A CASA DOS LIBION
Totonho
Laprovitera*
A história de expressivos artistas da MPB
passa pela casa de Lydia e Jacques Libion, na Travessa Santa Leocádia, 56, em
Copacabana, no Rio de Janeiro.
A iugoslava Lydia e o francês Jacques se
conheceram logo após o final da Segunda Guerra Mundial, na França, quando na
dor da perda de seus afetos se encontraram e se uniram no amor.
Assim sendo, decidiram morar no Brasil. Na
época, Jacques era representante da respeitável Hachette, uma tradicional
livraria e casa editorial francesa fundada em 1826. A partir daí, com
extraordinário carisma, o casal se destacou por atrair muita atenção e causar
boa impressão nas pessoas, naturalmente. Desse modo, prestigiado, tornou-se
muito querido e passou a reunir em seu lar os mais diversos intelectuais e
artistas nacionais e internacionais.
Lydia e Jacques, ainda, acolheram muita gente
das artes em sua morada, um autêntico mirante do azul localizado em uma
acentuada ladeira no coração da Zona Sul carioca. Por lá passaram: Elis Regina;
Fagner; Chico Feitosa; Miele; Joana Fomm; Maysa, Sérgio Mendes; Amelinha,
Nonato Luiz e Bernard Buffet – um dos pintores mais famosos do mundo pós-guerra
– dentre outros.
Coberta de arte e cultura, a casa dos Libion
se tornou patrimônio material e imaterial da cultura brasileira. Ambientada com
as mais diversas passagens, era um precioso santuário a guardar viva a nossa
memória.
Em cada canto da casa, nas paredes, quadros
dos mestres Bernard Buffet, Di Cavalcanti, Guignard e Chico da Silva, por
exemplo, descreviam a paisagem de tantas histórias que acendem as luzes dos
postes que iluminam uma rua chamada saudade.
Conheci Jacques e Lydia através do amigo
Raimundo Fagner, que os tinha como seus pais no Rio de Janeiro, desde quando o
casal soube que ele aniversariava no mesmo dia de um filho que havia perdido.
A última vez que vi Jacques foi por ocasião da
gravação do disco “Amigos e Canções”, do Fagner, no estúdio Companhia dos
Técnicos, em Botafogo, em 2004. Lembro como se hoje fosse, a canção era
“Saudade”, de Mário Palmério, e teve a participação da cantora Joana.
Após a partida de Jacques, Lydia ficou morando
só, mas sempre muito bem assistida pelos “filhos” Fagner, Lilibeth e Lulinha.
Certa vez, quando minha filha Joana foi
estudar teatro no Rio, Lydinha nos ofereceu um jantar de boas vindas. Para
reafirmar a nossa benquerença, ela deu de presente para Joana um pingente de
ouro em formato de coração, e disse: “Joana, receba o meu coração.”
Dos passeios que tive o privilégio de
compartilhar com Lydinha, dois permanecem bastante claros em minha memória: um,
à casa de Lilibeth em Araras, na região serrana do Rio de Janeiro, acompanhados
da maravilhosa e irreverente Alina Bulcão; outro, em Orós, no ardente sertão
cearense, em visitação aos domínios de Fagner, quando fomos hóspedes do “seu”
Eliseu Batista.
A última vez que estive com Lydinha foi em sua
histórica casa. Acompanhado de minha mulher Elusa e de meu filho Fernando
Victor, fomos muito bem recebidos, como sempre. Falamos sobre as coisas simples
da vida e de passagens corriqueiras que se tornam preciosidades existidas. A
sua lucidez nos alumiava e maravilhava.
Lydinha se foi em 12 de Maio de 2011.
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