UMA COISA
É UMA COISA
E OUTRA COISA
É OUTRA COISA
II
Reginaldo Vasconcelos*
Ao contrário do que a grande imprensa
quer passar ao público, Oprah Winfrey e Catherine Deneuve não
estão em trincheiras opostas, quando uma lidera o “Movimento Vestido Negro”,
contra o assédio sexual no meio artístico, e a outra assina um manifesto a favor
do direito masculino de “importunar” o mulherio.
As atrizes de Hollywood, lideradas
pela apresentadora de TV americana, insurgem-se, muito justamente, contra o que
no Brasil se conhece como “o teste do sofá” – aquele hábito nefasto de trocar
por sexo participações ou empregos glamorosos, que os poderosos da mídia põem
em prática, explorando a vaidade e a ânsia femininas de usar a beleza para
obter celebridade.
As francesas, por seu turno, estão
criticando o vezo “politicamente correto” de tentar demonizar o flerte, a
paquera, a azaração, o xaveco – conforme se queira designar, de maneira mais
tradicional ou mais moderna – contestando o exagerado sexismo que vem
atrapalhando as sadias aproximações amorosas entre os rapazes e as moças, entre
os homens e as mulheres.
De fotógrafos de modelos a diretores
de cinema, passando por produtores de televisão, tradicionalmente eles submetem
as moças que tentam espaço no meio artístico ao incômodo de ter que deitar com
eles (“sair” com eles ou “ficar” com eles), a exemplo do que se tem revelado
recentemente em relação a importantes nomes do grand mond “holiudiano”.
É claro que o assédio sexual não se
dá somente no ambiente artístico, mas também acontece em todo o meio
profissional, sendo que, sabidamente, somente fazem carreira por essa via mais
fácil as mulheres que cedem à tentação, e assumem a oportunidade, considerando
que isso possa constituir uma boa troca, lícita e justa. As demais têm como
rechaçar os avanços, bastando adotar uma maneira de vestir discreta, uma
postura adequada, recorrendo às respostas evasivas contra insinuações
subliminares.
Sim. Claro que não se está falando
nos casos em que a coação física seja usada, quer na empresa, quer na rua, na
sala do chefe ou no ônibus lotado, porque aí já se ingressa direto na seara
criminal, em que patrão algum vai querer se aventurar – pois quando o faz se
expõe a pagar muito caro. Somente os tarados sexuais e os intimoratos penais
praticam estupro, em qualquer de suas formas e graus, delito que não é tolerado
nem mesmo pelos criminosos de outras castas.
Enfim, a Oprah protesta contra a
“cantada” imprópria e insistente, com o uso indevido do poder econômico ou
hierárquico, com a aplicação de chantagem profissional, visando a obtenção de
sexo hedonístico, sem real vínculo amoroso. Então, ela reclama de excessos
licenciosos. Ela repudia abusos sexuais que de fato são intoleráveis.
Já as francesas apoiadas pela
insigne Deneuve, essas combatem os exageros culturais trazidos pela
onda feminista que assola o mundo moderno, quando se pretende criminalizar as
investidas amorosas normais, os naturais amavios desferidos pelos homens
enamorados, no jogo de sedução que forma os casais, inibindo dessa maneira que
aqueles que se sintam atraídos por alguém manifestem livremente os seus
legítimos interesses. Então, a sua intenção é nobre e também tem justa causa.
O torpedo espirituoso, escrito ou verbal – do tipo “e ainda dizem que boneca não nada”, e “a nora que a minha mãe queria” – ou o assobio lisonjeiro de “fiu-fiu”, que no Ceará era aspirado e se denominava “coió”, tudo isso está hoje proscrito ao campo da mais ignóbil violência moral contra as mulheres – e é com isso que as francesas não concordam.
Recentemente flutuou pela Internet um vídeo nacional em que uma jovem transeunte, vestida de maneira muito sensual, passa por um grupo de homens que estão na calçada, e em seguida retorna, para os agredir verbalmente e ameaçar aos berros, supostamente por haverem eles “olhado” para a nada discreta “bunda” dela. Esse é um caso extremo do absurdo contra o qual as francesas estão agora a reclamar.
Mas o que Ms. Winfrey não leva em
conta em seu manifesto é que as mulheres não são mais as coitadinhas de outros
tempos, hoje bem esclarecidas e “empoderadas”, já tendo conquistado grandes
espaços na sociedade, bem como elevados postos de comando, hierárquico e
patronal – e a própria Oprah é um exemplo disso – de modo que não lhes cabe
mais, exclusivamente, essa carapuça vitimária.
Homens jovens também estão
suscetíveis de sofrer assédio feminino (e já faz muito tempo, talvez desde o epidódio bíblico da mulher de Potifar) – no caso deles, geralmente chantageados, menos para a prática de sexo,
mas para encetarem namoro com as chefes, quando for o caso, ou até,
em situações específicas, para com elas se casarem. Eu mesmo sei de casos
recentes que seria indiscreto referir, e outros mais antigos que a modéstia me
proíbe detalhar.
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