quinta-feira, 30 de novembro de 2017

NOTA LITERÁRIA - Cássio Borges Relança Livro


CÁSSIO BORGES
RELANÇA
OBRA CIENTÍFICA


O Engenheiro e Jornalista Cássio Borges lançou, na noite desta terça-feira (28 de novembro), no Salão Nobre do Náutico Atlético Cearense, a 2ª Edição, revisada e ampliada, do seu livro “A Face Oculta da Barragem do Castanhão – Em defesa da Engenharia Nacional – Um Relato Atualizado para a História.

Cássio é um dos maiores especialistas em Recursos Hídricos no Brasil, Membro Titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo (ACLJ) e da Academia Cearense de Engenharia, da qual é fundador, ex-diretor do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS).



A obra tem nas abas comentário do Prof. Paulo Affonso Leme Machado, da UNESP – IB, de Rio Claro (em São Paulo), prefácio do Prof. Jorge Staico, da Universidade Federal de Juiz de Fora (Minas Gerais), e apresentação do Jornalista e Advogado Reginaldo Vasconcelos, Presidente  da ACLJ, que também se manifestou durante a solenidade do lançamento.




A noite de autógrafos, cujo cerimonial foi conduzido pelo radialista Vicente Alencar, Secretário-Geral da ACLJ, foi prestigiada por um público de jornalistas e engenheiros, cientistas especializados em hidrografia, parentes e ex-colegas de trabalho do autor.


 
A Mesa de Honra foi composta por Alberto Farias (empresário e escritor), Vitor Frota Pinto (Presidente do CREA e da Academia Cearense de Engenharia), Roberto Otto (Diretor do DNOCS), Cássio Borges, Reginaldo Vasconcelos e Ésio de Sousa (Agrônomo, Escritor, ex-superintendente da SUDENE, sócio do Instituto do Ceara – Histórico, Geográfico e Antropológico).





A ACLJ esteve representada no evento pelo próprio autor da obra, Cássio Borges; por seu filho, Marcos André; pelo Mestre de Cerimônia, Vicente Alencar; pelo apresentador do livro, Reginaldo Vasconcelos; e pelos Membros Titulares Fundadores Adriano Jorge, Nirez, Hermann Hesse e Paulo César Norões.

A solenidade foi embalada a boa música, com a arte dos músicos Ribamar Freire e Alves Nascimento, e se seguiu a um lauto coquetel. 




A solenidade teve cobertura da TV Diário e da coluna virtual Balada In, do Jornalista Pompeu Vasconcelos, cujas imagens, a cargo do fotógrafo Rogério Lima, ilustram esta matéria.



DISCURSO DE APRESENTAÇÃO

Eu não tenho suficiente erudição científica na área da engenharia, da hidrografia, da açudagem, para comentar o livro de Cássio Borges, do qual fiz uma introdução, mas tenho bastante ciência do grande descortino do autor, de modo que posso fazer o que em Direito se denomina “testemunho de caráter”.

Dr. Cássio, jornalista desde a juventude e engenheiro a vida  toda, nosso confrade na Academia de Jornalismo e integrante da Academia de Engenharia, do alto dos seus 84 anos, dedicou sua existência ao estudo da matéria, e empregou os seus grandes dotes intelectuais ao escrutínio das mais variadas soluções técnicas para a gestão dos recursos hídricos.

Aliás, essa é uma preocupação humana que remonta à pré-história, passando pela Roma Antiga, com os seus famosos aquedutos, e pelos diques e reservatórios egípcios, ao longo do extenso Rio Nilo. E essas preocupações são mais agudas agora, em face do aquecimento global e do crescimento demográfico.

Mas as questões hídricas, embora tratem com as ciências exatas, envolvem variáveis climáticas, geológicas, meteorológicas, agrológicas, e até antropológicas, pois podem produzir dramas sociais e humanos, como a inundação de cidades e a remoção obrigatória de grupos étnicos ou populações tradicionais.

Que traumas culturais e humanos podem resultar da submersão de grandes geografias, dissolvendo na enxurrada quilômetros de História e de memórias e de afetos que sobre elas se fundaram? Propriedades queridas, bens de família, casas da infância, igrejas, cemitérios, prédios históricos...

