Mulher no espelho
Edmar
de Oliveira Santos*
Toda mulher é mais ou menos narcísica. Prova é
que observar uma mulher frente ao espelho é muito interessante. Um foi feito
para o outro; à moda daqueles pares que, por tanto combinarem-se, servem até de
inspiração para músicas, do tipo: “como a camisa e o botão; Romeu sem Julieta;
sou eu, assim sem você!”
No entanto, como todo bom relacionamento,
muitas vezes vemos um conflito aqui e ali, quando um ou outro, só de birra,
causa uma chateação em seu parceiro.
Assim, o espelho, sempre mantendo um absoluto
silêncio, como um sábio estoico que se julgava imune ao infortúnio, permite que
sua parceira se auto-aprecie, proferindo monólogos analíticos de sua beleza que,
quando se acha realmente bela, em nada agradece ao parceiro que lhe reflete,
sequer tem o cuidado de lhe passar a velha flanela.
Ao contrário, se ele lhe revela a imagem de
algumas protuberâncias celulíticas, estrias ou varizes, logo lhe direciona
frases características de discussões de relacionamento, as velhas “DR”, tipo:
“Odeio esse espelho!”
Mas se sabe que um não vive sem o outro. Ora,
eles até se perseguem pelas ruas e bares, lojas e supermercados, sendo fácil vê-los
um frente ao outro em toda parte. O espelho é mesmo paciente e apaixonado, não
cansa de replicar a imagem de sua parceira, quer onde ela esteja.
Já a mulher em sua complexidade, o a pequena,
sem medir as consequências, só para que caiba em sua bolsa para continuar a
trazê-lo sempre consigo.
Eis que em seus caminhos, um terceiro lhes
aparece: o tempo. Este os cerca e os impacta por toda a vida, como querendo
mostrar que um dia se cansarão um do outro. O espelho, envelhecendo, se enche
de manchas, que vão lhe diminuindo o poder de reflexão; a mulher vai enrugando
a pele, os contornos se perdem na flacidez, cabelos embranquecendo, a beleza se
esvanecendo.
Mas o tempo, por mais incisivo que seja, não
consegue lhes tolher a vontade de estar um de frente ao outro, ainda que para comprovar
a velhice e lembrar-lhes dos tempos em que ambos, cada um de a sua maneira,
brilhavam!
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