quarta-feira, 27 de março de 2019

ARTIGO - Cosi È Se Vi Pare (HE)


COSI È SE VI PARE*
Humberto Ellery**



O teatrólogo italiano Luigi Pirandello criou uma peça teatral cômica, “Assim é se lhe parece”, para tratar de um assunto sério (ele a classificou como uma “farsa filosófica”), que é a discussão entre o que vemos e o que é a verdade, entre o que realmente é, e o que parece ser.

Um exemplo muito claro dos enganos que nossos sentidos nos induzem a cometer é que, se não fosse Nicolau Copérnico, autor do Heliocentrismo, poderíamos pensar que a terra está parada e o sol fica orbitando em torno, surgindo todas as manhãs no leste e desaparecendo ao entardecer no oeste. É isto que vemos diariamente. 

Aliás, a discussão entre o que é apenas uma opinião e o verdadeiro conhecimento, já era uma preocupação dos filósofos pré-socráticos (Século IV a.C), que Platão desenvolveu nos seus Diálogos e n´A República: Doxa e Episteme.

Todos esses pensamentos ficaram ocupando meu cérebro a partir da prisão preventiva do Michel Temer. Como não sou jurista fui pesquisar o que dizem os doutores no assunto, e procurei ler não só a denuncia do MP, como também o Despacho do Juiz Marcelo Bretas. Não sem antes ler e reler o Art. 312 do CPP, e tendo em mente sempre o brado do pintor Apeles: ne sutor ultra crepidam!

Sem querer ir “além das sandálias”, mas como sei ler e interpretar o que leio, fiquei estarrecido ao ler no despacho do Doutor Bretas coisas como “Não há um decreto condenatório em desfavor dos investigados (nenhum é réu, nem sequer indiciado) a análise a ser feita é ainda superficial, mas o fato é que o crime de corrupção, numa análise ainda superficial” (repete a superficialidade que embasou a prisão de um Ex-Presidente da República). Mais adiante afirma que “...o chefe da suporta Organização Criminosa parece ser o Ex-Presidente Michel Temer”.

Depois fiz uma releitura do Despacho contando quantas vezes o Juiz se pautou pelo parece ser; em dezenove oportunidades foi utilizado o verbo “parecer”. A cada duas páginas está lá o Doutor tomando a Doxa pela Episteme.

Depois de ler o Habeas Corpus exarado pelo Desembargador Antônio Ivan Athié, que desmontou, peça por peça, a ficção do Doutor Bretas, fui ler artigos de professores de Direito comentando o despautério, inclusive um manifesto assinado por dezenas de juristas, e deparei com um artigo do Professor Doutor João Paulo Martinelli (FSP 25/03/19) que, em apenas cinco parágrafos alertou para um absurdo que grassa hoje em nossa sociedade: a banalização da prisão no Brasil!

Agora uma pergunta: será que o Juiz Bretas pretendia mesmo prender o Michel Temer como parte de um implacável combate à corrupção? Não acredito, creio serem outros seus objetivos, e ele atuou com invulgar maestria.

Em primeiro lugar, ele atuou num campo que ele conhece muito bem, o meio jurídico, onde juízes são praticamente inimputáveis, praticamente fora do alcance da Lei de Combate ao Abuso de Autoridade (Lei 4.898/65); em seguida, soube escolher o alvo perfeito: o Ex-Presidente Michel Temer, o mais impopular presidente do Brasil, apesar de ter feito o mais profícuo e benfazejo governo dos últimos trinta anos.

Quais eram então seus objetivos? O primeiro, e mais importante, tomar para si a coroa que o Robespierre de Curitiba deixou sobre o trono quando o trocou pelo Ministério da Justiça.

Com isso o Doutor Bretas sentou-se ao trono e pôs a coroa antes que algum aventureiro lance mão. Ninguém o tira mais do trono, e o Caçador de Corruptos é sempre vivamente aplaudido até quando eventualmente erra. Ou será que nunca erra?

O segundo objetivo, também importante, foi dar uma violenta canelada no STF, que ousou mandar que se cumprisse a Lei, e determinasse que os crimes conexos ao caixa dois sejam julgados também pelo TSE, (os primeiros parágrafos do despacho são um ataque direto à Suprema Corte), retirando do parquet o filé de prender políticos e os aplausos daí decorrentes.

O terceiro objetivo foi dar um “chega pra lá” nas pessoas que “querem acabar com a Lava-Jato’; foi uma injeção de ânimo, mais que isso, uma revigorante transfusão de sangue. Antes que os militantes do lavajatismo queiram me colocar no rol dos “inimigos da Lava-Jato”, faço minhas as palavras da Dra. Raquel Dodge: “Sou a favor da Lava-Jato, mas não de interesses políticos na Operação”.

O quarto objetivo talvez não seja alcançado, que é inibir a aprovação da Reforma da Previdência, uma vez que o Moreira Franco, meio sogro do Rodrigo Maia, não é tão querido assim pelo Presidente da Câmara dos Deputados. Mas o Rodrigo Maia, como um dos principais fiadores da Reforma, talvez tenha entendido o recado: o Judiciário, com seus salários e aposentadorias extravagantes, não quer a Reforma, e não vai poupar ninguém.

Cosi è se vi pare...



*É assim, se lhe parece.



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