Mais do que isso, até estudos sismológicos podem ser necessários antes de se manipular mananciais hídricos. O peso da água da imensa represa chinesa das Três Gargantas, por exemplo, tem feito pressão sobre placas tectônicas e provocado risco de terremotos na região, enquanto a parede do Açude Castanhão tem sido objeto de preocupações relacionadas a pequenos tremores de terra que são comuns naquela área.

Por isso, embora os cálculos físicos sobre os dados topográficos e geodésicos possam ser apodíticos e incontroversos, porque são fáticos e matemáticos, o regime de chuvas, a qualidade agrícola das terras a serem alegadas, os custos financeiros das obras, os danos ambientais a serem suportados, tudo isso é objeto dos questionamentos de Cássio, contra o determinismo da vontade política sobre o local escolhido para a construção do Castanhão, movida por vaidades técnicas e por inconfessáveis interesses.

Então, meu caro Dr. Cássio, sua luta, ainda que em relação à sua engenharia seja inócua, porque factum atque transactum est, e o que está feito não se pode desfazer, não será inútil para o jornalista que você é, pois a sua obra reinará sobre os fatos, repreendendo erros e prevenindo equívocos futuros que os vícios antigos pudessem vir a provocar.

Reginaldo Vasconcelos
   
        

CRÔNICA - O Cearense e Dorothy Lamour (WI)


O CEARENSE E
DOROTHY LAMOUR
Wilson Ibiapina*


Dorothy Lamour / Com amor te matei / Sereia/ Na areia do cinema. Dorothy Lamour / Com ardor te adorei / No drama da primeira fila”. É asim que começa o poema de Fausto Nilo, depois musicado por Petrúcio Maia.

Naquele tempo, todos os jovens eram apaixonados pela artista norte-americana, nascida em Louisiana. Ela foi Miss Nova Orleans de 1931 e sonhava em ser cantora. Virou atriz aos 22 anos. Começou a fazer sucesso quando apareceu nas telas em trajes mínimos e sensuais, no papel de uma garota das selvas, num filme ao estilo de Tarzan.

O papel de Ulah tornou-a a atriz mais cobiçada, sex-symbol do cinema americano. Virou diva. Foi assim que ela chegou às telas de Fortaleza. Aparecia com pouca roupa, despertando a fantasia e o desejo dos adolescentes.

Participou de mais de 60 filmes. Atuou até 1987, quando fez seu último filme para o cinema. Ela virou um mito na literatura e na poesia. Rachel de Queiroz, num conto, apresenta a atriz como ideal de beleza no imaginário dos marinheiros, em plena Segunda Guerra:

No posto de dirigíveis criava-se aquela tradição da menina do laranjal. Os marinheiros puseram-lhe o apelido de Tangerine-Girl. Talvez por causa do filme de Dorothy Lamour, pois Dorothy Lamour é, para todas as Forças Armadas norte-americanas, o modelo do que devem ser as moças morenas da América do Sul e das ilhas do Pacífico. Talvez porque ela os esperava sempre entre as laranjeiras. E talvez porque o cabelo ruivo da pequena, quando brilhava á luz da manhã, tinha um brilho de tangerina madura”. Na mesma linha, outro cearense, Fausto Nilo, também se encantava: “A tua cor, o teu nome / Mentira azul / Tudo passou, teu veneno / Teu sorriso blue / Hoje eu sou / Água-viva dos mares do sul / Não quero mais chorar / Te rever, Dorothy Lamour.

E foi com esse encantamento que Fausto Nilo, um dia em visita aos Estados Unidos, decidiu conhecer sua musa pessoalmente. Através de amigos americanos acertou o encontro que seria no rancho em que ela morava perto de Los Angeles. No dia combinado, um portador chegou para avisar que a visita estava cancelada. Velha e feia, não queria que seu fã, Fausto Nilo, mudasse a imagem que tinha dela.

Dorothy Lamour – pseudônimo de Mary Leta Dorothy Slaton – morreu aos 81 anos, em  22 de setembro de 1996. Ataque cardíaco, enquanto dormia. Deixou os filhos Richard Thompson Howard e John Ridgely Howard. Ficou a  saudade da bela mulher que levou  Fausto Nilo a “naufragar em seus olhos de mar azul”.


ARTIGO - (In) Diferença e (Des) Igualdade (RMR)


(IN)DIFERENÇA E
(DES)IGUALDADE
Rui Martinho Rodrigues*


Desigualdade é tema polêmico. Como nem sempre as pessoas sabem do que estão falando. Cumpre distinguir diferença e desigualdade, como o fez José D’Assunção Barros, na obra Igualdade e diferença (2016). Reservemos diferença para os aspectos objetivos da realidade, denotação, sem conotação.

