quarta-feira, 22 de março de 2017

ARTIGO - A Corrupção e a Economia (RMR)


A CORRUPÇÃO E A ECONOMIA
Rui Martinho Rodrigues*



A tese segundo a qual o combate à corrupção prejudica a economia surgiu após o Petrolão. Embora o modo de combater a corrupção, como no caso da “Carne Fraca”, possa produzir efeitos adversos. Quando se considera não combater os desvios criminosos, percebe-se que a tolerância é muito mais danosa.

Apesar do caráter espetaculoso da divulgação das operações, inclusive com a divulgação do uso de vitamina “C” pelo nome científico, ácido ascórbico, assustando consumidores que não sabem o que seja o referido ácido; apesar da proporção das fábricas flagradas praticando irregularidades ser de apenas três dentre mais de quatro mil; apesar da diminuta proporção de agentes públicos envolvidos; apesar de algumas das irregularidades constatadas não representarem ameaça grave à saúde pública; apesar de tudo isso, o prejuízo maior é a tolerância com a fraude.

E se as fraudes fossem descobertas pelos serviços sanitários dos países importadores? O prejuízo seria maior do que a denúncia partindo das nossas autoridades. A investigação certamente não descobriu tudo. Deve ter flagrado apenas uma parcela das irregularidades. Assim compreendemos a conveniência e a oportunidade das ações de controle da corrupção.

A dinâmica do crime é progressiva. Quem começa praticando uma pequena irregularidade evolui para crimes mais graves. A lei não deve ser para inglês ver. A repressão ao crime não é prejudicial à economia. As máfias da corrupção mandam dinheiro para o exterior, prejudicando a economia. As licitações fraudadas prejudicam a economia, elevam custos e limitam as possibilidades de investimento público. A corrupção degrada as instituições políticas e perpetua a cultura da transgressão. O tratamento de fratura causa dor, mas não se pode deixar de tratá-las.

Apoiar as ações de controle de condutas ilícitas, todavia, não significa aceitar abusos. Devemos combater o crime para salvar as instituições, mas não devemos destruir as instituições alegando combater o crime. Não obstante se compreenda que autoridades precisem do apoio da sociedade para combater corruptos poderosos, é preciso que ao buscar tal apoio se proceda dentro dos limites da prudência e da lei.




COMENTÁRIO:

O Professor Rui Martinho Rodrigues confronta em seu artigo dois aspectos éticos envolvidos no caso da Operação Carne Fraca: a ética jurídica, entrevista na atribuição institucional da Polícia Federal de combater implacavelmente a corrupção, em oposição à ética patriótica referente ao zelo pelas finanças nacionais, neste momento de aguda crise econômica por que passa este país.

O dever da Polícia Federal de instaurar inquérito e proceder  às investigações, em face de notícia-crime ou de fundadas suspeitas, para servir ao Ministério Público, e para que este formule denúncia ao Judiciário, é inarredável. Caberá ao Ministério Público arquivar o inquérito, quando achar por bem, e ao Magistrado rejeitar a denúncia, quando for o caso. 

O que se questiona neste caso é a eventual necessidade de se manter segredo nas investigações, em seguida discrição do Ministério Público, e por fim o decreto de sigilo pelo Judiciário, quando o tema escrutinado tenha potencial para prejudicar os trabalhos ou lesar gravemente o interesse de terceiros de boa-fé, com mais veras causar deletério clamar popular, mais ainda ameaçar a paz social, bem como trazer prejuízo aos mais elevados interesses nacionais.

O que está em questão, finalmente, é a excessiva vaidade profissional de agentes públicos, que vazam apressadamente para a imprensa suas conclusões parciais, bem como cabe questionar, diante desse episódio nefasto, a liberdade de imprensa, que se considera intocável e absolutamente ilimitada. 

No caso da Operação Carne Fraca, a divulgação atabalhoada dos fatos levou a uma crise sem precedentes nas exportações brasileiras de produtos pecuários, afetando a economia nacional, já tão combalida pela má gestão dos últimos governos. 

Esse alarde desnecessário feito pela grande mídia brasileira, dando conta de irregularidades no processamento industrial de carnes, seguramente a mais forte rubrica das nossas exportações, foi um desastre. Até porque foram feitas interpretações risíveis de gravações telefônicas judicialmente grampeadas, que geraram uma revolução nas mídias sociais.

Entendeu-se que o nome científico da vitamina C, "ácido ascórbico", adicionado à carne como conservante, seria algo perigoso, e que o papelão das embalagens fosse misturado à carne moída, o que não faz nenhum sentido.  


O Governo Federal, por meio de Ministério da Agricultura e de sua diplomacia, está envidando esforços para restabelecer a verdade, internamente e mundo afora: episódios isolados de pagamento de propina a alguns fiscais, por alguns frigoríficos, para a flexibilização de algumas regras mais rigorosas de controle sanitário, puníveis com absoluto rigor penal – mas nada que comprometesse de fato a saúde dos consumidores, e que justificasse a suspensão das importações de carnes brasileiras pelos países compradores.

Reginaldo Vasconcelos   

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