O
ATO DE LAVAR AS MÃOS
Rui
Martinho Rodrigues*
Caminhoneiros interrompem o trânsito nas estradas. Por mais
legítimas que seja as suas razões, eles estão se apoderando de um bem público
de uso comum, prejudicando o direito de ir e vir de quem por ali passa. Poderiam
simplesmente parar o transporte de carga e ocupar o acostamento, como forma de
luta pelas suas reivindicações. Mas propalou-se a ideia segundo a qual
prejudicar terceiros inocentes, relativamente a um litígio entre partes, é uma
prerrogativa da cidadania.
Os atos administrativos têm o arrimo da presunção juris tantum de legitimidade e a
prerrogativa de autoexecutoriedade. Caso alguém atravesse um carro na avenida
13 de maio, a autoridade do trânsito pode mandar rebocar sem precisar pedir
autorização ao Poder Judiciário, porque, até que se prove o contrário, sua
decisão é legítima e pode ser executada autonomamente. Caso assim não fosse o
Judiciário seria afogado por demandas de iniciativa do Poder Executivo e o
governo seria exercido pelo Judiciário, configurando a tão falada
judicialização da política.
A Polícia Rodoviária Federal não precisa de ordem judicial
para desobstruir vias. A Advocacia Geral da União sabe disso, mas ainda assim
recorreu ao Judiciário para desobstruir estradas. A explicação para mais esta
manifestação da judicialização da política, com todos os seus inconvenientes, é
simples: hoje as pessoas estão fugindo às suas responsabilidades. Trata-se de
uma atitude que pode denotar demagogia e configura prevaricação. Quem não quer
assumir o desgaste do exercício do poder se omite e joga o problema para o
judiciário.
O demagogo, ao contrário do estadista, não pensa na próxima
geração, mas próxima eleição. A sabedoria, no mal sentido, é um bicho que
quando cresce demais engole o dono. As próximas eleições poderão expressar a
insatisfação de quem não pode transitar nas vias públicas porque o governo não
exerce as suas funções, com o objetivo de evitar o desgaste eleitoral. Este é apenas um exemplo entre muitos.
*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político
Titular Emérito de sua Cadeira de nº 10
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