NEOLOGIA NECESSÁRIA
Vianney Mesquita*
Pouca necessidade de pensar
experimentam aqueles que nunca precisam de palavras novas.
Com assento na sentença epigrafada, de autoria do
literato italiano Arturo Graf, de tripla nacionalidade, procedente de alemães,
nascido em Atenas e com registro de óbito em Turim (19.01.1848 – 31.05.1913),
firo este comentário acerca de um pequeno busílis, por mim topado, sempre que
se me depara algum escrito acerca da produção, comercialização, cultivo e
movimentação agrícola e econômica do coco-da-baía, principalmente, e outros
componentes palmáceos alimentares, amanhados como produtos para circulação no
mercado, classificados como pertencentes a um só gênero Coco – catulé, bocaiúva,
macaúba, coco-espinho etc – os três derradeiros, notadamente, para natural
sustento alimentar anima vili.
Não custa referir, pois é ensejado, ao fato de que o
babaçu, que no Nordeste do Brasil é tomado pelo vulgo como “coco-babaçu”, não é
parte do gênero Coco, mas pertence ao
Orbygnia phalerata, além de
constituir bem econômico de regular monta no âmbito do comércio de produtos de
procedência agrícola no País.
Mencionados estudos, cujos textos relatoriados são
por mim transitados para revista, procedem de programas brasileiros de
pós-graduação em Agricultura, stricto
sensu (com exame extensivo aos outros dois setores da produção), por exemplo, da Universidade Federal
de Viçosa, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ (USP-Piracicaba),
Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA-Mossoró) e, nomeadamente,
oriundos do Curso de Economia Rural, da
Universidade Federal do Ceará, Campus do
Pici, aqui em Fortaleza, um dos melhores programas de pós-láurea em curso no
Brasil.
O embaraço reside exatamente em determinar um
substantivo para bem retratar, nos relatos de suas investigações, a atividade
agrícola-econômica representada pelo Coco
nucifera – Linn. 1757, uma das
dezenas de espécies, da família Arecaceae,
inserta no gênero único de taxinomia do coco, o coco-da-baía, principal
cultivar dessa classificação, estudado em nossas escolas sob o prisma
científico, na conjunção dos vários ramos do disciplinamento ordenado a
envolverem seu exame.
Este impedimento não sucede, v.g., com a cultura do café, à qual, sem qualquer percalço de ordem
gramatical, linguística e elocutória, se concedeu o nome cafeicultura, com o “i” do meio fazendo a ponte com os dois
substantivos para formar o asserto híbrido, a fim de não retratar ideação
diferente (café-cultura, estabelecimento onde se toma café e se cultivam temas em
geral, café-livraria), bem assim – e, principalmente – com vistas a obedecer às regras de formação
vocabular da Língua Portuguesa, cujo trato, por não ser asado o ensejo, não há
de vir agora à colação.
A igual acontece com citricultura, relativamente a cítricos (gênero Citrus, família das rutáceas), plantação, cultura e exploração
econômica, por exemplo, de laranja e limão. E, assim, com sericicultura – criação do bicho-da-seda (Bombryx mory), beneficiamento, industrialização e comercialização
da seda; com olericultura – cultivo e
acrescentamentos econômicos de legumes; mangiferacultura
– plantação, acompanhamento dos cultivares de manga (Mangica indica); rizicultura ou
orizicultura – cultura e economia do
arroz (Oriza sativa); e tantas outras
ações agroeconômicas de ofício dos três setores produtivos.
O problema não subsistiria, caso a dicção coco não sugerisse, colada à sequente, a
formação de expressões cacofônicas, o registo de cacófato - palavra de som
feio, desagradável, discorde ou com sentido errado, advinda dos sons de dois
termos juntos; e de unidade de ideia obscena, grotesca ou descontextualizada,
proveniente da sílaba final de um vocábulo e a inicial do outro. Isto se dá em decurso
de um termo seu homógrafo imperfeito, parônimo – cocô – representativo de excremento e coisa de má qualidade.
