um gênio. Um Miguelangelo, um Leonardo da Vinci, um Van Gogh, um Beethoven, um Mosart, não  mereceriam dele reverência especial. Era um deles, um gênio criativo, na comedida e bastante dimensão. Não apelava para o mau gosto, não transbordava, não sonegava nem excedia. Era gênio por que era, não porque queiramos por bairrismo.

A acadêmica Karla Karenina, que trabalhou com ele na TV, convidou-o para ser Membro Honorário da nossa Academia. Ele concordou, íamos ao Rio lhe entregar o diploma, iam conosco os acadêmicos Djalma Pinto e Cândido Albuquerque. Então seu filho André Lucas nos comunicou que a doença se agravara e ele voltara a se internar, de modo que a nossa homenagem se tornou nuncupativa.
 
Lavivá, Chico Anysio! Antes de te prantear, te agradecemos.

Por Reginaldo Vasconcelos        

sexta-feira, 23 de março de 2012

PORQUE SIM!

Embora de utilização comum no nosso dia-a-dia, a expressão “por que não?”, como resposta a um convite, é de uma descortesia acachapante. Ela externa a absoluta falta de argumentos negativos, mas não representa um argumento positivo válido, indicando apenas que o indivíduo se deixa levar pela proposta, mas com mínimo compromisso.


Why not?
 “Vamos tomar umas?”, pergunta um amigo a outro. “Por que não?”, responde o interlocutor. Ele não exprime a vontade de dividir a mesa com outro, nem o prazer de tomar uma bebida para relaxar, nem tampouco a gostosura de passar horas num tremendo papo furado com a corriola do boteco. Exprime apenas um vazio, uma falta de alternativas, quase uma omissão de interesse.

Ao invés do negativismo entrevisto do “por que não?”, o ideal é seu oposto: o “porque sim!”. Embora não seja habitualmente mencionado expressamente, ele fica subtendido, e sempre se acompanha de fundamentados argumentos. O “porque sim!” é autêntico por natureza, positivo, ativo, contundente.

Então agora chegamos ao ponto. “Vamos formar um grupo e fundar uma nova academia literária no Ceará?”, propôs alguém. “Por que não?”, respondeu outro. Fatalmente esse grupo, partindo dessa postura passiva, não vai conseguir grande sucesso, constituindo mais uma agremiação estéril e sem ideias. Sua duração esta fadada a ser efêmera.

Muito diferente, portanto, de alguém que respondeu: “Vamos, porque sim! Qual o critério que adotaremos para formar o primeiro grupo? Quais atividades culturais e sociais a entidade pretende desenvolver? Como será seu custeio? Quais responsabilidades me cabem como membro efetivo?”. Colocando, cada um, questões que vão sendo objetos de reflexão do grupo todo, chega-se a propostas consensuais que satisfaçam o ideal acadêmico.

Desse modo, na base do “porque sim!”, foi que se concebeu o ideal da nossa Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, com meia dúzia de sonhadores reunidos numa certa “Tenda Árabe”, ora às noites de sexta, ora às tardes de sábado. E é essa postura positiva e participativa que deve nortear o comportamento de todos os membros dessa casa, que em breve completa seu primeiro ano de atividades. Como fundadores, então, a responsabilidade é dobrada.

Vamos todos, pois, ser agentes do “porque sim!”, participando e nos integrando de forma efetiva às atividades da ACLJ, valorizando-a e consolidando seus fundamentos. Fazendo isso, estaremos prestigiando a nós mesmos e prestando um bom serviço à cultura do Estado. Vamos deixar o “por que não?” para aquele cidadão que ia “sem lenço e sem documento”, sem “nada nos bolsos ou nas mãos”, como cantou nos anos 60 o compositor Caetano Veloso.

Por Altino Farias - Secretário-Geral da ACLJ

ÁREA "Q" - Cinema

Estreia em circuito nacional, no próximo mês de maio, uma nova peça cinematográfica, coproduzida por Brasil e Estados Unidos.

História filmada no Ceará, tem como tema de fundo da trama ficcional os fenômenos ufológicos verificados em Quixeramobim e Quixadá.

O filme se chama “Área Q”, o diretor é o carioca Gerson Sanginitto, residente em Los Angeles, e tem como ator principal o americano Isaiah Washington, o magnífico galã negro que se tem destacado em seriados de TV.