Alguém de 1,90m é alto. Outrem, de 1,50 é baixo. Eis uma diferença objetiva, um juízo de fato, sem nenhum juízo de valor ou significado social, político, jurídico ou moral. Desigualdade fica para um juízo de valor, seja ele de natureza jurídica, política, social ou moral.

A estatura, no exemplo da diferença, se transformará em desigualdade se associada a algum dos juízos citados, com alguma repercussão no mundo dos fatos, indo além de simples opinião.

Desigualdades podem ser legítimas ou ilegítimas. Adquirir disponibilidade financeira, diferencia, na lei, em relação ao Imposto de Renda. A conversão de tal diferença em desigualdade tributária é legítima. Aqui temos (1) a (des)igualdade legítima de alguns (adquirentes de disponibilidade financeira) em algo (obrigação tributária).

É preciso, ainda, discernir a igualdade de oportunidades da igualdade de resultados, exemplificada na reivindicação de oportunidades iguais no ensino público de qualidade, suplementado por aulas de reforço, material escolar, bibliotecas, tecnologia da informação e o que mais houver, é um caso típico de (2) igualdade legítima de todos em algo (oportunidades).

A igualdade de resultados se constitui na (3) igualdade de todos em tudo, exigindo as mesmas condições de vida material para todos, sem nenhuma influência da resposta de cada um aos desafios da existência, afastando todos os demais fatores que possam modificar os resultados da luta pela vida. Requer um poder absoluto para afastar tais coisas. Por isso é totalitária. Contraria a experiência histórica universal acumulada. Afasta inclusive o mérito. A legitimidade desta forma de igualdade é muito questionável, para dizer o mínimo.

Temos ainda (4) a igualdade de alguns em tudo, no caso das disposições legais e imperativos morais que instituem direitos e obrigações para alguns em tudo, equiparando, verbi gratia, todas as crianças em tudo. (Des)igualdades impostas por engenharia social são totalitárias.

As elucubrações de Platão (428 – 347 a. C.), exigiam a supressão da propriedade e da família, fatores de desigualdade, embora a República do pensador ateniense instituísse uma violenta desigualdade entre filósofos e demais estratos criados por sua utopia, impondo uma desigualdade concebida por quem se julgava esclarecido.

A distopia de Aldous Huxley (1894 – 1963) também extinguia a família (Admirável mundo novo, publicado pela primeira vez em 1932). Diferenças podem ser parte da cultura. Existem, todavia, diferenças próprias da natureza, observadas em todos os lugares e épocas. Submetê-las à engenharia social e antropológica é um grave erro.

A indiferenciação e a indiferença, em face de realidades distintas, podem trazer mais problemas do que soluções. Postular igualdade jurídica e política não deve instituir uma moral oficial, violando a liberdade de consciência e instituindo delito de opinião. A boa igualdade é a proporcional, que é jurídica, política e valorativa. A igualdade material pode levar a absurdos.

É preciso não confundir direitos potestativos com os direitos das obrigações, para não tomar Direito como se patrocínio fosse. Dizer, como o Fez D’Assunção Barros na obra citada, que a igualdade de todos em relação a algo, por exemplo, que todos têm o direito de ter um palácio, é uma falsidade da teoria de John Locke (1632 – 1704), pois a barreira do dinheiro desfaz esta igualdade, é ignorar que direito potestativo não é garantia, é faculdade, cujo desfrute deve ser uma conquista. Direito não é patrocínio.

Todos têm o direito (potestativo) de ter um palácio. Isso significa que ninguém pode opor objeção a este direito. Não significa que alguém tem obrigação de patrocinar o desfrute de um direito que não vincula terceiros. A diferença é: direito obrigacional é sinalagmático; direito potestativo apenas não admite contestação. Mas isso é assunto para outra reflexão.


segunda-feira, 27 de novembro de 2017

ARTIGO - Guia de Cego (HE)

GUIA DE CEGO
Humberto Ellery*


Um antigo dito popular afirma que “médico pensa que é Deus; Juiz tem é certeza”. Observando a cena política nacional tenho visto que vários ministros de tribunais superiores, juízes e até procuradores têm o vezo de permanecerem pairando acima da lei,  sempre prontos a fazerem novas leis. Esquecem que a função de um juiz é interpretar e aplicar a lei, não é fazê-las.

