Rui Martinho Rodrigues*
Eric Hobsbawm |
Eric Hobsbawm escreveu Era dos Extremos, Era dos Impérios,
entre outras. O historiador britânico poderia escrever, hoje, a Era das Manifestações.
Cerca de oitenta países têm vivido movimentos de ruas. Norberto Bobbio escreveu
A Era dos Direitos, manifestando preocupação com a ameaça do que considerou
excesso de demandas, viabilizadas pela democracia, voltando-se contra a ordem
democrática. Poderíamos acrescentar: as formas de luta e a fragilidade da
democracia confluem perigosamente.
Norberto Bobbio |
Expectativas ilimitadas chocam-se com recursos limitados e
mal administrados, apimentadas pela frustração de expectativas legítimas e
mínimas. Estimuladas as reivindicações pelos formadores de opinião,
concomitantemente a espetacularização da política e a ampla difusão de
informações, desnudando as mazelas do poder político, fragilizadas as
instituições pela desmoralização dos seus condutores, as manifestações
ultrapassam da fronteira dos distúrbios.
Sim, o que na velha Europa é considerado distúrbio, no
Brasil a imprensa classifica como manifestação. Ressalte-se que as condições
materiais de amplas parcelas da nossa população se constituem em solo fértil
para a insatisfação aguda. Some-se a tudo isso o fato de que se tornou
consensual a visão segundo a qual, ao nascer, o sujeito se torna ilimitadamente
credor da sociedade e do estado.
A terceira geração dos direitos, caracterizada por comandos
vindos da sociedade e dirigidos ao estado; e por prestações positivas
(obrigações de fazer), conferindo exigibilidade aos direitos sociais,
contribuem para alimentar as manifestações. Direitos máximos sem ter o mínimo;
autoridades e instituições desmoralizadas; formadores de opinião entusiasmados
com os movimentos de rua: eis o quadro.
A Argentina é o país das manifestações. Triste exemplo. A
Suíça, de onde não se tem notícia de movimentos de massa, é modelo de sucesso.
Tais coisas não abalam a fé nos movimentos de rua. A influência dos jesuítas
continua presente, com a marca da contrarreforma; do “crê ou morre”; com o nome
e disciplina de organização militar; espírito messiânico; e com a não-ética dos
fins, atestando a longa duração na História, principalmente nas camadas
letradas de onde saem os formadores de opinião. Arregimentar, formar rebanhos
obedientes, disponibilizando uma massa aguerrida e dócil aos seus dirigentes,
tornam agudas, no Brasil, a era das manifestações.
Novos convertidos ao credo democrático, tornamo-nos
excessivamente virtuosos, na forma do politicamente correto: órgãos de
segurança tolhidos em sua capacidade operacional na presença da imprensa;
máscaras toleradas; grupos organizados para promover depredações, obstrução de
vias e saques não são indiciados por formação de quadrilha. Confundimos o
direito à luta por meios democráticos com o direito à prática do crime.
*Rui Martinho Rodrigues
Professor e Advogado
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
Professor e Advogado
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
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