A CHAVE DEZESSETE
Reginaldo
Vasconcelos*
UMA
HISTORINHA VERÍDICA NADA-A-VER
O amigo ia se casar em Estado vizinho e nós fomos de
camioneta assistir à solenidade. Fomos, testemunhamos, apadrinhamos, lançamos
arroz sobre o casal, e no final da tarde partimos de volta pela estrada.
Veículo novo, asfalto bom, boa conversa, até que ao cair da
noite, enquanto ameaçava chover, o motor a diesel da camioneta rateou. No mesmo momento o
celular chama de casa, e de lá a mãe indaga se a viagem corre bem.
Mentimos, mas apelamos: “Está tudo bem. Mas, por via das dúvidas, acenda uma vela e peça
proteção ao santo de sua confiança”. Logo em seguida o carro engasgou de
vez e fomos para o acostamento.
Noite escura, chuvinha fina. Mulher e criança acenando na margem
da estrada, pedindo socorro aos que passavam, em nome da família – os homens no escuro, arma de fogo
ensarilhada, para o caso de atrairmos algum assaltante oportunista.
Até que um raro carro parou, e na cidade mais próxima
contratamos um mecânico. Havia ar no sistema, ele “sangrou” o motor e nós
saímos do prego, agora conhecendo o problema, mas sem saber a sua causa.
O carro pifava a cada lombada, na entrada de cada cidade, e
em cada uma delas tínhamos que acordar um mecânico para fazer a tal sangria.
Após vários episódios, aprendemos a fazê-lo, mas não tínhamos a chave de boca adequada aos ditos “bicos de injeção”.
Após uma longa negociação com o vigia de um posto de
combustíveis, compramos, a peso de ouro, uma velha chave de boca de 17 milímetros, e viemos nós
mesmos fazendo a operação para o motor ressuscitar, a cada quebra-molas, a cada passagem de nível, a cada catabil. Ao todo, paramos 17 vezes –
a última delas já na madrugada, na
chegada ao nosso destino.
No outro dia soubemos a causa daquele defeito mecânico
intermitente: o hábito de admitir combustível no tanque além do volume recomendado
forçou e fraturou a peça que suga o diesel, conhecida como “pescador”. Por isso,
a cada vez que uma lombada agitava o líquido, expunha a fratura e o motor “pegava
ar”.
A
HISTÓRIA VERÍDICA TUDO-A-VER
Pois bem. Assim como no caso narrado com a chave 17, uma
velha ferramenta adquirida no escuro, para nos dar uma chance de conduzir a
família a um porto seguro – a saída para um País que está em pane é recorrer à fé cristã, à autotutela, apostando na esperança como a única saída.
Porém, é absolutamente lúcido quem tenha certeza de que a
continuação da era petista será ruim, pois a experiência mostra que, quanto a
isso, sensatamente, não pode restar dúvida nenhuma.
De Lula a Temer, com a Dilma de permeio, o Brasil afundou
em corrupção. As grandes empresas estatais quase quebraram, a violência cresceu
e a economia naufragou, diante da crise fiscal e do descrédito dos mercados – e
até o candidato da esquerda já fez de público essa autocrítica.
Não. Não estou expressando posição política nem convicção ideológica
– nem medo, nem ódio – estou falando de evidência lógica, pela mais objetiva
experiência jornalística, falando de uma constatação fática já registrada pela
História.
O problema é que a lógica cartesiana não é componente da
paixão política, nem da cegueira ideológica. Aliás, a paixão e a razão são
naturalmente antagônicas. Os que insistem em confrontar os fatos óbvios e
pragmáticos o fazem por pulsões deletérias aos interesses nacionais.
É claro que entre a certeza do fracasso e a dúvida de
sucesso, esta última deve prevalecer em nome da esperança e do otimismo – como possibilidade, como aposta, como
alternativa – aquilo que em Direito se denomina “risco permitido” e em economia
se chama “risco calculado”.
Defender uma bandeira rota porque à sua sombra se obteve algum
proveito pessoal, e execrar uma legenda nova com base em ranços políticos do passado – ou para defender eldorados quiméricos intelectualmente concebidos, embora inviáveis na prática – é desprezar a cidadania de forma nada patriótica, destituído de genuíno espírito
público.
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