DOER
AGORA NO CORPO
PARA
NÃO
DOER SEMPRE NA ALMA
Humberto
Ellery*
Eu era ainda um menino de apenas onze ou doze
anos quando tive a minha primeira experiência de briga de rua, que felizmente foram
pouquíssimas.
O nome do adversário era Wellington, era meu
colega de classe na segunda série ginasial do Colégio Cearense, e eu me dava
bem com ele.
Um belo dia eu fiz uma brincadeira, da qual
ele não gostou, e ameaçou “me pegar na saída”. Eu não levei a sério a ameaça e
falei para ele deixar de besteira, o que parece que o enfureceu ainda mais.
Esquecido do fato, depois da última aula,
estava saindo do Colégio para encontrar meu pai e seguir para casa. Já na
calçada, senti uma mão me puxar pelo ombro direito, e no momento seguinte um
soco, que não pegou em cheio no meu rosto porque instintivamente desviei a
cabeça, mas, mesmo assim, com o impacto, minha bolsa de livros caiu no
chão (naquele tempo só quem tinha mochila era o Laurinho Chaves).
Ao me sentir assim agredido injustamente, de
surpresa, covardemente, senti uma raiva tão grande e tão súbita que mesmo não
sabendo brigar parti pra cima do garoto que, pelo inesperado de minha atitude,
desequilibrou-se e caiu de costas. Eu também, pelo embalo que imprimi na minha
reação, caí por cima dele. Naquele momento ecoou o grito da molecada: “É BRIGAAAA!”.
Como, por causa do inesperado, eu fiquei em
situação de vantagem, apliquei logo um soco meio desajeitado no rosto do
menino, e já preparava outro quando senti uma mão muito forte me segurar pelo
antebraço e me erguer no ar, retirando-me de cima do adversário. Era meu pai.
O Wellington, certamente com medo do meu pai,
juntou sua bolsa de livros e correu. A molecada entoou outro grito, agora para
amedrontar: “ÓÓÓi!”.
.
Meu pai, sorrindo, na maior calma, esperou que
eu juntasse minha bolsa e me dirigisse ao seu carro. Sem dizer nada, apenas
sorriu e acenou para alguns irmãos Maristas que acorreram por causa da
gritaria.
Seguimos em silêncio, ele dirigindo e eu em
pé, na parte de trás do carro, me segurando no encosto do assento dianteiro. Os
carros antigos tinham o teto alto e havia um grande espaço entre os bancos
dianteiro e traseiro. Eu era tão pequeno que só gostava de andar de carro
assim, em pé. Nunca me sentava.
Já perto de casa, eu ainda tenso e ofegante,
meu pai perguntou: “Quem provocou a briga?”. Eu relatei toda a história, desde
o começo. Ele ficou uns instantes em silêncio, e em seguida falou,
pausadamente:
“Meu
filho, aprenda uma coisa: Você nunca provoque uma briga, tente resolver seus
problemas sempre através do diálogo, amistosamente. Mas o mais importante é: Nunca
provocar, mas também nunca fugir. Se você entrar numa briga em desvantagem e
apanhar, ficar muito machucado, lembre-se de que as dores passarão, mas se você
se acovardar e fugir, toda vez que você se lembrar vai doer de novo”.
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