MALINAÇÕES EM PLENO EXPEDIENTE
Vianney Mesquita*
A ociosidade é a mãe de
todos os vícios. (Dito lusitano).
A ociosidade é a mãe de
todos os vices.(Paródia do Mons. Francisco SADOC DE ARAÚJO. Sobral, 17.12.1931).
De certa feita, abri a porta da Vice-Reitoria
da Universidade Federal do Ceará, com o fito de cumprimentar, no modo ordinário
de fazer, o então vice-reitor e meu amigo, Professor Ícaro de Sousa Moreira,
hoje na Casa do Pai. Eis que, por mim inesperado, esse atilado arturo-scottiano
dirigia uma “távola retangular” com umas quinze ou mais autoridades acadêmicas.
Só depois, soube que o reitor, Professor Renê Teixeira Barreira, estava de
viagem. Escabriado, ía fechando, quando ele disse:
– Entre, professor. Quer alguma coisa?
– Não. Apenas cumprimentá-lo. E a todos.
Então, para não passar batido, fiz esse
comentário:
– Magnífico: você está desdizendo a paródia cunhada pelo Monsenhor Sadoc!
– Magnífico: você está desdizendo a paródia cunhada pelo Monsenhor Sadoc!
– Qual é a paródia?
– A
ociosidade é a mãe de todos os vices. Casquinada
geral.
Comentada para abrir estas lérias a dita
paródia, remeto-me a Folha de Dezembro,
saída deste medium no dia 3 mais
recente, a fim de recordar o ócio praticado em expediente duro, porém gostoso e
saudável, como escriba do Reitor Hélio Leite, coadjutor dos diretores de
centros e faculdades, assistente dos pró-reitores, ajudante de docentes e
funcionários e, como os portugueses exprimem, acólito “de toda a gente”.
Os dois turnos e meio de intenso trabalho,
no entanto, eram de tal modo rentáveis que tive até a ensancha de publicar um
livro (1989) – Impressões – Estudos de
Literatura e Comunicação, título sugestionado pelo meu amigo, então datilógrafo (eita! Olha a diacronia da
Língua!) da Reitoria, o hoje Procurador da UFC, escritor José Edmar da Silva
Ribeiro.
Anselmo Frazão (acaba de fazer 90), diretor
da Imprensa Universitária, figura alegre, inteligente e acerbo crítico de tudo
e de todos, era, a despeito dessas qualidades, um dos cristos. Com o
beneplácito do Reitor e a parceria do vice, Professor Raimundo Holanda Farias, enriquecíamos
o Prof. Faria Guilherme como proprietário de fazendas e mais fazendas em Goiás,
acionista grande da Ferrari, sócio do Jumbo (hoje, Pão de Açúcar) e mais e
mais; Vianney Mesquita era nome de rua no São Gerardo, amigo e colega do Ciro
Gomes na Faculdade de Direito (verdade); Agerson Tabosa Pinto, meu parente,
amicíssimo do Frazão, emérito viajante, privava da companhia de Mohamed Reza
Pahlevi, xá do Irã, desde quando os dois se encontraram (1978) em Tabriz e
Shiraz; e o Professor Júlio Maria Lima de Araújo levou o Papa João Paulo II
para um almoço em sua casa. Em tudo isso ele cria com a maior facilidade!
Um dia veio, remetido pela assessoria do
Presidente Fernando Collor de Melo, um livro a respeito do jornalista e
político brasileiro Lindolfo Leopoldo Boeckel Collor, avô do ex-Presidente, com
um cartão trazendo a assinatura de punho – autêntica – da mãe de Fernando
Affonso. Com ótimo espaço antes da firma de Dona Leda (é), pedi ao dito Edmar
para datilografar esse
“oferecimento”:
Para o distinto mestre,
meu amigo particular, Professor Vianney Mesquita, a fim de que possa apreciar o
registro da admirável biografia do meu pai, exemplo a ser seguido por qualquer
bom brasileiro. Em Maceió, sempre à disposição. Renovo-lhe minha admiração.
Leda.
Nem foi necessário mostrar ao Frazão, pois
o volume, dadivosamente à vista sobre minha mesa, foi tascado por ele, que logo
o folheou e viu o cartão. Falou, então, para o Sr. José Rodrigues (garçon do
Gabinete que passava com a bandeja) apontando para mim: Ei, Zé, um cafezinho aqui pra mim e o futuro reitor!
O feitiço, entretanto, se voltou contra o
feiticeiro, num evento do qual jamais descobri a lavra. Guardo, entretanto, a
impressão de que teve a arte da professora Joseneide Franklin Cavalcante, de
sociedade com o Prof. José Nelson Espíndola Frota, então Pró-Reitor de
Extensão, por conta do estilo admirável daquela saudosíssima docente.
Costumava descansar alguns dos meus livros
didáticos numa mesinha auxiliar, vizinha da carteira grande, os quais os
passantes folheavam à vontade. Tempos depois de deixar a Reitoria, precisei
conferir uma citação do Discurso do
Método, a fim de forrar o capítulo inaugural do livro Resgate de Ideias – Estudos e Expressões Estéticas, intitulado
“Acerca do Conhecimento e do Método”. (1996, pp. 22-44).
Assim que abri esse excepcional rebento racionalista, li, na folha de rosto, à semelhança do que se vê no bilhete de Dona Leda Collor de Melo, porém em manuscrito por mim desconhecido, com estese caligráfica feminina:
_________________________________
“COGITO, ERGO SUM.
Para o célebre regente brasileiro, Professor João Vianney Campos de
Mesquita, este mero exercício investigativo, com vistas a conformar a Ciência à
pura razão, às compreensões apenas lógicas do conhecimento para expressão da
realidade.
Que esta simples diligência perquisitiva lhe aproveite à exaustividade.
Abraço-o com efusão.
La Haie en Touraine, 17 de fevereiro de 1638.
René
Descartes”.
*João VIANNEY Campos de MESQUITA é Prof. Adjunto IV da UFC. Acadêmico Titular das Academias Cearense da Língua Portuguesa e Cearense de Literatura e Jornalismo. Escritor e jornalista. Árcade fundador da Arcádia Nova Palmaciana. Membro do Conselho Curador da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura-FCPC-UFC.
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