O Ministério da Educação do atual Governo anda tentando desestimular o aprendizado e o uso correto da língua vernácula, como se o idioma não fosse uma ciência que se vem estruturando ao longo dos séculos, que demandou estudos, que tem regras importantes para a sua plena eficácia.
Quem fale o tupi, por exemplo, consegue se comunicar de forma rústica com o indígena que conheça esse idioma. Mas notará dificuldade de expressar sentimentos mais delicados, de transmitir pensamentos mais elaborados, de precisar números e quantidades, de identificar elementos, de dizer com perfeita exatidão aquilo que pretenda ou precise.
Em português, ao contrário, em virtude da riqueza vocabular da língua, da sua vasta sinonímia, das suas regras gramaticais precisas, pode-se fazer com grande propriedade um tratado científico, assim como produzir poesias sobre os mais íntimos sentimentos, e também redigir um contrato de negócio com clareza absoluta, sem dar margem a erros e a interpretações equivocadas.
Destarte, os que não querem estudar e aplicar corretamente a língua, aplicando a “lei do menor esforço”, de qualquer modo terminarão discriminados pelos que investiram tempo e interesse para conhecer e aplicar com propriedade, entre os compatriotas, a ciência da comunicação.
CONCORDÂNCIA DO VERBO HAVER
Existem deslizes típicos de quem não conhece as características do verbo haver. Quando se diz “há muitas pessoas na sala”, conjuga-se o verbo haver na terceira pessoa do singular do presente do indicativo.
Note que não foi feita a concordância do verbo haver com a palavra “pessoas’. Não se poderia dizer “hão pessoas”. O verbo haver, quando usado com o sentido de existir, fica no singular. Se fosse usado o verbo existir, este sim iria para o plural: “Existem muitas pessoas na sala”.
A confusão tende a aumentar quando o verbo haver é usado no passado ou no futuro. Em certo trecho, a versão feita pelo conjunto “Os incríveis” da canção “Era um garoto que como eu amava os Beatles e os Rolling Stones”, diz: “... Não era belo mas, mesmo assim, havia mil garotas a fim...”. Nesta canção o verbo haver foi empregado com o sentido de existir. Logo, está correta a versão, o verbo no passado e no singular.
No Brasil, fala-se “cabe dez”, “sobrou 30”, “falta 30”. Geralmente não se faz concordância. Mas, quando não é necessário fazer, erra-se. “Houveram muitos acidentes naquela rodovia”. Errado.
O correto é “houve muitos acidentes naquela rodovia”. Haverá acidentes, houve acidentes, há pessoas, havia pessoas, houve pessoas.
Vale repetir: “O verbo haver quando empregado com o sentido de existir, ocorrer, acontecer, fica no singular, independentemente do tempo verbal.
CONCORDÂNCIA DO VERBO FAZER
O verbo fazer indicando tempo não tem sujeito. Pode-se e deve-se dizer: “passaram dez anos”. De fato, os anos passam. Mas, nunca dizer “fazem dez anos “.
O mesmo acontece na locução verbal quando o verbo fazer é associado a outro na indicação de tempo: “Já deve fazer vinte anos que ela foi embora“.
Nunca dizer : “Já devem fazer vinte anos...”. Nesses casos o verbo fazer vem sempre no singular. Outro caso é levantado: “Quando conheci sua prima, eu morava lá há dez anos” ou “... morava lá havia dez anos”. A dica é muito simples. Usando o verbo fazer a forma correta de falar é “...morava lá fazia dez anos”. Logo, “... eu morava lá havia dez anos”.
Neste caso, o verbo haver equivale a fazer, indica tempo. Os tempos verbais também devem se casar: se eu morava..., morava fazia..., morava havia... É assim que exige o padrão formal da língua.
VERBO VER NO FUTURO DO SUBJUNTIVO
A maioria das pessoas da classe medianamente culta certamente não sabe mais definir o que seja o “futuro do subjuntivo”. Não é importante. Mas é importantíssimo saber empregar corretamente esse tempo verbal, no caso do verbo ver, principalmente quando falando em público, pois quem escreve para publicar tem sempre a possibilidade conveniente de submeter o texto a um revisor. Hoje, o próprio computador pode fazer a correção.
Mas em discursos orais, freqüentemente nos surpreendemos com o emprego errado desse verbo, nesse tempo verbal, até por quem tem curso superior: “Sempre que eu ver você fumando”, ou então “Quando você me ver apressado”. Erro grave.
Deve-se dizer: “Sempre que eu vir você fumando”, e “quando você me vir apressado”.
GÊNERO DA PALAVRA GRAMA
Por influência da última letra da palavra, a vogal “a”, que, em regra, em português, indica as palavras femininas, o vulgo costuma entender que seja “a grama”, quando na verdade o vocábulo é masculino.
Assim como as demais palavras que indicam unidade de massa – o tetragrama, o metagrama, o quilograma (o quilo) o hectograma – deve-se colocar a palavra grama entre os que podem usar barbas. Deve-se então dizer sempre “duzentos gramas de farinha”.
Esse tipo de falha na linguagem, aparentemente banal, obviamente não impede a compreensão da mensagem que se quer transmitir. Todavia indica que o falante em questão não teve oportunidade, ou não teve ânimo, de estudar o idioma português com a necessária atenção, desde a escola, e portanto se afeiçoou ao modo de falar coloquial.
Ou, pior ainda, indica que, depois da escola, a pessoa não adquiriu o hábito salutar de se entregar a boas leituras, e não é na rua, mas nos livros que os homens enriquecem o pensamento. Os concursos públicos estão aí, cada vez mais exigentes, procurando selecionar os que têm condições técnico-científicas de contribuir com humanidade, e discriminando aqueles que somente aprenderam o que o senso comum pode ensinar.