Antes de seu lançamento oficial o filme concorrerá no Festival de Cinema Transcendental, em Brasília, de 26 a 29 de março, organizado pela produtora cearense Estação da Luz, especializada em filmes que tratam da fenomenologia espiritualista.


No elenco do filme figura a poetisa e atriz Karla Karenina, titular da Cadeira de nº 24 da ACLJ, cujo Patrono Perpétuo é o insigne Costa Matos. 

Na imagem, a atriz posa com um grupo de acadêmicos, Reginaldo Vasconcelos, Dorian Sampaio, Adriano Jorge, Antonino Carvalho, Arnaldo Santos e Altino Farias. 

Na mesa do Parque Recreio, os acadêmicos prestigiam as marcas de uísque James King e Hilander, da destilaria escocesa Hamish Robertson.

Trata-se da última destilaria escocesa ainda administrada pela família fundadora, que dias antes enviara um representante da Escócia ao Ceará e convidara membros da ACLJ para uma degustação de seus produtos. 

É uma indústria tradicionalíssima, que para manter a qualidade nunca investiu em propaganda. 

quarta-feira, 21 de março de 2012

ADÍSIA SÁ, EM BUSCA DE IRACEMA

Romance de José de Alencar, de 1865, acaba de ganhar releitura, com traços atuais da história do Ceará, no novo livro “Em busca de Iracema”, escrito pela jornalista e professora Adísia Sá, que é membro honorário da ACLJ. A notícia teve  destaque no Jornal O Estado de hoje.

Na obra, que será lançada amanhã (22), um descendente de Iracema e de Martim Soares Moreno refaz o trajeto percorrido pelos ancestrais, ainda nos tempos da colonização do Ceará.

Tudo é ficção, como na publicação de José de Alencar, mas a escritora acrescenta nomes reais de políticos, jornalistas, arquitetos, escritores e mulheres da sociedade. “Se propõe a ser ficção e ao mesmo tempo histórico. Coloco a realidade dentro da ficção e a ficção dentro da realidade”, afirma.

Adísia Sá cria o personagem Moacir, pertencente à 16a geração de Iracema e Martim. O advogado bem sucedido mora no Rio de Janeiro e, depois de ler sobre o Ceará, resolve conhecer a terra dos ancestrais. Em Ipu, ele se casa com Helena, natural da terra.

O caminho até Fortaleza passa por Ibiapaba, Acaraú, Viçosa do Ceará, Camocim, Meruoca, Mundaú, Trairi e Maranguape. A viagem se passa entre os recentes anos de 1960 e 1964 e relembra as origens do Ceará, por meio do diário de Soares Moreno. “Para cada um desses locais, cito um trecho da obra de José de Alencar”.

A narrativa tem a leveza e a objetividade do texto jornalístico, oferecendo entretenimento e aprendizado ao mesmo tempo. O livro é reflexo da sensibilidade pessoal da autora e de seu envolvimento emocional com a gente do Ceará. “Tive a ideia de escrever a obra a partir da leitura dos textos, sobre o assunto, da escritora alemã Ingrid Schwamborn, a quem faço a dedicação”.

Outros motivos que levaram Adísia Sá a reconstituir as trilhas de Iracema são analisados pelo psiquiatra Cleto Pontes, no ensaio “Em busca do eterno retorno”, que complementa a obra, deixando no ar questões inquietantes que cercam o poder da ficção e os enigmas criados pelos jogos do imaginário.

Adísia Sá, além da ficção, escreve sobre filosofia e jornalismo. “Em busca de Iracema” é a 16ª obra e levou menos de um mês para ficar pronta. O livro, com 171 páginas, tem o selo da editora Armazém da Cultura.

domingo, 18 de março de 2012

CHUVA - Crônica

Chuva para o nordestino é dádiva que cai do céu. Hoje, nem tanto... As primeiras chuvas que caíram em Fortaleza me trouxeram lembranças da festa que era o inverno na minha infância.

Lembrei o capinzal que separava a velha Gentilândia do longínquo Jardim América, com seus currais de bois ao redor, cheio de burras e jumentas soltas, para mil e uma serventias.
Lembrei a lagoa na qual fazíamos desfilar barquinhos por nós fabricados com as raízes de madeira leve, tão comuns na redondeza. 
Lembrei o campinho onde batíamos as peladas diárias, para no final da tarde, lama até o pescoço, levarmos as merecidas palmadas maternas.

