ACIDENTE AÉREO
EM PARATY
MEU PONTO DE VISTA
COMO
AVIADOR
Ulysses Gaspar*
Tenho me deparado nos últimos dias, principalmente
através das redes sociais, com insinuações de que o acidente aéreo que vitimou
o ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki e mais quatro pessoas,
teve um cunho de atentado.
Em um país como o nosso, no qual quase todo o meio
político está envolto em corrupção e sob os holofotes da justiça, não é de se
admirar que as pessoas pensem logo em tamanha barbaridade, nos remetendo,
inclusive, às lembranças dos anos 80, quando, na Colômbia, um grupo
denominado Cartel de Medellin, comandado por Pablo Emílio Escobar Gaviria,
barbarizava com atentados, eliminando juízes e autoridades que se dispunham a
investigá-los. Os atentados eram realizados de forma brutal e variavam de
crimes “a bala”, até ações terroristas contra a aviação comercial.
Porém, analisando tecnicamente, tenho outra visão do
acidente, mas me resguardo afirmando que qualquer conclusão nesse momento seria
precipitada, pois o laudo final será emitido por uma comissão técnica do CENIPA
(Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) e um grupo da
Polícia Federal especializado neste tipo de investigação.
Eu sou piloto comercial e estive na ativa de 1984 a 1995,
quando, por opção, troquei a aviação por outras atividades empresariais. Nesse
período em que atuei como piloto comercial tive oportunidade de voar em várias
aeronaves, inclusive um avião modelo Carajá, no qual voei aproximadamente 1500
horas.
O Carajá é uma aeronave turbo hélice tão moderna e
sofisticada quanto o King Air c-90 que se acidentou com o ministro. As duas
aeronaves pertencem à mesma categoria, ou seja, voam praticamente com a mesma velocidade de
cruzeiro e autonomia de voo, tendo o
sistema de avionics (equipamentos eletrônicos de navegação) muito semelhantes.
Operei nesse período em modernos aeródromos, equipados
com os mais sofisticados sistemas de aproximação por instrumento, que, associados aos avançados sistemas de navegação das modernas aeronaves, torna a
aproximação e o pouso nesses aeroportos uma tarefa muito segura e precisa.
A aeronave que transportava o ministro e as outras
vítimas dispunha dessa aparelhagem tecnológica e avançada. O piloto tinha
qualificação técnica e muita experiência, tanto no equipamento, quanto no
conhecimento da região, porém o aeródromo não dispunha de nenhum recurso
tecnológico para a operação. Chovia muito no local, o teto (base das nuvens)
estava muito baixo, pois as nuvens estavam bastante carregadas.
O piloto precisava fazer uma aproximação visual, ou seja,
todo o procedimento de separação vertical, lateral e pouso mantendo referências e
contatos visuais com o solo. Segundo testemunhas, o avião fez curvas de 180
graus com baixa altura e com grande inclinação lateral, isso porque, conforme
acima mencionado, o teto estava muito baixo.
Além disso, é bom frisar que neste momento de
aproximação a aeronave se encontra geralmente em baixa velocidade, ficando
muito próximo de um fenômeno técnico chamado stoll (condição em que a
aeronave perde por completo a sustentação). Vale salientar que curvas de grande
inclinação lateral também aproximam a aeronave do fenômeno stoll.
Portanto, com base no meu conhecimento técnico, nas condições adversas
meteorológicas da região no momento do acidente e no depoimento de algumas
testemunhas do acontecido, suponho que o comandante tenha tido uma
desorientação espacial, levando a aeronave à condição de stoll,
provocando, consequentemente, o choque com o mar.
Cabe aqui mais uma opinião: este tipo de aeronave é
fabricada com duplo comando, ou seja, para ser operada por dois tripulantes,
porém as regras de voo visual a homologa para voar com um só piloto, situação
que acho muito perigosa, pois em uma cabine existe muito equipamento para ser
supervisionado por um só tripulante, o que, acrescido a condições meteorológicas
adversas, torna o voo muito vulnerável. Aguardemos o laudo final do CENIPA para
averiguarmos se estou no rumo certo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário