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Edmar Santos*
Roberto trazia
consigo um caixa de dúvidas, que guardou em seu arquivo mental; resolveu
remexê-la e tentar solucionar algumas delas. De sorteio pensante resultou na
escolha, talvez, da mais complexa: “Por que vivo, o quê, e como vivo?”. Sua
cabeça doía.
Não possuía a
cinemática dos filósofos e sua inquietude, ao invés de fazê-lo parar para
reflexões, o fazia sentir vontade de caminhar. Era como se a dinâmica de suas
pernas lhe gerasse energia cerebral para raciocinar sobre resoluções dos
problemas que o afligiam. E a dúvida presente lhe faria caminhar muito!
O tênis Adidas, já
surrado, lhe era velho companheiro das andanças, e nesta, ante a proximidade do
fim de vida útil, talvez fosse realmente a última. Calçado com o sempre
parceiro, Roberto saiu de casa e, circundando a lagoa do bairro Parangaba, cuja
margem encontra-se em obras de requalificação, seguiu a paços lentos pela Avenida
José Bastos, em direção ao Centro da Cidade. Escolheu ir, sem saber para onde.
Pensamento viajante,
buscava entender:
– Sou o que vivo. O que consegui ser! – sua
consciência dialogava com ele.
– Se afirmares, não tens dúvida.
– Afirmo, no entanto não sei o que me fez
chegar a viver assim.
– Talvez a resposta seja refazer o caminho.
– Daí eu necessitaria voltar ao ventre de
minha mãe. E claro, é impossível!
– Não está em exercício de pensamento? Refaça-o
assim: pensando, lembrando, refletindo. Regresse!
– Parece fácil quando você propõe. Mas não
consigo! Já tentei outras vezes; não é novidade o que diz.
– Não, não é! Mas
você bem que pode procurar a ajuda de quem possa lhe direcionar. Em seu tempo
existem pessoas que lidam com isso.
– Agora você está tentando me convencer que
estou... sei lá... doente?
– Não, estou nos
auto-preservando, porque doentes é o que seremos se você não resolver essa
angústia. Te dou uma pista que pode ajudar: somos frutos de nossas escolhas, ou
do que escolheram pra nós e passivamente seguimos. O que dá no mesmo.
– Quer dizer que sou eu o culpado do que sou e
vivo? Tolice! Que pensamento é esse agora?!
– Não se trata de culpa, mas sim de consequências.
Vamos lá, não seja tão duro consigo
mesmo; melhor, conosco!
Sua consciência lhe
apresentara uma possível solução, ou caminho para ela. Reconhecer o
protagonismo sobre a própria vida, afastando-se do vitimismo; reconhecer que
sozinho é mais difícil e procurar ajuda, talvez fosse o grande momento de
reorganização do arquivo mental, cuja bagunça lhe trazia ansiedade e estresse.
Um lugar para ir.
Roberto sentiu uma
leve brisa no dedão do pé esquerdo. Olhou e viu que o Adidas não resistiu à
caminhada e rasgou. Viu que seu amigo lhe indicara a hora de voltar para casa.
Pelo celular, pediu um UBER.
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