quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

ARTIGO - Michel Temer - Do Impeachament ao Indulto (RV)


MICHEL TEMER
DO IMPEACHMENT AO INDULTO
Reginaldo Vasconcelos*



Eu nunca entendi o impeachment de Dilma Rousseff como um “golpe”, na acepção que a ciência política dá ao termo. Sim, todo processo constitucional de destituição de um titular da República é um golpe lato sensu, pois representa um corte súbito no curso regular de um projeto de governo.

Mas, se o processo seguiu os procedimentos regulares previstos na Carta Magna e na legislação pertinente, como aconteceu no caso Dilma, não pode ter o caráter revolucionário que se lhe quis atribuir.

Aliás, a única irregularidade no processo foi a favor da governante deposta, quando o então Presidente do Supremo Tribunal, entrou em conluio com quem presidia o Congresso no momento.


Eles desconsideraram a imposição do período de inelegibilidade que a Constituição Federal prevê, como sanção acessória ao político deposto, e que, inclusive, foi aplicada contra o ex-presidente Collor, no idêntico evento exoneratório anterior.

Também não via eu qualquer participação de Michel Temer no episódio do impeachment, ao contrário do que queriam os petistas, pois tudo transcorreu por conta dos advogados que propuseram o processo; e do Presidente da Câmara Federal, que o acatou e lhe deu seguimento; e dos partidos de direita, que fizeram gestões políticas contra o Governo; e do Congresso Nacional, que, por maioria, votou contra a Presidente da República.


Sendo assim, a meu ver, Temer caiu na cadeira presidencial por pura sorte, pois esse é um dos destinos previstos para o vice-presidente, conforme a Carta da República. Também não é verdadeiro que se tornou um Presidente ilegítimo, por não ter sido votado, pois os votos do seu partido foram decisivos na eleição da chapa presidencial, por duas vezes, e, ademais, os parlamentares que depuseram a Dilma, e o entronizaram, haviam sido eleitos por seus respectivos eleitorados.  

Mas o meu consultor especial para assuntos políticos, que teve longa vivência pessoal no âmago do partido de Temer nos gabinetes de Brasília, me adverte de que, nos bastidores, agindo politicamente, Temer participou, sim, do processo, de forma ativa e determinante, a partir daquela carta que enviou à Dilma intitulada “verba volante, scripta manent” (as falas voam, a escrita fica), e de uma gravação que fizera “em off”, cujo vazamento à imprensa e ao público teria sido proposital.

Bem, faz sentido. Ele não era do partido no Governo,  sentia-se magoado pelo desprestígio sofrido da Presidente da República, e, afinal, ele seria beneficiado pela herança legítima do seu valioso cargo público. É compreensível. Até porque a política tem uma ética própria, que não se compadece com os padrões normais do mundo real. Políticos se traem e se reconciliam, dizem e se desdizem, mentem e se desmentem. Se digladiam internamente, mas protegem a sua corporação do público externo.

Superado esse ponto, nunca levantei a bandeira do “Fora Temer”, agitada pelos vingadores petistas, e apoiada por setores da mídia, porque depois da grande convulsão do impeachment, um real golpe político àquela altura arrasaria de vez a economia, massacrando o povo e prejudicando a Nação.

As vozes que bradavam em sentido contrário, na verdade, defendiam a nefasta tese politiqueira do “quanto pior, melhor”. Para mim, ainda que não acreditasse no Governo Temer, era melhor deixar a faca cravada no peito da República que extraí-la agora e provocar uma hemorragia social.


Então, sobreveio todo aquele cabuloso episódio envolvendo Rodrigo Janot e os irmãos Batistas. Flagrantes preparados, gravações suspeitas, ilações sem provas, atual Presidente e futuros candidatos ao cargo como alvos deliberados das investigações federais – culminando com uma anistia geral e irrestrita para os crimes dos Batistas, que ficariam belos e formosos, livres, leves e soltos, a bordo de sua empresa e da fortuna mal havida. Tudo devidamente homologado pelo Supremo Tribunal Federal.

Até que os empresários metem os pés pelas mãos e deixam vazar uma gravação ebriosa que incrimina a si mesmos e a Rodrigo Janot, trazendo de cambulhada outro Procurador da República, ligado ao Procurador-Geral, e até Ministros do Supremo Tribunal. Êpa! Fica o dito pelo não dito. Que acordo de colaboração que nada! Prende os donos da JBS urgentemente! 

Janot, que já estava de saída, retirou-se do cenário e caiu nas sombras. Seu assessor, envolvido em suspeitas até a medula, se tornou intocável, ao dizer que o deixassem em paz, pois, se fosse preso, falaria. Não foi preso; não falou. A minha conclusão: não há um só inocente em todo o caso – de investigados a investigadores, de delatados a delatores, de pré-julgados a pré-julgadores.

Mas a economia vai muito bem-obrigado, a inflação baixa, o nível de emprego melhorando, o PIB subindo, as reformas cogentes sendo implementadas e, muito sabiamente, o Congresso sobrestou as ações penais contra Temer e permitiu que ele continuasse o seu trabalho.

Até que Temer edita o chamado “insulto de natal”, que amplia demasiadamente o indulto anual do Presidente da República em favor de apenados. A Procuradora da República reage, a Presidente do Supremo susta parte do indulto, a mídia incita o povo à revolta, insinuando que Michel Temer atuou em favor dos presos da Operação Lava Jato – muitos deles seus amigos do peito, além de seus fieis aliados.

Mas, novamente, aquele meu consultor político, juridicamente bem embasado, adverte que, não obstante devesse ter sido evitado, o indulto de natal mais amplo, editado por Michel Temer, não beneficiaria nenhum dos políticos do PSDB presos na Lava Jato, porque nenhum deles tem sentença penal com trânsito em julgado – condição sine qua para ter as penas indultadas. E a bonomia do Decreto de Indulto só tem efeito imediato.

Agora temos a discussão ideológica e a guerra política em torno da reforma da Previdência. Os técnicos dizem que sem ela não haverá salvação; o Governo afirma que visa garantir as futuras aposentadorias dos mais pobres; os esquerdistas afirmam que não há déficit, que a reforma é perversa e quer apenas garantir privilégios. Alguém estaria enganando, ou muito enganado.

Que venham os desdobramentos dos fatos a partir de fevereiro deste vertiginoso 2018. Como diria o Chico Buarque, “estou me guardando para quando o carnaval chegar.

        

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