segunda-feira, 19 de outubro de 2015

ARTIGO - O Pecado da Dilma (RV)

O PECADO DA DILMA
Reginaldo Vasconcelos*


Algumas religiões preconizam que todo mundo está condenado a pecar. Que, em face das fraquezas humanas, até mesmo os santos pecam, razão pela qual precisaríamos de constante contrição, arrependimento, orações, sob pena de que a alma se perca e não obtenha a salvação eterna.

Já o filósofo agnóstico Jean-Paul Sartre defendia que todos eventualmente erram, mas que ninguém incorre em pecado, porque as escolhas e condutas tomadas por cada um lhe seriam sempre as únicas opções viáveis, em suas específicas condições psíquicas do momento e em cada circunstância vivencial que o destino lhe impõe.

Curiosamente, aquela vertente mística coloca sob a responsabilidade de cada um tudo que ele faz, ou deixa de fazer, enquanto o pensamento materialista de Sartre comete todas as culpas a Deus, entidade de que ele próprio nega a substância e a existência.

Sim, porque o “destino” – que determina a sorte de todos e de cada qual – é o primeiro aspecto da divindade, restando entender que esse deus-fadário seja lógico e justo, ditando boas normas de conduta, ou seja meramente aleatório, elididos totalmente os conceitos de disciplina e de moral.

Para aquele pensador, cabe ao destino (Deus) oferecer a cada um as condições ideais para que possa discernir sobre o bem e o mal, e encaminhar-se pela rota da virtude – ou sair cometendo crimes, pecados e erronias em geral, por lhe faltarem alternativas – tanto pelo parco descortino da sua mente, quanto pela falta de oportunidades fáticas para conduzir-se com grandeza.

Eu tendo a fazer um temperamento filosófico para, em termos, concordar com ambas as partes. Mas, para mim, tudo passa pelas questões da ética, que nenhum dos dois pensamentos faz referência e conceitua: “A ética é a disposição pessoal para assumir e cumprir compromissos  tácitos e expressos, implícitos e explícitos  consigo mesmo, com o próximo, com toda a sociedade”.  

As Igrejas impõem a ética religiosa aos seus fieis, conforme as suas escrituras (códigos geralmente focados no bem comum, conforme sua moral histórica), e condenam os transgressores aos castigos da danação infernal. Mas as Igrejas reconhecem que, em virtude da rigidez dos ditames, ninguém mantém conduta absolutamente reta  mas pode ir corrigindo a trajetória pela via do arrependimento, para ao final obter o perdão divino pleno.  

Sartre, por seu turno, percebe que os pecadores são aéticos, já que descompromissados, moral e socialmente, porque lhes faltaram exemplos de vida e experiências luminosas – ou então, ainda por ignorância, resolverem obedecer a éticas marginais, e então pervertem a hierarquia lógica devida aos grandes pactos da existência.

A norma correta é seguir primeiro a ética jurídica (entrevista no “contrato social” concebido por Jean-Jacques Rousseau), em seguida a ética familiar (em que, analogicamente, se insere a ética da amizade). Logo depois se deve observar a ética profissional. Na sequência, a ética religiosa, que se confunde com a ética moral. A tabeliã evangélica americana que se recusou a certificar casamento entre homens, por exemplo, inverteu essa ordem, subjugando a lei à sua fé, e nisso foi apoiada e elogiada pelo Papa.

Excepcionando a ética jurídica, corre por fora a ética personalíssima, de especial caráter eximente – aquela ética que admite o furto famélico, o homicídio em legítima defesa, o silêncio dos indiciados por crimes, os quais se recusem a produzir provas contra si.

Dilma Vana Rousseff, moça bonita e bem nascida, encantou-se pela utopia marxista e elegeu a ética espúria da violência, da luta armada, enveredando pelo terrorismo, em nome de uma pretensa fórmula perfeita de justiça social absoluta. Deus lhe dotara de um espírito rebelde e o destino a aproximou de algum revolucionário. Assim, segundo a análise de Jean-Paul Sartre, ela fez então aquilo que lhe parecia mais correto. Mas, estava errada, e pagou caro pelo seu erro.

Então Deus (ou o destino) lhe deu uma segunda chance, agora já politicamente redimida e reconciliada com a própria consciência, e com a experiência acumulada dos maus-passos do passado, tendo portanto “a faca e o queijo” para produzir agora uma boa obra política e praticar justiça social.

Mas então vieram os aloprados, o suplício do Celso Daniel, o cuecão, o mensalão, o Rosymarão, o Erenissão, o Lulinhão, o Petrolão, o Eletrolão, o Collorão, o Eduardão, o Pimentelão – que se saiba até agora – enfim, o desvio de verbas, o enriquecimento ilícito de líderes e de aliados, a mentira pública sistemática, o assistencialismo desvairado com objetivo eleitoreiro...




Dilma quebrou o País e envergonha a Nação, incorrendo em responsabilidade objetiva. Sim, porque neste caso, embora até agora não se lhe tenham encontrado as digitais nos atos sujos, estão evidentes os rastros da Ministra e da Presidente, rondando e dominando a cena dos crimes.

O seu Governo continuou alimentando os abutres políticos em nome da sua governabilidade e da manutenção do seu mandato, como já fazia Lula, e o que se vê agora é uma luta de carniceiros sobre a carcaça da Nação – “Farinha pouca, meu pirão primeiro!”. 

Gritam deputados, ameaçam os serventuários da Justiça, urra o MST, reclamam os petistas beneficiários de sinecuras, berram os que se tornaram dependentes dos programas sociais. Aliás, é este o brado que está no ar pelo Planalto Central, e pelo resto do País: “Já que não se moralizou a República, locupletemo-nos todos!”.
 
Não. Dilma Rousseff passa muito daquela adúltera da Bíblia, que uma vez foi vencida por instintos carnais,  traiu a velha  ética jurídica, a ética familiar, a ética religiosa de seu tempo, porque o destino a expôs a uma tentação irresistível. Foi inocentada pelas circunstancias, segundo o pensamento de Sartre, e foi merecedora do perdão de Cristo, pelo arrependimento. Nenhuma dessas razões pode socorrer Dilma Rousseff.

Pecar, todos pecamos, como quer a religião  seja pelos equívocos circunstanciais, seja pelos apelos mundanos, a pressão das demandas da vaidade e da ambição. E muitos só não pecam mais, e mais gravemente, por medo de que a punição os possa alcançar, ou, pior ainda, por falta de boas ensanchas do destino que lhes favoreça a delinquência.

Mas, para seguir as regras de Deus que os católicos pregam, e não incorrer na casualidade errática do destino a que Sartre se refere, cumpre a cada um se manter na boa senda, unicamente pelos próprios princípios. Para atirar a primeira (e a milésima) pedra moral contra a pecadora Dilma Rousseff estão habilitados todos aqueles que pautam a vida pelo melhor desiderato:

Não roubo, não furto, não fraudo, não minto, não traio, não adultero – porque do contrário feriria a minha ética pessoal – indiferentemente de hipotético castigo, e não me interessando as aliciantes vantagens da eventual impunidade”.


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