A Deusa Iustitia, da mitologia romana, difere de sua correspondente grega, a Deusa Dice, por alguns aspectos, como o uso da espada, enquanto Dice a tem sempre à mão para impor a punição aos infratores da lei, e mantém os olhos bem abertos para procurar o direito, a Deusa Iustitia deixa a espada em posição de descanso para ser usada apenas se necessário, e tem os olhos vendados para buscar o direito pelo equilíbrio dos pratos da balança, “sem olhar a quem”, objetivando a imparcialidade.

Daí dizermos que “a justiça é cega”; só que atualmente ela conta com vários “guias de cegos”. Vejamos por exemplo o caso da Dra. Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador Sérgio Cabral. 

Antes de comentar a suspensão de sua prisão domiciliar e a volta ao presídio, preciso deixar bem claro que não conheço a cidadã, não lhe tenho nenhum apreço nem desapreço especial, nem pretendo fazer uma defesa da indigitada senhora (nem Advogado sou), preocupa-me o cumprimento da lei!

Aliás permitam-me um parêntese: se ela precisar de um jurista brilhante para defendê-la poderá, quem sabe, contar com os préstimos do Ministro Luis Fux. Foi ele quem, ao ser nomeado ministro do STF dirigiu-se à casa dela no Leblon onde, teatralmente, ajoelhou-se e beijou seus pés, em agradecimento ao empenho do seu marido, o ex-governador Sérgio Cabral, em lhe conseguir a tão sonhada nomeação. Se fosse deputado ou senador teriam pedido sua cassação por falta de decoro parlamentar. 

Já que citei o Fux, e por falar em decoro, devo acrescentar que o jurisconsulto é tão competente que consegue ser contra e a favor de um mesmo fato ao mesmo tempo. Quando a OAB pediu, através de uma ADI, que o STF considerasse inconstitucional a lei dos precatórios estaduais, o ínclito magistrado atendeu à pretensão da OAB (com as novas normas definidas por ele os advogados iriam “rachar de ganhar dinheiro” em cima dos R$ 100 bilhões de precatórios).

Mas aconteceu o inesperado, os TJs estaduais resolveram não pagar mais nenhum precatório, posto que a nova norma foi considerada inconstitucional. Diante do impasse a OAB recorreu de novo ao meritíssimo que não se fez de rogado, “matou no peito” e, incontinenti, concedeu uma liminar “derrubando” a sua própria decisão anterior, validando a lei antiga. Não é fofo? O preço de tanta prestimosidade (que a OAB pagou sem pestanejar),  foi a indicação da jovem advogada Marianna Fux ao cargo de desembargadora do TJ do Rio de Janeiro. Não sei se ele beijou de novo os pés da Dra. Adriana, ou mandou sua filha fazê-lo.

Voltando ao caso em comento, a hoje execrada ex-primeira-dama, a ex-rainha que teve os pés beijados, que tem direito, por lei, a cumprir a sua prisão em regime domiciliar, teve seu direito subtraído por juízes que legislaram no sentido de que, já que existem outras presas que têm o mesmo direito, e não o estão usufruindo, então se revogue o direito da Dra. Adriana. Simples assim!

Atenção para o fato de que esse direito existe não é para beneficiar a mãe presa, mas para proteger seus filhos menores, para que as crianças tenham em casa ao menos a mãe para dar-lhes carinho, educá-los, se o pai também estiver encarcerado, como é o caso. Mas aí entrou a Procuradora Mônica de Ré, cheia de razão, afirmando que os filhos menores da Dra. Adriana não precisam dela em casa uma vez que “dispõem de um séquito de empregados para cuidar deles”, circunstância não prevista na legislação. Mas e daí? 

Eles dispõem de uma bandeira altamente popular, o “combate à corrupção”, não importa que as leis do País sejam estupradas, pois o “povão” vai aplaudir, a massa ignara, a plebe rude, na sua pouca compreensão do risco que corremos por conta da deterioração do nosso ordenamento jurídico, quando a força do direito vai paulatinamente sendo substituída pelo direito da força, irá se esbaldar vendo a desgraça dos poderosos.


