IMPASSE E OPORTUNIDADE
Rui Martinho Rodrigues*
O cenário político brasileiro, à semelhança de
uma encruzilhada, apresenta o caminho do impasse e a estrada da esperança. Os
argentinos optaram pelo impasse há mais de meio século, escolhendo a
decadência. Os nossos jornalistas, quando retornavam de alguma missão naquele
país, emitiam elogios à politização do seu povo. Taxistas, porteiros de hotel,
populares nas ruas, todos discutiam os intrincados problemas nacionais. A
perseverança com que os nossos vizinhos do Sul perseguiram o desastre foi o
resultado disso.
Povo “politizado” era povo tomado de paixão
partidária e ideológica, manipulado pelos (de)formadores de opinião, por sua
vez iludidos por aquela que alguns gregos chamavam de “Bem-Aventurança” e
outros preferiam chamar “Deusa Mentira”, que prometia estrada e cama macia,
além do direito de colher sem precisar semear.
As paixões manifestas na forma de ânimos
exacerbados se instalaram no Brasil, ao modo da Argentina. Tornamos-nos um
deserto de líderes e de partidos dignos deste nome. O nosso povo, outrora
havido como cordial, revelou uma intolerância extrema, criando uma atmosfera
política envenenada.
A continuidade do presidencialismo de
cooptação, o aparelhamento das instituições de ensino e dos órgãos de
informação prosseguem de modo cada vez mais acentuado. A insegurança jurídica
decorrente da politização do STF e da judicialização da política alcançou
níveis surpreendentes. As reformas necessárias foram demonizadas pelo
populismo. Este é o caminho do impasse, já percorrido pelos argentinos e cujos
resultados conhecemos.
Mas nem tudo está perdido. As redes sociais
contornaram a barreira do aparelhamento dos órgãos de informação e das
instituições de ensino; a maioria silenciosa parece despertar, apesar do
desânimo diante do deserto de líderes e partidos; os escândalos desmascararam
os falsos vestais da República e as religiões políticas, abalando a hegemonia
do “ópio dos intelectuais” (Raymond Aron, 1905 – 1983); a recessão começa a
bater em retirada; já existem vozes que ousam defender as reformas e dizer que
não existe almoço sem cobrança da respectiva conta.
Talvez o mais importante sejam os indícios do
surgimento do ânimo de participação na vida pública por parte de novos atores,
estranhos no ninho da política. Os baixos índices, obtidos pelas novas figuras
nas pesquisas eleitorais têm pouco significado, pois eles ainda não são
conhecidos e só os veteranos estão fazendo campanha.
Mas isso deverá mudar no curso do certame
eleitoral, quando os novos nomes se tornarem conhecidos e forem expostos os
laços dos profissionais da política com a interminável ciranda de escândalos. A
inevitabilidade das reformas, por sua vez, poderá sensibilizar parte
significativa do eleitorado; e o efeito da calamitosa situação da segurança
pública sobre a campanha política ainda está por ser devidamente avaliado.
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