Inverno era tempo de fartura. Do milho verde vendido de porta em porta e do feijão novinho debulhado em casa. Saudade da brincadeira do triângulo, com seu furo certeiro na areia molhada, e da temporada de bila.

No jogo de bila eu era mestre: destreza e pontaria para acertar o buraco; esperteza para comandar rápido as vantagens de ser o “último a beber”, de pedir “palmo troço, peço tudo e não dou nada”.

Tanto nas disputas do triângulo como no jogo de bila, as apostas eram pagas com a moeda em voga: carteiras de cigarro, dobradas que nem dinheiro. As da fábrica Araken valiam mais por serem mais raras. As de cigarro americano, então, valiam como se dólar verdadeiramente fossem.

Invariavelmente, todas essas pelejas terminavam em burburinho ou confusão. No entanto, nada tão violento que prejudicasse o companheirismo e a amizade reinantes entre a meninada. É daquele tempo a ideia atribuída ao memorável Virgílio Távora de que o inverno era o melhor governador do Ceará. Hoje, a história é outra. A festa virou tragédia...

Os buracos se fizeram crateras que se multiplicaram, enquanto governantes de esferas diversas discutem a responsabilidade para detê-los. O lixo acumulado devido à ação não cidadã de todos nós, concorreu para que o caos se instalasse.

Dorian Sampaio - Cadeira nº 23 da ACLJ

A ENJOADINHA - Crônica


A viagem continuou, apesar das náuseas e vômitos. Cada solavanco da camionete por aquela trilha esburacada produzia nela uma revolução: a vista escurecia, a cabeça doía, o estômago embrulhava, a saliva inundava sua boca. Mal estar? Que nada, ela queria era morrer!

A cada curva, a cada lombada, renovavam-se as esperanças dela de encontrar trecho melhorzinho, mas o que se via eram estradas precárias a ponto de fazer mula empacar e espantalho se assustar.

Nessa época, e já se vão longos anos, a única orientação nas estradas se dava através de mapas nem sempre precisos, por isso o próximo povoado, onde se poderia socorrer a enjoadinha a bordo da Rural, era uma grande interrogação. Voltar, nem pensar. Nem havia para onde. O jeito era seguir em frente, fugindo do anoitecer, quando o que já estava ruim poderia ficar bem pior.

Para completar o quadro de desolação, estava quente, muito quente. Quente ao ponto de confundir as ideias do mais resistente dos super-heróis dos quadrinhos. E a cada lufada de vento quente, subia aquele poeirão. Um suspiro, um gole d’água e... Mais um solavanco. Nem recostar a cabeça podia a coitada. Quando conseguia falar dizia somente: “Ainda tá longe, papai?”. Dava era pena de responder.

Chegaram ao próximo lugarejo já à noitinha. Procuraram uma estalagem para passar a noite, porém, sem sucesso. Findaram por dormir de favor numa casa de família, todos apinhados na sala.

No ambiente reinava um cheiro forte de urina e fezes de animal, pernilongos em profusão e mais alguma coisa que incomodava, provocando coceira e vermelhidão na pele. Eram pulgas, descobriu-se depois.


Um barulho vindo de um clube, bar, cabaré ou coisa semelhante, incomodou até tarde. Naquela noite ninguém dormiu, além da nossa doce enjoadinha, que, enfim, pode ter um descanso merecido de tanta chacoalhada.



Logo cedo, o chefe da família cutucou todo mundo e pegou a estrada novamente. Queria ir embora daquele lugar pulguento, onde não arriscara nem tomar a água. Ainda bem que o pior passara no dia anterior. Graças!


Com a aproximação da cidade destino, grande centro urbano, as estradas melhoraram substancialmente, e a camionete agora deslizava de modo suave sobre um pavimento mais regular, que permitia ao veículo desenvolver maior velocidade ainda, com conforto considerável. E nossa menininha, antes tão enjoadinha, agora sorria e brincava com os irmãos sob o olhar atento da mãe. Distraída, nem perguntava mais: “Ainda tá longe, papai?”

