quinta-feira, 11 de outubro de 2018

ARTIGO - Pequeno Tratado Sobre a Ética (RV)


PEQUENO TRATADO
SOBRE A ÉTICA
Reginaldo Vasconcelos*


O noticiário brasileiro e mundial tem sido dramático nestes dias. Terremotos, tsunamis, erupções e furacões sacodem as regiões menos felizes, no que tange a situações sismológicas e meteorológicas do Planeta.

Mas também quanto à ação humana sobre a Terra as notícias são dantescas – o jornalista assassinado na embaixada de seu país, em outro país, e a filha que mata a mãe pela herança, com a ajuda do marido.

A família morta em acidente de trânsito na estrada, com um infeliz sobrevivente ileso de três anos de idade, que passou três dias velando os destroços e os cadáveres na mata, antes de ser localizado.  

Na política interna, a “cavalaria” federal a tanger uma “boiada” de políticos profissionais corruptos para os “currais” presidiais, exatamente quando o País tenta fazer uma faxina moral através do voto.     

Deus, em sua concepção absoluta, está acima do bem e do mal, de qualquer ética e qualquer lógica. Sua vontade é soberana e aleatória, em relação a todos os destinos fragmentários do universo. Mas as duas outras vertentes divinas, a racional e a intuitiva, essas já se vinculam aos compromissos éticos firmados entre a pessoa e a sociedade, entre a sociedade e a Natureza.

A ética é matéria de estudos e palestras, é cátedra universitária em que especialistas diplomados discorrem sobre o tema, e sobre o mesmo tema editam livros e tratados. Mas ninguém define com exatidão o que objetivamente seja “ética”, que permanece um conceito um tanto vago e impreciso.

Mas é fácil entender a ética como o conjunto deontológico de pactos que os seres racionais são obrigados a firmar – consigo mesmos, com os circunstantes, com estamentos sociais – sejam explícitos, sejam tácitos, para viabilizar a existência gregária pelo estabelecimento dos “costumes”.

À medida que a sua consciência amadurece, a nova pessoa vai percebendo o que deve fazer e não fazer, segundo as necessidades existenciais e os regramentos da vida em sociedade, e a partir daí vai elegendo as suas condutas e vai formatando o seu caráter.

O mandamento católico “não matarás”, correspondente à norma penal que tipifica “matar alguém” como o crime principal – não infringi-los é o primeiro compromisso que a ética jurídica e a ética mística nos impõem, seguido pelo respeito ao patrimônio alheio – que desde a infância, tacitamente, se assume.

Para além das cautelas que a sensatez nos aconselha, em última instância ninguém está livre das tragédias. São “atos de Deus”, como a Marinha da Inglaterra as qualifica. Mas dos delitos jurídicos e morais é possível se abster, para manter a lisura e evitar a desgraça dos repreendidos e apenados.

Estranhamente, talvez por falha no DNA do seu caráter, ou má formação familiar, quem sabe em resposta a experiências mais agudas vividas, alguns indivíduos não suportam as pressões da competição social e do consumismo e se munem de disposição e coragem para a delinquência contumaz – mentir, roubar e até matar, se necessário, para a satisfação de sua concupiscência desmedida.

Há outros que não enveredam por essa senda amoral e desonesta, apenas por falta de oportunidade ou de coragem. Não se impõem freios éticos para manter conduta lícita, mas a falta de propostas e ensejos desonestos de aparência segura – e o medo da punição penal – vão lhes poupando dos deslizes.

Mas há aqueles que decidem intimamente desde cedo fazer parte do bem, daquilo que denomino “Mundo São”. Determinam-se a obedecer todos os compromissos éticos – e por isso não desejam, não planejam e não aceitam cometer quaisquer delitos, sejam patrimoniais, sejam de sangue – ressalvada aqui a ira santa, a reação justa, a legítima defesa, a autotutela, que a submissão pusilânime e a covardia não são cláusulas do compromisso cidadão. 

Esses virtuosos adquirem a habilidade de vencer as tentações do mundo, de dizer “não” ao canto mavioso da sereia, imunes à sensação enganadora de estarem sendo tíbios sobre os próprios interesses, de que os pruridos morais sejam  a fraqueza dos otários, que atuam em detrimento do bem-estar dos seus e de seu próprio sucesso social e econômico.

Resta uma palavra de solidariedade por aqueles que por toda a vida tomaram essa rota da legalidade e da virtude, e que de repente se vêem moralmente alvejados, feridos ou ameaçados pela seta da execração e da Justiça, pela casual contaminação sofrida da conduta de insuspeitados delinquentes entre os seus próximos, seus parentes, seus afetos – ou até por um deslize completamente inadvertido, o que infelizmente acontece vez por outra.

        

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