Tudo
outra vez *
Antonio Mourão Cavalcante**
Belchior, poxa
cara! Deu uma saudade lascada essa semana. Pois não é que passei estes dias
cantarolando “Tudo outra vez”... “Há tempo, muito tempo, que eu estou longe de casa.” E uma vontade danada de conversar. Papo sem pauta.
Descosturado. Lembrando os amigos. Feito uma chamada escolar. Dizendo, meio
triste, meio sem jeito: “Este aí, separou-se... Fulano morreu. Um câncer brabo.
Foi bem ligeirinho! Sicrano deu-se bem na vida. Ficou rico. É dono de hospital!”.
Sei que andaram
fazendo uma zorra doida com a sua vida. Foram lhe descobrir no Uruguai. Depois
você sumiu de novo... Tento localizar-lhe no Google Notícias, agenda... e nada!
Nem queria esse
Belchior de muita fama. Glamour e paetês. Pensava no Belchior da cantina da
Farmacologia, onde o cantineiro – no maior gesto de construção da paz – naquela
época, botou em seus filhos gêmeos, os nomes de Kennedy e Kruschev. Eram tempos
da guerra fria.
Voltando à
cantina. Lá, na segunda-feira, ocorria a avant-première das composições que
jorravam de sua guitarra. Éramos os primeiros ouvidos e aplausos. “No Corcovado
quem abre os braços sou eu!”.
Igualmente
surreais as histórias do convento capuchinho que você tinha acabado de frequentar
e sair. As normas e os costumes dos frades que ainda guardavam raízes nos
tempos medievais.
Havia, no que
vivíamos, muitas histórias e Histórias. Sonhos e um profundo desejo de
construir o mundo utópico e diferente. Éramos razoáveis. Exigíamos o
impossível.
Depois foi a
diáspora. Cada um seguiu seu rumo. De tempos em tempos, tínhamos encontros e
notícias recíprocas. De longe a gente ia construindo a vida, no possível.
Hoje é domingo.
Domingo em casa. Domingo no mundo. Fui mexer em uns velhos CDs, quase
empoeirados. Ouvindo estas músicas, despertou-me esse desejo de reencontro.
Talvez, nesse
domingo sem sol e sem mar, desejasse apenas dizer que continuamos vivos e
acreditando que a felicidade é ainda este alimento que nos move, na
esperança...
* Esta
crônica, tem algum tempo, foi publicada
no Jornal O Povo.
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