Contrarrespostas
Vianney Mesquita*
Pessoa sem educação é como terra sem adubo. (Provérbio árabe).
Quando
me reformei por tempo de serviço na Universidade Federal do Ceará, sem proceder
a generalizações, já não suportava a míngua de civilidade, com a total falta de
polidez de alguns estudantes, os quais tratavam, não apenas os colegas, como
também os professores e funcionários, por cima dos ombros, com descaso e
indelicadeza.
Como
sempre evocava a Professora Doutora Maria Adísia
Barros de Sá, já houvera eu
contraído as três alergias de um docente maturado e entediado, após as quais
não adianta prosseguir na carreira: ao giz, à disciplina ministrada e a uns
poucos alunos, nomeadamente aqueles malcriados e incivis.
A
primeira hipersensibilidade, ainda hoje, conduzo, uma vez que não consegui
debelar uma onicomicose, a qual de início afetou do polegar ao dedo mínimo da
destra (com a qual escrevia), sendo que o mindinho nunca se recuperou. As duas
restantes foram capitais para me levar à aposentadoria.
Certa
vez, um acadêmico me abordou em um pátio do Centro de Humanidades, no Benfica,
querendo operar um bullying
ascendente – além do que fazia horizontalmente com os colegas mais desprovidos,
em especial os pretos, pobres e depositários de senões físicos.
Remeto-me
um pouco ao fulcro desse assunto para, logo em seguida, volver ao episódio do Campus do Benfica e às contrarrespostas
no âmbito universitário. Impende exprimir, pois, a ideia de que esta modalidade
de assédio moral, ocorrente não apenas na escola, como também em diversas
circunstâncias da vida em sociedade – igreja, esportes, na própria conivência
familiar etc. – necessita, urgentemente, de um remédio legal, de uma sanção
resolutiva aos seus agentes, pois conduz a desvios de personalidade de quem chega
à adultícia.
No
decurso desse tempo e de acordo com o atestado por matérias de jornais,
magazines da Cidade e media
nacionais, componentes da família do poli-homicida, bem assim muitos dos seus
conhecidos, referiram-se ao fato de haver sido ele portador de consequências
psicológicas advindas do recebimento e retenção de bullying, quando estudante secundarista.
Tal
suposição – ou justificada certeza – parece racional, a se mensurar pela
maneira inusitada de proceder do mencionado jovem, ao trazer desespero a todos
os que se relacionavam com a Escola (a qual homenageia o escritor curitibano Tasso Azevedo da Silveira) e atemorizar
quantos assistiram à horrorosa cena e aos seus desdobramentos lamentáveis.
A Lei número 13.185, de 6 de novembro de 2015,
chamada Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying), é bastante criticada pela literatura das Ciências
Pedagógicas, pois, como a denominação sugere, se limitou a indicar o “combate”,
sem apontar qualquer castigo inibitório ou sistema de punição aos que a
praticam.
Também
indicam as estatísticas atuais, conforme está em Toda-a-Matéria (2018, on line),
que cerca de oitenta por cento das escolas brasileiras ainda não possuem nenhum
aparato corretor, de sorte a prosseguir existindo, à farta, esse tipo de
acercamento moral, que configura um grave
problema psicológico, de ética e formação do caráter, com desdobramentos
prejudiciais ao estabelecimento da individuação, da dignidade pessoal, quando é
fundada, por definitivo, a personalidade do ser adulto.
A
discussão mais prolongada, assentada em maior profundez investigativa, não há
de ser procedida em um medium como
este, de leitura informacional, literária e opinativa, de indiscutível
qualidade, porém, desenvolvo, no momento, demanda de caráter científico
intitulada Bullying: Algo
Negativamente Sério e Ilícito “Penal” não Tipificado, a fim de ser editada
por um periódico receptor de matérias desde jaez.