Altino Farias - Cadeira nº 16 da ACLJ 

sexta-feira, 16 de março de 2012

FORTALEZA - DESRESPEITO À MEMÓRIA ARQUITETÔNICA

Velho cartão postal da cidade, com o Castelo do Plácido
No início dos anos 70, Fortaleza ainda não tinha shoping Center nem centro de convenções. Foi  quando fizemos um projeto para utilizar o prédio abandonado do Castelo do Plácido, na Av. Santos Dumont, para ali promover uma grande festa no Dia das Crianças. 

A ideia era celebrar uma locação com os proprietários, cercar a área de tapumes, pintar de róseo o velho castelo, dotá-lo de iluminação feérica, montar um parque infantil em seu entorno, colocar bonecos do Walt Disney interagindo com as pessoas. Procuramos a TV Verdes Mares, recém inaugurada, para dividir a promoção em parceria, como era comum acontecer naquela época.

Fomos recebidos pelo jornalista Sabino Henrique, então editor local do Jornal Nacional e responsável pelo setor de eventos da emissora. Apresentamos o nosso projeto, que ao final foi indeferido porque concluíram que o edifício poderia ruir sobre as crianças. 

Pouco tempo depois um grupo empresarial que adquiriu o prédio para naquele espaço construir um supermercado o demoliu, e as picaretas hidráulicas sofreram muito para remover cada tijolo, ficando então patente que a construção era segura, absolutamente sólida, edificada para ficar de pé por muitos séculos.

Talvez, se tivessem os homens da área de eventos daquela época topado a empreitada, apoiando o nosso ousado projeto, a festa da criança no Castelo do Plácido teria sido um sucesso e teria entrado para o calendário anual desta cidade.

Castelo da Disney
Tornado equipamento útil à sociedade e rentável para os proprietários, possivelmente não tivesse sido o castelo vendido e demolido, já que somente a importância estética e histórica não é suficiente para proteger o patrimônio arquitetônico brasileiro. Empresários sem cultura humanística querem lucros a qualquer custo e os políticos, mais ignaros ainda, querem votos, ambições que para eles são prioritárias ante os valores culturais.

Descaso e perigo
Agora é o prédio histórico da antiga Casa Paroquial de Fortaleza, onde até recentemente funcionou a Escola Nossa Senhora Aparecida, na esquina da Av. Santos Dumont com a Rua Coronel Ferraz, que ameaça ruir sobre as pessoas e automóveis que circulam por lá, sem que ninguém se incomode com isso e sem que as autoridades se abalancem para evitar que desmorone.

Amarrações precárias
Segundo informa a administração do Colégio da Imaculada Conceição, que lhe fica próximo, o prédio pertence ao clero local, mas não se sabe se foi tombado pelo competente setor do Poder Público, nem qual seria a causa de seu estado de abandono. Inclusive, segundo se diz, ali teria sido alfabetizado o ex-presidente Humberto de Alencar Castelo Branco – dado que, em qualquer país sério, já seria suficiente para consagrar uma relíquia histórica do patrimônio nacional.  

Se o prédio tiver “sofrido” o tombamento, neste nosso país de contradições, pode vir daí sua maior desgraça, tendo em vista que, porquanto essa providência administrativa teoricamente vise proteger o patrimônio arquitetônico, termina por proibir que se promova, com a necessária rapidez, a sua restauração conservadora, antes de se vencer uma burocracia monstruosa.
  
Cine São Luiz
Por exemplo, o arquiteto Fausto Nilo, por encomenda dos antigos proprietários, concebeu um magnífico projeto para revitalizar (e salvar) o Edifício São Luiz, na Praça do Ferreira, onde funcionou por muitos anos a nossa maior e mais bela sala de cinema, mas seu trabalho não pode mais ser aproveitado pelo Governo do Estado, que adquiriu recentemente o imóvel, porque após a elaboração do projeto do Fausto o prédio foi tombado pelo Patrimônio Histórico.

Paredes pichadas
Outro descalabro crônico com o patrimônio da cidade vem se arrastando há anos, com o   naipe situado na área da chamada Praça dos Leões, que além do próprio largo General Tibúrcio envolve o prédio do Museu Histórico, onde funcionou a Assembleia Legislativa, a Igreja do Rosário, e o Palácio da Luz, antiga sede do Governo do Estado, que hoje abriga a Academia Cearense de Letras, além de outras confrarias literárias.
Lâmpadas furtadas

Não há quem proteja aquele logradouro do vandalismo desvairado, paraíso dos vagabundos, dos drogados, dos pichadores, dos mutiladores de estátuas e dos ladrões de lâmpadas da iluminação pública e dos refletores das fachadas.

