domingo, 14 de maio de 2017

ARTIGO - A Fragilidade da Mentira (RV)


A FRAGILIDADE 
DA MENTIRA
Reginaldo Vasconcelos



Uma grande rede de supermercados nacional contratou certa vez dois expertos russos para assistir a uma série de entrevistas com empregados que se candidatavam a exercer um elevado cargo na empresa. A função possibilitava desvios de conduta, e por isso exigia recaísse sobre pessoas absolutamente honestas, incorruptíveis, de extrema confiança.

Os russos não falavam português, e apenas olhavam os funcionários responderem aos questionamentos que o entrevistador lhes dirigia. Tampouco interessava aos dois estrangeiros o que era perguntado, mas apenas o número de cada pergunta, sobre uma folha em branco, diante do qual eles  anotavam simplesmente se o entrevistado fora sincero ou se falseara a verdade ao responder a questão.

Eles eram especialistas em interrogatórios, treinados pela KGB, e eram capazes de detectar a mentira com grande acerto – não com base no teor das respostas, que preferiam nem conhecer – mas verificando as expressões corporais do interrogado: a posição na cadeira, o movimento dos olhos, a contração das pupilas, os espasmos labiais, as hesitações e as ênfases, o posicionamento do tronco, a trajetória das mãos, enfim, o gestual como um todo.

Claro que os russos desprezavam uma tosse nervosa, um sorriso amarelo, o enrubescimento da face, a eventual sudorese, dentre outros efeitos normais provocados pelo estresse vivido por pessoa qualquer que sabe estar sendo examinada. Eles focavam em sinais somáticos sutis, cientificamente identificados como inevitáveis reações físicas causadas pelo cérebro que esconde a sua real consciência e elabora ficções para produzir inverdades.

Assistindo à filmagem do interrogatório de Lula da Silva diante do Juiz Sérgio Moro, prestado no fórum federal de Curitiba no último dia 10 de maio, notei que o habitual mentiroso perde os limites entre a imaginação e a realidade.

Lula domina todos os cacoetes com os quais os camelôs de esquina convencem os tolos da excelência dos produtos vagabundos que anuncia – embora cientes de que sua farsa não tem efeito algum para quem tenha dois neurônios a mais. Isso não lhes importa, porque os simples da população compõem mesmo o público alvo da barata quinquilharia que eles vendem.

Lula desempregaria aqueles técnicos russos, porque qualquer inteligência mediana nota em sua fala as tantas mentiras e bravatas, algumas das quais ele mesmo reconheceu – “...é força de expressão, Doutor”. Fizera um discurso dizendo que se não fosse preso logo, mandaria prender os acusadores. Cobrado pelo juiz, alegou que aquilo são coisas que se dizem nos palanques, como quem diz: “Essa conversa fiada se presta a enganar os meus eleitores, Dr. Moro. O senhor não precisa acreditar nela”. Mas afinal concordou que não fora apropriado tê-lo feito. 

E tratou com intimidade de compadrio o empreiteiro Leonardo Alexandre Gorgueira Pinheiro Fontes (“o Léo”), sobre quem ele dissera que não conhecia tão de perto. Mas sorriu e ficou feliz ao saber que era referido entre os corruptores pelo codinome “Zeca Pagodinho”, artista de quem é fã, aceitando afinal pacificamente que tivesse mesmo um epíteto de bandido.

E disse que pediu ao Vacari que trouxesse o Renato Duque à sua presença, porque este e o Duque tinham “relações de amizade” – Opa!... Vacari era amigo do Duque? – perguntou o Juiz Moro. Então Lula elaborou de emergência, já bebendo água e se afogando na inverdade: “Eu só quero lembrar uma coisa. Relação de amizade é uma coisa, relação é outra (sic).

Teve que fazer a ressalva confusa, ao ser cobrado, pois ele já declarara que o Vacari não tinha relações com aquele delator. Não tinha “relações” e tinha “relação de amizade”? A isso se chama “contradição”, a grande pedra de toque de qualquer interrogatório. 

Mas, enfim, Lula foi forçado a confessar que, não sendo mais o Presidente da República, convocou o alto funcionário da Petrobras apenas para perguntar, repreensivamente (segundo ele), se o homem tinha conta secreta no Exterior. Ora bolas! Que autoridade teria o Lula, àquela altura, para enquadrar o homem, se não tivesse nada a ver com isso?

Enquanto ouvia alegações contra si, que a seguir iria negar, Lula cofiava o bigode calmamente, com uma tranquilidade impressionante. Na sua história imaginosa, o rico empreiteiro Léo Pinheiro, dono da mega-construtora OAS, se converte em mero vendedor de um apartamento, a um cliente comum: “O Léo estava querendo vender o apartamento, e o senhor sabe que, como todo e qualquer vendedor – sabe – quer vender de qualquer jeito”.

Mas é preciso entender que o interrogatório no processo criminal representa uma oportunidade para que o acusado se defenda verbalmente, na presença do julgador de primeiro grau. O que Lula disse ali não visa demonstrar à família a sua condição de inocente, nem ao partido, nem à imprensa, nem à sociedade como um todo.


A preocupação dele deveria ser em convencer o Juízo da lisura de seus atos, sendo então inútil reclamar falta de provas materiais, atacar o Ministério Público, se dizer injustiçado. Moro vai dar uma sentença livremente, com base naquilo de que estiver convicto, e em grau de recursos os tribunais reexaminarão a decisão  e as sentenças dele na Lava Jato não têm sido reformadas.

Enfim, Lula da Silva – tenho muita pena dele. Que Deus se apiade de sua alma, porque há muitas outras delações para tentar esclarecer. E no dia seguinte ao seu interrogatório, o Ministro Fachin detonou a bomba fornecida pelo casal de marqueteiros; e muito em breve Antônio Palocci falará. Será a última pá de terra.


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