MARTELADAS NO GÓLGOTA
Assis Martins*
É preferível sofrer a morrer. Eis a divisa do homem. (ANATOLE FRANCE).
É preferível sofrer a morrer. Eis a divisa do homem. (ANATOLE FRANCE).
Lá pelos anos de
Cabral fazia tudo: era diretor, ator, maquinista,
contrarregra, eletricista e até
dava pitacos na confecção dos cenários feitos de papel de cimento, pintados com tinta xadrez. Já idoso, tinha muitas manias, uma das quais era anunciar o começo dos atos, dando três marteladas no piso do palco, para chamar a atenção do público.
dava pitacos na confecção dos cenários feitos de papel de cimento, pintados com tinta xadrez. Já idoso, tinha muitas manias, uma das quais era anunciar o começo dos atos, dando três marteladas no piso do palco, para chamar a atenção do público.
Naquele dia, como sempre, fazia o papel de São Pedro
e preparou-se para dar o famoso sinal do início do emocionante quadro do Monte das Oliveiras, quando Jesus
é levado pela guarda pretoriana. Eis que, porém, o Zé, contrarregra novato,
doido para mostrar serviço, abriu o pano ainda na segunda martelada, deixando o
Cabral em cena com o martelo escondido sob o manto, no conhecido gesto de
Napoleão.
A plateia não percebeu o desconforto dele
contracenando com a mão escondida na manga do manto, nem mesmo quando,
desajeitadamente, desferiu o golpe que cortou a orelha de Malco, o centurião
que fora prender Jesus.
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