***
Dando
continuidade à narração da tentativa de mobbing
em ascensão, iniciada no quarto parágrafo deste escrito, o estudante K.R.O.M.
interceptou-me no campus para,
estudadamente, me confrontar e, junto a um grupo, disse estranhar meu nome –
Vianney – ao achar esquisito meus pais o haverem escolhido. Ele indagou-me se
eu sabia o seu significado, ao que lhe respondi ser o crédito de um santo francês,
da Igreja Católica, e, por haver sido vigário da Paróquia de Ars, em França,
foi cognominado Cura d’Ars.
Ele
respondeu que não, eu estava “por fora.” E expressou: Vianney quer dizer exatamente cachorro ca ... do na chuva, o que suscitou risos em todo o
grupo e, de imediato, convocou mais estudantes para a roda.
Estupefato,
porém, sem perder a esportiva, deixei os motejos passarem e, com muita
serenidade, o interroguei sobre seus créditos, o que significavam. Ofereceu
explicações não muito convincentes acerca dos dois nomes e dois sobrenomes –
K.R. e O.M. Então aduzi, em discurso diferente deste:
–
Oh, rapaz, temos, portanto, eu e você, identificações nominais muito próximas,
a julgar pelo que explicou o meu nome – Vianney – como cachorro ca ... do na chuva, pois K.R.O.M. significa, exatamente, chuva. Não é interessante?
Risos
e vaias em cima dele, liberei-me da turma e afastei-me.
Não
é de se estranhar o fato de, também, os professores, usarem esse tipo de
expediente maléfico com os alunos, hoje, bem menos; mas, quando estudava na
antiga Escola Técnica Federal do Ceará, agora Instituto Federal de Educação
Tecnológica, os mestres (dois, principalmente, C.N.G.P. e C.L.B.) punham
apelidos que pegavam e duravam até os alunos terminarem o curso, quando deixavam
a Escola.
Uma
vez, na Faculdade de Direito (não terminei o curso), quando já lecionava na
U.F.C., fiz uma pergunta, chamando de professor o desembargador J.J.S.F., e ele
me repreendeu: – Sou desembargador, quero
que me chamem de desembargador!
A
isto, retruquei: – Desculpe-me,
professor, mas aqui não é um tribunal; é uma faculdade, onde quem leciona são
os professores! Isto provocou risos da sala toda.
Furioso,
então, me mandou sair da aula. E não saí. Quem fez isso foi ele. E a turma
achou ótimo (certamente, ele também), pois, com apenas quinze minutos, nos
livramos de uma aula sem qualidade. Poucos anos depois, os dois éramos colegas
na Academia Cearense da Língua Portuguesa...
Como
remate destas notas, narro um fato ocorrido na Universidade Federal da Paraíba
– Campus de João Pessoa. Meu irmão,
Vicente de Paulo Campos de Mesquita, aplicara uma prova da disciplina Introdução à Estatística, salvo engano,
para uma turma no começo de um curso das engenharias.
Dias
depois, ao se dirigir à cantina, o Professor foi interceptado por uma aluna que
tinha o apelido de “Biscoitcho” (como fala o paraibano), pelo fato de lembrar
fisicamente a atriz Zezé Macedo, uma das personagens do cearense Chico Anísio.
A
“Biscoitcho” foi logo dizendo, sem qualquer tinta de urbanidade, tampouco de
bom português:
–
Ei, cara! Tu tem de recorrigir a minha
prova, pois tu só me deu seis!
A
prova continha cinco quesitos, cada qual valendo dois pontos. Segundo a
primeira correção do Vicente, ela havia errado dois, razão por que lhe conferiu
o seis.
–
Vamos. É ligeiro, disse o Professor. Ele notou que, na recorreção, em vez de
errar duas, ela escorregou em três. Então ele perquiriu à “Biscoitcho”:
– Quanto é mesmo que você acha que tirou
nesta prova?
– Pelo menos um “oitcho” – respondeu.
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