A FALTA QUE FAZ UMA REDE
Wilson Ibiapina*
No Nordeste brasileiro
tem gente que nunca dormiu numa cama. A rede de dormir, armada no quarto, é o
utensílio doméstico mais usado, principalmente no sertão.
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Escravos carregam senhor de engenho
em uma rede.
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É usada também
para o lazer, para enterrar mortos e como transporte no tempo do Brasil
colônia. Os senhores eram carregados em redes pelos escravos. As primeiras
portuguesas que chegaram ao Nordeste se apaixonaram pela rede e imediatamente
armaram o utensílio indígena nas varandas de suas casas coloniais. Foram elas
que também passaram fazer redes de algodão, com franjas. No Nordeste tem gente
que usa a rede até para fazer sexo.
Rubem Braga
registrou em crônica a visita que fez à cidade de Ibiapina, no Ceará. Passeando
pela Serra da Ibiapaba chegou à Ibiapina no final da tarde e procurou a única
pensão que existia na época. Foi recebido pelo dono, seu Alfredo, que era
também o principal barbeiro do município. Quando ele abriu a porta do quarto,
Rubem Braga tomou um susto. Um salão imenso, sem cama, sem armário, sem mesa,
sem nada.
– Onde vou
dormir?
Seu Alfredo
ficou indignado e respondeu com outra pergunta:
– Você está
chegando de onde?
– Do Rio, disse
Rubem Braga.
– Você é um
viajante relapso. Como é que vem de tão longe e não carrega sua rede?
Teve que ir ao
mercado para comprar uma, senão dormiria no chão.
Hoje, o uso da
rede está disseminado pelo país e pelo exterior. No Ceará, como dizia Jáder de
Carvalho, “peça pousada que terás água fresca para tua sede e rede cheirosa e
limpa para teu sono”.
Tem cearense
que não consegue dormir em cama. É o caso do jornalista Edilmar Norões que, em
visita a Brasília passou a noite sentado na cama do hotel, sem pregar os olhos.
No dia seguinte, caindo de sono pediu-me para ajudá-lo a encontrar um hotel que
disponibilizasse redes para os hospedes. Acredite, não existem aqueles ganchos,
chamados armadores, nos quartos dos hotéis de Brasília. Nos mais de 30 que
contactamos, os recepcionistas nem sabiam do que se tratava. Tem rede aí? - Que
rede? Internet, temos. Rede Globo?
Não adianta
trazer sua rede. Não tem como armá-la. O meu amigo conseguiu uma receita e foi
pra cama à base de lexotan. Parece que a cidade não foi construída por uma reca
de nordestinos.
Presente do
amigo Macário Batista para minha esposa
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