REPÚBLICA
DOS EMBUTIDOS
Arnaldo Santos *
Por mais que o
Presidente Michel Temer aposte na mediocridade dos integrantes do Congresso
Nacional, na indigência moral e ética daqueles que, direta ou indiretamente, estão envolvidos na trama e o querem no poder, sob o falso argumento de que sua
saída prejudicaria ainda mais o país, e até na omissão e morosidade do Poder Judiciário,
seu mandarinato já não serve nem para produção de embutidos pela JBS.
Mesmo com todo o
desprezo que o senhor Michel Temer demonstrou nutrir pela República, (esse
sentimento ficou claro ao se permitir participar da trama que agora está sendo
divulgada), e pelo que se pode depreender dos fatos revelados nas gravações dos
Irmãos Batista, (ainda que editadas ou forjadas), não é preciso ser
constitucionalista nem penalista para logo se perceber quão graves são os
crimes contidos no diálogo do empresário com o ainda Presidente.
Se as delações dos
executivos da Odebrecht não encontram precedentes na história política
brasileira, pelo largo espectro de políticos e partidos envolvidos, convido os
do "andar de cima", que ora fazem de tudo para defender o senhor
Michel Temer, a fazerem uma aligeirada reflexão sobre a gravidade dos crimes
cometidos pelo Presidente da República, a partir dos conteúdos revelados nessas
gravações publicadas nas últimas duas semanas.
O mínimo que se lhe
pode imputar são os crimes de responsabilidade e de prevaricação, pois durante
38 minutos de gravação (esse é o tempo que durou a conversa do empresário com o Presidente), atentamente ele ouviu os relatos do cometimento de vários delitos
praticados pelo gângster Joesley, que vão da compra do procurador da república
Ângelo Gullar, já preso, passando pela concessão de propina a dois juízes
citado nas gravações (ainda não se conhece o seus nomes), ao pagamento a um
informante da força tarefa da Operação Lava Jato, (também não revelado ainda),
até a interferência na nomeação de agentes públicos nos vários órgãos do
governo, e pasmem – alguns dos delitos, como a compra do silêncio do Eduardo
Cunha e do doleiro Lúcio Funaro, com a plena concordância do Presidente, com a
frase: “Isso você deve continuar, viu!”.
Tudo isso relatado ao
Presidente, até com uma certa jactância, pelo senhor Joesley – que, a bem da
verdade, já era investigado pela prática de outros crimes, em cinco outros
processos pretéritos aos fatos agora revelados. Para agravar ainda mais o nebuloso cenário em
que esses fatos ocorreram deve ser dito que a trama foi encenada em uma reunião
secreta no Palácio do Jaburu, onde o senhor Michel Temer teve a preocupação de
perguntar ao seu interlocutor se alguém o havia visto entrar. O leitor saberia o
porquê desse cuidado? A um presidente da República é dado o direito a conversar
com um criminoso confesso, e ouvir os relatos dos seus crimes, e, não só ficar
calado, mas até manifestar o seu apoio?
O senhor Michel Temer,
ao aceitar participar desse despudorado enredo, demonstrou, além de desapreço
pelo republicanismo, não ter qualquer noção das nobres responsabilidades e da
concepção do que significa exercer a função de Chefe de Estado. Assim, é
preciso dizer-lhe que a majestade do cargo de Presidente da República não se
coaduna com a realização de encontros, ainda que informais, às escondidas, na
calada da noite, e menos ainda em companhia de um criminoso lesa-pátria, para tratar
de negócios pouco ortodoxo com o Governo.
Diante dos fatos que
abalaram a Nação, quando o Brasil inteiro esperava sua renúncia na última
quinta-feira, o senhor Michel Temer surpreendeu a todos, reafirmando sua
permanência no cargo. Aqui deve ser lembrado que quando a banda
"pútrida" dos seus Ministros começou a ser denunciada pela Lava Jato,
o Presidente logo se apressou em estabelecer e anunciar uma linha de corte,
adotando como critério para exoneração dos mesmos a denúncia contra eles, pois
enquanto investigados permaneceriam nos cargos, e assim é até hoje. Adotando
para si o mesmo critério, para o seu próprio benefício, talvez por isso tenha
afirmado em alto e bom som que não renunciaria, já que, por enquanto, é apenas
investigado, por determinação do Ministro Edson Fachin.
Assim, como fizera
Galileu Galilei, ainda no século XVII, quando apontou pela primeira vez seu
telescópio para os céus e identificou buracos negros na atmosfera, os irmãos
Joesley e Wesley Batista, quatro séculos depois, com suas lunetas de longo
alcance para a prática da corrupção, repetiram o gesto do cientista e astrônomo
Italiano seiscentista.
Dos
abatedouros da JBS, e das janelas de luxuosos apartamentos na Quinta Avenida em
Nova York, ao apontarem suas lunetas de longo alcance para o BNDES, fundos de
pensão e o Governo como um todo, desde a era Lula, logo também identificaram os
muitos buracos negros para a prática de um agudo processo de corrupção, até
mirar e abater o Presidente Michel Temer no Palácio do Jaburu, para com a sua
carcaça enriquecer a produção de embutidos, trazendo a chancela do PMDB e do
PSDB, e o selo de qualidade do Procurador Rodrigo Janot e do Ministro Edson Fachin, que os premiaram com uma vida nababesca – livre,
leve e solto pelo mundo afora, depois de todos os crimes cometidos.
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