PARECE CASTIGO
Reginaldo Vasconcelos*
Havia
uma mendiga em Fortaleza, lá pelos anos 70, a qual toda a cidade conhecia, pelo
método que ela adotava para enriquecer a sua féria de pedinte.
Cabocla
clara, talvez quarentona, sempre de vestido enfestado, suas formas roliças não denunciavam miséria absoluta, de modo que não se
enquadraria ela no célebre poema Verso e Reverso, de Padre Antônio Tomás:
“Essa
mulher de face escaveirada / que vês tremendo em ânsias de fadiga / estendendo
a quem passa a mão mirrada / foi meretriz antes de ser mendiga”.
No
caso, a criatura parecia não haver
atingido o “reverso” a que a poesia se refere, pois em querendo ainda tinha saúde para militar na mais antiga profissão, sem tremor de fadiga nem
fisionomia de caveira.
Pelo
contrário, ela sentava-se na calçada, recostada na fachada de uma loja, e fazia
um vigoroso alarido, clamando por uma moeda, por uma ajuda, apelando exageradamente à piedade dos passantes.
Quem
chegava à Praça do Ferreira, por qualquer vertente, já ouvia a latomia pungente
daquela mendiga, geralmente instalada entre a Leão do Sul e a Miscelânea, ou
entre esta e o Salão Lord.
Não
contente com as instâncias verbais chorosas, pedindo ajuda como se estivesse
afogando, com uma das mãos ela segurava a barra das calças ou o tornozelo de quem
lhe passasse mais próximo, enquanto estendia a outra em concha na direção do seu
virtual esmoleiro.
Muitos
censuravam a atitude de alguém de aparência sã, dotada de plena capacidade de
trabalho, e que recorria à caridade pública por comodismo ou por preguiça. A
grande ironia é que, certa feita, sentada no chão em sua função mendicante, na
esquina da Farmácia Teodorico, um veículo envolveu-se em acidente, no
cruzamento das ruas, subiu a calçada e lhe decepou uma das pernas.
Após
receber alta da Santa Casa de Misericórdia ela voltou a pedir esmolas, agora
exibindo uma real mutilação incapacitante, para enfim justificar a mendicância,
sem mais carecer de tanta súplica.
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Deu-se
muito parecido com a Presidente Dilma Rousseff nesta sua crise de governo,
quando ela recorreu à uma imaginária conjuntura mundial adversa para explicar os
efeitos de sua incúria e seus desmandos na economia brasileira.
Na
verdade, o drama econômico sistêmico internacional aconteceu em 2008, causado
pelo desequilíbrio financeiro americano, após o ataque às Torres Gêmeas e as
consequentes guerras no Islã.
Na
época, o então presidente Lula da Silva declarou que aquele tsunami na economia
do Primeiro Mundo chegaria ao Brasil como uma tênue “marolinha”, o que até se
confirmou, à medida que tudo se normalizou rapidamente.
Agora,
revelado o estado gravíssimo em que se encontram as nossas empresas estatais, sangradas
em bilhões de reais durante a administração petista para o financiamento de
campanhas, com o enriquecimento ilícito dos executivos envolvidos,
Dilma resolveu culpar pela sua desídia a velha “marolinha” ocorrida há sete anos.
Então,
como aconteceu com aquela mendiga cearense, a justiça divina parece lhe puniu pela blasfêmia. Sobreveio esta semana a explosão da bolha da economia chinesa, ameaçando de crash todas as
Bolsas de Valores. Agora tudo ficará ainda pior, e doravante a Presidente poderá
dizer, com alguma verdade, que o agravamento da nossa desgraça vem de fora. Parece
castigo.
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