A VELHA NOVIDADE
Reginaldo Vasconcelos*
A chamada
“delação do fim do mundo” foi deflagrada exatamente quando entrávamos nesta
Semana Santa, que se encerrou no domingo passado. Não veio como o advento de
algo inesperado, mas como aquele ansiado grito do menino do conto de Andersen:
“O rei está nu!!!”. Como na fábula, todos sabiam, mas não se podia constatar.
A corrupção no
Brasil não é novidade. Desde sempre se soube que a política e a administração
pública brasileiras driblavam as éticas jurídica e social, por meio
do chamado “jeitinho brasileiro”, aplicado na troca de favores ilícitos ou por
meio de propinas.
Vimos de longe
com uma direita desonesta, em permanente relação incestuosa com a grande
empresa nacional, mantendo intensa promiscuidade entre interesses eleitorais e
o erário público, naquilo que o compositor Chico Buarque chamou de “tenebrosas
transações”.
Então, há quase
vinte anos, a esquerda assumiu o poder com discurso moralizador, e todos
esperávamos que fosse haver uma devassa nas células apodrecidas do poder público,
e que uma renovação dos hábitos se operasse.
Qual nada, a
patifaria continuou, se aprimorou, se agudizou, até que a “casa caiu” – como
dizem na polícia – ao preço da falência do País, restando enfim evidente que
havia uma espúria ética interna na política brasileira, um pacto
suprapartidário segundo o qual se podia “fazer o diabo” para obter e manter o
poder, de tal modo que o povo, embora desconfiasse, fosse mantido na ilusão.
Era “normal”,
era “institucional”, havia no mínimo trinta anos – segundo afirmou Emílio
Odebrecht. A nudez do rei era de fato muito antiga, todo mundo sabia, os mais
tolos desconfiavam, os mais crédulos imaginavam que haveria exceções... e nada se
dizia, não se podia provar, não se fazia nada.
A propósito, o
Professor Doutor Cid Carvalho, Presidente de Honra da ACLJ, um dos mais
importantes jornalistas do Estado, elegeu-se Senador da República 1986, pelas
mãos de Tasso Jereissati, o maior governador que o Ceará já conheceu, um
político tão rico quanto honesto, jamais citado ou imaginado em embustes e
tramoias.
Antonino
Carvalho, primogênito de Cid, conta que certa vez, ao ir a Brasília quando o
pai era do Senado, recebeu recomendação sua de não aceitar nenhuma das ofertas
que certamente os lobistas lhe fariam – carros de luxo, hotel cinco estrelas, scort
girls? Então, fica confirmado: Lá em Brasília, há mais de trinta anos, o
senador cearense já sentia o odor dessa podridão que a Lava Jato trouxe a lume.
As centenas de
citados nas delações da Odebrecht recorrem à mesma cantilena para responder às
acusações: “Não recebi nem autorizei ninguém a receber”; “As contas
da minha campanha foram aprovadas pela Justiça Eleitoral”; “Tenho
certeza de que meu processo será arquivado; “Estou à disposição do
Poder Judiciário”.
Mas o argumento
mais cínico é aquele de que as delações de outros envolvidos não têm força de
prova, que tudo que eles dizem precisaria ser provado. Ora, testemunha dos
fatos, embora seja considerada “a prostituta das provas”, é prova fortíssima.
E no caso
daqueles que fazem acordo com o Ministério Público, com muito mais veras. Esses
são testemunhos qualificados. Ademais, centenas de milhões de reais não podem
sumir sem deixar rastros. Os delatores saberão indicar como rastreá-los.
Pessoalmente, a
essa altura, não me interessa quem foi citado desta vez, quem será citado
depois, quem vai ser condenado, se e quando uns e outros serão presos – o
Lula, a Dilma, o Aécio, o Temer, Caifás ou Ferrabrás.
Para mim, o que
é mais relevante neste momento é a grave constatação de que os políticos
brasileiros não representam o seu eleitorado, de modo que não têm legitimidade
real. Que, portanto, a república brasileira é de fato uma ficção
sarcástica, e a democracia no Brasil foi carnavalizada.
Que o povo
brasileiro não sabe mesmo votar, que o Brasil não é realmente um país sério,
que este país anedótico é uma piada de mau gosto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário