terça-feira, 25 de agosto de 2015

ARTIGO - A Seca (RMR)

A SECA
Rui Martinho Rodrigues*

O centenário da seca do quinze é um ano de seca. Não temos o deslocamento de populações; epidemias; saques de cidades e outras tragédias que acompanhavam os anos de baixa pluviosidade.

A população rural já não migra. Extinguiu-se. Moradores das fazendas mudaram-se para as cidades. Não temos economia rural. A cotonicultura acabou e não foi substituída, como a carnaúba e a oiticica. A pecuária ficou reduzida a uma proporção diminuta.

As epidemias desapareceram por falta das grandes migrações de flagelados que propiciavam doenças extintas pela imunização e demais fatores ligados à modernidade.

O comércio movimenta negócios conforme o pagamento dos servidores públicos e dos programas de assistência social. Estes não sofrem alteração nos anos secos. Os carros pipa mitigaram o desabastecimento d’água.

As velhas obras contra os efeitos da secas deram algum resultado. O nosso semiárido apresenta a maior densidade demográfica entre os ambientes análogos em todo o mundo. A açudagem fixou populações, inclusive originando cidades, como Orós, Banabuiú, Forquilhas. Cidades usam água de açudes, como Campos Sales abastecida pela barragem Poço da Pedra, Senador Pompeu pelo açude Patu. Fizeram-se açudes e estradas em tempos de seca, empregando a mão-de-obra desempregada pela estiagem.

Hoje não são criadas frentes de serviço de emergência, como eram chamadas as obras destinadas a oferecer emprego aos rurícolas sem roça, desempregados pela seca. A assistência social não oferece oportunidade de trabalho. O consumo proporcionado por tal forma de assistência se encerra nele mesmo. Não investe nem não prestigia a cultura do trabalho. Não restam açudes, nem poços, nem estradas após a seca.

A transposição do S. Francisco não veio. O custo comparado entre ela e a dessalinização nunca foi divulgado. Agora, com as grandes empreiteiras envolvidas na Lava Jato é improvável que a tal transposição aconteça, logo em época de ajuste fiscal. O turismo voltado para sexo e drogas, limitado pela sazonalidade, é a única novidade, depois que as culturas tradicionais desapareceram.

A irrigação sofre com a evaporação dos trópicos, que leva a água e deixa os sais, prejudicando o solo. A piscicultura nunca foi suficientemente explorada. O aumento de consumo do precioso líquido foi ocasionado pela urbanização, a chegada do automóvel, a multiplicação de piscinas e a disponibilidade fácil de água encanada. Os reservatórios tornam-se insuficientes. É preciso construir novos açudes e ampliar alguns dos já existentes. Mas não temos notícias de tal coisa.

As represas Castanheiro e Aurora, no rio Salgado, poderiam fazer grande parte do que a transposição do S. Francisco faria, por um custo muito menor. Construí-las ensejaria empregos, injeção de recursos com as indenizações e o fornecimento para as obras, além de permitir uma grande provisão do líquido que nos falta nas secas. Até o Fronteiras, que esteve prestes a ser iniciado, foi esquecido.


A crise, além de política, moral e política, é também uma crise de falta de planejamento.


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