MICHEL TEMER
DO IMPEACHMENT AO INDULTO
Reginaldo Vasconcelos*
Eu
nunca entendi o impeachment de Dilma
Rousseff como um “golpe”, na acepção que a ciência política dá ao termo. Sim,
todo processo constitucional de destituição de um titular da República é um
golpe lato sensu, pois representa um
corte súbito no curso regular de um projeto de governo.
Mas,
se o processo seguiu os procedimentos regulares previstos na Carta Magna e na legislação
pertinente, como aconteceu no caso Dilma, não pode ter o caráter revolucionário
que se lhe quis atribuir.
Aliás,
a única irregularidade no processo foi a favor da governante deposta, quando o
então Presidente do Supremo Tribunal, entrou em conluio com quem presidia o Congresso
no momento.
Eles desconsideraram a imposição do período de inelegibilidade que a Constituição Federal prevê, como sanção acessória ao político deposto, e que, inclusive, foi aplicada contra o ex-presidente Collor, no idêntico evento exoneratório anterior.
Eles desconsideraram a imposição do período de inelegibilidade que a Constituição Federal prevê, como sanção acessória ao político deposto, e que, inclusive, foi aplicada contra o ex-presidente Collor, no idêntico evento exoneratório anterior.
Também
não via eu qualquer participação de Michel Temer no episódio do impeachment, ao contrário do que queriam
os petistas, pois tudo transcorreu por conta dos advogados que propuseram o
processo; e do Presidente da Câmara Federal, que o acatou e lhe deu seguimento;
e dos partidos de direita, que fizeram gestões políticas contra o Governo; e do
Congresso Nacional, que, por maioria, votou contra a Presidente da República.
Sendo
assim, a meu ver, Temer caiu na cadeira presidencial por pura sorte, pois esse
é um dos destinos previstos para o vice-presidente, conforme a Carta da
República. Também não é verdadeiro que se tornou um Presidente ilegítimo, por
não ter sido votado, pois os votos do seu partido foram decisivos na eleição da
chapa presidencial, por duas vezes, e, ademais, os parlamentares que depuseram
a Dilma, e o entronizaram, haviam sido eleitos por seus respectivos
eleitorados.
Mas
o meu consultor especial para assuntos políticos, que teve longa vivência
pessoal no âmago do partido de Temer nos gabinetes de Brasília, me adverte de
que, nos bastidores, agindo politicamente, Temer participou, sim, do processo,
de forma ativa e determinante, a partir daquela carta que enviou à Dilma intitulada “verba volante, scripta manent” (as falas
voam, a escrita fica), e de uma gravação que fizera “em off”, cujo vazamento à
imprensa e ao público teria sido proposital.
Bem,
faz sentido. Ele não era do partido no Governo,
sentia-se magoado pelo desprestígio sofrido da Presidente da República,
e, afinal, ele seria beneficiado pela herança legítima do seu valioso cargo público.
É compreensível. Até porque a política tem uma ética própria, que não se
compadece com os padrões normais do mundo real. Políticos se traem e se
reconciliam, dizem e se desdizem, mentem e se desmentem. Se digladiam internamente, mas protegem a sua corporação do público externo.
Superado
esse ponto, nunca levantei a bandeira do “Fora Temer”, agitada pelos vingadores
petistas, e apoiada por setores da mídia, porque depois da grande convulsão do impeachment, um real golpe político
àquela altura arrasaria de vez a economia, massacrando o povo e prejudicando a Nação.
As
vozes que bradavam em sentido contrário, na verdade, defendiam a nefasta tese
politiqueira do “quanto pior, melhor”. Para mim, ainda que não acreditasse no
Governo Temer, era melhor deixar a faca cravada no peito da República que
extraí-la agora e provocar uma hemorragia social.
Então,
sobreveio todo aquele cabuloso episódio envolvendo Rodrigo Janot e os irmãos Batistas. Flagrantes preparados, gravações suspeitas, ilações sem provas,
atual Presidente e futuros candidatos ao cargo como alvos deliberados das
investigações federais – culminando com uma anistia geral e irrestrita para os
crimes dos Batistas, que ficariam belos e formosos, livres, leves e soltos, a
bordo de sua empresa e da fortuna mal havida. Tudo devidamente homologado pelo
Supremo Tribunal Federal.
Até
que os empresários metem os pés pelas mãos e deixam vazar uma gravação ebriosa que
incrimina a si mesmos e a Rodrigo Janot, trazendo de cambulhada outro
Procurador da República, ligado ao Procurador-Geral, e até Ministros do Supremo
Tribunal. Êpa! Fica o dito pelo não dito. Que acordo de colaboração que nada! Prende
os donos da JBS urgentemente!
Janot,
que já estava de saída, retirou-se do cenário e caiu nas sombras. Seu assessor,
envolvido em suspeitas até a medula, se tornou intocável, ao dizer que o
deixassem em paz, pois, se fosse preso, falaria. Não foi preso; não falou. A
minha conclusão: não há um só inocente em todo o caso – de investigados a
investigadores, de delatados a delatores, de pré-julgados a pré-julgadores.
Mas
a economia vai muito bem-obrigado, a inflação baixa, o nível de emprego
melhorando, o PIB subindo, as reformas cogentes sendo implementadas e, muito
sabiamente, o Congresso sobrestou as ações penais contra Temer e permitiu que
ele continuasse o seu trabalho.
Até
que Temer edita o chamado “insulto de natal”, que amplia demasiadamente o
indulto anual do Presidente da República em favor de apenados. A Procuradora da
República reage, a Presidente do Supremo susta parte do indulto, a mídia incita
o povo à revolta, insinuando que Michel Temer atuou em favor dos presos da
Operação Lava Jato – muitos deles seus amigos do peito, além de seus fieis
aliados.
Mas,
novamente, aquele meu consultor político, juridicamente bem embasado, adverte
que, não obstante devesse ter sido evitado, o indulto de natal mais amplo, editado por Michel Temer, não beneficiaria nenhum dos políticos do PSDB presos na Lava
Jato, porque nenhum deles tem sentença penal com trânsito em julgado – condição
sine qua para ter as penas
indultadas. E a bonomia do Decreto de Indulto só tem efeito imediato.
Agora temos a discussão ideológica e a guerra política em torno da reforma da Previdência. Os técnicos dizem que sem ela não haverá salvação; o Governo afirma que visa garantir as futuras aposentadorias dos mais pobres; os esquerdistas afirmam que não há déficit, que a reforma é perversa e quer apenas garantir privilégios. Alguém estaria enganando, ou muito enganado.
Agora temos a discussão ideológica e a guerra política em torno da reforma da Previdência. Os técnicos dizem que sem ela não haverá salvação; o Governo afirma que visa garantir as futuras aposentadorias dos mais pobres; os esquerdistas afirmam que não há déficit, que a reforma é perversa e quer apenas garantir privilégios. Alguém estaria enganando, ou muito enganado.
Que
venham os desdobramentos dos fatos a partir de fevereiro deste vertiginoso 2018. Como diria o Chico Buarque, “estou me guardando para quando o carnaval chegar”.
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