segunda-feira, 26 de março de 2018

RECENSÃO - Literatura da Profa. Graça Martins (VM)



Literatura Filosófico-Científica Inusitada na Crônica da
Prof.a D.ra Graça Martins
Vianney Mesquita*



Filosofia, doce leite da adversidade! (Guilherme Shakspeare).

A Natureza não dá saltos. (Godofredo Leibniz).



Para o observador menos devotado ao exame procedimental do trato científico, pode afigurar-se inacreditável - no mínimo, surpreendente - a ideia de ser possível a vinculação racional em vertentes de aparências dessemelhantes, de procedências tão supostamente díspares, como esta admirandamente comprovada pela Autora de O HOMEM nas Abordagens Mecanicista e Humanista da Administração e no Humanismo de Inspiração Cristã.

Maria da Graça Holanda Martins publicou o mencionado livro em ótima ocasião, propícia a excitar, ainda mais, a já efervescente reflexão, felizmente em uso atual na ambiência da nossa Academia. Isto porque – e ela de sobra conhece este suposto – o exame do conhecimento parcialmente ordenado não tem por objeto o saber particular, pois é inexequível reunir em insulado conceito, estabelecer apenas em uma lei, a enorme quantidade de detalhes e situações particulares, constitutivas do ser ou do fato individual: Omne individuum inefabile, conforme ensina a velha, revisada tantas vezes e, em muitos pontos ainda, acreditada Escolástica.

Nas alegações expressas nessa produção, eminentemente interdisciplinar, a Pesquisadora não perde o foco, portanto, das grandes ligações da totalidade do ser, deixando de assujeitar-se ao perigo de reduzir a visão a um apoucado domínio da técnica, em virtude do desdobramento dos objetos, o qual conduziu o debate da Ciência a uma progressiva especialização.

A Escritora demonstra, com efeito, no seu substancial e bibliograficamente bem forrado escrito, o caráter extensivo, a feição horizontal e o perfil encadeado da compreensão ordenada, quando acolheu para arguir, sob o mesmo pálio argumentativo e a umbela plural, o tema da Administração Científica e da Teoria da Burocracia (esta havida pelo teórico alemão Max Weber como modalidade de poder), com base na conceição de homem esposada nas abordagens mecanicista-humanista da Ciência/técnica de Taylor e Fayol, para saber se e até onde a ideação de humano, nesses dois sistemas, converge para ou se desvia da homovisão do Humanismo de inspiração cristã, divisado, e.g., por Pedro Dalle Nogare, em Humanismos e Anti-Humanismos (Petrópolis: Vozes, 1977).

Conforme já se dessume, a despeito da postiça falta de identidade temática, os assuntos são passíveis de avaliação, todavia solicitam a necessária diligência intelectiva, a exigir do estudioso a prontidão suficiente para fruir de juízos absolutamente racionais, a fim de podê-los partilhar com todo o ecúmeno, felizmente numa mensuração facilitada, pois serenamente transitados pelas indicadas sistematizações da ordem metodológica, provindas das instruções de filósofos e metodólogos de ofício.

Esses aprontos intelectuais, é claro, a Autora detém elevadamente, porquanto os resultados do seu ensaio podem ser socializados, haja vista representarem nascente de fé e manifestação de verdade por parte de quem, por toda a vida, mourejou em bancos e laboratórios idôneos, bem como fez da inteligência atelier de raciocínio, forja de experimentos e terreno de prova.

Conquanto possa antecipar o proveito da investigação, achei por bem não o fazer, a fim de não baldar a curiosice do futuro consulente do livro, tampouco frustrar a sofreguidão daquele leitor mais pressuroso, cuja necessidade orgânico-psíquica o levará a consumir, de uma vez, todo o teor do curto (116 pp.) e substancioso esforço triunfante de pesquisa.

De passagem, no entanto, me impende atentar para o recheio interdisciplinar do texto, pois reúne o enredamento profuso, quase desacostumado, de vários contextos disciplinares – Administração, Filosofia Humanista, Religião, Trabalhismo, entre outros – concedendo horizontalidade ao feito científico, conjunção de procedimentos multíplices, significativos de parêmia da Filosofia Escolástica, por onde lidaram Thomas de Aquino, Guilherme de Occam, Duns Scotto Erígena e tantas outras figuras da inteligência medieval, bem como seu discipulado ainda hoje resistente.

O brocardo há segundos mencionado configura a ideia de o todo individualizado ser inexprimível. Inexiste, por conseguinte e em tese, o saber particular: Non datur scientia de individuo.


Nota: A modo de exercício, não há neste texto qualquer uso do vocábulo que.




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