segunda-feira, 17 de abril de 2017

ARTIGO - A Velha Novidade (RV)


A VELHA NOVIDADE
Reginaldo Vasconcelos*



A chamada “delação do fim do mundo” foi deflagrada exatamente quando entrávamos nesta Semana Santa, que se encerrou no domingo passado. Não veio como o advento de algo inesperado, mas como aquele ansiado grito do menino do conto de Andersen: “O rei está nu!!!”. Como na fábula, todos sabiam, mas não se podia constatar.

  
A corrupção no Brasil não é novidade. Desde sempre se soube que a política e a administração pública brasileiras  driblavam as éticas jurídica e social, por meio do chamado “jeitinho brasileiro”, aplicado na troca de favores ilícitos ou por meio de propinas.  


Vimos de longe com uma direita desonesta, em permanente relação incestuosa com a grande empresa nacional, mantendo intensa promiscuidade entre interesses eleitorais e o erário público, naquilo que o compositor Chico Buarque chamou de “tenebrosas transações”.

Então, há quase vinte anos, a esquerda assumiu o poder com discurso moralizador, e todos esperávamos que fosse haver uma devassa nas células apodrecidas do poder público, e que uma renovação dos hábitos se operasse.


Qual nada, a patifaria continuou, se aprimorou, se agudizou, até que a “casa caiu” – como dizem na polícia – ao preço da falência do País, restando enfim evidente que havia uma espúria ética interna na política brasileira, um pacto suprapartidário segundo o qual se podia “fazer o diabo” para obter e manter o poder, de tal modo que o povo, embora desconfiasse, fosse mantido na ilusão.


Era “normal”, era “institucional”, havia no mínimo trinta anos – segundo afirmou Emílio Odebrecht. A nudez do rei era de fato muito antiga, todo mundo sabia, os mais tolos desconfiavam, os mais crédulos imaginavam que haveria exceções... e nada se dizia, não se podia provar, não se fazia nada.

A propósito, o Professor Doutor Cid Carvalho, Presidente de Honra da ACLJ, um dos mais importantes jornalistas do Estado, elegeu-se Senador da República 1986, pelas mãos de Tasso Jereissati, o maior governador que o Ceará já conheceu, um político tão rico quanto honesto, jamais citado ou imaginado em embustes e tramoias.

Antonino Carvalho, primogênito de Cid, conta que certa vez, ao ir a Brasília quando o pai era do Senado, recebeu recomendação sua de não aceitar nenhuma das ofertas que certamente os lobistas lhe fariam – carros de luxo, hotel cinco estrelas, scort girls? Então, fica confirmado: Lá em Brasília, há mais de trinta anos, o senador cearense já sentia o odor dessa podridão que a Lava Jato trouxe a lume.

As centenas de citados nas delações da Odebrecht recorrem à mesma cantilena para responder às acusações: “Não recebi nem autorizei ninguém a receber”; “As contas da minha campanha foram aprovadas pela Justiça Eleitoral”; “Tenho certeza de que meu processo será arquivadoEstou à disposição do Poder Judiciário”.

Mas o argumento mais cínico é aquele de que as delações de outros envolvidos não têm força de prova, que tudo que eles dizem precisaria ser provado. Ora, testemunha dos fatos, embora seja considerada “a prostituta das provas”, é prova fortíssima.

E no caso daqueles que fazem acordo com o Ministério Público, com muito mais veras. Esses são testemunhos qualificados. Ademais, centenas de milhões de reais não podem sumir sem deixar rastros. Os delatores saberão indicar como rastreá-los.

Pessoalmente, a essa altura, não me interessa quem foi citado desta vez, quem será citado depois, quem vai ser condenado, se e quando uns e outros serão presos – o Lula, a Dilma, o Aécio, o Temer, Caifás ou Ferrabrás.

Para mim, o que é mais relevante neste momento é a grave constatação de que os políticos brasileiros não representam o seu eleitorado, de modo que não têm legitimidade real.  Que, portanto, a república brasileira é de fato uma ficção sarcástica, e a democracia no Brasil foi carnavalizada.

Que o povo brasileiro não sabe mesmo votar, que o Brasil não é realmente um país sério, que este país anedótico é uma piada de mau gosto.


  

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