Diante disso, apelemos ao Governador do Estado, à Prefeitura, ao Iphan, ao Ministério Público, ao Arcebispado, às famílias a que hipoteticamente pertencem imóveis desses, aos magistrados que porventura presidam demandas cíveis envolvendo tais prédios, enfim, a quem de qualquer maneira possa intervir, transigir, ou agilitar providências, para proteger e preservar a memória física da cidade.

Postado por Reginaldo Vasconcelos

quinta-feira, 15 de março de 2012

RICARDO BACELAR É EMPOSSADO NA ACR

Ricardo Bacelar e Damasceno Sampaio
O secretário adjunto e corregedor geral da Secional Ceará da Ordem dos Advogados do Brasil, Ricardo Bacelar, ocupará a cadeira de número 14 da Academia Cearense de Retórica, durante solenidade de tomada de posse que acontecerá nesta quinta-feira, a partir das 19:30h, na sede da Academia Cearense de Letras.

Ocupará a cadeira que tem como patrono o jornalista e político João Brígido, um dos maiores historiadores do Ceará, nascido no século XIX. O lugar foi ocupado anteriormente por José Milton Gaspar Brígido.

Presidida por Maurício Benevides, a Academia Cearense de Retórica foi fundada em 1979, por iniciativa do escritor Itamar Espíndola, seguindo o perfil tradicional concebido pela Academia Francesa.

Ricardo Bacelar é membro do Conselho Estadual de Cultura do Estado do Ceará e do Conselho de Políticas Públicas de Cultura de Fortaleza, e vice-presidente da Academia Cearense de Letras Jurídicas.

A Academia Cearense de Letras Jurídicas foi fundada em 28 de setembro de 2011. No passado, a ínclita jurista Wanda Othon Sidou reuniu uma gama de juristas para iniciação deste sodalício, entretanto, a ideia não prosperou. A Academia não foi registrada, e teve apenas duas ou três reuniões. No ano passado a ACLJUR finalmente foi instalada, sob a presidência do advogado José Damasceno Sampaio.

domingo, 11 de março de 2012

IMPRENSA DISCUTE CENSURA A DICIONÁRIO


O programa Visão Política, do confrade Arnaldo Santos, que vai ao ar pela FGF TV, Canal Universitário 14 da Net, na edição da semana passada, entre outros temas candentes, repercutiu a notícia nacional sobre a censura presentemente imposta pela Justiça ao Dicionário Houaiss, quanto à acepção atribuída por ele a certo verbete designativo de uma raça.

Entendeu o Ministério Público Federal que o léxico incorre em preconceito contra a etnia nômade, ao registrar o termo “cigano” como sinônimo de usurário, trapaceiro, burlador, embora ressalvando que esses significados não são literais, já que têm conotação pejorativa.

A questão é muito sensível, pois a medida de recolher livros e proibir a sua venda cheira a censura, embora envolta no enjoativo incenso modernoso do corretismo social. Um dicionário tem que registrar os usos que as palavras têm de fato, sem obrigação de analisar se tais usos são corretos ou injustos. Aliás, todos os bons dicionários de português dão ao substantivo “cigano” o conceito paralelo de negociante espertalhão, porque assim entende o mundo.

Ciganos têm orgulho de ser ciganos, e têm amor à sua tradição cultural, na qual se inserem a quiromancia, a  vida itinerante, a vocação para os negócios. Como se sabe, a esperteza é inerente ao comerciante hábil, que atribui maior qualidade àquilo que vende, enquanto deprecia aquilo que compra, para conseguir preços melhores – mesma característica que os judeus também ostentam.

No mais, deve-se ao nomadismo a ideia de que os ciganos sejam corsos, assim como os circenses, tradicionalmente acusados de raptar crianças e aliciar jovens das comunidades visitadas. Esse é um fenômeno sociológico histórico que um decreto judicial jamais poderá modificar.

De todo modo, talvez se pudesse recomendar enriquecer o verbete com uma melhor ressalva sobre as razões da antiga discriminação verbal, para não a propagar para as futuras gerações – mas jamais o exagero de negar a história, proibir edições e fazer “faxinas” lexicográficas.

