A FAMÍLIA AVERMELHADA
Assis Martins*
O comunismo é coisa odiosa... mas o comunismo da riqueza
e o do capital, combinados, não se mostram menos perigosos do que o comunismo
da pobreza e do trabalho oprimidos. (STEPHEN GROVER CLEVELAND, vigésimo segundo
presidente dos EEUU).
Passavam-se
os anos 1960, logo após o golpe civil-militar, de sorte que a repressão corria
solta. Apesar da dura vigilância, no entanto, em todos os setores da sociedade,
sempre aparecia um esquerdista pronto para fazer
a cabeça da corriola. E as
palavras de ordem – Go home yankees!, Abaixo a ditadura!, Fora, milicos! – teimavam em
aparecer nos muros de Fortaleza.
Um
desses descontentes aportou, levado não sei por quem, à sede do Conjunto
Teatral Cearense, passando a integrar o elenco em diversas peças. Foi o
Juvenal, comunista militante e vibrador, adepto do marxismo-leninismo e que
aproveitava qualquer conversa para passar suas ideias contra o “imperialismo
americano”.
Assim
que se enturmou, o Juva começou a
fazer a doutrinação da galera em
demoradas conversas nos intervalos dos ensaios. Mais tarde, o papo era esticado
para o bar do seu Lauro, onde o encarnadinho angariava alguns
simpatizantes.
As
coisas estavam seguindo um curso regular, com o Juvenal fazendo pontas e
conseguindo mais seguidores, graças a sua facilidade de convencer. Foi, então,
que apareceu o Guilherme, doido para desenvolver teatro e, para azar do Juva, ex-militar e ferrenho inimigo dos
“enviados de Moscou”, conforme dizia.
O
bar do seu Lauro, então, ficou sendo
palco de grandes embates entre os dois. As reuniões, antes pacíficas, nas quais
pontificava a eloquência do Juvenal, se transformaram numa rinha ideológica,
algumas vezes descambando para as ofensas pessoais.
O
pior aconteceu entre o segundo e o terceiro ato da peça Lágrimas de Mãe, da qual ambos eram apenas figurantes. O simples
bate-boca foi crescendo e acabou numa séria briga que resultou em cenários
rasgados, lâmpadas quebradas, fios espalhados e o público inquieto, sem
entender tamanho estrupício. Depois do entrevero, porém, os dois sumiram e o
Conjunto Teatral Cearense voltou para sua missão de fazer teatro apenas por
diletantismo.
Quem
diria que, naquele ambiente simples, haveria uma peleja de tão grande
envergadura entre a linha de pensamento marxista-leninista e a instauração do
regime político no Brasil!
OBS. O desenho
é de Audífax Rios.
Nenhum comentário:
Postar um comentário