Existe uma palavra alemã que traduz esse sentimento, que Schopenhauer considerava diabólico: schadenfreude, que significa alegria pela desgraça alheia. Um sentimento rasteiro, abjeto, que existia latente, quase despercebido em nossa cultura, tanto que não existe sequer uma palavra para defini-lo, como no alemão, e hoje se alastra em nosso meio como fogo de morro acima. O povo pacato, ordeiro e bem humorado está se tornando um povo ressentido, zangado  e cruel. Não é pequeno o prejuízo sociológico causado por essa irresponsabilidade de alguns dos nossos magistrados.


É muito triste!
COMENTÁRIO:

O Titular Humberto Ellery sempre produz os mais interessantes artigos, nutridos com eruditas citações, trazendo aspectos inusitados da fluente realidade do País, que ele escrutina com malícia e com coragem.

Não sei se o Ministro Fux beijou os pés da então Primeira-Dama do Rio de Janeiro, Adriana Anselmo, atribuindo-lhe a sua indicação para o STF, porém confesso que eu mesmo o faria, fosse eu o indicado, e ela a madrinha política do ato.

Fá-lo-ia hic et nunc, sem o compromisso de em futuro pagar com a toga a indicação, favorecendo interesses escusos que um dia ela tivesse. Não. Quem indica um juiz não pode esperar esse retorno. Juiz de Direito que não é justo não é juiz de fato. É um dublê profissional.

Sim, é claro, não é correto que juízes de tribunais sejam indicados por políticos. Malgrado, no Brasil isso é legalmente permitido e adotado. Sendo legal, volto a dizer, fosse eu indicado, beijaria os pés de quem indicou, e ainda pediria para indicar uma filha minha, se tivesse uma preparada para tal. Nem por isso seria um dublador de juiz no exercício da judicatura.

Quanto aos julgamentos divergentes, sobre o mesmo caso, em momentos processuais diversos, por incrível que pareça ao senso comum, isso é permitido e acontece bastante. O entendimento que um juiz expresse agora não o vincula para as futuras decisões.

Em cada oportunidade o juiz tem que motivar nos fatos e fundamentar na lei o seu decisum, de forma congruente naquele momento, sem importar de que maneira o tenha feito antes, ou venha a fazê-lo depois. O juiz pode evoluir no entendimento, e pode até fazer juízo de retratação, se e quando lhe aprouver.

Sobre a prisão das inditosas mulheres dos políticos corruptos, com filhos pequenos ou não, eu acho cruel e desnecessária, desde que, uma vez soltas, não delinquam. Aliás, noventa e nove por cento de todas as mulheres condenadas e presas foram induzidas, ou obrigadas, por seus homens, a praticar delitos. Alguém conhece quem se tornou criminoso por influência feminina?

Não sei o que as feministas pensam disso, tampouco me interessa. Estas costumam ter um comportamento esquizofrênico. Uma hora querem se diferenciar dos homens, sendo tenentas e presidentas, outra hora querem se confundir com eles, sendo poetas e não poetisas. Uma hora querem ter privilégios, outra hora querem funções iguais  que se lhes abra a porta e lhes puxe a cadeira — mas que concorram com os homens nas mais árduas profissões.

Reginaldo Vasconcelos          

       

CRÔNICA - Projetos Mirabolantes (WI)


PROJETOS
MIRABOLANTES
(As maluquices que inundam o Brasil desde o Império)
Wilson Ibiapina*


José de Salles era oficial de justiça em Fortaleza. Com quase dois metros de altura, só andava de terno escuro e com um chapéu de madeira na cabeça. Na terra de baixinhos, Zé de Sales era notado por onde passava com seu andar meio capenga. Ele ficou famoso também por tocar bandolim no programa A Hora da Saudade, que José Limaverde apresentava nas noites das segundas na Ceará Rádio Clube.

Ele ensaiava numa oficina de consertar violões e outros instrumentos de corda, que ficava na Avenida Padre Ibiapina, bem em frente ao Sesi. A audiência do programa do pai do Narcélio e do Paulo ajudou a popularizar a figura do Zé de Sales, que logo-logo disputou uma cadeira na Câmara Municipal de Fortaleza. Um dos projetos do Zé de Sales prometia encanar o vento da serra de Guaramiranga para Fortaleza, como forma de amenizar o calor. Quilômetros e quilômetros de canos descendo a serra rumo ao litoral. Ainda bem que ele não foi eleito.

Essa coisa de canalização atormenta os legisladores e administradores públicos desde o começo do Brasil. Em 1670, o governo português decidiu canalizar a água do rio carioca, descendo o morro do Corcovado até o centro do Rio de Janeiro. No audacioso projeto foram usados canos de madeira. Em pouco tempo apodreceu tudo.