Mais grave ainda foi a tentativa recente de censurar obra de Monteiro Lobato, por parte do Governo Federal, em virtude dos impropérios racistas contra a personagem Tia Nastácia, lançados pela boneca Emília, um tipo doidivanas de ante-heroína que nunca diz coisa com coisa.

Nesse caso, a grande insensatez da censura a Lobato reside no fato de que a intenção dele era exatamente criticar o racismo, num tempo em que os negros eram muito mal avaliados. Ele não podia fazer isso colocando uma negra culta e rica no Brasil rural de então, porque soaria falso, mas dotando a cozinheira negra do sítio de grande dignidade humana, sabedoria inata, inteligência emocional. E ele fez isso. A idiota boneca de pano, que a própria Nastácia confeccionou, é o seu antípoda moral.

sexta-feira, 2 de março de 2012

MARCIANO LOPES SOFRE PEQUENO ACIDENTE

Ontem, 1º de março, o jornalista veterano, antiquário e famoso escritor memorialista cearense Marciano Lopes passou mal e caiu na via pública, em avenida da Aldeota, ferindo a cabeça sem maior gravidade.

Por sorte o ferimento foi superficial, pois a chamada “queda da própria altura” é uma das causas mais freqüência de lesões graves em pessoas idosas – e o nosso Marciano declarou aos socorristas que já atingiu os 90 anos.

Esse número pode não se confirmar, pois no momento da anamnésia o jornalista ainda estava desorientado. Todavia, Marciano Lopes tem realmente idade muito avançada, de modo que se torna arriscado para ele andar sozinho pela cidade.

Uma equipe do SAMU, chamada por funcionários da revenda de automóveis usados do Grupo Ventura, que socorreram o jornalista, chegou muito rápido ao local, e prestou um atendimento exemplar ao autor de Royal Briard.

Louve-se o atendimento prestimoso e competente do médico Denis Colares, chefe da equipe, que aplicou os primeiros socorros, checou a pressão arterial e a glicemia do paciente, examinou o ferimento e convocou a ambulância, a qual também não demorou.

A foto que registra a ocorrência está propositadamente desfocada, em respeito ao Marciano, que sempre foi avesso a divulgar sua imagem, mesmo por ocasião dos concorridos lançamentos de seus livros de memórias. A ACLJ faz votos de pronta recuperação e de vida longa ao insigne jornalista.

quinta-feira, 1 de março de 2012

SESSÃO DA SAUDADE PARA IVONETE MAIA

Hino Nacional

Cumprindo a tradição acadêmica, realizou-se neste último 29 de fevereiro, no auditório da ACI, a Sessão da Saudade em memória de Ivonete Maia, falecida no dia 14 de fevereiro passado, titular da Cadeira de nº 2 da ACLJ, cujo Patrono é o insigne Perboyre e Silva. O mestre de cerimônia foi o jornalista Fernando Dantas, Membro Efetivo Titular da Academia.


Acadêmicos com a família
de Perboyre e Silva
Familiares e amigos da acadêmica falecida, bem como do patrono de sua cadeira, compareceram à solenidade, prestigiada pelos confrades que com ela tinham mais afinidade.



Mesa diretiva
A mesa diretiva foi composta pelo Presidente Rui Martinho Rodrigues, o Secretário da Cultura, representando S.Exa. o Governador do Estado, a presidente em exercício da ACI, Emília Augusta, a Professora Adísia Sá e o jornalista Vicente Alencar, presidente eleito da Academia Cearense da Língua Portuguesa.

Fala de Vicente Alencar


Fala de Djalma Pinto
Usaram da palavra Vicente Alencar, representando as demais academias literárias cearenses, os acadêmicos Djalma Pinto e Reginaldo Vasconcelos, e por fim a Professora Adísia Sá, maior amiga de Ivonete Maia. 
Fala de Reginaldo Vasconcelos

Fala de Adísia Sá
Ao final, cumprindo norma regimental, o Presidente da ACLJ declarou vaga a Cadeira de nº 2 da entidade, para que a partir de então se inicie o processo de eleição de um novo acadêmico para essa titularidade.

Banda Militar
A solenidade teve início com a primorosa função da Banda de Música do Corpo de Bombeiros Militar, e foi encerrada com  homenagem póstuma musical do coral Vozes de Outono, composto por senhoras, sob a regência do Maestro Poty, que é Membro Honorário da ACLJ.


Coral Vozes de Outono

Final da Solenidade