O INVERNO E O CARNAVAL
Reginaldo Vasconcelos*
O carnaval e o inverno cearense coincidem, coexistem, misturam-se e se molham um ao outro de alegria.
Úmidos corpos molham fantasias coloridas, brotam amores, chovem sorrisos e abraços são colhidos. Cheiro de terra, grama molhada e poças d’água nas calçadas.
Antes de tudo, o inverno e o carnaval são perfumes e cores, que portanto podem descolorir e evaporar, durante a vida e os anos sobrepostos.
Milhares de crianças vestem penas, pintam o rosto, colocam máscaras, vestem panos de seda e calçam botas: são índicos, super-homens e piratas.
Os adultos tornam-se palhaços, viram tuaregues, ou transformam-se em havaianas e odaliscas. No meio da folia, no epicentro da algazarra, no momento da fervura cai a chuva.
Rostos suados, gotas brilhando entre lantejoulas e confetes, plumas e paetês apanham chuva nos cordões, bumbo e corneta salpicam som, sopram chuviscos.
Pelo asfalto, nos estandartes os símbolos místicos do baralho. Desce o maracatu titubeando ao “chim-bum” afro dos tambores, e ao tinir dos guizos e chocalhos.
Índios e negros vestindo os trajes da Corte, trazem à tona as raízes da raça e da cultura, de onde se eleva o envolvente éter da História.
Sob os véus das fantasias veem-se os corpos mornos da folia, molhados de suor. Entre apitos, passes de dança e evoluções, uma euforia, um incêndio íntimo.
Sorrisos franqueados, empurrões e abraços se permitem, suor e cerveja para a chuva temperar. O carnaval não é loucura, é remédio, é antídoto, alivia todos da luta insana pela vida, evitando a demência da dor e da solidão.
No terceiro dia o folião já canta rouco, o bêbado cai de porre na calçada, as fantasias já se rasgaram mas ainda resta alegria.
E na quarta-feira a chuva chora e lava o asfalto, num chuá sentido de saudade. Nos salões as serpentinas fazem engodos, que simbolizam mil paixões, namoros mominos, recordações de outros carnavais.
Publicado na Tribuna do Ceará – Fevereiro de 1980
COMENTÁRIO:
Impressionante!
Este escritor, há já 38 anos, este escritor a mancheias já escrevia assim?
Este escritor, há já 38 anos, este escritor a mancheias já escrevia assim?
Hoje,
então... Realmente, é uma glória!
Vianney Mesquita
Impressionante!
ResponderExcluirEste escritor, há já 38 anos, este escritor a mancheias já escrevia assim?
Hoje, então....
Realmente, é uma glória!
Vianney Mesquita