Um outro governante carioca apresentou um projeto parecido com o do candidato a vereador de Fortaleza. Igualmente ambicioso, mandava derrubar o Pão de Açúcar, com o objetivo único de melhorar a ventilação da cidade. O projeto que acabava com o morro, que é um dos símbolos da cidade maravilhosa, foi aprovado pelo Visconde de Ouro Preto, presidente do Conselho de Ministros. Uma firma inglesa chegou a ser contratada para fazer a demolição, que só não ocorreu por causa da proclamação da República. O projeto foi esquecido.

No Ceará, um espirituoso deputado pediu ao governador do Estado que lhe doasse uns canos furados que ele vira no pátio da Secretaria de Agricultura. O governador imediatamente atendeu. Meses depois o secretário de Agricultura comunica que o projeto de irrigação que seria inaugurado no interior teve que ser cancelado. Os canos que seriam usados no projeto simplesmente desapareceram. O governador manda chamar o deputado, achando que tinha sido enganado por ele:

 – Você disse que os canos estavam furados.

 – Sim, Governador. O Sr. já viu cano sem ser furado?

O Rio de Janeiro, em várias ocasiões, esteve sob o comando de desastrados administradores. O historiador Milton Teixeira chegou a reunir 35 fatos que mostram quão loucos foram alguns desses administradores do Rio. O jornalista Mário de Moraes, que ficou famoso escrevendo reportagens nas páginas da revista O Cruzeiro, conta que o historiador Milton Teixeira gastou dias fazendo pesquisas no Museu Histórico do Exército e no Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural. Ele queria reunir dados que comprovassem a veracidade de suas histórias.

Mário de Moraes conta duas outras histórias saborosas, levantadas pelo mesmo historiador Milton Teixeira. Após a independência, o Brasil precisou formar seu próprio Exército. Como tinham que correr contra o tempo, o jeito foi contratar mercenários alemães. O major Von Ewald, em 1825, era o comandante da tropa. Na época, a mais famosa e rica prostituta do Rio era Gertrudes. Mulata bonita, morava em uma mansão em Botafogo. Bastou uma noite de amor para que o major Von Ewald se apaixonasse. Para azar do alemão, Gertrudes não queria nada com ele. No desespero provocado pela rejeição, o major comandante mandou sua tropa desfilar em frente a residência de sua amada, em Botafogo. Como não surtiu efeito, ele engendrou plano mais diabólico para tocar os sentimentos mais profundos de Gertrudes. Não se sabe como ele conseguiu as ligas íntimas de Gertrudes, que mandou prender à Bandeira do Brasil e desfilou com ela em frente a Dom Pedro I. O apaixonado major teve que fugir do país para escapar da corte marcial .

Em reportagem escrita no jornal Terceiro Tempo, Mário de Moraes conta que o Brasil entrou no século XVIII dominado pela violência que se alastrava pelas ruas do Rio. O governador do Rio, Luiz Monteiro, desencadeou uma campanha contra ladrões, criminosos e corruptos que infestavam a cidade. As cadeias ficaram abarrotadas. Foi preciso alugar casas, que foram improvisadas como presídios. O governador não contente, pegou a caneta e escreveu o seguinte bilhete ao rei de Portugal: “Senhor, nesta terra todos roubam, menos eu”. O Rei, acreditando que seu governador ficara louco, mandou prendê-lo, também.

Esses legisladores e governantes pirados continuam existindo no país. A exemplo do que ocorreu em Nebraska, Estados Unidos, onde o governador mandou construir uma pista de pouso para extraterrestres, aqui no Brasil o dinheiro público também foi usado na construção de pista de pouso para disco voador. Perto de Barra do Garças, está o primeiro discoporto do Brasil. A jornalista Carla Fagundes me mostra o recorte de jornal que prova que o prefeito de Bocaiúva do Sul, que fica perto de Curitiba, também teve essa brilhante ideia. Élcio Berti anunciou a criação de um aeroporto para discos voadores, batizado de Ovniporto. Ele disse que “é uma coisa do futuro”

A lista de projetos inusitados não pára de crescer em pleno século XXI. E não adianta transparência nas contas públicas governamentais. Os desmandos acontecem desde que o Brasil foi descoberto. Sempre soubemos dos exageros, por exemplo , da família imperial, que gastava uma fábula em dinheiro para manter palácios e residências nos quatro cantos do Rio. E, como hoje, aumentava os impostos, deixando indignados os brasileiros que moravam longe da corte, que já não se conformavam com as notícias de favoritismo e corrupção.

