JUDICIÁRIO E POLÍTICA
Rui Matinho Rodrigues*
Vivemos uma grave crise. A polifonia em torno desta situação admite:
o impasse político é o nó górdio da tempestade. A reforma política exige
clareza do que entendemos como Estado democrático e o tipo de ordem política,
econômica e social que desejamos. Os ingredientes da ordem política, qualquer
que seja ela, incluem a noção de participação e representação dos cidadãos;
divisão e equilíbrio de poderes; garantias institucionais; segurança jurídica;
ao lado da Antropologia Filosófica a ser considerada, isto é, o que entendemos
que sejam os seres humanos.
O homem “nasce bom e a sociedade o corrompe” (Rousseau)? É “um
animal político (sociável) por natureza” (Sócrates)? Quem pensa assim tende a
buscar fundamento para a democracia nas virtudes do povo.
Pode-se, todavia,
admitir mais acertadamente, que o homem se comporta como animal político por
necessidade, não por virtude natural e a sociedade reflete as imperfeições dos
homens como admitiu Platão na obra “As leis”. A democracia reconhece o direito
do povo decidir porque não tem opção melhor.
As imperfeições humanas não se
corrigem com o aprimoramento intelectual. Não se pretende delegar ao povo
decisões técnicas, mas questões valorativas; e que autorize temporariamente
alguém a escolher decisões técnicas. Voto é confiança, não discernimento
técnico. Os intelectuais produziram os piores regimes. Um líder apedeuta não
representa o povo simples. Ele é um boneco de ventríloquo dos intelectuais.
Corporativismos devem ser evitados. O sistema de freios e
contrapesos não deve ser esquecido. Mas o poder político, por ser
representativo, malgrado as graves imperfeições da representação, deve ser a
fonte de todo poder. O Judiciário, que deve ser independente, precisa ter um
papel político. Por isso os ministros do STF devem ser escolhidos pelo poder
representativo, não para subordiná-los aos partidos, mas para direcioná-los de
acordo com uma política judicial, como o maximalismo ou minimalismo penal.
A
reforma política deve manter escrupulosamente a separação dos poderes, mas deve
preservar a condição de legitimidade derivada do Judiciário, que nasce da
escolha dos ministros do STF pela via política, como é na maioria das democracias. Não
queremos um governo de juízes, sem legitimidade primária.
COMENTÁRIO:
Discordar de
qualquer assertiva feita pelo Prof. Rui Martinho Rodrigues é tão temerário
quando cutucar um leão com uma vara curta. Aliás, não importa o tamanho da
vara. É sempre um perigo discutir com um sábio, e aquele é o membro mais
ilustrado da nossa Academia, seguramente, sem favor nenhum, um dos maiores
polímatas do Estado e do País.
Mas ouso me arriscar
uma vez ou outra, se não para vencer o debate, tarefa inglória, pelo menos para
exercitar a nossa “fera” do saber, estimular essa “cobra” dos argumentos a movimentar
a musculatura constritora do privilegiado raciocínio, provocar o voo majestoso dessa
“água” do conhecimento, que não ficaria nada a dever àquele outro Rui, dito a
Águia de Haia.
Do alto da minha
imensa ignorância, não acredito nesse conceito de legitimidade, direta ou
indireta, a que o Prof. Rui se refere, mas apenas na capacidade intelectual das
pessoas, no caráter moral das pessoas, predicados que somente podem ser
reconhecidos ou negados por quem as conheça de perto – e ninguém melhor do que
os próprios pares para apontar com segurança à Nação, dentre eles, os melhores.
Por isso, para mim,
a nomeação política dos membros dos tribunais superiores é um equívoco, pois
esses deveriam ser eleitos pela sua classe magistrada. Segundo penso,
corporativismo é a autoproteção de uma classe em detrimento de outras, que não
é o caso, pois o processo seria intestino. Discordo ainda do meu próprio mestre
quando ele entende que a intelectualidade pessoal não contribui para o aprimoramento do
caráter.
Para mim, os homens
nascem bons ou ruins, a depender de sua genética, e melhoram ou pioram ao longo
da vida, mercê de seu potencial de descortino, de suas experiências de vida,
dos exemplos que tenham, da educação que recebam. E, me parece claro, a escolaridade,
o saber livresco, o cabedal teórico, a cultura humanística, o domínio da
história, a lucubração filosófica, a graduação acadêmica, se não pioram os
homens, só os podem melhorar.
Por fim, o Prof. Martinho Rodrigues, após o seu sempre brilhante pontificado, encerra o artigo dizendo
que “não queremos um governo de juízes”,
sem designar quem ele inclui nesse sujeito oculto “nós”. Digo-o... e corro.
Reginaldo
Vasconcelos
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