sábado, 20 de janeiro de 2018

ARTIGO - Acerca d'O Silêncio Visto por Dentro (VM)


ACERCA D’O SILÊNCIO
VISTO POR DENTRO
(A Modo de Prefácio)

Vianney Mesquita*


Mais uma vez, guardo a satisfação de deparar um conjunto de joias em alvos versos, procedente da messe poética da conhecida e muito bem avaliada escritora brasileira, a cearense Neide Azevedo Lopes, acadêmica, poetisa e compositora – de quem sou fã matriculado  que subscreve, dentre outros, O Resvalar do Sonho e Uma Pausa, uma Luz – todos esteados em metro solto e com sedutora estesia.

Em 2010, tomei-me de encantamento com sua Teoria dos Afetos, então enunciando, em manifestação publicada em media massivos e igualmente válida para este ensejo, a ideia de que [...] os efeitos imprimidos nas expressões de musicalidade do seu metro me conduzem a evocar os rafaeis e mechellângelos da Capela Sistina, bem assim a expressão da alma nacional galega, de Rosalía de Castro Murguia (cuja casa, em Padron – A Coruña, Espanha, tive a ventura de conhecer) no seu O Cavaleiro de Botas Azuis [...].

Neste passo, sem pretender subtrair o apéritif dos multíplices consulentes de O Silêncio Visto por Dentro, privando-os de degustar o “primeiro prato”- razão por que não comento, de per se e de caso pensado, nenhum dos poemas deste exemplar - procedo a rápidas glosas atinentes aos aspectos globais do produto sob relação, ao evocar de novo, exempli gratia, [...]o Metal Rosicler, de Cecília Meireles (1960), menos por identidade estilística e mais pelo esplendor vocabular e elevação ideativa, fluência e estro desdobrados, centuplicados a cada elaboração. Nalgumas passagens, Neide denota, ainda, similitude com Gabriela Mistral (Lucila de Maria de el Perpétuo Socorro Godoy Alcayaga), Nobel de Literatura (1945), no seu Ternura, enquanto noutras estâncias aparece, ainda, com a elevação comovente da IV Marquesa de Alorna – Dona Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre.

Sem que seja necessário apontar poemas deste volume, manobre, leitor caríssimo, ab hoc et hab hac, o exercício de colacionar as medidas e inventivas geniais de nossa Autora, neste livro premiado por seu inconcusso alcance literoartístico, o entusiasmo transportante de seu ímpeto como poetisa bem aparelhada, situando suas associações imagéticas em relação aos concertos das mencionadas e paradigmáticas versejadoras, duas das quais estrangeiras, para, na sequência, extrair suas ilações.

Eis as sugestões para o cotejamento alvitrado:

a) Eu não tinha este rosto de hoje
Assim calmo, assim triste, assim magro [...]
Eu não dei por esta mudança
Tão simples, tão rápida, tão fácil. [...]
 Em que espelho ficou perdida a minha face?

(Cecília Meireles – Carioca. 07.11.1901 – 09.11.1964).


b) Senhor! Tu que ensinaste, perdoa que eu ensine;
 Que leve o nome de professora, que Tu levaste sobre a Terra ...

(Gabriela Mistral – Chilena. 07.04.1889 – 01.01.1957.


c) Se me aparto de ti, Deus de bondade,
Que ausência tão cruel!
Que me leva a um abismo tão terrível!
O pendor infeliz da humanidade.

(Marquesa de Alorna – Portuguesa. 31.10.1750 – 11.10.1839.

Não expresso, por conseguinte, de maneira alguma – por tal sobrar impreciso, injusto e não verdadeiro - a noção de que Neide Azevedo Lopes é menor do que elas, pois seu vigor é semelhante, a maneira de tornear é parecida e aplica, com propriedade, graça e perfeição, os recursos figurais recepcionados pela poesia, ornamentando, aliás, desnecessariamente, o fascínio de suas produções, porquanto a ela já sobejou ingênito o veio artístico, sendo, pois, a si imanente o jeito natural de poetizar.

Repito, como se faz com um estribilho, aquilo já expresso noutra ocasião, ao relatar a ideação de que a originalidade e a inspiração multímodas, ínsitas a ela, de formular representações figurais múltiplas, a concertam ao esplendor da Língua Portuguesa, parecendo acercá-la de Flor Bela d’Alma da Conceição Espanca – Florbela Espanca – em Alma da Conceição, Livro das Mágoas Charneca em Flor.

Pincem estas grades poéticas de Florbela, comparem-nas com poemas de O Silêncio Visto por Dentro (extraordinário título!), bem assim de outros trabalhos de sua riquíssima semeadura literária, e notem a similitude, divisem a paridade, lobriguem a igualdade de ideações e glamour composicionais.

Saudades! Sim ... Talvez... E por que não? ...
Se o sonho não foi tão alto e forte,
Que pensara vê-lo até a morte
Deslumbrar-me de luz o coração!
Esquecer? Para quê? Ah, como é vão! ...
(Florbela Espanca).

Magistrais resultam, pois, TODAS as estâncias deste recompensado volume, reconhecido pela justiça literária coestaduana, a qual o indicou como o melhor postulante à láurea, ora diplomado com esta publicação, a qual honra o recheio de obras de boa qualidade no nosso País.

Então, Palma qui meruit ferat – Quem está com a palma que a conduza – eis aplicada aqui a divisa da minha Arcádia Nova Palmaciana.




Para a poetisa, a mancheias, Neide Azevedo Lopes, dedico o soneto decassilábico Português – com dez ictos em cada verso  reproduzido na sequência.


O SILÊNCIO VISTO POR DENTRO

Dos corcéis rememoro seus galopes
E em latinas corridas me concentro;
A Via Ápia da vida, pois, adentro,
Sem manifestar medo dos ciclopes.

Oh tu, cicuta! Por mais que me dopes,
Nem Sócrates, que foi teu epicentro,
Permitirá me faças hipocentro
De unguentos, peçonhas e xaropes.

Na batalha de gládio, então, reentro,
De energia me faço o microcentro,
Luto contigo, desde que me topes.

Ruy Barbosa ideou o adedentro (**)
E eu, no silêncio que é visto por dentro,
Saúdo a Neide Azevedo Lopes.


**Adedentro é vocábulo cunhado pelo intelectual baiano Ruy Caetano Barbosa de Oliveira e significa interiormente – advérbio. Adefora – impende dizer-se – conota, a seu turno, do lado de fora, exteriormente.





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