quarta-feira, 31 de julho de 2019

ARTIGO - Ideias Políticas na Era Romântica (RMR)


IDEIAS POLÍTICAS
NA ERA ROMÂNTICA
Rui Martinho Rodrigues*



A filosofia romântica dominou por muito tempo as cogitações teóricas. Ciclos estéticos e teóricos passam, mas alguma coisa fica. Nas reflexões políticas as impressões digitais do romantismo são bastante visíveis.

Isaiah Berlim (1909 – 1997) na obra “Ideias políticas na era romântica”, analisou pensadores ligados à filosofia romântica ainda influentes. São traços românticos do pensamento político contemporâneo o titanismo e A oposição ao racionalismo.

Fatos objetivos, como os dos indicadores estatísticos de qualidade de vida, analisados racionalmente, encontram resistência injustificada porque contrariam a denúncia de algumas injustiças sociais. Temos o titanismo, que é a tendência para resistir aos fatos. Temos o uso da hipérbole, figura de linguagem típica do romantismo.

Os exageros da revolta contra os males denunciados são hipérboles, contrastam claramente com a tendência secular dos dados sobre mortalidade infantil, analfabetismo, escolaridade média, esperança de vida, acesso aos bens e serviços e tudo mais.

Há também a tática descrita em análise transacional, na análise dos jogos, em que os comunicantes desempenham, ou procuram atribuir uns aos outros, os papéis de perseguidor e vítima, ensejando a intervenção de um salvador.

A letra da música “mulher de trinta”, de Luiz Antônio Drink Fermata, tem sido citada como exemplo disso. Nela um personagem descreve a mulher de trinta como vítima (“você mulher, que já viveu, e já sofreu, não minta”) e em seguida se coloca como salvador (“no meu olhar, na minha voz um novo mundo sinta”). Intelectuais usam de hipérbole, ao modo romântico, para tornar a vítima dramaticamente sofrida, colocando-se como salvadores ou autores da receita messiânica.

Não falta a promoção mercadológica. Sofrimento atrai espectadores e promove audiência. Um poeta romântico de sucesso disse que “todo grande amor só é bem grande se for triste” (Marcus Vinicius de Moraes, 1913 – 1980).

Os primeiros tempos da Revolução Industrial são descritos como terríveis. Crianças retiradas dos folguedos para as fábricas; mulheres arrancadas do conforto dos lares e escravizadas na indústria; altos índices de mortalidade, longas jornadas de trabalho em péssimas condições; e baixos salários.

A descrição, além do jogo de vítima, perseguidor e salvador, ajuda a vender livros ou jornais e a amealhar votos e incorre na prática do anacronismo, atitude de quem olha o passado com os parâmetros do presente. As crianças do período referido não foram retiradas de atividade lúdica. Elas trabalhavam na zona rural; a mortalidade, inclusive a infantil, era altíssima então. Os salários do período pré-industrial eram mais baixos, tanto que os fluxos migratórios voluntariamente se dirigiram do campo para as cidades. Mulheres não foram a arrancadas do conforto do lar. Viviam miseravelmente, submetidas ao duro trabalho do campo e em casa.

A falta de regulamentação das relações trabalhistas, a economia de mercado e a propriedade privada são apontadas como causa dos “terríveis males” descritos. Mas salários guardam relação com produtividade. Regulamentação não muda isso. A Revolução Industrial aumentou a produtividade e melhorou os salários, não comparados aos de hoje, mas quando cotejados com a alternativa da época. Remuneração artificialmente inflados, de pequenos grupos com poder, obtidos via regulamentação ou pressão sindical prejudicam outros grupos, como demonstrou Lawrence W. Reed (1953 – vivo). Sem o jogo da análise transacional, sem anacronismo e sem romantismo a Revolução Industrial trouxe foi melhora.


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