domingo, 2 de agosto de 2015

ARTIGO - Um Cearense na Guerra (WI)

UM CEARENSE NA GUERRA

Wilson Ibiapina*

Esse tal de comunismo já deu muito trabalho aos americanos. Quando Fidel assumiu o comando em Cuba, em 1959, você não imagina o tamanho do temor de que o comunismo tomasse conta da América Latina. 

O Presidente Kennedy criou a Aliança para o Progresso para tentar frear o avanço das esquerdas na região. Nos anos 60, os americanos viam o Nordeste brasileiro como região perigosa. Achavam que a miséria e a atuação de cearenses como dom Helder Câmara, dom Fragoso e Miguel Arraes, assim como a do pernambucano Chico Julião  fertilizavam as ideias marxistas. Durante dez anos os americanos despejaram no Nordeste  dólares, leite em pó e muitos jovens.

Em 1968, Fortaleza ficou cheia desses rapazes e moças americanos que fugiam do serviço militar como o diabo da cruz. No mesmo instante em que eles desembarcavam por aqui com medo de ir pro Vietnam, um cearense chegava a Saigon, hoje Ho Chi Min, como correspondente de guerra.

Luís Edgar de Andrade  é o único jornalista cearense que  cobriu a guerra do sudeste asiático. Levou na bagagem a experiência adquirida em redações de jornais do Ceará e do Rio, nada que se comparasse ao que viveu durante o ano de 1968 na mais sangrenta guerra de guerrilha que se tem notícia. 

José Hamilton Ribeiro perdeu a parte inferior da perna esquerda ao cobrir a guerra do Vietnã. Ele lembra que foram quase 2 mil repórteres que passaram por lá. Quarenta e oito morreram e 18 foram dados como desaparecidos.



Viu o companheiro brasileiro, hoje repórter do Globo Rural, acidentar-se. Estava apenas há 14 dias no Vietnam quando pisou numa mina.

Luís Edgar esperou mais de 30 anos para colocar suas lembranças de guerra num livro. E elas vieram em forma de romance, que acabo de reler.

Os correspondentes de guerra no Vietnam eram obrigados a usar o mesmo uniforme dos soldados americanos. A diferença era que no lugar da arma usavam papel, caneta, máquina fotográfica.

Edgar conta que o medo de ser apanhado por um vietcong fez alguns, como o filho do ator Errol Flynn, bordarem na farda a expressão bao chi. E obrigou o resto dos correspondentes a pronunciar “bao chi” (imprensa), que na verdade queria dizer “não atirem”.

O grito, em meio a batalhas significava, também e, principalmente, “imprensa, não me mate.” "Bao Chi! Bao Chi!" é o título do romance de Luís Edgar de Andrade, cearense de Fortaleza, formado em direito e filosofia e com pós-graduação em jornalismo na França.

Norma Couri escreveu no Jornal do Brasil: “Não se trata de uma reportagem nem de um livro de memória. É uma ficção que mistura o rigor da história de um jornalista tarimbado à glamourização e ao sexo ocasional que envolvem situações de muito perigo.

Também trata de personagens reais, como o colega José Hamilton Ribeiro, além de Peter Arnet, que a guerra do Golfo consagraria, Oriana Falacci e outros menos conhecidos.”

São 284 páginas e o protagonista da história é o jornalista Miguel Arruda, que perde o emprego e larga a namorada no Rio e parte para o Vietnam. Numa mesa de bar, ao longo do romance, Luís Edgar, como o personagem Miguel descreve sua adaptação à cultura e costumes do povo vietnamita, revelando bastidores do conflito e o segredo de uma cobertura.

Norma Couri diz que Bao chi, Bao chi traz suspense quase como num romance policial, mas relata situações verdadeiras vividas pelo correspondente. O livro mostra o ambiente de tensão, loucura, solidão e medo vivido pelos correspondentes.

Carlos Heitor Cony diz que o romance de Luís Edgar "só é comparável aos melhores textos de Hemningway, tanto na economia vocabular como na eficiência dos diálogos”. Como você deve lembrar, os americanos perderam a guerra.


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