segunda-feira, 15 de maio de 2017

ARTIGO - Soneto Vai, Sonetilho Vem (VM)


SONETO VAI, 
SONETILHO VEM
Vianney Mesquita*



Sentimental é o homem que vê um valor absurdo em tudo e não sabe o preço exato de nada. (OSCAR Fingal O’Flahertie Wills  WILDE. Dublin, 16.10.1854; Paris, 30.11.1900).




Obtive de Cima a mercê de haver conhecido e privado, por muitos anos, da  companhia e benquerença do magistrado, homem de letras e linguista Dr. Sinésio Lustosa Cabral Sobrinho, natural de Várzea Alegre-CE (22.05.1915), autor de qualidade incontendível, cujas obras fazem eco em todo o País, pois docente de língua portuguesa de alçados recursos, poeta inventivo e, em especial,  pessoa de fina educação e esmerada urbanidade.

O Dr. Sinésio Cabral exerceu a Presidência da Academia Cearense da Língua Portuguesa de 03.03 1984 a 03.03. 1986, tendo ocupado a Cátedra número 03, patroneada pelo filólogo e etnógrafo carioca Antenor Nascentes. Ele editou por quase quarenta anos o Mensageiro da Poesia, ao lume com absoluta regularidade, até seu trânsito para a Dimensão Etérea, em 10 de maio de 2012, às portas dos 97 anos.

Mencionado periódico – cujo teor privilegiava poemas e comentários analíticos – chegava aos consulentes sem nenhum custo, pois as despesas de produção gráfica e editorial, bem assim os dispêndios de postagem, corriam a expensas dele, numa louvável peleja para que não afracasse a prática do metro no nosso meio.

Enviei-lhe, certa vez, algumas colaborações, a primeira das quais foi publicada no número 209, relativo a abril de 2004, registada na coluna Recebemos e Agradecemos. Aqui a reproduzo – o soneto que foi, como também o faço  com o sonetilho de resposta – ambos publicados no meu Arquiteto a Posteriori – Apreciações Críticas (Fortaleza: Imprensa Universitária da UFC, 2013).



BILHETE


Sinésio amigo, muito boa tarde,
Neste nubloso mês de fevereiro.
A Graça Inata eternamente o guarde
E a todo o contingente seu herdeiro.

Assinta, por favor, ficar ciente:
Grande afeição eu por você sustento,
Porquanto este mundo é carecente
De benquerer e paz – da vida o alento.

Precisamos, também, neste comenos,
Agricultemos traços bem amenos
Para não amargarmos a desdita.

De sua atenção na expectativa,
Aguardo uma resposta positiva
Com os amplexos do Vianney Mesquita.


A resposta ao Bilhete excele em qualidade poética e graça na técnica da versificação. Diverso de mim, ao aplicar o decassilábico do pé português, ele se firmou no sonetilho, composição não obrigada ao rigorismo canônico no tocante às rimas das quadras e trísticos.

Feito, então, excelso poeta, obediente às medidas, aprestou a consonância métrica das estâncias, aplicando o verso redondilho maior – ou de arte menor – isto é, com sete acentos (ictos), semelhante ao da escrita de cordel nordestina, fazendo consoar nas quadras o primo verso da primeira estrofe com o quarto desta e o secundário e quaternário da segunda.

Consociou, entrementes, o segundo verso da primeira estância com o quarto desta e o secundário e o quarto versos da segunda.

Já nos tercetos, rimou o primeiro do trístico número um com o terceiro deste e o segundo do último; e o segundo pé do primeiro com o primo e o terceiro do outro conjunto de três versos. Com efeito, nas quadras, aplicou ABAB-ABAB, ao passo que nos trísticos utilizou-se da craveira compositiva ABABAB.

Como desfecho destas notas, onde descansa a saudade da enorme pessoa que foi Sinésio Lustosa Cabral Sobrinho, comprovemos seu estro e apreciemos o quinau a este escrevente, em castigo pelo mau soneto Bilhete.



S O N E T I L H O


Meu caro Vianney Mesquita,
Em seu bilhete ouço a voz
De quem não quer que a desdita
Projete sombra entre nós.

E sobre a afeição descrita,
Ao dizê-la tanto a sós,
No papel me trouxe escrita
Bem oito dias após.

Dando conta do recado,
Em sonetilho, afinal,
Relembro: bem-humorado,

Sim, no apê residencial,
Com meu abraço apertado

Do irmão. Sinésio Cabral.



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