O SIGNIFICADO
DE CONVERSAS
Rui Martinho Rodrigues*
Conversas podem adquirir múltiplos significados. Conteúdo, pessoa e
atividade dos interlocutores, âmbito em que ocorrem e circunstâncias em que se
desenrolam ensejam diferentes sentidos aos diálogos. Um conteúdo pode ter conotação
diferente, conforme seja objeto de declaração formal, ou opinião confidenciada
informalmente na intimidade entre amigos. A proteção dada à intimidade, na
forma de garantia constitucional ao segredo, porém, pode ser afastada quando o
conteúdo tenha relação com o interesse público, ou esteja ligado ao exercício
do munus publicum.
Autoridades, porém, não estão impedidas de cultivar amizades,
trocar desabafos, confessar temores e apreensões uma às outras. Os órgãos do
Ministério Público Federal (MPF) podem ter apreensões humanas ligadas a
personagens por eles acusados, principalmente quando estes proferem ameaças
nada desprezíveis para quando voltarem ao poder. Os fiscais da lei podem
conversar entre si e mencionar orações para que isso não aconteça. Tal fato não
é incompatível com o exercício do aludido munus publicum.
Órgãos do MPF
não são proibidos de conversar uns com os outros sobre o que quer que seja.
Confessar apreensões e mencionar que apelam a Deus, o que pode ser mera figura
de linguagem para expressar desejos ou temores, não é atitude incompatível com
o desempenho dos encargos ministeriais. Enfrentar numerosos e poderosos infratores,
articulados em organização criminosa, com apoio nas mais altas esferas dos Poderes
da República, é algo preocupante, exceto para os super-heróis de revistas de
quadrinhos. Confidências, em tais circunstâncias, não caracterizam
irregularidade processual.
A comunicação de um órgão do MPF, sobre um processo em que atua,
com o juiz da mesma ação, é algo distinto da conversa entre Procuradores, e é
objeto de certas restrições legais. O processo acusatório separa quem acusa de
quem julga.
Mas juízes e procuradores que oficiam na mesma vara, debruçando-se
sobre os mesmos processos, não estão proibidos de cultivar amizade, conversar
informalmente e fazer desabafos e confidências na intimidade. O que não é
permitido é a subordinação de uns aos outros.
A independência do MPF é
assegurada constitucionalmente e os seus integrantes são ciosos de suas prerrogativas.
Quem conhece os meios forenses sabe que Procuradores não se deixam tutelar.
Podem, todavia, ter ideias semelhantes às do juiz. Isso não é proibido nem é
conluio.
A independência do MPF e a imparcialidade de um juiz podem ser
avaliadas pelas divergências entre eles. Sérgio Moro absolveu cinquenta e
quatro réus, para os quais o MPF havia pedido condenação, e teve impugnadas,
pela via recursal, centenas de decisões terminativas e interlocutórias. Não houve
tutelava sobre o MPF, nem conluio deste com o juiz citado, nem sanha
persecutória. Procuradores são selecionados mediante concursos rigorosíssimos.
São profissionais qualificados. Não precisam de guias de cego.
O interesse público afasta a intimidade e a proteção ao segredo. Uma
informação que revele uma clara tentativa de obstacular a ação da Justiça,
valendo-se de documento oficial produzido no exercício de uma elevada função
pública não deve ser sigilosa. Precisa obedecer o princípio da publicidade dos
atos administrativos e processuais. Caracteriza conduta ilícita. Uma conversa
informal, porém, sem a elaboração de nenhum documento oficial e sem efeito
sobre as decisões oficiais não viola o Direito Processual Penal. Já a tentativa
de promover a impunidade de réu ou condenado, violando comunicações para criar
uma aparência de nulidade processual, é uma ilicitude.
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