TRUMP É DIREITA OU ESQUERDA?
Rui Martinho Rodrigues*
Donald Trump é contra a globalização, o livre
comércio, o intervencionismo pelo qual os EUA se imiscuíram nos conflitos por
toda parte. Disse que o Japão e a Coreia do Sul deveriam cuidar da própria
defesa, fazendo suas próprias armas nucleares. Renunciou ao papel de polícia da
proliferação nuclear. É protecionista. Pratica a intervenção nas decisões das
empresas, coagindo montadoras de automóveis a mudar investimentos do México
para os EUA. Adota teses mercantilistas do século XVII. É nacionalista. É
esquerda?
Nacionalismo era coisa de direita. Com a
guerra fria passou a coisa de esquerda, para servir de arma contra os EUA. O
livre comércio e a globalização eram satanizados pela esquerda. Com o Brexit,
Trump e assemelhados na Europa passaram a ser defendidos por quem os combatia.
Agora, quem defende o livre comércio e a globalização é Xi Jinping, dirigente do Partido
Comunista Chinês. A mudança não é da essência do nacionalismo. Este continua uma paixão irracional como
qualquer outra. Já foi descrito como o último reduto dos canalhas. Mudou a
exploração que se faz dele.
A determinação de dirigir a economia privada
sempre foi uma prática da direita, que queria mandar sem estatizar; e da
esquerda, que queria mandar estatizando. Hoje, a maior parte da esquerda já não
quer estatizar, só quer mandar e trocar apoios por benesses, e mais alguma
coisinha.
A renúncia ao papel de polícia do mundo
subitamente deixou de ser uma reivindicação da esquerda. Agora é ameaça do
Trump. O fim da pax americana é um
lamento, anuncia o agravamento dos conflitos regionais.
Norberto Bobbio, na obra “Esquerda e direita”,
admite a existência da dicotomia, depois de demonstrar que nenhuma bandeira
política é exclusividade de um ou de outro agrupamento. Democratas,
autoritários, totalitários, nacionalistas, cosmopolitas, românticos, tudo isso
e muito mais estão dos dois lados.
Bobbio, porém, reafirma a existência dos dois
polos. Não porque um defenda mais a liberdade e o outro a igualdade, nem afirma
que um seja mais inclinado a uma Antropologia filosófica otimista e outra à
pessimista, nem que um seja favorável aos oprimidos e outro contrário, pois
isso seria uma falácia ad hominem,
confundindo os diferentes caminhos para o mesmo objetivo com defesa e oposição
em face da meta citada.
Bobbio reconhece a dicotomia, por ser, na
prática, reconhecida. Não se importa com o fato de que as inúmeras bandeiras
políticas não se dividem uniformemente em dois blocos. Quem é contra a pena de
morte não é obrigado a ser a favor do aborto; nem quem é a favor do casamento
entre pessoas do mesmo sexo está obrigado a ser contrário a posse de um meio de
defesa.
Getúlio e Peron eram direitistas. Depois de
mortos foram transformados em esquerdistas. Nos anos trinta do Século XX os
nossos intelectuais, em geral, eram direitistas. Subitamente converteram-se à
esquerda. A dicotomia é falsa. O que existe é esquerdo-direitismo. Trump é
isso, na versão populista. Passa por cima dos partidos e instituições.
Comunica-se direto com as massas.
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