Para ajudar nos gastos da família real, Dom João vendia até títulos de nobreza. O historiador Pedro Calmon escreveu que para ser Conde em Portugal eram precisos 500 anos. No Brasil, bastava 500 contos. Dom João VI, segundo o historiador Patrick Wilcken conta no livro “Império à deriva”, criou 28 títulos de marqueses, 8 de condes, 16 viscondes, 21 barões e mais de mil cavaleiros.

A comunidade tem o direito de saber onde o dinheiro dos impostos é empregado e pode até questionar qual a melhor maneira de sua utilização. Só não vamos nos livrar é desses malucos criativos. Eles vão continuar angariando a simpatia dos eleitores e estarão sempre preparando projetos que consideram geniais, sempre “com a melhor das intenções”.


domingo, 26 de novembro de 2017

CONVITE - A Face Oculta da Barragem Castanhão (CB)



ARTIGO - O Nevoeiro e os Navegantes (RMR)


O NEVOEIRO E 
OS NAVEGANTES
Rui Martinho Rodrigues*




Como será o financiamento das campanhas? Como o eleitorado reagirá à desmoralização da vida pública? Não é possível responder a estas indagações com segurança. 


Espera-se um aumento dos índices de renovação das casas legislativas, que já eram muito elevados. Mas não se sabe se haverá renovação de atitudes; qual será a influência do poder econômico e da “máquina” governamental. Temos um nevoeiro com baixa visibilidade.

O Ceará já teve alternância no Poder, sem renovação de condutas. A UDN e o PSD se revezavam no governo. Pequenos partidos eram os fiéis da balança. Cobravam caro por isso. Não em dinheiro. No poder, nomeavam os seus eleitores e demitiam os do adversário. Isso configurava uma forma tosca de seguro desemprego: Era temporário; só durava até o adversário voltar ao poder; pagava pouco; não era preciso trabalhar. Tudo como um seguro desemprego. Era distribuído segundo critérios partidários.

Havia oposição, porque as empresas não dependiam tanto do aparato estatal. Não havia tanto incentivo ou amparo oficial aos negócios. Nem o Estado era um comprador tão importante. Empresários eram mais independentes. Prefeitos também não tinham tantas formas de cooperação com o Estado ou com a União. Não havia o presidencialismo de cooptação, porque tínhamos menos Estado na economia. 

O voto rural superava em muito o voto urbano. O camponês vota no “coroné” por lealdade pessoal, por laços de parentesco, amizade ou compadrio, que era uma forma de parentesco ritual. Não havia tanta despesa nas eleições. Além da troca de favores era preciso matar um boi para alimentar os eleitores, gastar algum dinheiro para transportá-los, já tendo gasto um pouco para qualifica-los na Justiça Eleitoral. Não se gastava com marqueteiro, filmes, aviões ou helicópteros.

Não havendo tantos gastos, não havia tanta extorsão (tecnicamente concussão) nos negócios com o Poder público. Depois de uma vida dedicada à política os homens públicos não iam além da acumulação de algumas aposentadorias, sem nenhuma semelhança com os bilhões amealhados hoje. Não ficavam ricos. 

O casuísmo das obras públicas não era tão prejudicial. A estrada feita para o aliado político transportava bens para toda a sociedade; o açude viabilizava alimento para o mercado, sem distinção. Por tudo isso havia partidos ou cooperativas de poder assemelhados a agremiações políticas.

Hoje só existe um grande partido: o governista. O favoritismo atrai irresistivelmente. Agora, porém, o favoritismo, em meio ao nevoeiro, já não é tão certo. O mundo passa por uma onda de rejeição dos políticos. Surpresas são consideradas nos cálculos. O horror à perda do poder ou dependência das tetas da “viúva”, leva os irreconciliáveis à conciliação. 

Mas como o eleitor reagirá? As chorosas vítimas do “golpe” farão aliança com os “golpistas”? Já se disse que a política é dinâmica. Mas o velho Tancredo Neves gostava de lembrar que a sabedoria é um bicho que quando cresce demais engole o dono.

O tempo dará todas as respostas, e Paulinho da Viola aconselha: “Faça como o velho marinheiro, que durante o nevoeiro, leva o barco devagar”.