OS
FINS E OS MEIOS
Rui Martinho Rodrigues*
A corrupção tem apresentado como defesa o ataque. Quem
acusa é direitista, moralista, ingênuo. A negativa de autoria fica em segundo
plano porque carece de plausibilidade. “Rouba mas faz política social”, “a
política sempre foi assim”, são argumentos em forma de confissão. A hipocrisia
deu lugar ao cinismo. Dizer que os fins justificam os meios é uma destas
confissões, advinda da chamada ética finalista (teleológica, em “filosofês”) e
da ética situacional. Estas fazem parte das ideologias messiânicas, presentes
no grupo político dominante.
Há quem confunda ética situacional com a ética da
responsabilidade. É um erro. A ética situacional é relativismo deontológico,
apoiada no mito do contexto. Tanto quanto a ética teleológica, acaba derivando
para o oportunismo puro e simples. A ética da responsabilidade não condiciona
valores a situações. Ela reconhece uma hierarquia de valores e, quando se
constate uma colisão entre eles, sacrifica o de menor hierarquia. Assim, os
valores são sempre reconhecidos com um dado peso ou posição na hierarquia, sem
acomodações de ocasião, independentemente de qualquer situação. Nas situações
apenas temos o encontro de valores de peso desigual.
Na política os maiores valores são principalmente o bem-estar social, a
segurança jurídica, a liberdade. A atual corrupção endêmica atende a
alguma finalidade excelsa? Saquear os cofres públicos, corromper parlamentares
e amealhar o “troco” de alguns milhões atende algum interesse superior? Não.
Corrompidos os parlamentares, tendo-os submetidos a peso de ouro, não se fez a
reforma política; não se fez a reforma tributária; não se fez a reforma
previdenciária; não se fez a reforma trabalhista; não se fez nada. Não se fez e nem sequer foi tentado.
Qual foi a finalidade de tanta corrupção? A manutenção e
expansão do poder e o enriquecimento pessoal. Só se fez multiplicar a dívida
pública, sucatear o setor elétrico, trazer de volta a inflação, prejudicar a
PETROBRAS, produzir déficit público. Os serviços públicos e a infraestrutura
logística continuaram sucateados. Até a pobreza e a desigualdade social
voltaram a crescer.
A corrupção “bem intencionada” é como o esquadrão da morte
“bem intencionado” ou a tortura “bem intencionada”. Começa escudada em
finalidades virtuosas, mas termina sempre no crime vulgar.
Quando o corrupto se apropriava do dinheiro público e o
aplicava aqui mesmo, escolhendo os setores mais dinâmicos, impulsionava a
economia. O problema era mais de natureza moral do que natureza econômica ou
social. Hoje o corrupto já recebe a propina no exterior. A nossa economia é
subtraída daquela importância. O problema, além do aspecto moral, é também de
natureza econômica e social. Já não se pode falar em “moralismo”. Há um fator
econômico indutor de sérias consequências sociais.
Tem mais: a corrupção de outrora visava apenas o
enriquecimento. Hoje acrescentaram o atentado às instituições democráticas,
pela corrupção do aparelho do Estado. Ganhar eleições foi uma das finalidades, que foi bem sucedida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário