O PECADO DA DILMA
Reginaldo Vasconcelos*
Algumas religiões preconizam que todo mundo
está condenado a pecar. Que, em face das fraquezas humanas, até mesmo os santos
pecam, razão pela qual precisaríamos de constante contrição, arrependimento, orações, sob pena de que a alma se perca e não obtenha a salvação eterna.
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Curiosamente, aquela vertente mística
coloca sob a responsabilidade de cada um tudo que ele faz, ou deixa de fazer,
enquanto o pensamento materialista de Sartre comete todas as culpas a Deus, entidade
de que ele próprio nega a substância e a existência.
Sim, porque o “destino” – que determina a
sorte de todos e de cada qual – é o primeiro aspecto da divindade, restando
entender que esse “deus-fadário” seja lógico e justo, ditando boas normas de conduta,
ou seja meramente aleatório, elididos totalmente os conceitos de disciplina e de moral.
Para aquele pensador, cabe ao destino
(Deus) oferecer a cada um as condições ideais para que possa discernir sobre o
bem e o mal, e encaminhar-se pela rota da virtude – ou sair cometendo crimes, pecados e erronias
em geral, por lhe faltarem alternativas – tanto pelo parco descortino da sua
mente, quanto pela falta de oportunidades fáticas para conduzir-se com grandeza.
Eu tendo a fazer um temperamento filosófico
para, em termos, concordar com ambas as partes. Mas, para mim, tudo passa pelas
questões da ética, que nenhum dos dois pensamentos faz referência e conceitua: “A ética é a
disposição pessoal para assumir e cumprir compromissos – tácitos e expressos,
implícitos e explícitos – consigo mesmo, com o próximo, com toda a sociedade”.
As Igrejas impõem a ética religiosa aos
seus fieis, conforme as suas escrituras (códigos geralmente focados no bem comum, conforme sua
moral histórica), e condenam os transgressores aos castigos da
danação infernal. Mas as Igrejas reconhecem que, em virtude da rigidez dos
ditames, ninguém mantém conduta absolutamente reta – mas pode ir corrigindo a
trajetória pela via do arrependimento, para ao final obter o perdão divino pleno.
Sartre, por seu turno, percebe que os
pecadores são aéticos, já que descompromissados, moral e socialmente, porque lhes
faltaram exemplos de vida e experiências luminosas – ou então, ainda por
ignorância, resolverem obedecer a éticas marginais, e então pervertem a
hierarquia lógica devida aos grandes pactos da existência.
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Excepcionando a ética jurídica, corre por
fora a ética personalíssima, de especial caráter eximente – aquela ética que
admite o furto famélico, o homicídio em legítima defesa, o silêncio dos
indiciados por crimes, os quais se recusem a produzir provas contra si.
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Então Deus (ou o destino) lhe deu uma segunda
chance, agora já politicamente redimida e reconciliada com a própria consciência,
e com a experiência acumulada dos maus-passos do passado, tendo portanto “a faca e o queijo”
para produzir agora uma boa obra política e praticar justiça social.
Mas então vieram os aloprados, o suplício
do Celso Daniel, o cuecão, o mensalão, o Rosymarão, o Erenissão, o Lulinhão, o Petrolão,
o Eletrolão, o Collorão, o Eduardão, o Pimentelão – que se saiba até agora –
enfim, o desvio de verbas, o enriquecimento ilícito de líderes e de aliados,
a mentira pública sistemática, o assistencialismo desvairado com objetivo
eleitoreiro...
Dilma quebrou o País e envergonha a Nação, incorrendo
em responsabilidade objetiva. Sim, porque neste caso, embora até agora não se
lhe tenham encontrado as digitais nos atos sujos, estão evidentes os rastros da
Ministra e da Presidente, rondando e dominando a cena dos crimes.
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Gritam deputados, ameaçam
os serventuários da Justiça, urra o MST, reclamam os petistas beneficiários de sinecuras, berram os que se tornaram dependentes dos programas sociais. Aliás, é este o brado que está no ar pelo Planalto Central, e pelo resto do País: “Já que não se moralizou a República, locupletemo-nos
todos!”.
Não. Dilma Rousseff passa muito daquela
adúltera da Bíblia, que uma vez foi vencida por instintos carnais, traiu a velha
ética jurídica, a ética familiar, a ética religiosa de seu tempo, porque
o destino a expôs a uma tentação irresistível. Foi inocentada pelas
circunstancias, segundo o pensamento de Sartre, e foi merecedora do perdão de
Cristo, pelo arrependimento. Nenhuma dessas razões pode socorrer Dilma
Rousseff.
Pecar, todos pecamos, como quer a religião – seja pelos equívocos circunstanciais, seja pelos apelos mundanos, a pressão das
demandas da vaidade e da ambição. E muitos só não pecam mais, e mais
gravemente, por medo de que a punição os possa alcançar, ou, pior ainda, por falta
de boas ensanchas do destino que lhes favoreça a delinquência.
Mas, para seguir as regras de Deus que os
católicos pregam, e não incorrer na casualidade errática do destino a que
Sartre se refere, cumpre a cada um se manter na boa senda, unicamente pelos
próprios princípios. Para atirar a primeira (e a milésima) pedra moral contra a pecadora Dilma Rousseff estão habilitados todos aqueles que pautam a vida pelo melhor desiderato:
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