Desta sorte, convenhamos, é defesa, por absolutamente
descabida, a referência a “cococultura” (aqui como a sugestionar um exame
parasitológico de material excrementício), ou a “cocoicultura”, cujo “i” certa
pessoa já sugeriu como ligação, a fim de reduzir o efeito da cacofonia, no
entanto (me parece), ideia desprovida de sucesso. No tentame de aportar a uma
solução, outras insinuações vocabulares apareceram, entretanto, deseixadas de
ideação lógica e revéis às normas de formação glossológica em Português, como
nos casos de coquicultura, e cocucultura – este que me ressoa ainda
mais desarrazoado.
Louvado, com efeito, na configuração latina da
denominação taxinômica efetivada pelo célebre e operoso naturalista sueco
Carlos de Lineu, em 1757 – Coco nucifera
– penso haver encontrado uma proposição verossimilhante, consistente em
ajuntar, como primeiro elemento do hibridismo ora sugerido, a palavra nucifera, (+ cultura) com
esteio nas razões aduzidas na sequência.
Impende-me, então, elucidar, considerando, em
primeiro lugar, o fato de que alguém aventou – e os lexicógrafos,
inadvertidamente, aceitaram, introduzindo o verbete nas obras de referência – a
expressão nucicultura, como
representativa da intenção de “cultura de nozes”, todavia procedente apenas das
diversas ocorrências de nogueira, como, por exemplo, nogueira-americana ou
nogueira-pecã (carya illynoensis),
nogueira-brasileira ou nogueira-de-iguape (Aleurites
mollucana), nogueira comum (Juglans
regia), nogueira-da-austrália ou
macadâmia (Macadamia ternifolia) et reliqua.
Conquanto, sob o prisma da evolução histórica, nuci se reporte a nogueira, a inserção
definitiva e oficial da unidade de ideia nucicultura,
especificamente para nogueira, nos
dicionários é, sem dúvida, no mínimo, apressada, porquanto nuci, como antepositivo, do Latim, alcança todo fruto com amêndoa,
castanha, noz e outros, como o são, exempli
gratia, a castanha-de-caju, fruto do cajueiro (Anacardium occidentale) – pegada ao pedicelo comestível (caju), bem
como todas as espécies do gênero Coco (único).
De tal maneira, pelo fato de estar permanentemente
sob registro lexicográfico, é interdito se empregar nucicultura, a não ser para o bem originário das diversas espécies
dessas árvores produtoras de nozes – ficando de fora coco-da-baía, catulé ou
babão, macaúba, macaíba e quaisquer outras palmáceas.
A sugestão, por conseguinte, é a de se cunhar a
palavra NUCIFERACULTURA, a fim de
descrever, para emprego nos textos de exame científico, a plantação, o cultivo
e seus desdobres econômicos – evidentemente com os inerentes nexos sociais –
uma vez que a palavra é bem formada, de nuci
– envolvendo todo fruto com noz – somada a fera,
também Latim, elemento pospositivo, representativo de “que traz”, “conduz” –
isto é, feito de nozes.
Malgrado em detrimento das demais espécies do gênero Coco, as quais praticamente não possuem
representatividade econômica, sendo parcas, por tal pretexto, referências mais
alentadas na literatura da Economia Agrícola, sobra, pois, como alvitre a
expressão neológica nuciferacultura,
para aplicação em textos de manifestação do saber parcialmente ordenado
relativo a coco-da-baía (Coco nucifera).
Minha expectativa é de que, dentro em poucos anos, os
glossários das ciências ditas aziendais,
ligadas ao ecúmeno rural, incorporem a sugestão, restando, também, a
probabilidade de, em poucos decênios, ou mesmo antes, os dicionários oficiais
da Língua Portuguesa, circulantes nos nove países lusofônicos, apropriarem a
elocução, ao jeito como procederam com relação à unidade de ideia nucicultura, devidamente em si
consignada em tempo relativamente curto.
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